Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
sexta-feira, 12 de março de 2021
Com Helio Fernandes, os jornalistas aprendiam a ser combativos e não ter medo da verdade
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Tribuna' e Hélio Fernandes | Acervo
acervo.oglobo.globo.com
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Publicado em 10 de março de 2021 por Tribuna da Internet
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Carlos Newton
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Helio na oficina da Tribuna, destruída no atentado a bomba
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Helio Fernandes preenche sozinho um enorme capítulo da história do jornalismo brasileiro. Nenhum outro profissional de imprensa deu tantas entrevistas a historiadores, cientistas políticos, cineastas, pesquisadores e jornalistas. Relatava os fatos de memória, jamais consultava nada, sua inteligência era impressionante.
Ficamos amigos em 1967, quando passei a integrar o Clube dos Repórteres Políticos, presidido por Carlos Chagas e que se reunia no restaurante Casa da Suíça, que nos cedia uma sala especial para que pudéssemos entrevistar reservadamente os maiores políticos do país.
COM OS MITOS DO JORNALISMO – Eu tinha apenas 22 anos, era o mais jovem e ficava siderado ao assistir como se comportavam os maiores mitos da jornalismo de Política, como o próprio Helio Fernandes, meu mestre Antonio Vianna, editor de O Globo que me transformou em repórter, Carlos Castelo Branco, Villas-Bôas Corrêa, Sebastião Nery, os irmãos Tarcísio e Haroldo Holanda, Oyama Telles, Berilo Dantas, Jair Rebelo Horta, Murilo Melo Filho e outros destaques do jornalismo político, um verdadeiro festival, e naquela época nenhuma mulher escrevia sobre política, eram outros tempos bem machistas.
Helio impressionava pela presença marcante, não mostrava a menor timidez, era o oposto de Castelinho, que tinha problemas de dicção e falava sibilante como o Marechal Dutra. A diferença de Helio para os outros membros do Clube é que ele era o único a ser dono de um jornal, a Tribuna da Imprensa, que comprara de Nascimento Brito em 1962. Os outros eram todos empregados de jornais e revistas.
AI-5 E CENSURA – Em 13 de dezembro de 1968, veio o AI-5, o governo se assumiu como ditadura e impôs a censura à imprensa. No primeiro dia, através de um grupo de oficiais fardados; depois, ficava apenas um militar na redação, lendo os originais e censurando, mas à paisana, sempre de terno. O constrangimento deles era evidente.
Nos jornais que apoiavam os militares, como o Globo, a censura era branda, Mas na Tribuna da Imprensa, no Correio da Manhã e no Estadão, a repressão foi arrasadora.
Helio não se curvava, resistia a tudo e mandava a Tribuna da Imprensa circular com espaços em branco, mostrando as matérias que tinham sido censuradas, enquanto o Estadão publicava poemas e receitas de comidas em lugar dos textos suprimidos. Já O Pasquim nasceu em 1969 e foi censurado desde o início.
A censura ao Estadão durou ate 1975, quando os militares aliviaram. Mas continuou a perseguição à Tribuna da Imprensa, que ficou dez anos sob censura prévia, até 15 de dezembro de 1978, quando os censores abandonaram a redação.
O JORNAL NÃO FECHAVA – Durante esses anos de chumbo, os anunciantes sumiram, com medo dos militares. Helio então reduziu o número de páginas e de exemplares, ficou segurando o tranco. Depois, teve de demitir, enxugar ao máximo a empresa.
O governo militar fez o possível e o impossível para fechar o jornal, inclusive colocou três auditores da Receita Federal de plantão na contabilidade, para fiscalizar a entrada e saída de dinheiro e sufocar o jornal, mas não conseguiram.
Foi nesse época sinistra que entrei para a Tribuna. Helio não ia mais ao jornal, que era dirigido pelo filho Helinho. Lá dentro descobri o segredo. O governo não conseguia fechar o jornal, porque Helio tinha amigos fiéis, que pagavam todas as despesas, sem que os anúncios de suas empresas fossem publicados.
MAGALHÃES PINTO, O SALVADOR – O principal patrocinador da Tribuna da Imprensa era o ex-governador e ex-ministro Magalhães Pinto, dono do Banco Nacional, que jamais aceitou a perseguição movida contra o jornalista. O banco enviava ordens de publicação de anúncios, o jornal emitia a nota fiscal, pagava os impostos e seguia em frente.
