Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
terça-feira, 23 de novembro de 2021
"prova tem um tríplice significado:"
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"Assim, uma das características mais marcantes do processo penal é a vigência do chamado princípio da verdade real ([4]). Não deve o juiz criminal, por conta de tal princípio, satisfazer-se com a mera verdade formal (aparente) que lhe é exibida pelas partes."
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Política - Estadão
Tribunal da Lava Jato nega recurso de Lula e mantém pena de 17 anos de prisão no caso sítio de Atibaia
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DECISÃO
Moraes suspende quebra de sigilo telemático de Bolsonaro pedida pela CPI da Pandemia
Para Moraes, como as atividades da CPI encerraram-se, não há mais necessidade dos dados. Leia a íntegra da decisão
FLÁVIA MAIA
BRASÍLIA
22/11/2021 17:39
Atualizado em 22/11/2021 às 18:44
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Jair Bolsonaro
O presidente Jair Bolsonaro. Crédito: Marcos Corrêa/PR
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JOTA PRO PODER
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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu nesta segunda-feira (22/11), a quebra de sigilo de dados telemáticos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de abril de 2020 a outubro de 2021, requerido pela CPI da Pandemia. O ministro também afastou a solicitação de banir ou suspender as contas em redes sociais vinculadas ao presidente.
Para Moraes, como as atividades da CPI encerraram-se, não há mais necessidade dos dados. (Leia a íntegra do mandado de segurança)
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“Evidencia-se desse quadro que, finalizada a CPI com aprovação do relatório final, não há que se cogitar em aproveitamento pela própria Comissão Parlamentar de Inquérito das medidas constritivas mencionadas”, escreveu o ministro. “Não se vê, portanto, utilidade na obtenção pela Comissão Parlamentar das informações e dos dados requisitados para fins de investigação ou instrução probatória já encerrada e que sequer poderão ser acessadas pelos seus membros”, complementou.
Moraes destacou ainda que, se for de interesse da Procuradoria Geral da República (PGR) a obtenção desses dados, há via processual adequada para que se obtenha as mesmas informações.
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No dia 26 de outubro, a CPI da Pandemia aprovou o relatório final e o Requerimento nº 1.587/2021, após a finalização da fase de investigação e a elaboração do relatório da CPI, em que se pedia a quebra do sigilo telemático, o banimento do presidente das redes sociais e uma retratação por declaração falsa após ele associar vacinas contra Covid-19 à Aids. A comissão sugeriu ainda que o ministro Alexandre de Moraes incluísse a declaração de Bolsonaro sobre vacinas e Aids no inquérito das fake news, no qual o presidente já é investigado.
Bolsonaro impetrou, então, um mandado de segurança no dia 27 de outubro contra o requerimento. No documento feito pela Advocacia-Geral da União (AGU), o presidente pedia que fosse suspensa a eficácia da decisão proferida pela CPI da Pandemia, que as empresas Google, Facebook e Twitter não repassem as informações e que houvesse garantia do sigilo de todos os dados privados de Bolsonaro que não tenham nenhuma relação com o objeto da CPI.
De acordo com a peça, “a CPI – invertendo de forma integral a garantia dos direitos da parte impetrante –, determinou a adoção de várias providências em seu desfavor, dentre elas destaca-se a quebra de sigilos dos seus dados telemáticos, quando, repita-se, sequer pode o Presidente da República ser investigado no âmbito da CPI”.
O texto lembrava ainda que Bolsonaro não participou da comissão sequer como testemunha. “E nem poderia ser diferente, já que o Presidente da República não pode ser investigado no âmbito de CPI’s ou de qualquer outra Comissão Parlamentar, seja a que título for”, escreveu a AGU no pedido.
Como Moraes afastou todo o requerimento, foi derrubada também a necessidade de Bolsonaro fazer retratação quanto a sua fala que relacionou a vacinação contra Covid-19 à Aids.
O relatório final da CPI sugeriu o indiciamento de Bolsonaro e outras 77 pessoas, além de duas empresas que também foram indiciadas por crimes como corrupção e lavagem de dinheiro, como no caso da Precisa Medicamentos, e crimes contra a humanidade como da Prevent Senior. No documento, o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL) apontou que o presidente cometeu dez crimes.
FLÁVIA MAIA – Repórter em Brasília. Cobre Judiciário, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF). Foi repórter do jornal Correio Braziliense e assessora de comunicação da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Faz graduação em Direito no IDP. Email: flavia.maia@jota.info
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FONTE: JOTA
*** *** https://www.jota.info/stf/do-supremo/moraes-suspende-quebra-de-sigilo-telematico-de-bolsonaro-pedida-pela-cpi-da-pandemia-22112021 *** ***
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Código de Processo Penal: Estudos comemorativos aos 80 anos de vigência Tomo I e tomo ll
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Artigo 155 do código de processo penal: breves comentários
Rogério Sanches Cunha
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Publicado por Rogério Sanches Cunhahá 10 anos68,1K visualizações
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"Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil”.
1. Prova
O processo destina-se à aplicação do Direito; a aplicação do Direito, de sua parte, depende da existência ou verificação dos fatos aos quais a ordem jurídica alia a produção de um dado efeito jurídico ([1]). As provas, por sua vez, têm por função a demonstração da realidade dos fatos, um caminho a ser necessariamente desenvolvido até o juízo final. Como bem resume Germano Marques Silva, a expressão prova tem um tríplice significado:
“A – Prova como atividade probatória: acto ou complexo de actos que tendem a formar a convicção da entidade decidente sobre a existência ou inexistência de uma situação fatual;
B – Prova como resultado: a convicção da entidade decidente formada no processo sobre a existência ou não de uma dada situação de facto;
C – Prova como meio: instrumento probatório para formar aquela convicção”.([2])
2. Princípio da verdade real:
O processo, sabidamente, é o instrumento pelo qual o Estado aplica a jurisdição, consistente numa reconstituição de fatos. Materializa-se na tentativa de reconstrução da verdade com o escopo de se aplicar corretamente o Direito ao caso concreto. A verdade real, cuja busca é a tônica do Processo Penal, somente se atinge por intermédio da prova. Daí avulta a importância desse tema, referido nas Ordenações Filipinas como"o farol que deve guiar o juiz em suas decisões"(Liv. III, Tít. 63) ([3]).
Assim, uma das características mais marcantes do processo penal é a vigência do chamado princípio da verdade real ([4]). Não deve o juiz criminal, por conta de tal princípio, satisfazer-se com a mera verdade formal (aparente) que lhe é exibida pelas partes. Definido o objeto do processo pela acusação e delimitado consequentemente o objeto do julgamento, o julgador deve procurar a reconstrução histórica dos fatos ([5]), buscando, por todos os meios processualmente admissíveis, alcançar a verdade histórica, independentemente ou para além da contribuição da acusação e da defesa (art. 156, CPP) ([6]).
Portanto, a posição de inércia, mais freqüente no processo civil, onde vigora a máxima ne procedat ex officio, não se admite no âmbito criminal, isso porque, ao lidar com um dos mais caros direitos da pessoa – o direito à liberdade – deve o Magistrado procurar adequar sua decisão não somente à prova apresentada pelas partes mas, além disso, suprindo eventual omissão dos interessados, pesquisar os fatos, aproximando-os, o mais que possível, da verdade real. Tudo, é evidente, com o cuidado de não perder de vista a imparcialidade, agindo de maneira supletiva e jamais assumindo a posição de parte, acusando ou defendendo.
3. Princípio da liberdade de provas
A produção da prova no processo penal é livre (o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial). Como bem ensina Eugenio Florian, “o princípio da verdade material, que no processo brilha com luz própria e constitui fundamento do sistema probatório e o critério do livre convencimento, que é a alma e o espírito vivificador desse sistema, levam conjuntamente à conclusão de que os meios de prova não podem restringir-se a uma enumeração taxativa e inalterável. Assim manifesta-se em toda sua firmeza o princípio da liberdade dos meios de prova (Das provas, tomo I, p. 223).
A liberdade aqui prevista não é, nem deve implicar nunca o arbítrio, merecendo limitações. Dentre tais limitações, destaca-se aquela que veda a produção da prova obtida por meios ilícitos, segundo expresso preceito constitucional (art. 5º. LVI, da CF). Ou a prova quanto ao estado das pessoas, para a qual não vigora qualquer liberdade em sua produção, na medida em que deve atentar às restrições estabelecidas na lei civil, conforme se verá abaixo.
4. Restrições à liberdade de provas
No desejo de conter o poder punitivo estatal, o art. 155, caput, proíbe o magistrado sentenciante fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
No Senado houve emenda buscando retirar do dispositivo a expressão"exclusivamente", sob o argumento de que as informações colhidas na investigação não são provas produzidas de acordo com o contraditório, não devendo sequer ser levadas em consideração pelo juiz criminal. Não foi acolhida pela Câmara. A supressão pretendida faria com que o órgão jurisdicional fosse impedido de considerar qualquer elemento informativo da fase de inquérito. Foi (corretamente) lembrado que, por determinação constitucional, todas as decisões judiciais devem ser fundamentadas, de tal forma que o julgador só deve levar em consideração informações contidas em inquérito policial se o fizer de forma razoável. Deve, portanto, o magistrado explicitar os motivos que o levaram a utilizar o elemento informativo colhido no inquérito policial. Este, por sua vez, não segue mais o antigo paradigma de investigação inquisitória, havendo, atualmente, observância às garantias do acusado no que tange à ampla defesa, sendo, inclusive, assegurado o acesso do advogado aos autos do inquérito.
A inovação em estudo acompanhou copiosa jurisprudência dos nossos Tribunais. A novel Lei, simplesmente, adequou o artigo em comento ao princípio do devido processo legal, estampado na CF/88 (art. 5º, LV), protegendo o cidadão contra a ingerência arbitrária do Estado, proibindo a este exercer o seu direito de punir senão por meio de um processo judicial legítimo, concedendo ao acusado o direito de oferecer resistência, produzir provas e influenciar, positivamente, no convencimento do Julgador.
Fez coro, ainda, ao sistema da livre convicção ou da persuasão racional (ou da verdade real), adotado pelo legislador do código, conforme se depreende de sua Exposição de Motivos, da lavra do Ministro Francisco Campos, que assenta: “todas as provas são relativas: nenhuma terá, ex vi legis, valor decisivo, ou necessariamente maior prestígio que a outra. Se é certo que o juiz fica adstrito às provas constantes dos autos, não é menos certo que não ficará subordinado a nenhum critério apriorístico no apurar, através delas, a verdade material” (item VII). Vê-se aqui, destarte, que o legislador, de um lado, confere ao Juiz a mais ampla liberdade de análise da prova, já que não fica limitado a nenhuma hierarquia previamente estabelecida, julgando segundo sua consciência e conforme a prova constante dos autos. De outra banda, porém, tal liberdade não se confunde com arbítrio e, por isso, criou o legislador uma série de restrições, cujo objetivo é o de impedir o despotismo judicial.
Conclusão: diante do preceito constitucional do contraditório, exige-se que a prova extrajudicial, para ser utilmente oposta ao acusado, venha a reproduzir-se na forja da Justiça ou, ao menos, a receber amparo suficiente na prova da instrução. Não se pode, entretanto, desconsiderar que os elementos amealhados no inquérito policial, apesar de insuficientes, por si sós, para sustentar a condenação, mostram-se hábeis na formação do convencimento do magistrado, pois colhidos na polícia na função de apurar a ilicitude e, quase sempre, com grande proximidade temporal do delito (nesse sentido: TACrim-SP – Rel. Renato Nalini – RJD 28/39).
5. Provas cautelares, não repetíveis ou antecipadas
As provas cautelares, não repetíveis ou antecipadas dispensam reprodução sob o crivo do contraditório. A razão é óbvia: há provas que, por sua própria natureza, não permitem reproduçãoem Juízo. Nessescasos, embora produzidas extrajudicialmente, pode o juiz basear sua decisão em tais provas. Imagine-se uma perícia realizada em um portão, a fim de apurar a prática de um crime de furto qualificado. Tal exame deverá ser realizado o mais rápido possível, tão logo se der a prática do crime. Não se exigirá, nesse caso, que passado um ano, já em Juízo, nova violação na porta seja feita, para que uma perícia, agora judicial, seja produzida. Tampouco se imporá à vítima o dever de aguardar, durante um ano, um eventual processo criminal para, somente a partir daí, poder efetuar os reparos na porta, como forma de proteger seu patrimônio. Não. A prova válida e eficaz será aquela produzida ainda na fase policial, embora – insistimos – sem contar com as garantias do contraditório e da ampla defesa, exigíveis, apenas, para o processo criminal.
O mesmo ocorrerá em um caso de homicídio. O exame necroscópico a ser sopesado pelo julgador é aquele realizado no âmbito administrativo, ainda durante o inquérito policial. Não se exigirá, decerto, que passados três ou quatro anos da prática do crime, se vá reproduzir a perícia em Juízo, em face, inclusive, do total desaparecimento do material a ser levado a exame.
Mas não é só: imagine-se uma busca e apreensão (inserida, em nosso ordenamento jurídico, no capítulo das provas, a despeito da crítica doutrinária a respeito). Ora, trata-se de prova que possui nítido caráter cautelar e que se esgota em si mesma. Uma vez realizada não há como se reclamar sua reprodução mais adiante, em Juízo. Cumpriráao juiz, portanto, analisar se a prova, em sua realização e cumprimento, atendeu aos requisitos formais, conferindo-lhe, em seguida, o valor que entender devido. Jamais, porém, pretender sua renovação judicial.
Nesses casos, destarte, a prova, embora produzida extrajudicialmente, terá plena validade e eficácia na formação da convicção do Juiz. Trata-se, porém, de medida excepcional. A regra continua sendo aquela descrita no caput do dispositivo em estudo: a sentença penal deverá vir lastreada na prova produzida em Juízo, revestida dos princípios constitucionais que informam o processo penal.
