quinta-feira, 7 de abril de 2022

A GAIVOTA INTERROMPIDA

*** "É o seguinte, como atriz, o teatro só existe com o ator presente. É o bicho por excelência. A razão por excelência. Do outro. Você pode coadjuvar. Você pode explodir a cena. Você pode imaginar montagens espetaculares." "Mas tem a hora que o bicho ator tem que dar conta." Fernanda Montenegro ***
*** Marie Claire - Globo.com O teatro não foi um capricho de adolescente. Foi vocação" diz Fernanda Montenegro - Revista ***************************************************************** *** 5 Frases de Anton Tchecov *** cincofrases 163 mil inscritos Anton Pavlovitch Tchecov] (em russo: Анто́н Па́влович Че́хов, AFI [ɐnˈton ˈpavləvʲɪtɕ ˈtɕexəf]; Taganrog, 29 de janeiro de 1860 — Badenweiler, 15 de julho de 1904) foi um médico, dramaturgo e escritor russo, considerado um dos maiores contistas de todos os tempos. Em sua carreira como dramaturgo criou quatro clássicos e seus contos têm sidos aclamados por escritores e críticos. Tchecov foi médico durante a maior parte de sua carreira literária, e em uma de suas cartas ele escreve a respeito: "A medicina é a minha legítima esposa; a literatura é apenas minha amante." Tchecov renunciou do teatro e deixou de escrever obras teatrais após a péssima recepção de A Gaivota (em russo: "Чайка") em 1896, mas a obra foi reencenada e aclamada em 1898, interpretada pela companhia Teatro de Arte de Moscou de Constantin Stanislavski que interpretaria também Tio Vânia (Дядя Ваня), As Três Irmãs (Три сестры) e O Jardim das Cerejeiras (Вишнëвый сад). Estas quatro obras representam um desafio para os atores, bem como para o público, porque no lugar da atuação convencional Tchecov oferece um "teatro de humores" e uma "vida submersa no texto". Nem todos apreciaram o desafio: Liev Tolstói disse a Tchecov: "Sabe, eu não consigo tolerar Shakespeare, mas suas peças são ainda piores". No entanto, Tolstói admirava os contos de Tchecov. A princípio Tchecov escrevia simplesmente por razões financeiras, mas sua ambição artística cresceu, e ele fez inovações formais que influenciaram na evolução dos contos modernos. Sua originalidade consiste no uso da técnica de fluxo de consciência, mais tarde adotada por James Joyce e outros modernistas, além da rejeição do propósito moral presente na estrutura das obras tradicionais. Ele nunca fez nenhum pedido de desculpas pelas dificuldades impostas aos leitores, insistindo que o papel de um artista era o de fazer perguntas, não o de respondê-las. Música neste vídeo Saiba mais Ouça músicas sem anúncios com o YouTube Premium Música Verve Artista Benjamin Martins Álbum Verve https://www.youtube.com/watch?v=07ocnHkP7uM ******************************************************* *** Gilberto Gil - A Gaivota Gaivota menina De asas paradas Voando no sonho D'águas da lagoa Gaivota querida Voa numa boa Que o vento segura Voa numa boa Gaivota na ilha Sem noção da milha Ficou longe a terra Gaivota menina Gaivota querida Voa numa boa Que o alento segura Voa numa boa Gaivota, te amo e gaivotaria sempre em ti Gaivotar seria poder te eleger para mim Eu te quero, e se fosse o caso, quereria mais ainda Ser, eu mesmo, gaivota sobre mim Sobrevoar meus temores, meus amores E alcançar o alto, alto, o mais alto dos teus sonhos Dos teus sonhos de subir De subir aos ares Gaivota querida Gaivota menina Pousa perto de mim https://l-hit.com/pt/49655 ****************************** "O teatro não foi um capricho de adolescente. Foi vocação" diz Fernanda Montenegro Em entrevista publicada em março de 2003, a atriz falou sobre sua indicação ao Oscar, teatro e vaidade aos 71 anos 17 min de leitura WhatsApp Facebook Twitter Pinterest Linkedin Copiar Link Fernanda Cirenza 14 Abr 2016 - 16h18 Atualizado em 14 Abr 2016 - 16h18 Fernanda Montenego hoje tem 86 anos (Foto: Alexandre Sant’Anna) ***
*** Fernanda Montenego hoje tem 86 anos (Foto: Alexandre Sant’Anna) Para comemorar os 25 anos de Marie Claire, republicamos esta entrevista histórica. Thank you for watching A carioca Fernanda Montenegro impressiona pela simplicidade e simpatia. Esguia e de grandes e atentos olhoscastanhos, considera “bobo’’ o título de primeira-dama do teatro brasileiro. “É