Para mim, trabalhar com Helio Fernandes era uma festa. No andar da redação tinha uma restaurante onde a gente podia relaxar e tomar uma cervejinha. Éramos totalmente livres. Ele me deu uma coluna na página 3, com autonomia total. Às vezes Helio defendia uma tese na primeira página e eu discordava na página 3.
O BLOG DA TRIBUNA – Entrei e saí do jornal diversas vezes, seu filho Helinho era um de meus melhores amigos. Quando o irmão Rodolfo chegou na redação para trabalhar, era quase um adolescente. Ficamos amigos na hora. Quando já estava doente, em 2010, e dirigia O Globo, Rodolfo me pediu que tomasse conta do Helio, que estava brigado com Helinho. Prometi que faria isso.
Rodolfo morreu em 2011, e eu fiz o que pude. Até as fitas da máquina de escrever era eu quem comprava e trocava. Mas cuidar do Helio era missão impossível.
Quando a Tribuna fechou, no final de 2008, em 2009 criei o blog da Tribuna da Imprensa para que Helio não parasse de escrever. Depois de algum tempo, ele arranjou um procurador que me mandou um e-mail dizendo como eu deveria editar o blog, advertindo que não queria mais matérias de outros veículos, um maluco completo.
FIM DA AMIZADE – Por causa do tal procurador, Helio Fernandes se afastou de mim e somente o reencontrei no velório de sua mulher, dona Rosinha, uma pessoa muito querida na sociedade do Rio.
A vida é assim, vai nos ceifando, um a um. Daquele pessoal do Clube dos Repórteres Políticos, agora somos apenas três – Sebastião Nery, Haroldo Holanda e eu. Guardo preciosas lições de cada um dos que já se foram, especialmente do Antonio Vianna, editor do Globo que na véspera do AI-5 enfrentou Roberto Marinho e o fez recuar para seu gabinete, um lance inesquecível.
Com Helio Fernandes aprendi a ser combativo e não ter medo da verdade. É o suficiente.
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quinta-feira, 11 de março de 2021
Malu Gaspar - Juízes não podem tudo
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- O Globo
O Fla-Flu em que se transformou a política brasileira viveu nos últimos dias um capítulo icônico, que começou com o movimento de Edson Fachin para salvar Sergio Moro e o legado da Lava-Jato e culminou no discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em São Bernardo do Campo. Enquanto moristas e bolsonaristas se revoltavam — não necessariamente pelo mesmo motivo —, partidários de Lula comemoravam o que diziam ser o restabelecimento da justiça e da verdade no Brasil.
Os últimos lances no STF deixam claro, porém, que nada disso eliminou um dos fatores que mais contribuíram para a crise em que vivemos e continua sem ser encarado de frente: no Brasil, juízes agem como se pudessem tudo. E, ao fazê-lo, ameaçam um pilar básico da democracia: o de que ninguém está acima da lei.
A esta altura do campeonato, só um alienígena consideraria não haver elementos para discutir se Moro agiu ou não com parcialidade nos processos contra o ex-presidente. Os diálogos divulgados pela Vaza-Jato mostram que ele de fato “pulou o balcão”, como diz Gilmar Mendes, dando a procuradores instruções que não lhe competiam e tomando decisões que abriram flanco a contestações.
Entre esses atos, estão a condução coercitiva de Lula; a divulgação dos diálogos entre Lula e Dilma captados por interceptação telefônica já depois do horário permitido por lei e a liberação para o público da delação de Antonio Palocci sobre o caixa 2 do PT, dias antes do primeiro turno de 2018. Sem contar Moro ter assumido a pasta da Justiça no governo de Jair Bolsonaro, dizendo que o fazia para preservar o legado da operação.
Em que pese não ter sido tomada uma decisão final sobre o ex-juiz, o desenrolar dos acontecimentos colocou Lula de volta no jogo eleitoral — o que, na avaliação dos mais entusiasmados, seria sinal da volta ao “estado de direito” e garantia de que não haverá mais interferências indevidas do Judiciário no cenário político.
Alguns fatos, porém, não deveriam escapar aos autointitulados garantistas. Em seu arrazoado, o ministro Gilmar Mendes criticou duramente a divulgação dos áudios interceptados em escritórios de advocacia, mas logo adiante utilizou-se de diálogos também captados ilegalmente por um hacker para sustentar seu argumento.
Afirmou, ainda, que Moro agiu como “juiz acusador”, rompendo as barreiras legais para sua atuação. Nem parecia o mesmo ministro que defende enfaticamente o inquérito das fake news, aberto depois de uma reportagem com denúncias contra Dias Toffoli.