6. Estado das pessoas
Em relação ao estado das pessoas, o parágrafo único do art. 155 do CPP determina que se deve observar as restrições estabelecidas na lei civil. Nessas hipóteses a intenção é encontrar, com exclusividade, no campo cível, a prova competente, prevalecendo sobre eventual prova criminal produzida em sentido contrário. Assim por exemplo, a existência da violência presumida nos crimes contra a liberdade sexual (art. 224, a, CP), deve ser demonstrada com a juntada da certidão de nascimento da vítima. Também através de tal documento será reduzida ou aumentada a pena (arts. 65, I e 61, II, h, ambos do CP), ou o prazo prescricional em favor do menor de 21 ([7]) ou maior de 70 anos. Também a morte, fator extintivo da punibilidade do réu (art. 107, I, CP), somente pode ser demonstrada por meio da respectiva certidão de óbito (art. 62, CPP) ([8]). E assim, inúmeras outras hipóteses espalhadas na legislação, nas quais a prova civil é indispensável, jamais sendo superada pela prova penal, mesmo ante eventual confissão do réu ou depoimento veraz da vítima ou testemunha.
Esta restrição, para alguns, mostra-se arbitrária, ferindo, inclusive, a garantia da ampla defesa. Não nos parece. Temos, no caso, a previsão do princípio da especialidade, sobrepondo-se à penal, a prova civil, produzida na seara própria.
Fotocópia do documento sem autenticação serve como prova? Apesar de julgados em sentido contrário, o STF já decidiu que a eficácia probante das cópias xerográficas resulta, em princípio, da sua formal autenticação por agente público competente (CPP. Art. 232, parágrafo único). Peças reprográficas não autenticadas, desde que possível a aferição de sua legitimidade por outro meio idôneo, podem ser validamente utilizadas em juízo penal (Rel. Min. Celso de Mello – RT 709/418).
7. Conclusão.
Conforme se destacou no transcurso deste trabalho, a inovação legal procurou ressaltar a importância da prova produzida em Juízo, sob o crivo dos princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório, da publicidade, etc. O legislador, assim, vedou ao Magistrado qualquer possibilidade de fundamentar sua decisão com base, exclusivamente, na prova produzida extrajudicialmente (com exceção das provas que, por sua própria natureza, não possam ser repetidas em Juízo). Com isso, além de privilegiar, de forma expressa, os princípios contidos na Constituição, acabou por encampar, no texto legal, entendimento jurisprudencial plasmado na mais alta Corte do país, que não conferia maior valor à prova obtida fora do processo judicial ([9]). Como bem acentua Antonio Scarance Fernandes, jurisprudência e doutrina, tendo a Constituição como norte, indicaram que “a condenação não podia estar lastreada nos elementos do inquérito, porque, se assim fosse, não estaria sendo observado o princípio constitucional do contraditório. Além do mais, como a defesa não participa, necessariamente, do inquérito, a condenação escorada em informes colhidos durante a investigação representa ofensa ao princípio constitucional da ampla defesa”. ([10])
[1] J. Ribeiro de Daria, Provas, Ed. Polis, vol. IV, p. 1687.
[2] Curso de Processo Penal, vol. II, Ed. Verbo, p. 96.
[3] Ronaldo Batista Pinto, Prova Penal – doutrina e jurisprudência, p. 8.
[4] Luigi Ferrajoli trata, não sem razão, a verdade real como processual e esta, por sua vez, como verdade aproximativa. “A impossibilidade de formular um critério seguro de verdade das teses judiciais depende do fato de que a verdade ´certa´, ´objetiva´ ou ´absoluta´ representa sempre a ´a expressão de um ideal´ inalcançável” (Direito e Razão. Teoria do Garantismo Penal, Ed. Revista dos Tribunais, p. 42). Eugênio Pacceli, apesar de não enxergar inconveniente na expressão “verdade real”, observa: “Desde logo, porém, um necessário esclarecimento: toda a verdade judicial é sempre uma verdade processual. E não somente pelo fato de ser produzida no curso do processo, mas, sobretudo, por tratar-se de uma certeza de natureza exclusivamente jurídica. De fato, embora se utilizando de critérios diferentes para a comprovação dos fatos alegados em Juízo, a verdade (que interessa a qualquer processo, seja cível, seja penal) revelada na via judicial será sempre uma verdade reconstruída, dependente do maior ou menor grau de contribuição das partes, e por vezes do juiz, quanto à determinação de sua certeza” (Curso de Processo Penal, Ed. Del Rey, p. 281).
[5] Germano Marques Silva, Curso de Processo Penal, vol. I, Ed. Verbo, p. 78.
[6] O juiz, longe de ser um observador de pedra – imóvel, estático -, conta com poder de iniciativa complementar de provas, nos termos do art.1566 doCPPP. Segundo Pedro Henrique Demercian e Jorge Assaf Maluly, na Justiça Penal, “o juiz não é mero espectador das provas produzidas pelas partes. Tem o dever de investigar a fundo a realidade do fato. Tão largo é o alcance desse princípio que até mesmo a confissão, no processo penal, tem valor relativo (art. 197) e deve ser valorada de acordo com as demais provas coligidas, enquanto, no processo civil, esse mesmo ato, quando não se cuidar de direitos indisponíveis, tem importância definitiva e absoluta (art. 341, § 1º, CPC), autorizando desde logo o julgamento da lide” (Curso de Processo Penal, Ed. Atlas, p. 28). Contudo, deve ser observado que o poder conferido ao juiz é o de (repita-se) complementar as provas, jamais tomando a dianteira na sua produção. Com fulcro nesse alerta, o STF declarou inconstitucional o art. 3º da Lei 9.034/95, que conferia ao magistrado poder total de investigação, extrapolando a intenção (permissão) do legislador processual (ADI 1570).
[7] Preceitua a Súmula744 do STJ: “Para os efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil”.
[8] Temos doutrina admitindo a prova da morte mediante a sentença declaratória de ausência (morte presumida).
[9] “Somente a prova penal produzida em juízo pelo órgão da acusação penal, sob a égide da garantia constitucional do contraditório, pode revestir-se de eficácia jurídica bastante para legitimar a prolação de um decreto condenatório. Os subsídios ministrados pelas investigações policiais, que são sempre unilaterais e inquisitivas - embora suficientes ao oferecimento da denúncia pelo Ministério Público -, não bastam, enquanto isoladamente considerados, para justificar a prolação, pelo Poder Judiciário, de um ato de condenação penal. É nula a condenação penal decretada com apoio em prova não produzida em juízo e com inobservância da garantia constitucional do contraditório” (STF – HC nº 73.338 – RJ – DJ de 19.12.96 – Rel. Celso de Mello).“A unilateralidade das investigações desenvolvidas pela polícia judiciária na fase preliminar da persecução penal (informatio delicti) e o caráter inquisitivo que assinala a atuação da autoridade policial não autorizam, sob pena de grave ofensa a garantia constitucional do contraditório e da plenitude de defesa, a formulação de decisão condenatória cujo único suporte seja a prova, não reproduzida em juízo, consubstanciada nas peças do inquérito” (STF – RE nº 136239 – SP – DJ de 14.8.92, p. 12227 – Rel. Celso de Mello).
[10] Antonio Scarance Fernandes, Teoria geral do procedimento e o procedimento no processo penal, p. 98.
Processo Penal I - v.10
Rogério Sanches Cunha e Ivan Luís Marques
Rogério Sanches Cunha
Rogério Sanches Cunha
Promotor de Justiça no Ministério Público do Estado de São Paulo
Promotor de Justiça/SP, Professor da Escola Superior do MP/SP, Professor de Penal e Processo Penal
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3 Comentários
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Tom Motta
2 anos atrás
Excelente Publicação! Obrigado!
2Responder
Walter i
3 meses atrás
Muito bom! Necessita atualização. Obg!!!
*** *** https://rogeriosanches2.jusbrasil.com.br/artigos/121814601/artigo-155-do-codigo-de-processo-penal-breves-comentarios *** ***
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Tribunal da Lava Jato nega recurso de Lula e mantém pena de 17 anos de prisão no caso sítio de Atibaia
O petista foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no processo do sítio de Atibaia. O recurso buscava reverter aspectos da sentença
Por Redação Jornal de Brasília
06/05/2020 4h33
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Former Brazilian president Luiz Inacio Lula da Silva gestures as he attends a rally of Paris Mayor Anne Hidalgo, as part of her campaign for the upcoming mayoral election in Paris, France, March 2, 2020. REUTERS/Charles Platiau
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Os desembargadores da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), o Tribunal da Lava Jato, negou os recursos apresentados pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e mantiveram a sentença proferida pela corte em novembro do ano passado, de 17 anos e um mês de prisão, em regime fechado.
O petista foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no processo do sítio de Atibaia. O recurso buscava reverter aspectos da sentença. Os desembargadores também negaram pedido preliminar da defesa de Lula, que buscava remarcar o julgamento para uma data futura, de forma a garantir que ele fosse feito presencialmente.
O julgamento desta quarta, 6, foi concluído no plenário virtual do TRF-4. A análise do caso começou na semana passada.
É a segunda sentença em segundo grau de Lula nos processos da Lava Jato, em Curitiba. Em janeiro de 2018, o mesmo TRF-4 condenou o ex-presidente a 12 anos de prisão no processo do tríplex do Guarujá (SP) e determinou a prisão do petista para início do cumprimento provisório da pena, assim que esgotado os recursos no tribunal. A pena foi depois reduzida para 9 anos, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento no ano passado.
Lula foi preso em abril de 2018, após a condenação em segunda instância do caso triplex, e solto em novembro do ano passado após o Supremo Tribunal Federal rever entendimento sobre execução de pena antes do transito em julgado (quando o caso já não cabe recursos). Por conta da mudança jurídica, o petista segue respondendo aos dois processos em liberdade.
Em primeira instância, Lula foi sentenciado no caso do sítio de Atibaia em fevereiro de 2019 pela 13.ª Vara Federal em Curitiba por supostamente receber R$ 1 milhão em propinas via reformas do sítio de Atibaia, que está em nome de Fernando Bittar, filho do amigo de Lula e ex-prefeito de Campinas, Jacó Bittar.
A Lava Jato apontou que o sítio passou por três reformas: uma sob comando do pecuarista José Carlos Bumlai, no valor de R$ 150 mil, outra da Odebrecht, de R$ 700 mil, e uma terceira reforma na cozinha, pela OAS, de R$ 170 mil. Total de R$ 1,02 milhão gastos pelos acusados. Os pagamentos tiveram relação com negócios na Petrobrás e os caixas de propinas acertados entre as empreiteiras e o PT.
Estadão Conteúdo
*** *** https://jornaldebrasilia.com.br/noticias/politica-e-poder/tribunal-da-lava-jato-nega-recurso-de-lula-e-mantem-pena-de-17-anos-de-prisao-no-caso-sitio-de-atibaia/ *** ***
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Grupo Independente
8h - Apelação de Lula no caso do Sítio de Atibaia está liberada para análise do TRF-4
EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUIZA FEDERAL SUBSTITUTA
DA 12ª VARA FEDERAL CRIMINAL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE
BRASÍLIA/DF
Ref.: Autos n.º 1032252-24.2021.4.01.3400/DF (Processo de
origem n.º 5021365-32.2017.4.04.7000/PR - Caso “Sítio de
Atibaia”)
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, já qualificado nos autos em
epígrafe, vem, em atenção as manifestações ministerial de ID’s n.° 656946985 e
690568973, à respeitosa presença de Vossa Excelência, expor e requerer o que se segue:
1. Conforme consta no despacho de ID n.º 631255992, esse d. Juízo
determinou textualmente ao ilmo. membro do parquet que se manifestasse sobre os
“termos do despacho ID 618214352, cientificando-lhe, outrossim, do pedido formulado
pela defesa de LUIZ INACIO LULA DA SILVA (Ids 628106461 e seguintes)”, o que foi
reiterado no decisum de ID n.º 655137964.
2. Apenas a título de recapitulação, insta sumarizar o teor das
seguintes petições já acostadas pelo Peticionário, com vistas de sanear os autos antes
de qualquer outra providência: (i) ID n.º 566526347: prevenção do juiz titular da 12ª
Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de Brasília/DF; (ii) ID n.º 566529847:
violação do princípio do promotor natural; (iii) ID. nº 566529955: não conformidade dos autos; e (iv) ID n.º 628106472: juntada de novas decisões da Suprema Corte,
fulminando a viabilidade jurídica do presente procedimento.
3. Mas, debalde! Esses relevantes fundamentos não foram analisados.
4. De fato, no parecer subscrito em 29.07.2021 pelo procurador da
República FREDERICO DE CARVALHO PAIVA – que sempre manteve estreita relação com
a Lava Jato de Curitiba1 -, é possível constatar que, tomado pela sanha de processar o
Peticionário a qualquer custo, deliberadamente atropelou a fase de aferição de
conformidade dos autos para forçosamente pugnar pela ratificação da denúncia, sob o
retórico argumento de que: “No caso, em razão do extenso lastro probatório existente”
- a despeito de não se mencionar um único sequer na claudicante manifestação.
5. Consta ainda, de forma injustificável, manifestação do aludido
procurador da República defendendo que: “(...) o mais acertado seria excluir a
manifestação da defesa para que ela seja novamente apresentada quando for
devidamente intimada”.
6. Embora se compreenda a dificuldade do órgão ministerial em
contrastar as robustas manifestações do Peticionário, com o devido respeito e
acatamento, carece de qualquer seriedade os termos do parecer exasperado para tentar
amordaçar a indicação dos graves vícios que saltam aos olhos.