uma coisa que não me diz respeito”, conclui. Com “Central do Brasil’’, afirma ter seguido o protocolo do Oscar à risca: “Fui cumprir um papel e fiz tudo direitinho, todos os jantares, os cabelos, as bocas’’. Agora, está de volta ao palco com “Alta Sociedade’’, de Mauro Rasi, em cartaz no teatro Scala, no Rio de Janeiro. Católica que se agarra em Cristo, Fernanda, que na verdade é Arlette, casou virgem com Fernando Torres, seu companheiro há quase 50 anos. Mas acha a virgindade uma questão de geografia. Aqui, ela conta que nem só fama, sucesso e glória fazem o seu retrato. Maire Claire — “Central do Brasil” ainda está fresco na memória da gente. Além do filme, você fez a peça “Da Gaivota”, com direção da Daniela Thomas, e teve uma participação em “O Auto da Compadecida” (Guel Arraes). Não dá para ficar parada? Fernanda Montenegro — Não dá. O negócio é ser ativo. Há tempos o Mauro Rasi [autor e diretor de “Alta Sociedade’’] tinha me convidado para fazer uma peça. Ficou essa história de um dia trabalharmos juntos. Aí, pedi essa peça a ele para mim e para o Italo [o ator Italo Rossi], que também é um amigo de anos. Depois, apareceu a chance de inaugurarmos o teatro Scala. No mais, é um verão quente, e “Alta Sociedade” é uma comédia ácida MC — Você iniciou sua vida artística ainda menina. Na época, havia muito preconceito contra mulheres que faziam teatro. Qual foi a reação da sua família? FM — Cheguei ao teatro via rádio.Tinha uns 15 anos, e o rádio era o que a televisão é hoje. Fui procurar a rádio MEC, fiz um concurso e fiquei na casa por dez anos. Na rádio, conheci pessoas que também faziam teatro. Um belo dia, em dezembro de 1950, fui convidada para fazer um papel. Logo depois, veio a televisão. Venho de uma família modesta, mas muito sólida em seus princípios. Meu pai era um operário especializado; minha mãe, de prendas domésticas. Tiveram três filhas, sendo eu a mais velha. No início, eles ficaram assustados. Era uma anomalia uma família produzir uma jovem que queria entrar para um meio totalmente desconhecido, com horários de trabalho malucos, tudo ao contrá- rio do que manda a boa organização social. Enfim... A mentalidade da classe média daquela época. Mas, devagarinho, sem nenhuma atitude revolucionária surda, perceberam que eu falava sério. Eles me apoiaram porque viram que eu não era leviana, que a minha decisão não era gratuita, não era um capricho adolescente de disputa de poder com a família. Era vocação mesmo. MC — Seu pai teve vários problemas de saúde: paralisia infantil, surdez, paralisia total. Morreu aos 92 anos sem se queixar da vida. Isso contaminou você? FM — Ele foi um homem combativo e com um profundo amor à vida. Aliás, venho de uma família resistente. Somos sobreviventes resistentes a qualquer intempérie. Essa é a história das minhas origens, desses europeus que vieram enfrentar a vida no Brasil. MC — Essa foi a sua herança? FM — Acho que a minha família ainda tem isso. Nosso tônus de vida ainda é de recémchegados a uma terra. Eu sou a segunda geração no Brasil e, quando vejo em volta, acho que herdamos algo.Também meus filhos. Somos ativos. Mas não sei se isso é genético. MC — Fama, glória, sucesso, filhos legais. É assim a sua vida de artista? FM — A vida no teatro é muito dura. É claro que hoje em dia, com a televisão, essa visão de que a vida do artista é sempre uma maravilha se espraia. Parece que tudo é uma festa, que tudo é capa de revista, tudo é casa com piscina. Mas isso é uma visão falsa de uma pseudo-Hollywood, que nem a televisão é isso. Principalmente o teatro é um artesanato muito difícil, conquistado a cada dia porque todo dia você refaz o mesmo trabalho diante de uma platéia que se renova. MC — É como se fosse um trabalho operário? FM — É operário porque é artesanal. Você tem de fazer a sua parede todo dia, tijolo por tijolo. Isso não é literatice, é fato. O mundo da cultura industrializada, que é a televisão, é outra coisa. Lá você ensaia e tudo é fixado de uma maneira industrial. A qualquer momento, é possível repetir, passar o seu personagem aos pedaços. MC — Dá para conciliar o fato de ser reconhecida como a primeira-dama do teatro brasileiro e o seu jeito artesanal de fazer teatro? FM — Não existe isso. Eu não criei isso, nunca pedi isso e nunca cultuei isso. MC — O título incomoda? FM — Não é que incomoda. Acho isso bobo porque é uma coisa que não me diz respeito. Sei o que custa subir em um palco, realizar um trabalho. Há colegas meus tão bons ou melhores que eu que também estão na batalha da vida. MC — Você está em todas as mídias. Como é enfrentar meios tão diferentes? FM — Eu atuo na felicidade. Faço televisão porque gosto. O trabalho nas minhas novelas, boas ou más, tem muita alegria. Eu me relaciono bem com o elenco, entendo a mecâ- nica, executo e não fico elucubrando.Teatro é diferente, é uma opção de ação e de produção. Escolho os textos que quero fazer no palco. Bons ou maus, a escolha e a responsabilidade são minhas. Não sou contratada para fazer mais uma peça. O cinema é mais de amor mesmo. Ele faz parte da minha vida porque cresci vendo cinema. Meus pais iam ao cinema três vezes por semana. Era uma época em que não havia televisão, e o cinema de bairro era a grande diversão. Mas cinema não alimenta.Você faz um filme a cada cinco anos. Fiz poucos filmes, mas bons, filmes conhecidos, com prêmios internacionais. Trabalhei com diretores ótimos, elencos ótimos. Não estou aqui fazendo a boa moça. É verdade. MC — Você é a favor de sexo na TV? FM — Vivemos em uma época de aids, que obriga a gente a ver o sexo de uma forma clara. É salutar que se ensine na televisão como não pegar uma doença mortal. Sendo assim, é necessário falar de relações sexuais, homossexuais, heterossexuais, em coitos anais, orais, vaginais. Isso é saúde pública. MC — Mas a TV mudou muito nesses últimos anos. FM — A gente tem a televisão que o nosso povo quer ver. Tanto que tem audiência. Quando uma pessoa diz que fica constrangida com a violência, com os sexos, com o diabo, é conversa. Se ficasse realmente constrangida, mudaria de canal. MC — Conta a história de a Fernanda Montenegro ser Arlette Pinheiro Monteiro Torres? FM — Tive de inventar um nome porque eu redigia na rádio. Era redatora de programas literários. Aí inventei um nome, com certo humor, que lembrasse algo literário, de outra época. E foi esse o nome que pegou. Ninguém se chama Fernanda Montenegro. As pessoas se chamam Fernanda ou alguma coisa Montenegro. Mas Fernanda Montenegro só se for inventado. MC — É verdade que o Fernando Torres só soube de seu verdadeiro nome na hora do casamento? FM — Não, soube antes. Lá pelo terceiro ou quarto mês de namoro, disse a ele:“Olha, você está namorando uma mulher que não é esta mulher. Há uma outra mulher.Você está levando duas mulheres aqui. Pensa bem”. MC — Vocês tiveram filhos depois de dez anos de casamento... FM — Foi, depois apareceram os filhos em dois anos. Foram duas gestações muito complicadas, com quatro meses de hemorragia em cada uma. O Cláudio, que é de 1963, nasceu de parto normal com fórceps.Assim que ele nasceu, tirei um ovário e uma trompa. No início da gravidez, tive rubéola. A Nanda, de 65, foi cesariana. Tudo isso aconteceu em uma época bem complicada, um período difícil para viver e criar filhos MC — Vocês tiveram problemas com os militares? FM — Tivemos problemas com a censura, que nos arruinou economicamente. Muitos espetáculos que não entraram em cartaz, produ- ções que não vingaram. Foi uma fase longa de instabilidade altamente desesperada. MC — Como você conciliou a vida de mulher, atriz e mãe em um cenário político tão conturbado? FM — Ah, isso não sei dizer. A gente vai como pode, como o dia se apresenta. Há coisas que dependem de você e outras não. Mas a gente sobrevive. Não sei se eles [militares] sobrevivem. MC — Mas ser mãe... FM — É uma responsabilidade MC — Você é o tipo de mãe que reúne a família aos domingos? FM — Não, porque todos nós trabalhamos aos domingos. Então, não dá para fazer macarronada. Somos uma família que não tem essas datas muito compulsivamente e obrigatoriamente festejadas. Sempre liberei um pouco a casa de determinados compromissos, menos os aniversários.Acho que os aniversários são datas muito especiais. Mas dia de mãe, de pai, de avó, a gente não comemora. Mesmo no ano-bom, cada um vai para onde quer ir. Natal a gente