7. Pede-se vênia para verticalizar tais aspectos.
8. Ao primeiro, causa espécie que a denúncia açodadamente
ratificada sequer tenha sido analisada em detalhes pelo órgão acusador. Com efeito,
1 Defesa de Lula pede suspeição de procuradores de caso sobre caças suecos. CNN Brasil.
Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/politica/2021/05/04/defesa-de-lula-pede-suspeicao-deprocuradores-de-caso-sobre-cacas-suecos. Acesso em: 19.08.2021.
longe de qualquer ilação, o parecer acostado constitui prova cabal de que o procurador
da República FREDERICO DE CARVALHO PAIVA não compulsou a denúncia ora
ratificada, limitando-se a pinçar o nome do Peticionário para ablaquear sua cólera.
9. Veja-se nessa linha que, segundo despacho de ID n.º 553452352,
esse d. Juízo determinou: “Vista ao Ministério Público Federal da Ação Penal
(5021365- 32.2017.4.04.7000/PR - Sítio de Atibaia), oriunda da 13ª Vara Federal da
Seção Judiciária de Curitiba -PR”. No entanto, atestando que a denúncia ora ratificada
jamais fora analisada com o mínimo de rigor, aduz textualmente o membro do parquet:
“A denúncia de ID 544533867 deflagrou a ação penal no 5021365-
32.2017.4.04.7000/PR. Segundo narrou a inicial, 8 (oito) imputados praticaram crimes
de corrupção ativa (art. 333 do CP), corrupção passiva (art. 317 do CP), lavagem de
dinheiro (art. 1o da Lei 9.613/98)”.
10. Ora, embora tenha acertado o número antigo do processo, causa
espanto que esse d. Juízo tenha determinado textualmente vista sobre o caso “sítio de
Atibaia” e o documento indicado no parecer nem ao menos verse sobre tal unidade rural.
A conclusão invariável que se extrai é de que não se leu a denúncia do caso “sítio de
Atibaia”, tampouco a denúncia acostada no ID n.º 544533867 – relacionada ao caso
“sede do Instituto Lula” — feito que sequer tramita perante este D. Juízo.
11. Destarte, para muito além de mero erro material, quadra pôr em
evidência, por exemplo, que o parquet exarou sua opinio delicti denunciando os
senhores PAULO RICARDO BAQUEIRO DE MELO, DEMERVAL DE SOUZA GUSMÃO FILHO
e GLAUCOS DA COSTAMARQUES. Virando e revirando a fantasiosa denúncia da antiga
Ação Penal (5021365-32.2017.4.04.7000/PR - Sítio de Atibaia), inexiste qualquer
referência a tais sujeitos – o que por si só já conflagra hipótese patente de inépcia.
12. O que dizer então da inexplicável pretensão formulada em face do
advogado ROBERTO TEIXEIRA - absolvido em definitivo no aludido caso?
13. A máxima de que nada é tão ruim que não possa piorar, nunca se
fez tão presente como no parecer vergastado. Prossiga-se então.
14. Em segundo, se o ilmo. membro do parquet não analisou em
detalhes a denúncia - afobadamente ratificada, como já escancarado -, por evidente, com
mais razão, que também não leu com atenção as manifestações do Peticionário. Triste
investida!
15. Em outra lamentável passagem do parecer – quantas já são? -,
vocifera o procurador da República: “(...) nota-se que a defesa, mesmo sem ter sido
intimada para se manifestar, atravessou petição extemporânea para postular a extensão
da nulidade dos atos decisórios determinada em decisão monocrática”. Em que pese
ainda não se tenha notícia de que as intervenções da Defesa Técnica dependam de
convite ou autorização do parquet, não mais que um simples passar de olhos nos autos
é suficiente para se constatar que, o que se rotula de “petição extemporânea”, em
verdade se refere a decisão pública e notória que já se encontrava encartada aos autos
pelo próprio juízo incompetente da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de
Curitiba/PR (ID n.ºs 601479855, 601479856 e 601479857).
16. Deveras conveniente: ataca-se a Defesa, ignora-se o conteúdo dos
autos.
17. Ainda nessa linha de atacar a Defesa ignorando o conteúdo dos
autos, no tocante ao pedido de prevenção do juiz titular da 12ª Vara Federal Criminal da
Subseção Judiciária de Brasília/DF, defende o procurador da República que: “a ação penal foi distribuída, por sorteio, para a 12ª Vara, razão pela qual a pretensão, além
de não possuir amparo jurídico, não faz sentido”.
18. A Defesa do Peticionário, com hialina clareza, apresentou
manifestação de 18 laudas aludindo a prevenção do juiz titular – e não do juízo - dessa
12ª Vara em ao menos 8 passagens. No ponto, assiste razão o procurador da República,
pois de fato não faz sentido com um dado desse jaez, que não demanda qualquer esforço
intelectivo, não pôde ser assimilado.
19. Em outra raia, na terceira posição, em relação a quase uma centena
de autos acessórios a este feito que foram represados pelo juízo incompetente de
Curitiba, o inusitado parecer sustenta que não haveria prejuízo pois acha que podem ser
acessados em outro Tribunal. Não satisfeito em tergiversar para o conteúdo dos autos e
as petições apresentadas, despreza-se também o brocardo latino do quod non est in actis
non est in mundo.
20. A confusa ginastica hermenêutica tem como pano de fundo: o feito
principal tramita em Brasília e os acessórios em Curitiba. É de se registrar para os anais
da história esse caso inédito em que o acessório não segue a sorte do principal.
21. Aliás, a remessa de todos os procedimentos acessórios não se presta
a satisfazer mero capricho da Defesa, mas essencialmente subsidiar a conformação do
entendimento do parquet e do Juízo. Se o parquet nem ao menos conhece todos os
procedimentos, como admitir, seriamente, que pode externar qualquer opinio delicti?
Mas se compreende, se o ilmo. membro do parquet não leu nem ao menos a exordial
acusatória, o que dirá dos feitos acessórios...
22. Em quarto, verifica-se que o parecer acostado também não deixa a
desejar em termos de afronta às ordens emanadas pela Suprema Corte. De fato, agindo
como sensor do Supremo Tribunal Federal, ao se referir a ordem de habeas corpus que alijou do mundo jurídico todos os elementos destes autos, ponderou que: “Sob a singela
alegação [!?] de identidade fática e circunstancial da questão, o Ministro Gilmar
Mendes, monocraticamente, estendeu a suspeição do Juiz Sérgio Moro para os atos
decisórios praticados pelo referido magistrado durante a tramitação da Ação Penal ora
sob análise”. Definitivamente, jamais se viu algo mais acintoso.
23. Tamanho é disparate do parecer que, nada obstante a ordem clara e
inequívoca da Suprema Corte anulando, de forma absoluta, todos os atos processuais e
pré-processuais, o ilmo. membro do parquet não só revisou a decisão, como disse que o
órgão de cúpula do Poder Judiciário errou (?!): “No entanto, os atos pré-processuais
não possuem conteúdo decisório, pois apenas impulsionam o andamento da
investigação”. Obtempere-se que nem mesmo a Procuradoria-Geral da República, a
única legitimada para recorrer de tal decisão, fora tão pedante nos recursos manejados.
24. Insta esclarecer, inclusive, que esse excêntrico entendimento, de tão
absurdo, foi recentemente rechaçado pelo Poder Judiciário. Arrostando igualmente a
contaminação dos autos, foi impetrado no palco do e. Tribunal Regional Federal da 3ª.
Região a ordem de habeas corpus n.º 5014649-25.2021.4.03.0000/SP2
. Em sede
liminar, suspendeu-se a marcha processual daqueles autos de origem, reconhecendo
textualmente a relevância da arguição de contaminação – que aqui se ousa desprezar.
Confira-se3
:
Relevante, pois, a arguição defensiva de que a prova na qual se baseia o feito originário
seria nula, ainda que por derivação.
25. Mas não é só! Em ato contínuo, ao analisar o mérito do citado writ
no último dia 09.08.2021, o e. Tribunal Regional Federal da 3ª. Região, em
unanimidade, acolheu a tese de contaminação dos autos e determinou, como
2 Doc. 01. 3 Doc. 02.
consequência lógica, o trancamento da Ação Penal n.° 0006803-
31.2018.4.03.6181/SP4
. Leia-se5
:
Afirmam que os autos originários são resultado de uma fishing expedition, oriundos
da Operação Lava Jato, em especial das diligências realizadas na 24ª fase (Operação
Aletheia).
Em cumprimento às medidas de busca e apreensão decretadas no processo n.º
5006617-29.2016.4.04.7000/PR (Operação Aletheia), foi elaborado o RPJ 411/2016,
com base no exame de comunicações telemáticas (arquivos das caixas de emails)
apreendidas na sede do Instituto Lula.
Também foi elaborado o Laudo nº 1232/2016 no inquérito policial nº 5054533-
93.2015.4.04.7000/PR.
O RPJ 411/2016, junto com o Laudo n.º 1232/2016, ensejaram a instauração do
Inquérito Policial n.º 5036812-94.2016.4.04.7000/PR para se apurar suposto
crime de tráfico de influência praticado pelo ex-Presidente LULA em operações
junto a RODOLFO GIANETTI GEO e MAURO MARCONDES MACHADO.
Nestes autos foi elaborado o RPJ 493/2016 que consta como elemento de prova na
denúncia da ação penal originária. (destacou-se)
26. Cabe frisar que os argumentos aqui ventilados, ante a similaridade
de circunstâncias, foram veiculados de forma idêntica na impetração em comento. Vejase novamente os termos da ordem de trancamento6
:
Narram que o STF concedeu a ordem de habeas corpus 164.493/PR para anular todos
os atos decisórios praticados no âmbito da ação penal 5046512-94.2016.404.700/PR
(caso tríplex do Guarujá) incluindo os atos praticados na fase pré-processual,
fulminando de nulidade absoluta os elementos exportados da Operação Aletheia.
Dentre os atos praticados na fase pré-processual vinculada àquele feito, encontrase o mencionado pedido de Busca e Apreensão nº 5006617-29.2016.4.04.7000/PR,
que uma vez declarado nulo, contamina todos os atos subsequentes, entre eles o
RPJ 411/2016.
Assim, toda a cadeia de provas e elementos informativos produzidos no curso das
investigações dos autos de origem está maculada por nulidade absoluta e devem ser
declaradas ilícitas por derivação (art. 157, §1ª, do CPP). (destacou-se)
4 Doc. 03. 5 Idem.
6 Idem.
27. Em arremate, ao fundamentar o trancamento daquela ação penal
contaminada, a qual tramitava perante a Justiça Federal bandeirante, o e. Tribunal
Regional Federal da 3ª. Região declarou a nulidade do emprego dos elementos
exportados da 24ª fase da Operação Lava Jato (Operação Aletheia), porquanto tisnados
pela peste da suspeição, e reconheceu o caráter ilícito destes e todos os atos dele
derivados. Senão, vejamos7
:
O feito trata de suposto tráfico de influência internacional que teria sido cometido pelo
ex-Presidente e as provas respectivas adviriam de uma das fases da operação Lava
Jato, a saber, a fase "Aletheia", em que foram realizadas buscas no Instituto Lula.
A denúncia esteia-se em emails apreendidos no referido Instituto, que dariam conta do
mencionado tráfico de influência.
Não se controverte que as buscas em questão da fase Aletheia foram determinadas pelo
ex-Juiz Sérgio Moro, considerado suspeito pelo Supremo Tribunal Federal na
condução de processos contra o ex-Presidente.
Relevante, pois, a arguição defensiva de que a prova na qual se baseia o feito originário
seria nula, ainda que por derivação.
(...)
A decisão do E. STF é enfática e vigorosa ao repudiar a postura inquisitorial do
ex-Juiz, que teria ofendido o princípio acusatório de sede constitucional.
É verdade que a Suprema Corte restringiu a nulidade ali decretada ao processo
específico já mencionado, mas não poderia ser diferente, notadamente porque a
suspeição e parcialidade foi reconhecida em relação ao paciente Luiz Inácio Lula da
Silva, não sendo de bom alvitre fosse o raciocínio estendido de pronto a outros réus da
operação Lava Jato.
Observe-se, contudo, por extremamente relevante, que o Supremo Tribunal é também
explícito, em sua decisão, em anular também os atos praticados na fase pré-processual.
Não cogitou a Corte Suprema em restringir a nulidade às sentenças, como argumenta
o MPF em sua manifestação nos presentes autos.
Dessa forma, penso que o E. STF acertou ao deixar que as demais instâncias apreciem
no caso concreto a extensão ou não do julgamento em questão.
Como na decisão acima transcrita foram anulados também os atos pré-processuais,
ainda que daquele feito (tríplex do Guarujá), parece-me que o mesmo raciocínio
impõe-se para os demais feitos a que responde o paciente em que tenha havido atuação
7 Idem.
processual ou pré-processual relevante do ex-Juiz considerado suspeito, afinal, “ubi
eadem ratio ibi eadem dispositio”.
(...)
Assim, deve ser considerada nula a busca e apreensão decretada nos autos n.º
5006617-29.2016.4.04.7000 (Operação Aletheia).
Dessa forma, uma vez declarada nula, restam contaminados todos os atos
subsequentes, como decorrência da Doutrina dos Frutos da Árvore Envenenada
(ou venenosa, visto que decorre da fruits of the poisonous tree doctrine, de origem
norte-americana), consagrada no art. 5º, LVI, da Constituição Federal e no artigo
157, “caput”, do Código de Processo Penal. (destacou-se)
28. In casu, entre outros fundamentos já veiculados, faz-se de rigor, no
mínimo, a aplicação da mesma ratio decidendi nos autos em tela, extirpando-se de
pronto todo e qualquer elemento ou referência maculados por nulidade absoluta
decretada pela Suprema Corte, cuja manutenção está a configurar a utilização de prova
reputada ilícita. Para tanto, faz-se necessário a leitura dos autos, o que de fato, como já
se viu alhures, nunca ocorreu pelo ilmo. membro do parquet.