ainda guarda um pouco, muito em memória de meus pais, que eram muito religiosos e exigiam mesmo que a gente ficasse em família. MC — Você tem dois netos. Você faz bem esse papel? FM — O Joaquim, filho da Fernanda, tem 1 ano e 4 meses, e o Davi, que é do Cláudio, tem 4 meses. Eles são muito bonitinhos. Sou uma avó calma. Acho que também fui uma mãe calma, sabe? Sou avó com festa no meu coração. Acho que o Joaquim olha para mim me gostando MC — A Fernanda Torres falou em um programa de TV que você gosta muito de dinheiro. É verdade? FM — Quem não gosta? Não gosto de dinheiro além daquele que ganho honestamente. Sempre vivi do meu trabalho. Sempre fui economicamente independente. Meu marido não é o meu INPS e nunca foi. MC — Você já foi o sustento da família? FM — Não, mas nunca deixei de colaborar com algo para o grupo familiar. E gosto de ser paga pelo meu trabalho. Nunca tirei nada em rifa, bingo, loteria. Nunca dei golpe em ninguém para ganhar dinheiro. MC — E o teatro é capaz de dar esse sustento? FM — Ao teatro eu devo, com o Fernando, a nossa sobrevivência. Com o teatro, educamos os nossos filhos e, se temos alguma coisa melhor, é porque fizemos televisão, cinema, publicidade, rádio. MC — Depois de três anos de “Central do Brasil’’, foi decepcionante não ter recebido o Oscar? FM — Nunca esperei chegar ao Oscar. Dentro da corrente principal do prêmio, desse prêmio-ícone, desse bezerro de ouro que é o Oscar, imagine! Quem é que sonha com isso em qualquer país de Terceiro Mundo? MC — Mas aconteceu. Foi ou não decepcionante? FM — Sim, aconteceu. E então eu fui lá cumprir um papel, mas sem nenhuma expectativa nem de ser indicada nem sequer de ganhar. Foi legal, foi uma experiência maravilhosa. Foi também muito estressante, houve momentos de grande exaustão, mas cumpri direitinho tudo o que me coube no latifúndio: todos os jantares, os longos, os cabelos, as bocas, os tapetes vermelhos, as luzes, as entrevistas no meu inglês macarrônico. Cumpri tudo direitinho, acho, como uma insuspeita executiva que você tem de ser e eu não sabia. Foi exaustivo, mas não me queixo. Tive essa honra, esse momento. MC — Você passaria por tudo isso de novo? FM — Não gostaria, acho que uma vez está bom. Mas me deixa dizer... Sou extremamente reconhecida a todas as circunstâncias que me levaram a isso. É uma experiência. Se você consegue passar por ela, ótimo. Mas é um outro mundo, outra realidade. A gente que sai dessa vida distraída... Lá não tem distração. É um mundo pragmático, onde as pessoas são profissionais e cada uma tem de cumprir as suas obrigações em tempo e com responsabilidade. Lá não cabe a improvisação. MC — A sua megaexposição com “Central do Brasil’’ ajudou ou atrapalhou a sua vida? FM — A exposição é inarrendável porque você entra em um túnel e tem de sair no buraco seguinte. Não saí para entrar no túnel. Fui dar um passeio e, de repente, me vi em um túnel e tinha de sair por algum buraco, tendo de caminhar até o final dele. E foi o que fiz. Acho que isso tudo faz parte do meu ofício. Uma coisa é ter 70 anos e já ter apresentado todo o instrumental de atriz. Estou numa fase conclusiva de vida e insisto nessa vida há 50 anos. Seria triste se eu fizesse cinema, teatro, televisão, rádio, publicidade e as pessoas não soubessem quem sou. Optei por uma vida pública, não por um convento. MC — Você pensa na morte? FM — Ué, com 70 anos já vivi mais do que eu possa viver daqui para a frente. Penso na morte, mas não de uma maneira mórbida, mas penso como toda pessoa de 70 anos deve pensar, senão é uma alienada. Quando eu tinha 3 anos, perdi um irmão. Todos nós temos perdas pela vida. Então, são lembran- ças... Parentes, primos, amigos que se vão ou porque são velhos ou porque ficaram doentes. A morte é uma coisa presente, todo dia é um dia a menos. Há dias em que ela se apresenta para mim como irmã amorosa e outros, como uma madrasta diabólica. MC — O Fernando Torres passou por um problema de depressão por oito anos. Como ele está? FM — Ele está bem. Teve uma medicação errada por oito anos, sofreu uma intoxica- ção por causa dessa medicação e, por caminhos tortos, conseguiu sobreviver. MC — Como assim? FM — Se não tivesse tido a intoxicação, talvez estivesse morto. Mas, como teve, foi operado. Uma junta médica indicou outro médico e, em dois meses, ele estava bom. MC — Ele foi operado do quê? FM — Ele teve um derrame biliar por conta de um erro de anos de uma medicação errada para depressão. Isso foi se estendendo e se tornando agudo. E quanto mais agudo ficava, mais esse remédio vinha. Ele teve a vesícula retirada e ficou com uma pancreatite crônica de dimensão pequena. Mas o grande encontro foi de um médico que chegou para ele e disse: “Vamos parar tudo isso, vou te dar outra medicação’’. MC — Como foi viver com esse drama familiar? FM — Não sei se essa depressão foi causada por uma medicação que não foi contrabalançada. Eu não sei te dizer. São desses momentos da vida que você não explica como caiu naquele funil. A questão é você poder lutar por mais dez minutos. Ele foi um homem que passou a vida inteira batalhando, e eu não sabia o que era assinar um cheque. Tive de aprender a fazer coisas, fomos caminhando. Diante da crise dele, determinadas coisas tiveram de ser divididas, mas ele nunca deixou de estar presente. MC — E o seu primeiro encontro com Ferrnando? FM — Foi no teatro. A gente se via sempre e um belo dia começamos a namorar. O casamento aconteceu em 1953. MC — Você é mulher de um homem só. O Fernando, homem de uma mulher só. É uma relação de quase 50 anos. Você considera o seu casamento um exemplo? FM — Não somos exemplos de nada. Até onde se possa concluir, a gente fechou um par para a vida. Não é fácil, são quase 50 anos juntos.Tivemos crises de todas as ordens, mas estabelecemos um princípio de fidelidade enquanto der. MC — Como é isso? FM — É ser fiel um ao outro enquanto der. A hora que não deu, a hora que não dá, a hora que não der... Daí, não vamos blefar, cada um toma o seu rumo. MC — Mas tem dado? FM — Deu. MC — Você é uma mulher que não tem uma beleza clássica. Esse fato é um benefício ou um prejuízo no meio artístico? FM — Nasci com a cara que Deus me deu e isso nem me atrapalhou nem me ajudou. Sabe por quê? Porque a gente trabalha no imaginário. Meu primeiro papel com madame Morineau era o de uma menina muito feia, que era a filha dela na peça. Elas recebiam em casa uma sobrinha deslumbrante, que acabava destruindo o casamento da prima, tirando o marido da tia, fazendo misérias.Todo mundo achava que a prima tinha de ser uma mulher deslumbrante para poder convencer o público. Não queria fazer a feia, queria fazer a deslumbrante e fiz. Ninguém foi embora do teatro ou disse que eu não convencia. Essa foi a primeira vez que tive a idéia de que a imagem, de que a fantasia é muito mais criativa do que a realidade. Se eu fosse bonita e fizesse aquele papel, seria só uma mulher bonita fazendo aquele papel. Nunca me achei bonita a ponto de fazer aquele papel, mas quis correr o risco na minha afirmação de mulher, de possibilidade de beleza. Essa foi a primeira lição que tive sobre a fantasia ser o reino do artista. MC — O que você faz para cuidar da aparência? FM — Faço medicina ortomolecular há oito anos, caminho quando posso e me alimento bem sem me empanturrar como na juventude. Tenho, acho, uma tiróide disparada porque sempre me alimentei bem e nunca fui gorda. Quando tinha uns 17 anos, era muito magra, e era uma época de mulheres peitudas, bundudas. Eu só tinha cabelo e olho e me achava fora do tom. Fiz um tratamento, peguei dez quilos e são esses que carrego pela vida afora.A minha grande doença é enxaqueca, o que deve explicar tudo. MC — O que você faz para driblar a enxaqueca? FM — Tomo tudo, tudo. Tenho enxaqueca desde os meus 15 anos. Meu pai tinha, minha mãe tinha, é uma família de “enxaquecosos’’. Já representei de olho fechado, chorando de dor e de não agüentar a luz. MC — Você é católica. De onde vem esse interesse pela religião? FM — Acho interessante o catolicismo, apesar de ler sobre religiões em geral. Tenho muita curiosidade sobre o passado do homem, sobre as origens da humanidade. Mas sou católica. Não sei quem disse que o catolicismo não é para quem quer, é para quem pode. No entanto, há uma postura da Igreja Católica com a qual eu não concordo. MC — Qual é? FM — A visão de que a mulher ainda