29. Essa afronta às ordens emanadas da Suprema Corte evidenciam, a
bem da verdade, que também não se analisou os comandos ali contidos, ou melhor,
sequer se leu o inteiro teor dos julgados. À guisa de exemplo, em determinado trecho
afirma-se que: “defesa busca a suspensão do feito até que o Supremo Tribunal Federal
se manifeste novamente sobre os efeitos da decisão que reconheceu a suspeição do exJuiz Sergio Moro, nos autos do HC 193.726/PR/STF”. De fato, é constrangedor que o
agente público subscritor do parecer, por idiossincrasias, saia ratificando acusações
criminais sem nem ao menos verificar o que afirma. Ao revés, tivesse no mínimo feito
uma busca comezinha na rede mundial de computadores, teria constatado que o writ
193.726/PR sequer trata de suspeição.
30. Noutro giro, se o ilmo. membro do parquet analisasse tão somente
a ementa do acórdão correto, jamais teria consignado, sobre o caso em apreço, que: “O
responsável pela investigação é o Ministério Público, uma vez que a Carta Magna retirou do julgador qualquer poder investigatório. Age o Juiz durante a investigação
como ator que preserva os direitos e garantias fundamentais dos investigados, sem
imiscuir-se no mérito do plano investigatório, conduzido pelo Ministério Público em
conjunto com a polícia judiciária”. É fato público e notório, bem como causa finita, que
o ex-juiz SÉRGIO MORO se investiu na função persecutória ainda na fase pré-processual,
violando o sistema acusatório. Em suma - especialmente ao membro do parquet, que ao
que tudo indica ainda não conhecera da ordem de habeas corpus -, a vazia e retórica
argumentação arremessada não possui qualquer aderência aos autos e vai de encontro,
em rota de colisão, com quase uma resma de acórdão do writ n.º 164.493/PR – este sim
tratando da suspeição.
31. Não por acaso, o e. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, lendo
e analisando as ordens da Suprema Corte, concluiu de forma irretorquível em recente
pronunciamento: “A decisão do E. STF é enfática e vigorosa ao repudiar a postura
inquisitorial do ex-Juiz, que teria ofendido o princípio acusatório de sede
constitucional”.
32. A perplexidade que acomete a Defesa Técnica do Peticionário é
profunda, posto que, ao que parece, tampouco a ordem de habeas corpus n.º
193.726/PR, que ensejou na (re)distribuição deste feito, fora objeto de escrutínio. Isto é,
somado a circunstância canhestra de se almejar arrostar os fundamentos de uma decisão
do Plenário da Suprema Corte em primeira instância, cabe informar ao parecer
desorientado que o falaz argumento da aplicação da teoria do juízo aparente já foi
ventilado no caso em apreço pela Procuradoria-Geral da República no palco do Plenário
da Suprema Corte, sendo prontamente refutado e ilidido in totum. Logo, não há como
prosperar essa claudicante revisão.
33. Mas não é só! Acrescente-se a todas essas impropriedades que até
mesmo a ordem hierárquica do Poder Judiciário fora subvertida no parecer em comento.
Com o fim de solapar os efeitos da decisão proferida pela Suprema Corte, afirma o ilmo.
membro do parquet, de forma absolutamente constrangedora, que: “A imparcialidade
aparente do Juiz Sérgio Moro, reconhecida pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da
4ª Região e pelo Superior Tribunal de Justiça, reflete que este não conduzia o feito com
usurpação teratológica de função”.
34. Ou seja, segundo a visão míope do parquet, as decisões da Suprema
Corte seriam mera perfumaria – “filigranas”, como costumavam dizer os inquisidores
de Curitiba – diante do entendimento firmado pelas instâncias inferiores.
35. Na turva visão do eminente procurador da República, para fins de
análise destes autos, o ex-juiz SERGIO MORO não teria quebrado a imparcialidade! Como
seria isto?
36. Após afrontar as ordens dos e. Ministros GILMAR MENDES (STF –
habeas corpus n.º 164.493/PR) e EDSON FACHIN (STF – habeas corpus n.º 193.726/PR),
não satisfeito, também assim o fez em relação ao e. Min. RICARDO LEWANDOWSKI (STF
– Reclamação n.º 43.007/DF).
37. Como já pontuado anteriormente nestes autos, em r. decisão
proferida em 28.06.2021, nos autos da Reclamação n.º 43.007/DF, o e. Min. RICARDO
LEWANDOWSKI declarou a imprestabilidade, quanto ao Peticionário, dos elementos de
prova obtidos a partir do Acordo Global de Leniência n.º 5020175-34.2017.4.04.7000,
celebrado pela Odebrecht, bem assim de todos os demais que dele decorrem. Assim
como em relação as demais ordens, o ilmo. membro do parquet – pretenso revisor da
Suprema Corte -, desta vez repreende o e. Min. RICARDO LEWANDOWSKI: “Nesse ponto,
é importante relembrar que no âmbito processual, não existe a figura do ato jurídico
nulo de pleno direito. Caso exista ato viciado, por qualquer motivo, é passível de mera anulação, uma vez que demandam decisão judicial para ser reconhecido como tal e, a
partir de então, deixar de produzir efeitos”.
38. E “leciona” ao e. Min. RICARDO LEWANDOWSKI: “De toda sorte,
o Acordo de Leniência é negócio jurídico realizado entre o MP e o Grupo Odebrecht
classificado como meio de obtenção de provas. Os elementos probatórios produzidos,
esses, sim, fundamentos da peça deflagradora dessa ação penal, foram objeto de ampla
defesa e contraditório pelos imputados, não havendo nulidade a ser reconhecida nesse
momento”. Repita-se: triste, lamentável e sem precedente investida!
39. Na sequência (quinto) dessa profusão de teratologias, olvidandose de quem é o dominus littis, o ilmo. membro do parquet, quiçá imaginando que essa
d. magistrada leia e lhe explique o processo, roga: “Assim, é preciso primeiro que Vossa
Excelência decida se vai receber a denúncia ou não, pois o recebimento da denúncia
pelo Juiz Sérgio Moro, até que sobrevenha nova determinação do Supremo Tribunal
Federal em sentido contrário, foi declarado nulo”.
40. Eis então que transcorrido quase um mês desse inusitado parecer e,
pasmem, UM DIA após essa Defesa Técnica se manifestar colocando uma pá de cal em
outra fábula conjecturada pelo mesmíssimo procurador da República contra o
Peticionário8
, resolve-se então “arrumar” a denúncia.
41. Antes de apontar as arbitrariedades deste novo parecer, cabe abrir
novo parêntese para externar a perplexidade com a confusão de ideias do aludido
procurador da República. Na manifestação anterior de ID n.º 656946985, vociferou o
acusador, como já indicado, que as petições dessa Defesa deveriam ser apeadas dos
autos, porquanto não fora convidada a se manifestar. Veja-se, então, também sem ser
8 Doc. 04.
convidado, almeja o parquet refazer sua opinio delicti. Ora, não se aplicaria o mesmo
entendimento?
42. Mas prossiga-se em benefício da dúvida. De forma ainda mais
extravagante, todas as impropriedades contidas no parecer anterior são explicadas
singelamente, nesta segunda rodada, sob o argumento de “imprecisões materiais”.
43. Embora nesta “retificação da ratificação da denúncia”, algo jamais
visto de tão teratológico, o ilustre membro do parquet tenha ao menos acertado o nome
dos acusados, não é preciso muito para constatar que os autos permanecem sem uma
leitura atenta. Veja-se que no parecer de 03 laudas (!!!), referente a um processo com
centenas de milhares de folhas, não consta uma única linha, frase ou oração relativa ao
objeto da acusação.
44. Os autos em comento, aliás, parecem fadados a uma sina: ter seu
conteúdo confundido com outros feitos. É preciso registrar que, quando ainda tramitava
perante o juízo incompetente de Curitiba, a julgadora que assumiu tardiamente o
processo, já na fase de interrogatório dos acusados, e que contava então com 110.287
folhas9 - incluídos autos principais, mídias e apensos -, confessadamente sentenciou em
menos de um mês após a conclusão dos respectivos autos, mediante
“aproveitamento” de outra sentença teratológica.
9 Tabela ilustrativa do levantamento realizado informalmente por esta equipe de Defesa:
AÇÃO PENAL Nº 5021365-32.2017.4.04.7000/PR - CONTAGEM UNIVERSAL DOS AUTOS
AUTOS PRINCIPAIS 52.945
MÍDIA E APENSOS 57.342
TOTAL 110.287
45. Se antes os atos processuais eram pautados por uma curiosa técnica
de “aproveitamento”, o membro do MPF ora oficiante está ratificando a esmo o
desconhecido. Triste investida!
46. Com o devido respeito e acatamento, a persecução penal exige
seriedade e não constitui instrumento arbitrário a serviço daqueles que possuem uma
clara – e, no caso, notória – indisposição para com o acusado. No caso em apreço, carece
de qualquer seriedade os pareceres acostados, sendo inadmissível a condução de um
processo tal como uma aposta em um jogo de azar.
47. Nesse conduto, em vista do quadro caótico de ideia e de
afirmações mendazes sublinhado alhures - o que não foram poucas -, pede-se,
respeitosamente, e antes de qualquer outra providência, que sejam analisadas por
este E. Juízo as manifestações acostadas nos ID’s n.º 566526347, 566529847,
566529955 e 628106472 — por dizerem respeito ao próprio saneamento do
processo, significativamente ferido, entre outras coisas, pela contaminação de
provas reputadas ilícitas, como, aliás, já se pronunciou recentemente o E. TRF-3.
Termos em que,
Pede deferimento.
De São Paulo (SP) para Brasília (DF), 19 de agosto de 2021.
CRISTIANO ZANIN MARTINS
OAB/SP 172.730
VALESKA TEIXEIRA MARTINS
OAB/SP 153.720
MARIA DE LOURDES LOPES
OAB/SP 77.513
ELIAKIN T. Y. P. DOS SANTOS
OAB/SP 386.266
*** *** https://www.conjur.com.br/dl/manifestacao-defesa-lula.pdf *** ***
***
SENSO INCOMUM
"O problema é o processo", Dr. Moro? Até Reinaldo Azevedo sabe que não!
2 de abril de 2015, 8h00
Por Lenio Luiz Streck
***
***
caricatura lenio luis streck 02 [Spacca]
***
Nesses tempos de crise, volta a tentação revolucionária. Contudo, o Estado de Direito deu conta de uma institucionalidade democrática, a partir da qual se pode e se deve fazer o controle e punição de condutas ilícitas. Não podemos perder a capacidade de indignação, mas sem solapar nossas conquistas civilizatórias.
Por isso, preocupa que juízes (Antônio Bochenek e Sergio Moro) publiquem um artigo de jornal sob o título de O problema é o processo (ver aqui). Ainda mais em se tratando do juiz responsável pela operação "lava jato" em parceria com o presidente da Associação dos Juízes Federais. Para incrementar a eficiência do sistema de justiça, postulam que
“A melhor solução é a de atribuir à sentença condenatória, para crimes graves em concreto, como grandes desvios de dinheiro público, uma eficácia imediata, independente do cabimento de recursos [...]”[1].
Afinal, anunciam que essa tese será apresentada como projeto de lei pela Ajufe. É evidente que a notícia repercutiria. De pronto, os ministros do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurelio e Celso de Mello, caíram de pau na proposta. Corretíssimos. E por certo essa deve ser a posição unânime da Suprema Corte. Mas o que mais impressiona — e isso demonstra o grau da crise de paradigmas que perpassa o direito — que a chinelada maior tenha vindo de um jornalista, no caso, um jornalista insuspeito em face de suas posições duras em relação a fenomenologia que cerca a operação "lava jato" e as relações com o governo. Falo da aula de Direito Constitucional que foi dada à comunidade jurídica por Reinaldo Azevedo (ver aqui), que, entre outras coisas — óbvias, mas o óbvio deve ser dito — lembrou que:
“ [...] Não basta a mudança da lei. Aí seria preciso mudar a Constituição. O Inciso LVII do Artigo 5º da Constituição estabelece: ‘LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;’”
Mais:
“Vou com o juiz até o fim do mundo, se preciso, para punir os larápios. Mas só vou se for com a Constituição. Se não, ele se torna a fonte de legitimidade da Carta, e não a Carta a fonte da sua legitimidade.(...)”.[2]
Com efeito, em sua argumentação, os juízes Moro e Bochenek fragilizam a autonomia do Direito, expondo-o à predação pela Moral e pela Economia. Essa crítica que faço não é assim só porque eu quero e por qualquer implicância. É porque é científica. Não fosse assim e no mínimo dois ministros da mais alta Corte não teriam saído com duras críticas aos colegas juízes. Ainda há algumas certezas no direito. Uma delas é o valor de uma cláusula pétrea. Vingando a tese de Moro e Bochenek, tem-se que deverá o condenado na primeira instância judicial, em regra, ficar preso? E adiantam que “A proposição não viola a presunção de inocência”! Como não? Presume inocente, mas, em regra, prende... Como assim? É porque já há uma condenação em primeira instância... Presume menos inocente, então? Uma presunção de inocência ornamental, talvez.
Na sequência, defendem que
“as Cortes recursais possam, como exceção, suspender a eficácia da condenação criminal quando presente, por exemplo, plausibilidade do recurso”.
Talvez aí o réu recuperasse um pouco da presunção de inocência, que jamais perdera por completo (mas apenas operacionalmente, subsistindo no plano retórico). Em que pese a confusão, nosso Texto Fundamental não fala em nada disso. Mas não fala, mesmo. Socorre-nos o artigo 5º, inciso LVII. Trata-se de cláusula pétrea sendo ameaçada por lei ordinária! E, atenção: veja-se a sutiliza da frase: “as cortes possam, como exceção” (sic). Eis a palavra mágica: a invocação da exceção. E o que é (estado de) exceção? É quando o soberano decide o que é a própria exceção. Bingo. E binguíssimo.