é um pecado mortal.A visão de que a grande mulher é a mulher na maternidade, subtraindo a condição de fêmea, de Afrodite. Na sua condição vaginal, na sua erotização, a mulher ainda é um demônio, um perigo, um buraco escuro. Na hora em que você se transforma em mãe, aí é a glorificação. A Grande Maria só funciona como mãe.Todo o lado de sua genitália, de sua criatura fêmea só é trazida à luz pela maternidade. Isso é a primeira coisa que me incomoda, a condição nefanda da mulher fêmea que só é resgatada quando ela é mãe. Isso é um pouco de todas as religiões. É uma visão totalmente patriarcal da Igreja Católica. MC — Você reza, vai à igreja? FM — Rezo e no desespero me agarro mesmo em Jesus Cristo. MC — Então o seu papel em “O Auto da Compadecida” era verdadeiro? FM — Aquilo era verdade. Jesus Cristo, Maria Santíssima, Nossa Senhora, Divino Espírito Santo, São Judas Tadeu, vai dizendo... MC — E eles te escutam? FM — Não posso me queixar. MC — Você casou virgem? FM — No meu tempo, uma grande maioria de mulheres casava virgem, mas não todas. Sou uma das que casaram virgens. Hoje em dia tem muita gente que casa virgem, mas tem vergonha de dizer. Isso virou uma nó- doa, um pecado, não é contemporâneo. Quero saber onde é que está escrito que você tem de casar desvirginada ou virginada. Há culturas em que as mulheres têm de casar desvirginadas. Acho esse negócio de virgindade uma questão de latitude. MC — É por causa dessa sua consciência que você vive dizendo que foi profissional ao fazer a cena de masturbação com a sua filha, Fernanda Torres, na peça “The Flash and Crash Days’’, de Gerald Thomas? FM — Justamente. Essa é apenas uma das tantas condições da mulher. Não há nenhum constrangimento naquilo porque existe uma genitália, existe um prazer, existem “n’’ modalidades de prazer. É uma cena de teatro. Por que posso coçar o meu ouvido e não ser masturbação? Mas mexer na genitália é masturbação. Entende como são as coisas? Em público, até posso dar uma coçadinha na minha cabeça, mas não posso coçar a minha genitália porque é feio. A não ser que eu queira ser provocativa. Aí, vou lá, mexo e todo mundo fala: “Ih, ela mexeu lá, é uma libertária mesmo”. MC — No início da década de 90, a cultura sofreu um bocado. A situação melhorou no governo de Fernando Henrique Cardoso? FM — Depois do Collor, qualquer coisa já está melhor. O Collor foi o fundo do buraco. Um dirigente que desmonta a cultura de um país sem colocar nada no lugar não pode permanecer no poder. Hoje, a cultura está sendo assistida empresarialmente por essas leis de incentivo, que reconhecem a empresa cultural, mas não os artistas. O artista tem obrigatoriamente de virar empresa para poder ter algum diálogo com o governo. Isso cria um mundo que, para a minha cabeça, é uma coisa exaustiva, mas necessária.Ao mesmo tempo, fico pensando qual é o espaço para o experimento, para o iniciante... MC — O que você acha de uma mulher à frente da Prefeitura de São Paulo? FM — Acho ótimo. Desejo a Marta Suplicy todo o sucesso porque ela é emblemática neste país, até mesmo por causa da condi- ção social de alta burguesia da qual ela vem. Ela representa uma série de contradições. Se der conta disso, pode ser presidente da República. Isso é uma hora especialíssima dentro deste país e, sem dúvida, algo em que a gente deve apostar. MC — Quais são seus planos? FM — Viajar por 15 cidades brasileiras com “Alta Sociedade’’. MC — E a sua representação da estilista francesa Coco Chanel, que está sendo falada há um bom tempo? FM — Vai acontecer no ano que vem. A produção será do José Maurício Machiline. A peça foi escrita por Maria Adelaide Amaral e a direção deverá ser do Ney Matogrosso. https://revistamarieclaire.globo.com/Noticias/noticia/2016/04/o-teatro-nao-foi-um-capricho-de-adolescente-foi-vocacao-diz-fernanda-montenegro.html ****************************************************************
*** São Paulo, sexta, 31 de julho de 1998 FOLHA DE S.PAULO ilustrada Texto Anterior | Próximo Texto | Índice NO RIO Fernanda Montenegro, a gaivota, estréia no Leblon da Sucursal do Rio Fernanda Montenegro não é diva. Afirma que, ao contrário de Arkádina -sua personagem na peça "Da Gaivota", que inicia temporada hoje no Rio- não tem "o vício do divinismo". Fernanda é mais. É a própria gaivota. "Eu sou uma gaivota no melhor sentido da palavra. Não tenho pudor de dizer que nunca tive vergonha do que um dia intuí como vocação teatral", diz a atriz. "Determinadas coisas não cabem a uma diva. Não posso ser diva. Tenho verdadeiro horror do preconceito cênico. Quero me exercitar diante de qualquer proposta. No exercício de minha vocação quero me permitir tudo." Vocação. Essa é a palavra que Fernanda considera essencial na peça "A Gaivota", do dramaturgo russo Anton Tchecov -que foi traduzida, adaptada e dirigida por Daniela Thomas e recebeu o nome de "Da Gaivota". "Embora seja uma peça que fale de teatro, atores e escritores, o tema central é o rigor da vocação. Cada pessoa da platéia, tenha o ofício que tiver, levará um chamamento sobre a sua vocação criativa", diz Fernanda Montenegro. "A pergunta é: Você está sendo fiel à sua escolha de vida?" Para responder, Fernanda Torres -que além de interpretar Nina, a jovem atriz que deseja a fama, também é, com a mãe, produtora da peça- formou o que considera o "grupo de teatro impossível". "Impossível, porque poderia parecer impraticável misturar pessoas de tendências e experiências tão diversas como fizemos. Mas não poderia ser diferente, já que o próprio texto de Tchecov coloca no mesmo saco, sem preconceito, todas as tendências do teatro", diz Fernanda Torres. Também não poderia ser diferente, porque a condição de Daniela Thomas, que está estreando como diretora, para realizar a peça era justamente tornar possível o que poderia parecer impossível. "Para representar os seis personagens da adaptação que fiz (na versão original são 11), só poderia pensar em atores que pudessem representar a força extraordinária deles e romper qualquer limite de tradição", disse Thomas. Além de Fernanda mãe e Fernanda filha, estarão no palco Celso Frateschi, Nelson Dantas, Matheus Nachtergaele e o diretor/ator Antônio Abujamra. Para Fernanda Montenegro, "Da Gaivota" é "o resultado do desejo de seis atores e uma diretora de discutir que rumo dar, o que fazer, o que zerar no fim de século, onde todas as linguagens teatrais estão praticamente esgotadas. Como Tchecov fez há cem anos". Em "Da Gaivota", Arkádina é uma uma atriz de renome que vive com Trigorin (Frateschi), um escritor de sucesso. Durante um final de semana em sua fazenda, seu filho, Trepliov (Nachtergaele), aspirante a dramaturgo, ensaia uma peça interpretada pela jovem atriz Nina, por quem ele é apaixonado. O administrador da fazenda (Abujamra) é um nostálgico que relembra o teatro do passado. Sorin (Dantas), sensível irmão de Arkádina, percebe a solidão e o sofrimento de Trepliov diante das críticas e do desprezo de sua mãe. Peça: "Da Gaivota" Direção: Daniela Thomas Com: Fernanda Montenegro, Fernanda Torres, Antônio Abujamra, Matheus Nachtergaele, Nelson Dantas e Celso Frateschi Onde: Teatro Leblon - sala Marília Pêra (rua Conde de Bernadote, 26, Leblon, tel. 021/294-0347) Quando: de hoje a 30 de agosto. Quinta a sábado, às 21h; domingo, às 19h Quanto: R$ 20 (quinta), R$ 25 (sexta), R$ 30 (domingo) e R$ 40 (sábado)
*** Cris Freitas - Medium O dia em que me ajoelhei aos pés de Fernanda Montenegro e de outros nomes consagrados do teatro brasileiro | by Cris Freitas | Medium V *** São Paulo, sexta, 10 de julho de 1998 FOLHA DE S.PAULO ilutstrada Texto Anterior | Próximo Texto | Índice TEATRO Peça dirigida por Daniela Thomas faz sua pré-estréia hoje em Curitiba e entra em cartaz em SP em setembro "Gaivota" opõe no palco gerações da arte NELSON DE SÁ da Reportagem Local Antônio Abujamra, que faz um pequeno papel em "Da Gaivota", aceitou porque, afinal de contas, é Tchecov. Grandes atores, atores iniciantes ou divas sonham interpretar os personagens, dizer as falas do russo Anton Tchecov. Não é só pelo centenário do lendário Teatro de Arte de Moscou, que encenou as suas maiores peças, que o dramaturgo vem reunindo elencos grandiosos. Em "Da Gaivota" estão Fernanda Montenegro, prêmio de melhor atriz no Festival de Berlim, Fernanda Torres, prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes, Celso Frateschi, cria