Enfim, para ser bem breve: é uma pena ver parcela da magistratura e do Ministério Público Federal torcendo contra aquilo que é condição de possibilidade da jurisdição — a Constituição e o processo. As conquistas civilizatórias trocadas pela possibilidade de exceção. Não pensei que veríamos isso em pleno Estado Democrático. E é uma pena que os juristas temos de receber puxões de orelha de jornalistas.
O risco de jogar a criança fora junto com a água
No fundo, o que a proposta de Moro e Bochenek fazem é o clássico “pela necessidade de limpeza, joguemos tudo fora, mesmo que haja, junto com a água, o objeto do banho — a criança”. Simples assim. E ao mesmo tempo, complexo.
Explico. Entendo a indignação do juiz Moro e do presidente da Ajude. Como brasileiros honestos e ciosos pela coisa pública — e coloco aqui todos meus sinceros elogios aos dois — sentem que querem fazer mais do que suas funções permitem. Sentem-se “atados” pelas amarras do processo. Por isso a frase “O Problema é o processo”. Mas não deve ser assim. Juristas devem lutar dentro das regras de jogo e bajo a la Constituição. A democracia, do mesmo modo, mesmo quando não funciona bem, não pode ser vista como um problema. Mutatis, mutandis, o que o artigo de Moro e Bochenek representa é algo similar a um deputado que diga: assim não dá mais para tocar o Parlamento. Muitas regras, formalidades, obediência de quorum... “— O problema é a democracia...”. E clamasse pelo Estado de Exceção.
Temos muita corrupção? Sim. Até as pedras sabem disso. E jornalistas e jornaleiros, idem. Mas não podemos resvalar para moralismos. Quanto fico tentado a fazer algum raciocínio antidemocrático tipo “assim não dá mais...”, lembro da Fábula das Abelhas, de Mandeville. Tenho-a decorada. E no alto da cabeceira da cama. É uma fábula liberal. Já contei a estorinha aqui várias vezes. As abelhas moralistas se ferraram. Pediram uma sociedade só de virtudes. Impossível, porque “vícios privados, benefícios públicos”. Só que, por incrível que pareça, em Pindorama até a fábula das abelhas ocorre de forma inversa. Por aqui é Vícios Públicos, Benefícios Privados.
Sei que há um escândalo atrás de outro. Agora é a vez do Carf (cuja sigla parece uma onomatopeia). Ao que consta, não são milhões. São bilhões de prejuízo aos cofres públicos. Hoje é assim: quem roubar menos de R$ 100 mil, vai para o JEC. Afinal, onde não tem chuncho? Alguma atividade que envolva o Estado estaria livre da chunchagem?
Temos que ter paciência. A corrupção é a conta que nossa herança patrimonialista está apresentando. Dona do poder, a sociedade de estamentos quer sempre mais. Como dizia Faoro, acima da luta de classes estão os estamentos. Há alguns anos, o jornal inglês The Guardian estampou a manchete: Brasil é pré-moderno. Tinha razão, porque os estamentos são da virada do medievo para a modernidade. São as neo-corporações de ofício, compostas por funcionários de alto escalão que-possuem-laços-de-afinidade-cleptocrática com diversos setores privados e públicos.
Assim se constroem os nichos de corrupção e poder. Qual é o critério para chegar ao Carf? E a Furnas? E a Itaipu? Indicado por quem? E para chegar aos tribunais? Sem QI, nem pense em começar. Não há almoço grátis. Alguém pensou em meritocracia? Em curriculum? Não, é claro. Gosto quando se fala “Fulano tomará posse do cargo de....”. Bingo! Toma posse e pensa que é dele. Daí a noção de birô-cracia (a força do sujeito atrás da mesa e que pensa que, primeiro, a mesa é dele e, segundo, que está prestando um favor à malta). Brasília é o máximo. Brasília não é um lugar; é um enunciado performativo. Um lugar fundamental. Todo mundo tem poder. Os empoderados (odeio essa palavra). E quem não tem, roda a bolsa para ter.
Gostaria de ver uma severa autocrítica
Não estou pregando moral (com ou sem ceroulas) e nem quero sair gritando por aí : “vamos esfolar essa gente”. Sou um cultor da Constituição. Guardo coerência e integridade em minha fala. Mas no ecossistema criminal, pode-se ver tranquilamente que os predadores, isto é, aqueles que, no ecossistema, deveriam predar os criminosos, estão perdendo a batalha. E sabem por quê? Talvez porque, a vida toda, nossas instituições fecharam os olhos para tudo-isso-que-está-aparecendo-agora. E estiveram demasiadamente preocupados com ladrões de galinha. Claro. Ocupados com o andar de baixo, o andar de cima foi se fartando. E se acostumando com a coisa. Na verdade, talvez nossas Instituições tenham perdido a mão, como se diz. O braço longo do direito penal se “acostumou” em pegar os descalzos. Agora, na hora de pegar os “de bota”, chegam a conclusão que o braço é curto. Não. O braço deve ser o mesmo. Não pode haver condutas ou campanhas ad hoc ou de exceção. Se eu admito exceção hoje, qual é o limite para a próxima?
Então ao menos gostaria de ouvir uma severa autocrítica dos predadores (TCU, CGU, Polícia, Ministério Público e Judiciário). E não simplesmente botar a culpa “no sistema”. Em Alegrete, no agreste gaucho, os fazendeiros, preocupados com a perda de bezerros de ovelhas, exterminaram os caranchos. Só que esqueceram que os caranchos também comiam, como sobremesa, os ovos das caturritas. Resultado: as caturritas se multiplicaram tanto, que virou uma praga. O prejuízo foi maior ainda. Por isso, há que ser cuidado. Dosagem adequada. E, atenção: isso também não pode significar o afrouxamento de garantias, como se viu no pacote apresentando pelo MPF dias atrás, contra o qual escrevi com veemência. E tampouco chegar ao extremo de viabilizar a proposta apresentada pelos juízes Moro e Bochenek.
O que ocorre é que a corrupção virou uma pandemia. O dilema é, parafraseando o psicanalista Alfredo Jerusalinski: como combater o gozo desses setores corruptos de terrae brasilis sem ser tirânico? Quem não souber responder a isso não pode se meter no jogo. Isto porque o jogo se joga dentro das regras. Mesmo que não gostemos das regras. Afinal, fomos nós que as fizemos.
Post scriptum: para que não sejamos tentados a fazer discursos moralistas, leiam:
“Ressurge a Democracia”
“...salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo (...) o Brasil livrou-se do Governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições. Agora, o Congresso dará o remédio constitucional à situação existente...(...).. Poderemos, desde hoje, encarar o futuro confiantemente, certos, enfim, de que todos os nossos problemas terão soluções, pois os negócios públicos não mais serão geridos com má-fé, demagogia e insensatez. (...) Era a sorte da democracia no Brasil que estava em jogo.”
- Os meus leitores sabem do que se trata? Pois lhes conto. Trata-se do editorial do Jornal O Globo de 2 de abril de 1964. Bingo! Há 51 anos! Que lhes parece? Por isso, tenho tido o máximo cuidado quando tenho coceiras autoritárias... Além de ler a Fábula das Abelhas, leio esse editorial! É, meus Amigos, a história é cruel.
[1] MORO, Sérgio; BOCHENEK, Antônio Cesar. O problema é o processo. In: Jornal Estadão, Blog do Fausto Macedo, São Paulo, 29 Mar 2015. Disponível em: . Acesso em: 31 Mar 2015.
[2] AZEVEDO, Reinaldo. Um péssimo artigo do juiz Sérgio Moro. Ou: O mal do Brasil não está no cumprimento da lei, mas no descumprimento. In: Revista Veja, Blog do Reinaldo Azevedo, São Paulo, 30 Mar 2015. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/um-pessimo-artigo-do-juiz-sergio-moro-ou-o-mal-do-brasil-nao-esta-no-cumprimento-da-lei-mas-no-descumprimento/>. Acesso em: 31 Mar 2015.
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Lenio Luiz Streck é jurista, professor, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine o Facebook.
Revista Consultor Jurídico, 2 de abril de 2015, 8h00
COMENTÁRIOS DE LEITORES
66 comentários
LEMBREI DA DILMÃE.
João B. (Advogado Autônomo)
9 de abril de 2015, 11h21
"...assim não dá mais para tocar o Parlamento. Muitas regras, formalidades, obediência de quorum."
Lembrei da Dilma, e seu alto apreço pelo uso de MP's. Pobre Brasil.
O GLOBO
Rodrigo Beleza (Outro)
8 de abril de 2015, 18h41
Não é que essa semana o jornaleco voltou a publicar algo com o mesmo teor de 64? Tsc, essa Globo... não aprende com a História.
FOCARUM "AD HOMINEM" AMESTRADORUM
Adriano Las (Professor)
6 de abril de 2015, 19h44
Em terrae brasilis:
Foca Amestrada.
Ver todos comentários
Comentários encerrados em 10/04/2015.
*** *** https://www.conjur.com.br/2015-abr-02/senso-incomum-problema-processo-moro-reynaldo-azevedo-sabe-nao *** ***
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Espaço Vital
Gilmar Mendes diz que a anulação das condenações de Lula não foi “absolvição” |
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O ministro Gilmar Mendes, do STF, avalia que a Operação Lava-Jato provocou um "colapso" no Judiciário que atingiu da primeira instância até o STJ. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Gilmar disse que essas instâncias sucumbiram a "pressões políticas" da força-tarefa que comandou a operação em Curitiba. “O STJ não cumpriu adequadamente seu papel” - afirmou.
Expoente inflexível da ala garantista, Gilmar reconhece que a correção de rumos imposta pelo STF coincide com o momento em que a Lava-Jato caiu em desgraça, mas afirma que isso se deve à "estrutura hierárquica do Judiciário", em que o Supremo é o último a se manifestar.
O ministro ressaltou que o Supremo anulou as condenações contra o ex-presidente Lula por questões meramente processuais, ao concluir que os casos não deveriam ter ficado em Curitiba. O STF não entrou no mérito se o petista cometeu corrupção passiva e lavagem de dinheiro. “Não foi uma absolvição” - observou.
Mas Gilmar nada falou sobre as óbvias possibilidades de que, proximamente, Lula possa ser beneficiado pela ocorrência da prescrição.
Gilmar já fez duras críticas a posições adotadas pelo mais novo ministro, Kassio Nunes Marques, que coincidem com os interesses do presidente Jair Bolsonaro, responsável por sua indicação. Mesmo assim, Gilmar disse não ver riscos de uma “corte bolsonarista" e afirmou que os vínculos políticos dos magistrados vão se "esmaecendo com o tempo".
Leia algumas perguntas e respostas da entrevista
Estadão - Anular as condenações de Lula legitima o discurso do PT de que ele não praticou corrupção?
Gilmar - Não. O que o tribunal está mandando é para o juiz competente processar e julgar as denúncias. É isso. Não foi uma absolvição. Claro que cancela as condenações, mas manda que o juiz competente prossiga no seu julgamento.
- Lula ainda tem um novo encontro com a Justiça?
- Com certeza! Você viu que surgiu a dúvida sobre a vara competente, São Paulo ou Distrito Federal. Definida a competência, essa vara vai prosseguir o trabalho.
- O senhor vê espaço para o plenário derrubar a suspeição do ex-juiz Moro?
- Essa questão está resolvida. Porque, de fato, nós julgamos o habeas corpus da suspeição de Moro na 2ª Turma. Nós temos que ser rigorosos com as regras processuais. Não podemos fazer casuísmo com o processo, por se tratar de A ou de B.
- O julgamento de Lula pode provocar um efeito cascata e beneficiar outros réus?
- Não vejo assim. O caso do Lula, no que diz respeito à suspeição, é muito delimitado. É uma situação muito personalista.
- Lula ficou 580 dias preso, acabou afastado das eleições de 2018 e só agora o plenário do STF decidiu que Curitiba não tinha competência para julgá-lo. O Supremo dormiu no ponto?
- Acho que não. Na verdade, o processo judicial é muito complexo. E ele segue toda essa escala: o juiz de primeiro grau; o tribunal intermediário, no caso deles, o TRF-4; o STJ; e o Supremo. Desde 2015, o STF vem afirmando que a competência de Curitiba não é universal.
- Como explicar à sociedade que o Judiciário cometeu um erro que levou à prisão de uma pessoa?
- Isso é fruto, primeiro, dessa estrutura hierárquica do Judiciário. O Supremo só fala por último. Essa questão do Lula - da competência de Curitiba - só aportou no Supremo em novembro. Agora, o Supremo, no caso do "quadrilhão do MDB", já tinha decisão. O caso da Gleisi Hoffmann, presidente do PT e do Paulo Bernardo é um antecedente, de 2015, e ali se assentaram balizas muito interessantes. Dizendo, por exemplo, que não bastava que um delator informasse vários fatos para justificar a competência de Curitiba.
- Por que instâncias inferiores não foram na mesma linha?
- Havia uma ânsia de decidir rapidamente, de acordo com aquilo que a Lava-Jato tinha estabelecido. Se nós formos olhar, havia uma certa opressão dos tribunais que eram suscetíveis de serem oprimidos. O STJ, nesse período, foi submetido a uma pressão político-judicial. Uma perseguição judicial. Por conta daqueles episódios ligados à nomeação do Marcelo Navarro, alvo de acusação na delação de Delcídio Amaral. O tribunal, ele próprio, perdeu a ossatura. Ele não cumpriu, adequadamente, seu papel.
- O STF impôs uma correção de rumos à Lava-Jato?
- A Lava-Jato sofreu inúmeras derrotas ao longo desse tempo. Mas por seus próprios méritos. Ou deméritos. Ela causou isso, na medida em que avançavam sobre competências que não tinham. A pergunta básica é: como que se deu tanto poder a uma força-tarefa? Em que lugar do mundo haveria isso? É alguma coisa que precisa ser explicada. Virou um esquadrão.