do Teatro de Arena, Nelson Dantas, cria do cinema novo, Matheus Nachtergaele, protagonista de "O Livro de Jó", e o citado Abujamra. A peça faz sua pré-estréia hoje, às 21h, em Curitiba, no teatro Guaíra. Estréia em São Paulo em setembro. Quem juntou tamanho elenco foi Daniela Thomas, que estréia na direção depois de trabalhos de excelência com Gerald Thomas e Bete Coelho, como cenógrafa, co-criadora e autora. "A coisa dessa peça é que ela é extremamente democrática", diz, "cada um tem seu monólogo". Seu objetivo, desde o início, foi encontrar um elenco à altura. "O que eu fiz, de direção, nessa peça?", pergunta. "Escolher um elenco em que a bola não caísse." Fez mais. No último fim-de-semana, um ensaio aberto da encenação em Santo André (SP) recebeu largos elogios de José Celso Martinez Corrêa, diretor de um Tchecov histórico no Brasil, "As Três Irmãs". Para ele, é possível ver a mão de Daniela Thomas em cada fala da peça, trabalhada ao menor detalhe. A diretora confirma. "A peteca não cai. Ela sai da mão de um ator que está defendendo muito bem para outro. Isso a gente conseguiu." "Da Gaivota" é a primeira produção conjunta de Fernanda Montenegro e Fernanda Torres, mãe e filha, mas a diretora e as atrizes querem desvincular o jogo de mãe e filha do espetáculo. As duas já passaram por situação igual em "The Flash and Crash Days", de 91, e não desejam insistir no tema. "É o gancho da mídia para a peça", diz Daniela Thomas. "Mas é realmente irrelevante no processo de trabalho. O que tem ali, que a gente brincou, são os 'geriactors' e os 'pediactors'." Os atores mais velhos, como Montenegro e Dantas, e os mais novos, como Torres e Nachtergaele. O que a montagem fez foi reunir atores de escolas e gerações diversas, do brechtiano Celso Frateschi à realista Fernanda Montenegro. A tradução/adaptação é da própria diretora. "Eu peguei muita coisa", diz ela. "Fiz um círculo em volta, maluco, com umas cinco traduções inglesas, duas francesas, algumas portuguesas de Portugal, espanholas. E saí brincando, escolhendo o que eu achei o som mais legal." Cortou vários personagens, como Macha, para concentrar-se no conflito das atrizes (a diva Arkádina e a jovem Nina) e dos escritores (o talentoso Trigorin e o jovem Treplev, filho de Arkádina), daí o título "Da Gaivota" e não o original "A Gaivota". "A peça é sobre duas vertentes do nascimento do artista", diz. "É da Nina e do Treplev. A Nina faz o ritual de passagem. Ela fala que, para conseguir a fama, suportaria miséria, repúdio. Depois descobre que o importante é perseverar. Transcende o drama pessoal e entra no universo do artista." Treplev é diferente. "É um cara que não consegue sair de seu universo. Ele fala no final: "Continuo no caos dos delírios e das imagens, sem saber por quê', que eu acho que é a sina do artista moderno." Quanto a Arkádina e Trigorin, são os pais do artista moderno. "Eles estão ali para nos dar uma noção do que os artistas que nasceram neste século tiveram que enfrentar, contra o que tiveram que lutar." https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq10079829.htm ****************************************************************** *** Além da Bola com Dadá: Ele parava no ar, corria de ganso na infância e nunca quis ser bonito 11.991 visualizações2 de jul. de 2019 ESPN Brasil 3,83 mi de inscritos Eduardo de Meneses entrevista Dadá Maravilha no Além da Bola. Confira! https://www.youtube.com/watch?v=WtW-xgAJyk4 *************************************************** *** Especial Fernanda Montenegro 90 anos | 24/12/19 https://www.youtube.com/watch?v=Gzdt8olBl7Y *** *** CULTURA FERNANDA MONTENEGRO - PARTE II | PERSONA EM FOCO O Persona exibe a segunda parte da homenagem à atriz Fernanda Montenegro. Na edição, o diretor teatral Celso Nunes e o ator e também diretor teatral Sérgio Mamberti, ex-companheiros de trabalho de Fernanda, entrevistam a artista, que conta sobre sua infância e sua carreira repleta de sucessos e prêmios. Com apresentação de Atílio Bari, o programa vai ao ar às 21h30, na TV Cultura e aqui no YouTube. Inscreva-se no canal e clique no sininho para ser notificado das novidades! 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