- O senhor utilizou as mensagens de hackers como reforço para declarar Moro parcial.
- Isso sugere uma subversão institucional. Houve, de alguma forma, um colapso aí, em termos de gestão administrativa. Esses problemas se multiplicam. De alguma forma, estão ocorrendo episódios semelhantes na 7ª Vara do Rio de Janeiro. Em que aparece um super advogado (Nythalmar Filho, alvo de mandados de busca da PF), que teria relacionamento com o juiz (Marcelo Bretas), que teria trânsito com os procuradores, que faziam todas as delações... E tudo mais. Nesse mundo obscuro que é o Rio de Janeiro. O combate à corrupção não pode ser instrumento de corrupção.
- No julgamento da suspeição de Moro, o senhor ficou frustrado com o voto de Nunes Marques, que foi contra declarar o ex-juiz parcial?
- Eu saio do julgamento, o tema se encerra, e a vida segue com a mesma normalidade. Sou bastante enfático, como vocês sabem. Posso até ter adversários, mas não tenho inimigos, não.
- O senhor destacou que "não há salvação para o juiz covarde". O voto dele foi covarde?
- Não estava falando sobre isso. É um artigo de Ruy Barbosa, que diz: "O bom ladrão salvou-se. Mas não há salvação para o juiz covarde". É uma expressão clássica. Estimula-se muito a técnica do não conhecimento (rejeição do processo por questões técnicas), para evitar enfrentar determinadas questões, especialmente em matéria criminal. Eu sou crítico disso, porque depois nós acabamos por chancelar brutais injustiças.
- Após a indicação para o STF, qual deve ser a relação do ministro com o chefe do Executivo?
- Tenho a impressão de que esses vínculos políticos vão se esmaecendo com o tempo. É natural e surge até um distanciamento...
- Bolsonaro riu ao ser informado por um apoiador de que uma ação contra Alexandre de Moraes ficou nas mãos de Nunes Marques. Essa "bancada bolsonarista" que pode se formar dentro do STF não preocupa?
- Acho que não. A vida é tão dinâmica, e as pessoas vão se conscientizando do seu papel. O que acontece é que talvez o momento político está tão crispado e acaba acontecendo que muitos políticos ficam falando para os seus convertidos: ah, estou atuando nisso, mas o ministro Kassio simplesmente encaminhou para o arquivo essa matéria. Portanto, aqui não sinaliza nenhuma subordinação hierárquica ao presidente da República. Ao revés, mostra que simplesmente ele está seguindo a jurisprudência do STF.
- O senhor vê risco de um "Supremo bolsonarista"?
- Não vejo, acho que as pessoas - os indicados - começam a fazer uma autocrítica do seu papel.
FONTE: https://www.espacovital.com.br/publicacao-38874-gilmar-mendes-diz-que-a-anulacao-das-condenacoes-de-lula-nao-foi-ldquoabsolvicaordquo
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UOL Notícias
'Não foi uma absolvição', diz Gilmar sobre caso de Lula
'Não foi uma absolvição', diz Gilmar sobre caso de Lula Gilmar Mendes durante julgamento da anulação Imagem: Reprodução/Youtube Rafael Moraes Moura e Andreza Matais Brasília 18/04/2021 16h00Atualizada em 18/04/2021 18h23 O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, avalia que a Operação Lava Jato provocou um "colapso" no Judiciário que atingiu da primeira instância até o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em entrevista ao Estadão, Gilmar disse que essas instâncias sucumbiram a "pressões políticas" da força-tarefa que comandou a operação em Curitiba. "O STJ não cumpriu adequadamente seu papel", afirmou. Expoente da ala garantista, Gilmar reconhece que a correção de ... - Veja mais em https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2021/04/18/nao-foi-uma-absolvicao-diz-gilmar-sobre-caso-de-lula.htm?cmpid=copiaecola
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Entre anulação, absolvição e decisão de Gilmar, como ficam 17 processos contra Lula
23 junho 2021
Atualizado 24 junho 2021
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Lula em foto de maio de 2021CRÉDITO,REUTERS
Legenda da foto,
De 17 acusações feitas contra ele na Justiça, Lula responde a três
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*Reportagem atualizada às 18h20 de 24 de junho de 2020 com decisão do ministro Gilmar Mendes
O Plenário do Supremo Tribunal Federal confirmou, nesta quarta-feira (23/6), a decisão de que houve suspeição (ou seja, parcialidade) do ex-juiz Sergio Moro no caso do tríplex do Guarujá envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Quatro decisões contra Lula haviam sido anuladas ainda em março por decisão do ministro Edson Fachin, permitindo que o ex-presidente recuperasse seus direitos políticos e voltasse a se tornar elegível (entenda abaixo).
Também ficou decidido que esses casos serão remetidos à Justiça Federal do Distrito Federal, onde começarão a tramitar a partir da estaca zero. Todas as provas acumuladas até agora serão desconsideradas.
Em seguida, na quinta-feira (24/6), o ministro Gilmar Mendes, do STF, estendeu a suspeição a outros processos envolvendo Lula (e o sítio em Atibaia e um imóvel do Instituto Lula) em que Moro atuou quando estava na 13ª Vara Federal de Curitiba.
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É a segunda decisão judicial favorável a Lula nesta semana. Na segunda-feira (21/6), Lula havia sido absolvido, por falta de provas, pela Justiça do Distrito Federal em outro processo de corrupção, fora do âmbito da Lava Jato.
Com isso, informa seu advogado Cristiano Zanin Martins, Lula hoje responde a três dos 17 processos ou inquéritos dos quais já foi alvo na Justiça.
Entenda a seguir os detalhes de todos os casos recentes envolvendo o ex-presidente:
Operação Lava Jato: a decisão de Fachin
Em 8 de março, o ministro Edson Fachin anulou quatro processos movidos contra Luiz Inácio Lula da Silva na 13ª Vara Federal de Curitiba.
Dois destes processos ainda tramitavam na primeira instância da Justiça Federal no Paraná e não haviam sido julgados, mas em outros dois o ex-presidente já havia sido condenado.
STF decide manter suspeição de Moro; processos contra Lula serão julgados de novo no DF
Em referência aos processos ainda em tramitação, tratava-se de acusações de suposto recebimento de propina da empreiteira Odebrecht para a compra do terreno do Instituto Lula, criado pelo ex-presidente após deixar o Planalto, da suposta compra de um apartamento em São Bernardo do Campo (Grande SP), no mesmo andar e no mesmo prédio onde Lula vivia antes de ser preso, de doações feitas pela Odebrecht ao instituto para pagar propinas por contratos fraudados da Petrobras.
O ex-presidente, bem como o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci e o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, eram acusados de lavagem de dinheiro. A denúncia foi baseada em informações prestadas por Palocci em uma delação premiada.
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Sergio Moro
CRÉDITO,REUTERS
Legenda da foto,
O ex-juiz Sergio Moro condenou Lula no caso do triplex, mas STF o considerou parcial no caso
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Lula e Okamotto negam ter cometido os crimes. A defesa do ex-presidente negou que este "tenha praticado qualquer crime ou recebido qualquer benefício em troca de atos praticados na condição de chefe de Estado ou de governo".
Por decisão de Fachin, os casos foram remetidos à Justiça Federal do Distrito Federal - a avaliação do ministro foi de que as ações judiciais não poderiam ter corrido em Curitiba, por não terem relação direta com o esquema de desvios na Petrobras e, portanto, com a Operação Lava Jato.
Esses dois processos então recomeçarão do zero na Justiça do Distrito Federal, assim como as outras duas ações pelas quais Lula já havia sido condenado a 26 anos de prisão.
São elas:
A primeira condenação da Lava Jato: tríplex do Guarujá
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O petista foi acusado de receber propina da empreiteira OAS na forma da reserva e reforma de um apartamento no balneário paulista.
Embora o imóvel nunca tenha pertencido formalmente a Lula, o Ministério Público alegou que o negócio foi desfeito depois de o assunto vir a público — e por isso não chegou a se concretizar.
Em julho de 2017, Lula foi condenado a 9 anos e 6 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo então juiz Sergio Moro.
Depois, a condenação foi confirmada pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em janeiro de 2018, que aumentou a pena para 12 anos e um mês de prisão.
Em abril de 2019, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu manter a condenação, mas reduziu a pena imposta a Lula para 8 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão.
Na ocasião, a defesa do ex-presidente criticou a decisão dos ministros: "O único desfecho possível é a absolvição do ex-presidente Lula, porque ele não praticou qualquer crime".
Foi a condenação neste processo do tríplex que levou Lula à prisão em 2018 e primeiro o deixou inelegível, após sua condenação em segunda instância.
Lula ficou preso pouco mais de um ano e meio, por 580 dias, mas foi libertado em novembro de 2019 após o STF decidir contra a prisão após condenação em segunda instância.
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Tríplex no Guarujá
CRÉDITO,AFP
Legenda da foto,
Lula foi acusado de receber propina da por meio da reserva e reforma de um apartamento no Guarujá
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A corte determinou que a pena só pode começar a ser cumprida após o processo transitar em julgado, ou seja, ao se esgotarem todos os recursos.
Neste caso, a defesa do ex-presidente ainda pôde recorrer ao próprio STF. Um dos recursos apresentados argumentava que a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para processar e julgar a ação do tríplex.
Fachin concordou com isso e identificou o mesmo problema nos outros três processos que foram anulados, entre eles a ação na qual Lula foi condenado pela segunda vez.
A segunda condenação da Lava Jato: sítio de Atibaia
O ex-presidente foi acusado de receber propinas das construtoras OAS e Odebrecht por meio de reformas, em 2010, num sítio no município do interior paulista.
O imóvel pertence formalmente ao empresário Fernando Bittar, mas o MPF alega que Lula é o verdadeiro dono do sítio e era o principal usuário do local.
Substituta de Moro após o juiz deixar o magistério para se tornar ministro do governo Bolsonaro, a juíza federal Gabriela Hardt condenou Lula a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro.
Em novembro de 2019, a condenação foi confirmada em segunda instância pelos desembargadores Gebran Neto, Leandro Paulsen e Thompson Flores, do TRF-4. O trio de magistrados também concordou em elevar a pena de Lula para 17 anos, um mês e dez dias, e multa.
Além de Lula, outras dez pessoas haviam sido condenadas na sentença proferida por Hardt, entre elas os ex-presidentes da OAS, Léo Pinheiro, e da Odebrecht, Marcelo Odebrecht.
O ex-presidente Lula negou irregularidades, enquanto os dois empresários viraram colaboradores da Lava Jato e confessaram os crimes.
À época da primeira condenação, a defesa de Lula acusou a Justiça Federal de Curitiba de fazer "uso perverso das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política".
A defesa destacou que o ex-presidente nunca foi o dono do sítio, e que a decisão se baseia num suposto "caixa geral" de propinas das empreiteiras porque não há, segundo a defesa, provas materiais de que o dinheiro desviado de contratos da Petrobras foi usado nas reformas.
Tramitação no STF
Depois da decisão de Fachin, a Segunda Turma do STF julgou, em março, por 3 votos a 2, que Moro agiu com parcialidade no caso do tríplex.
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STF
CRÉDITO,EPA
Legenda da foto,
Sessão desta quarta (23/6) no STF manteve maioria pela suspeição de Moro, anulando portanto processos contra Lula
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Na ocasião, a ministra Cármen Lúcia afirmou que se demonstrou uma "confusão" entre o juiz do caso (Moro) e o Ministério Público, encarregado da acusação.
As provas colhidas no processo do tríplex foram anuladas e não poderão ser reutilizadas na possibilidade de esse caso voltar a ser julgado.
Houve novos desdobramentos das ações contra Lula em abril.
Em 15 de abril, a decisão de março de Fachin foi confirmada pelo Plenário do STF, que formou maioria para anular as ações penais contra Lula. O julgamento continuaria no dia 22 de abril, para determinar o destino dos processos contra o ex-presidente, mas houve um pedido de vista por parte do ministro Marco Aurélio.
O que nos traz à sessão desta quarta (23/6), no qual, apesar dos votos contrários de Marco Aurélio e Luiz Fux, não foi mudada a maioria de 7 votos (contra um total de 4 votos contrários) para manter a suspeição de Moro no caso do tríplex - suspeição que foi estendida, por decisão de Gilmar Mendes, a outros casos de Lula sob a atuação de Sergio Moro.
Operação Zelotes: absolvição e processo pendente
Para além da Lava Jato, Lula foi acusado em duas ações dentro da Operação Zelotes, que é uma investigação aberta dentro da Receita Federal para apurar acusações de fraudes, lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, formação de quadrilha e prestações de serviço ilícitas que, segundo o Ministério da Economia, causaram prejuízos "que podem chegar às cifras de bilhões de reais aos cofres públicos".
Em uma das ações, Lula foi absolvido na última segunda-feira (21/6), junto a Gilberto Carvalho, seu ex-chefe de Gabinete. O ex-presidente havia sido denunciado em 2017 pelo Ministério Público sob acusações de ter estendido benefícios fiscais a montadoras por meio de uma Medida Provisória editada em 2009, em troca da promessa de R$ 6 milhões que seriam dados a campanhas eleitorais.
Lula negou as acusações e afirmou, durante depoimento em 2020, que "não discutia medida provisória com indústria automobilística".
Em maio passado, o próprio MPF pediu a absolvição do presidente e outros réus, afirmando não ter encontrado provas de que a Medida Provisória teria como contrapartida uma doação.
Na decisão desta segunda-feira, o juiz Frederico Botelho de Barros Viana, da Justiça Federal em Brasília, afirmou que "não há evidências apropriadas e sequer minimamente aptas a demonstrar a existência de ajuste ilícito entre os réus para fins de repasse de valores em favor de Lula e Gilberto Carvalho".
Ainda dentro da Operação Zelotes, porém, Lula segue sendo réu em uma outra ação, que investiga suposto tráfico de influência, lavagem de dinheiro e organização criminosa na compra de 36 caças Gripen, da empresa sueca Saab, durante o governo de sua sucessora, Dilma Rousseff.
Lula negou as acusações e disse que não se envolveu na negociação.
Angola e Guiné: acusações de propina
As outras duas ações às quais Lula ainda responde na Justiça são:
- Uma acusação de ter influenciado na liberação de financiamento do BNDES para obras da empreiteira Odebrecht em Angola, em troca de suposta propina ao PT, partido de Lula. O empresário Marcelo Odebrecht confirmou esse acerto em depoimento em outubro de 2019. Na época, a defesa de Lula afirmou que o ex-presidente não teve participação em nenhum ato ilícito.
- Uma acusação de suposta lavagem de dinheiro por influência em negócios da empresa ARG na Guiné Equatorial, supostamente em troca de uma doação ao Instituto Lula. Na ocasião, a defesa de Lula negou a acusação e afirmou que a doação foi "lícita e contabilizada" e "dirigida ao Instituto Lula, que não se confunde com a pessoa do ex-presidente".
Dos restantes nove casos citando o ex-presidente na Justiça (considerando-se o total de 17 casos e excetuando-se os que já foram detalhados acima), há também denúncias que foram rejeitadas ou arquivadas pela Justiça.
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e-Diário Oficial
O que é Medida Cautelar e Para que Serve? | E-Diário Oficial
MEDIDA CAUTELAR EM MANDADO DE SEGURANÇA 38.289 DISTRITO
FEDERAL
RELATOR : MIN. ALEXANDRE DE MORAES
IMPTE.(S) :JAIR MESSIAS BOLSONARO
PROC.(A/S)(ES) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
IMPDO.(A/S) :PRESIDENTE DA COMISSÃO PARLAMENTAR DE
INQUÉRITO DO SENADO FEDERAL - CPI DA
PANDEMIA
ADV.(A/S) :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
DECISÃO
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Jair Messias
Bolsonaro em face de ato praticado pela Comissão Parlamentar de
Inquérito do Senado Federal - CPI da Pandemia, no qual requer,
liminarmente:
“a concessão de medida liminar inaudita altera parte para
o fim de que seja suspensa a eficácia da decisão proferida pela
Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI da Pandemia, em
sessão realizada no dia 26/10/2021, no que tange à aprovação do
Requerimento nº 1.587/2021;
(ii) seja imediatamente encaminhado ofício às empresas
Google Brasil Internet Ltda., com endereço na Avenida
Brigadeiro Faria Lima, 3477, 18º andar, CEP 04538-133, São
Paulo/SP e Facebook Serviços Online do Brasil Ltda., com
endereço: Rua Leopoldo Couto de Magalhães Júnior, 700, 5º
andar, Itaim Bibi, CEP 04.542-000, São Paulo-SP, e a empresa
Twitter Brasil Rede de Informação Ltda., com endereço na Rua
Professor Atilio Innocenti, 642, 668 9º andar, São Paulo/SP, CEP:
04538-001, para que não forneçam os dados telemáticos do
impetrante requeridos pela Comissão Parlamentar de Inquérito
– CPI da Pandemia, nem tampouco procedam a qualquer
suspensão de acesso a contas em plataformas, até decisão final
desse Supremo Tribunal Federal;
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(iii) subsidiariamente, requer seja determinada a garantia
do sigilo de todos os dados privados da parte impetrante que
não tenham nenhuma relação com o objeto da Comissão
Parlamentar de Inquérito, sendo vedada a sua divulgação e/ou
utilização; no que toca aos dados eventualmente
correlacionados à CPI, requer seja também assegurado o acesso
restrito de seu teor somente ao Procurador-Geral da
República;”
O impetrante relata que “ontem (26/10/2021), após finalizada a fase de
investigação e a elaboração do relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito,
no mesmo dia em que encerrados seus trabalhos, aprovou-se o requerimento nº
1.587/2021 pelo qual se determina ‘a TRANSFERÊNCIA DOS SIGILOS
telemático do Presidente da República ao Procurador-Geral da República e ao
Supremo Tribunal Federal, de abril de 2020 até o presente (...)’, dentre outras
determinações como por exemplo, a suspensão de acesso ‘a(s) conta(s) do
Presidente da República’ em diferentes plataformas ‘até ulterior determinação’”,
mas “que o impetrante, enquanto Presidente da República, não pode ser
investigado no âmbito de CPI’s ou de qualquer outra Comissão Parlamentar, seja
a que título for, como se demonstra a seguir”.
Sustenta que “de acordo com o parágrafo 3º do artigo 58, da Constituição,
as CPIs possuem ‘poderes de investigação próprios das autoridades judiciais’
para ‘apuração de fato determinado’, o que implicaria, para esse efeito, incidência
subsidiária das normas processuais penais no desenvolvimento de seus atos,
conforme estipula tanto o art. 3º da Lei nº 1.579/523 quanto o art. 153 do
Regimento Interno do Senado Federal”.
Alega que “o requerimento aprovado invade a esfera de sigilos dos dados
telemáticos da parte impetrante, de abril de 2020 até a presente data, além de
determinar outras providências igualmente ilegais em face do Impetrante, a
exemplo da suspensão de contas em plataformas, e instar a representação pela
Advocacia do Senado para promover sua responsabilização”.
Aduz que “o impetrante não participou da comissão sequer como
testemunha. E nem poderia ser diferente, já que o Presidente da República não
pode ser investigado no âmbito de CPI’s ou de qualquer outra Comissão
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Parlamentar, seja a que título for”.
Assenta que há “limites à atuação da CPI. O primeiro deles é de ordem
procedimental. Compete ao locus legislativo a apuração de fatos, a coleta de
elementos indiciários, mas não a atribuição de responsabilidades, antecipação de
julgamentos ou imputação de práticas de ilícitos criminais” e que “não há
poderes de investigação criminal ou para fins de indiciamento, seja da Câmara
dos Deputados ou do Senado Federal, em face do Presidente da República, no
âmbito de CPI’s ou de qualquer outra Comissão Parlamentar, seja a que título
for”.
Assevera que “com relação ao Chefe do Poder Executivo, esta compreensão
é extraída do art. 50, §1º, da CRFB/88, que não sinaliza o Presidente como
partícipe, em qualquer dimensão, dos atos instrutórios ou desdobramentos em
colegiados do Parlamento Federal, seja em face da Câmara ou do Senado”, se
revelando inviável “nos termos da Constituição da República, a investigação
ou mesmo a fixação de medidas constritivas por parte da CPI em face do
Presidente da República”, não podendo, portanto, o Presidente da
República “figurar como testemunha nem tampouco como investigado, tendo
em vista o silêncio eloquente dos artigos 50, caput e § 2º, e 58, § 2º, III, da
Constituição”.
Afirma que “revela-se vedada qualquer medida cautelar penal em face do
Presidente da República por essa ótica. É uma decorrência, ainda, do brocardo a
maiori, ad minus, ou seja, se a Lei Maior afasta o Titular do Poder Executivo
Federal da obrigação de comparecer como testemunha, por óbvio, esta garantia
abarca a vedação de indiciamento ou mesmo de imposição de medidas cautelares
de caráter penal em face daquela autoridade, situações absolutamente mais
invasivas, sob o ponto de vista investigativo ou processual” e que “em sede de
Direito Penal incide o princípio que exorta interpretação mais benéfica ao agente,
a vedação de analogias in malam partem e, ainda, a legalidade em sentido estrito,
tudo a corroborar a impossibilidade de que seja admitida a quebra de sigilo de
dados telemáticos a suspensão de seu acesso a plataformas, ou mesmo instar
órgão jurídico a promover a investigação e responsabilização do Presidente da
República, o qual, conforme delineado, não pode sequer ser convocado como
testemunha no âmbito de CPI”.
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Assinala que “o contato do Congresso Nacional com investigações em face
do Presidente da República somente é possível em dois momentos, ambos
exteriorizados de forma reativa (receptiva), quais sejam: i) pelo Senado Federal,
nos juízos jurídico-político de crimes de responsabilidade (Art. 52, I, da
CRFB/88); e (ii) pela Câmara dos Deputados, na admissibilidade – juízo de
prelibação de crimes de responsabilidade e comuns, como requisito de
procedibilidade de denúncias ofertadas ao Senado e a esse Supremo Tribunal
Federal”.
Alega que “o Senado Federal, ao processar e julgar imputações de crimes
de responsabilidade (art. 52, I e II, da CRFB/88), funciona atipicamente como
instância julgadora, apropriada de parcela das faculdades do Poder Judiciário. O
mesmo ocorre com a Câmara que, na admissibilidade de que trata o art. 51, I, da
CRFB/88, exterioriza função julgadora de primeira fase no bojo de processo
criminal ou de responsabilidade de trâmite complexo, ou seja, cujo resultado –
condenação – depende da conjugação de duas deliberações ou julgamentos
(vontades), a primeira delas, sob responsabilidade da Câmara, de natureza
jurídico-política”.
Aduz que, assim, “verifica-se a impossibilidade de CPI’s ou de qualquer
outra Comissão, seja da Câmara, do Senado Federal ou mesmo mista,
investigarem o Sr. Presidente da República e, por corolário, igualmente inviável
seja apontado como indiciado ou investigado ou contra ele impostas medidas
cautelares penais”.
Assenta que “foi justamente por reconhecer que não poderia investigar o
Presidente da República, que a Comissão Parlamentar de Inquérito, no intuito de
obter a indevida quebra de dados a qualquer custo, determinou que a
transferência do sigilo fosse direcionada ao Procurador-Geral da República e a
esse Supremo Tribunal Federal” mas, que não “se verifica na lei ou na
Constituição, contudo, nenhuma previsão de legitimação extraordinária para que
qualquer CPI se substitua ao juízo próprio de Instituições que, nas
circunstâncias adequadas teriam, em tese, competência para investigar o
impetrante”.
O impetrante também sustenta a ausência de fundamentação do ato
coator, sob a alegação de que “os fundamentos para a quebra dos sigilos
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decorrem da participação do impetrante em live, na qual supostamente teria lido
uma notícia no sentido de que ‘vacinados [contra a Covid] estão desenvolvendo a
síndrome da imunodeficiência adquirida [Aids]’. Este, repita-se, foi único
fundamento utilizado para postular a quebra de sigilo telemático das redes sociais
do Presidente da República”.
Prossegue afirmando que “extrai-se da fundamentação utilizada no
requerimento nº 1.587/2021, acima reproduzido, a utilização da quebra de sigilo
como instrumento de punição à manifestação do Presidente da República na
referida live. Na justificativa do requerimento não se observa demonstração de
eventual necessidade da prova a ser obtida a partir dos dados telemáticos do
impetrante. Não há, de igual forma, quaisquer argumentos no sentido da
necessidade de aprofundamento das investigações para contribuir com os
trabalhos da CPI. Aliás, o relatório final da CPI foi aprovado na mesma data de
aprovação do requerimento (26/10/2021) sem que seus integrantes tivessem
acesso aos dados requisitados, o que só denota a inutilidade da providência”.
Assenta que “inexiste a indicação de fato ou ato concreto e específico
realizado pelo impetrante, que necessitasse de provas a serem obtidas apenas por
meio da transferência de dados telemáticos, capaz de motivar adequadamente a
devassa de seus dados no período de abril de 2020 até o presente, sendo o ato
impetrado, portanto, manifestamente arbitrário” e que “a quebra de sigilo de
forma generalizada e inespecífica não encontra fundamento no devido processo
legal, representando uma devassa indiscriminada e violadora da dignidade e
intimidade individual do impetrante”.
Destaca que “a adoção de uma medida tão extrema como a quebra de sigilo
telemático do impetrante a partir de abril de 2020 ainda se revela desproporcional
e desalinhada com o escopo da investigação que se pretende empreender. A live
referenciada foi realizada em 21 de outubro de 2021, sendo absolutamente
injustificado e desproporcional, com alusão a ela, vindicar quebra com esta
máxima retroatividade, o que revela outra causa autônoma de
inconstitucionalidade do Requerimento parlamentar”.
Ressalta que “além da (1) motivação idônea, para que ocorra a quebra do
sigilo, devem igualmente estar presentes os requisitos de (2) pertinência temática
da diligência de quebra de sigilo com o objeto a ser investigado, (3) a necessidade
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imperiosa da medida, e (4) o resultado a ser apurado não possa ser passível de
confirmação por nenhum outro meio ou fonte lícita de prova (como documentos,
perícias, acareações, etc)”.
Além disso, o impetrante sustenta a ilegalidade do ato coator tendo
em vista que determina a quebra de sigilo telemático de pessoa não
investigada, alegando que “o direito fundamental ao sigilo das comunicações e
de dados somente poderá ser relativizado nas hipóteses onde houver indícios
razoáveis de autoria e participação em infração penal punida com pena de
reclusão e, ainda, se a prova não puder ser obtida por outros meios disponíveis no
ordenamento jurídico. Ou seja, é evidente que tal medida extrema exige, ao
menos, um mínimo indício de autoria do crime, ou seja, que tal pessoa esteja
sendo formalmente investigada por tais fatos”.
Aduz que “não se vislumbra a ocorrência de nenhuma das hipóteses legais
que poderia potencialmente abrir a possibilidade de eventual quebra de sigilo do
impetrante. Isso porque, a Comissão Parlamentar de Inquérito decretou, de forma
completamente ilegal e inconstitucional, a quebra de sigilo de dados telemáticos
do impetrante que sequer poderia (pelas razões acima relatadas) ter figurado
como testemunha, tampouco como investigado”.
Por fim, sustenta a presença dos requisitos necessários para a
concessão da cautelar – fumus boni iuris e periculum in mora:
“Conforme mencionado anteriormente, o impetrante, que
ocupa o cargo de Presidente da República, não pode ser
investigado no âmbito de CPI’s ou de qualquer outra Comissão
Parlamentar, seja a que título for.
Esta compreensão é extraída do silêncio eloquente do art.
50, §1º, da CRFB/88, que não sinaliza o Presidente como
partícipe, em qualquer dimensão, dos atos instrutórios ou
desdobramentos em colegiados do Parlamento Federal, seja em
face da Câmara ou do Senado.
[…]
Além disso, o entendimento do Supremo Tribunal Federal
é pacífico no sentido de exigir a adequada fundamentação das
decisões proferidas no âmbito das CPIs em casos de quebra de
sigilos de dados, bancários, fiscais e telefônicos. Diante da
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inexistência de fundamentação adequada, resta configurado o
fumus boni iuris do presente mandado de segurança.
Também se configura presente o periculum in mora,
considerando que, caso não deferida a concessão da medida
liminar aqui vindicada de forma incontinenti, restará à
inocuidade os direitos fundamentais à intimidade e à
privacidade do Presidente da República.
[…]
Além disso, a quebra dos dados telemáticos do Presidente
da República tem potencial aptidão de provocar danos à ordem
institucional e à segurança nacional.
De mesma sorte, resta evidenciado o fundado receio de
dano irreparável (periculum in mora), com a prolação de
decisão satisfativa. Isso porque, uma vez determinada a
divulgação dos dados telemáticos, a eventual modificação da
decisão não restabelecerá o status quo ante.”
Intimado, o Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito
presta informação de que “as fake news proferidas pelo impetrante na live do
dia 21 de outubro tinham o claro propósito de sabotar a campanha de vacinação
coordenada pela Secretaria Extraordinária de Enfrentamento a Covid-19 do
Ministério da Saúde em articulação com Estados, Municípios e organismos
internacionais, o que configura em tese crime de responsabilidade tipificado nos
incs. IV e V do art. 853 da Constituição da República e do art. 4º da Lei nº 1.079,
de 10 de abril de 1950”.
Assenta, ainda, que “a gravidade da conduta é exponencializada pelo fato
de que o Presidente da República, a par da representação legítima de eleitores que
se identificam de maneira significativa e razoável com sua agenda política, tem
um séquito de radicais que aderem cegamente às prescrições mais absurdas
emanadas do Chefe do Poder Executivo (Mito), como se viu nos lamentáveis
episódios de 7 de setembro passado intentados contra este Egrégio Supremo
Tribunal Federal, em especial, contra Vossa Excelência”.
Assevera que o presente mandado de segurança deve ser denegado
de plano, “uma vez que, como o próprio impetrante concedeu na exordial
(edoc1, p. 4), o inquérito parlamentar impugnado foi encerrado em 26 de outubro
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de 2021, após a aprovação do respectivo relatório final, em que se subsumiu o
requerimento ora impugnado, com inexoráveis elisão do objeto da impetração e de
eventual direito líquido e certo, falta de interesse de agir do impetrante, e
ilegitimidade passiva do impetrado” e que “com o exaurimento do inquérito
parlamentar, com ultimação do relatório final e seu encaminhamento nos termos
do art. 6º-A da lei nº 1.579, de 18 de março de 1952, a Comissão impetrada
chegou a seu termo e não pode mais atuar, nem mesmo se sujeitar a qualquer
ordem mandamental, o que torna absolutamente inepta a petição inicial”.
Aduz que “a Comissão Parlamentar de Inquérito, em atenção ao princípio
da harmonia entre os Poderes e ao princípio da proporcionalidade, não
determinou a transferência de dados de sigilo bancário, fiscal, telemático ou de
qualquer natureza relativamente ao impetrante, mas tão somente de conteúdos e
informações de redes sociais utilizadas pela Presidência da República, com
financiamento público, para promoção pessoal, promoção institucional e,
infelizmente, para disseminação de fake news em detrimento do interesse público
e com violação de direitos de cidadania à informação, à saúde pública, entre
outros”.
Ressalta que a “Comissão Parlamentar de Inquérito, diante da gravíssima
fake news proferida e difundida pelo impetrante, que já até reconheceu o erro e se
desculpou pelo fato, e já às vésperas da aprovação de seu relatório final, procedeu
conforme o respectivo mandamento constitucional, determinando a transferência
de dados das redes sociais utilizadas para a disseminação de Fakenews pela
assessoria do Presidente da República diretamente ao Supremo Tribunal Federal e
ao Procurador-Geral da República, bem como a suspensão de acesso aos
respectivos perfis para fins de se evitar a destruição de provas” e que “esses
dados integram para todos os fins o relatório final aprovado pela Comissão
Parlamentar de Inquérito e são imprescindíveis à consecução das medidas
determinadas no documento”.
Assenta, por fim, que a “atribuição de competências de admissibilidade,
processamento e julgamento do Presidente da República por crimes de
responsabilidade ou a necessidade de autorização da Câmara dos Deputados para
julgamento desta autoridade por crimes comuns não exclui, mas reforça os
poderes de investigação do Poder Legislativo em face do Chefe do Poder
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Executivo” e que a “abrangência temporal da transferência em tela coincide que
o período de funcionamento da Comissão Parlamentar de Inquérito e se justifica
porque têm estrita relação de pertinência com as investigações legislativas em
questão”.
É o relatório. Decido.
Nos termos do artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal e do
artigo 1º da Lei 12.016/2009, o mandado de segurança será concedido
para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou
habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer
pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la
por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as
funções que exerça.
Cabível, portanto, o Mandado de Segurança nas hipóteses em que
estiverem presentes indícios razoáveis de possível lesão a direito líquido e
certo; bem como, necessária a concessão da medida liminar quando
houver potencialidade da lesão se tornar efetiva, caso não sejam
suspensos os efeitos do ato impugnado (CAIO TÁCITO, Poder de polícia
e seus limites. RDA 61/220; OTHON J. SIDOU, Habeas data, mandado de
injunção, habeas corpus, Mandado de Segurança e ação popular. Rio de Janeiro:
Forense, 1989, p. 42; HELY LOPES MEIRELLES. Mandado de Segurança,
ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, habeas data. 18. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 3; CASTRO NUNES. Do Mandado de
Segurança e de outros meios de defesa contra atos do poder público. 7. ed.
Atualizada por José de Aguiar Dias. Rio de Janeiro: Forense, 1967. p. 73).
A concessão da liminar em Mandado de Segurança, desse modo,
encontra assento no próprio texto constitucional (ADI 975 MC/DF, Rel.
Min. CARLOS VELLOSO, Pleno, DJ de 20/6/1997), pois, estando
presentes os requisitos ensejadores, sua concessão é ínsita à finalidade
constitucional de proteção ao direito líquido e certo, sob pena de restrição
a eficácia do remédio constitucional.
Nesses termos, o artigo 7º, inciso III, da Lei 12.016/09 prevê ser
possível a suspensão do “ato que deu motivo ao pedido, quando houver
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fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida,
caso seja finalmente deferida”.
Na presente hipótese, se fazem presentes tais requisitos.
O impetrante insurge-se contra ato praticado pela Comissão
Parlamentar de Inquérito que aprovou o Requerimento 1.587/2021, “pelo
qual se determinou, de maneira absolutamente ilegal e arbitrária, a transferência
do sigilo de seus dados telemáticos ao Procurador-Geral da República e ao
Supremo Tribunal Federal, de abril de 2020 até o presente momento, a suspensão
de contas em redes sociais, dentre outras medidas”.
O ordenamento constitucional brasileiro consagrou, dentro das
funções fiscalizatórias do Poder Legislativo, as Comissões Parlamentares
de Inquérito, seguindo uma tradição inglesa que remonta ao século XIV,
quando, durante os reinados de Eduardo II e Eduardo III (1327-1377),
permitiu-se ao parlamento a possibilidade de controle da gestão da coisa
pública realizada pelo soberano.
As Comissões Parlamentares de Inquérito, sejam da Câmara dos
Deputados, sejam do Senado Federal ou do próprio Congresso Nacional
devem absoluto respeito a separação de poderes, ao princípio federativo,
e, consequentemente, à autonomia dos Estados-membros, Distrito
Federal e Municípios, cujas gestões da coisa pública devem ser
fiscalizadas pelos respectivos legislativos.
Em havendo respeito ao seu campo constitucional de atuação, como
sempre defendi em campo acadêmico, as Comissões Parlamentares de
Inquérito deverão observar os limites de seu poder investigatório, que
equivalem aos poderes instrutórios do magistrado no processo penal, nos
mesmos termos proclamados pela Lei Fundamental alemã, que em seu
art. 44, item 2, ao se referir às comissões de inquérito, estabelece que "as
disposições relativas ao processo penal terão aplicação por analogia à apuração de
provas" (Direito Constitucional. 37 ed. São Paulo: Atlas, 2021, capítulo 10,
item: 2.5).
Nesses termos, os poderes investigatórios das Comissões
Parlamentares de Inquérito compreendem, entre outros, a possibilidade
de quebra de sigilo bancário, fiscal, telefônico, telemático e de dados em
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geral, pois como consagrado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,
"não há como negar sua natureza probatória e, em principio, sua compreensão no
âmbito dos poderes de instrução do juiz, que a letra do art. 58, §3", da
Constituição, faz extensíveis às comissões parlamentares de inquérito" (MS
23.466, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Plenário, DJ de 22/06/1999),
podendo, portanto, “a CPI quebrar o sigilo dos dados ou registros telefônicos
de pessoa que esteja sendo investigada” (MS 23.556, Rel. Min. OCTÁVIO
GALLOTTI, Plenário, DJ de 14/9/2000).
As Comissões Parlamentares de Inquérito, em regra, terão os
mesmos poderes instrutórios que os magistrados possuem durante a
instrução processual penal, inclusive com a possibilidade de invasão das
liberdades públicas individuais, mas deverão exercê-los dentro dos
mesmos limites constitucionais impostos ao Poder Judiciário, seja em
relação ao respeito aos direitos fundamentais, seja em relação à necessária
fundamentação e publicidade de seus atos, seja, ainda, na necessidade de
resguardo de informações confidenciais impedindo que as investigações
sejam realizadas com a finalidade de perseguição politica o de aumentar
o prestigio pessoal dos investigadores, humilhando os investigados e
devassando desnecessária e arbitrariamente suas intimidades e vidas
privadas.
Entretanto, mesmo reconhecendo às Comissões Parlamentares de
Inquérito poderes instrutórios legitimadores de atos de natureza
constritiva, as medidas outorgadas distanciaram-se do seu caráter
instrumental, pois o ato coator acabou por extrapolar os limites
constitucionais investigatórios de que dotada a CPI ao aprovar
requerimento de quebra e transmissão de sigilo telemático do impetrante,
entre outras determinações, sem que tenha apresentado fundamentação a
demonstrar sua própria efetividade em relação ao fim almejado pela
Comissão Parlamentar, que já havia encerrado sua investigação, inclusive
com a elaboração do relatório final.
Como ressaltado pelo próprio Presidente da Comissão Parlamentar
de Inquérito, o Requerimento foi aprovado no mesmo dia do
encerramento da CPI, 26/10/2021, com o objetivo de determinar a
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“transferência dos sigilos telemáticos do Presidente da República ao ProcuradorGeral da República e ao Supremo Tribunal Federal, desde abril de 2020,
especificamente quanto a dados de conteúdo, conexões e gestão de perfis mantidos
pelo Chefe do Poder Executivo nas plataformas YouTube, Facebook, Instagram e
Twitter, com suspensão de acesso às respectivas contas ‘até ulterior deliberação’”,
entre outras providências a serem direcionadas à Procuradoria Geral da
República e ao Supremo Tribunal Federal por representação da
Advocacia do Senado Federal.
Evidencia-se desse quadro que, finalizada a CPI com aprovação
do Relatório final, não há que se cogitar em aproveitamento pela
própria Comissão Parlamentar de Inquérito das medidas constritivas
mencionadas.
Ora, assentada a premissa de que os poderes instrutórios
legitimadores das medidas cautelares tem direto nexo de
instrumentalidade com o escopo da CPI, não se mostra razoável a adoção
de medida que não comporta aproveitamento no procedimento pelo
simples fato de seu encerramento simultâneo. Não se vê, portanto,
utilidade na obtenção pela Comissão Parlamentar das informações e dos
dados requisitados para fins de investigação ou instrução
probatória já encerrada e que sequer poderão ser acessadas pelos seus
membros.
Ressalte-se, ainda, que se for de interesse da Procuradoria Geral da
República a obtenção desses dados, há via processual adequada para que
obtenha as mesmas informações.
Por fim, embora a criação das Comissões com objetivo específico não
impeça a apuração de fatos conexos ao principal, ou ainda, de outros
fatos, inicialmente desconhecidos, que surgiram durante a investigação, é
necessário, para isso, que haja um aditamento do objeto inicial da CPI o
que não restou caracterizado no presente caso (Direito Constitucional. 37
ed. São Paulo: Atlas, 2021, capítulo 10, item: 2.5.1)
Retratada, neste aspecto, a plausibilidade do direito líquido e certo
invocado.
Evidencia-se, ainda, risco de dano de difícil reparação caso não seja
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MS 38289 MC / DF
suspenso o ato impugnado, em razão da possível irreversibilidade da
quebra do sigilo telemático do impetrante.
Diante do exposto, presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora,
DEFIRO O PEDIDO LIMINAR PARA SUSPENDER AS
DETERMINAÇÕES CONSTANTES NA APROVAÇÃO, PELA
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO, DO REQUERIMENTO
1.587/2021.
Dê-se vista dos autos à Procuradoria-Geral da República para
oferecimento de parecer, no prazo de 15 (quinze) dias.
Publique-se.
Brasília, 19 de novembro de 2021.
Ministro ALEXANDRE DE MORAES
Relator
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