Mesmo sendo vítima do suposto crime, Toffoli determinou a abertura do inquérito e, em vez de mandar sortear um relator, indicou Moraes para conduzi-lo e relatá-lo — contra a posição da Procuradoria-Geral da República e sob críticas de juristas. A investigação depois mudou de rumo e chegou a um esquema de disseminação de fake news por bolsonaristas — o que, para alguns, desculparia o desvio original. O próprio Gilmar já se referiu ao inquérito como uma “contribuição para o mundo civilizado”.
Na sessão desta semana, ao listar os abusos de Moro, Gilmar salientou que vários pedidos de suspeição contra o ex-juiz foram arquivados sem análise. Mas não mencionou que todas as arguições de impedimento e suspeição de magistrados do próprio STF foram arquivadas.
Algumas, inclusive, contra o próprio Gilmar, que, apesar de ter sido padrinho de casamento do filho de um empresário de ônibus do Rio preso por corrupção, não viu nada demais em conceder um habeas corpus para soltá-lo. “Ser padrinho de casamento impede alguém de julgar um caso?”, disse, na ocasião.
A seletividade nas decisões ocorre também no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em julho passado, o ministro João Otávio Noronha concedeu habeas corpus a Fabrício Queiroz e sua esposa, Márcia Aguiar. Noronha, com quem Bolsonaro diz ter tido “um amor à primeira vista”, havia negado vários pedidos de habeas corpus de presos que diziam fazer parte do grupo de risco para a Covid-19. Mas acatou o pedido de Queiroz com base nesse mesmo argumento.
Os exemplos estão à vista de todos. Mesmo assim, há quem agora julgue que estamos mais próximos do restabelecimento das garantias individuais e do devido processo legal, porque Moro foi punido e Lula voltou a ser elegível.
Há alguns meses, ouvi de um ativo combatente da Lava-Jato uma frase que resume o espírito: “Estado direito é aquele que pune meu inimigo. Quando pune meu amigo, é estado policialesco”.
Enquanto as decisões judiciais no Brasil forem encaradas dessa forma, sempre haverá juízes que, a pretexto de fazer o bem, extravasam limites de sua atuação. Pode até ser bom para os amigos, mas é muito ruim para a democracia.
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https://gilvanmelo.blogspot.com/
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quinta-feira, 11 de março de 2021
Cora Rónai – O feitiço do tempo
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Túnel do tempo
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Essa foi feita na Cobal, há milênios, num sábado de manhã. Tom Jobim ainda era vivo e estava na mesa com a gente. E mais Lucinha Veríssimo, Chico e Eliana, José Lewgoy, Jaguar e Hugo Carvana (se não me engano).
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http://cora.blogspot.com/2003/12/
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- O Globo
Tudo é permitido a quem tem poder, a quem tem os advogados certos, os votos necessários, os desembargadores e os juízes da causa
11/03/2021 - 04:30
Não sei vocês, mas eu tinha mais de 30 anos quando consegui comprar o meu primeiro apartamento, e ainda me lembro da sensação de pânico de escrever um cheque tão grande sem errar, e de me comprometer com uma dívida tão séria. Passar a escritura foi um momento marcante na minha vida. Levei uma caneta tinteiro muito bonita para assinar a papelada, e saí do cartório me sentindo adulta e importante.
Quem já comprou um imóvel com certo sacrifício se lembra desses detalhes, da escritura sendo lida pelo escrivão, do frio na barriga, da felicidade da casa própria.
Não sei por quê estou falando nisso.
Mentira: sei sim.
Como qualquer brasileira que acompanha o noticiário, estou desde a semana passada com uma mansão de R$ 6 milhões atravessada na garganta. Mas quando digo que não sei por que estou falando nisso, o que quero dizer é que não adianta falar disso. No Brasil é normal que os filhos dos presidentes sejam extremamente talentosos, no Brasil é normal enriquecer no serviço público e, no Brasil, é mais normal ainda o eleitor passar pano para a sua família política de estimação.
Rouba mas faz; isso é coisa do filho; desde 1500 se rouba e só agora estão reclamando; rouba mas não é o PT; rouba mas é o PT; os tucanos o Centrão os neoliberais a sua mãe.
Eu não quero mais falar disso.
Eu não quero mais ter a minha pauta sequestrada pelos mesmos assuntos, ano após ano, entra governo sai governo. A gente grita grita grita escreve escreve escreve e nada acontece nunca, nada se resolve, nada muda.
Mentira: muda sim.
Muda para pior.
Tudo é permitido a quem tem poder, a quem tem os advogados certos, os votos necessários, os desembargadores e os juízes da causa. Dinheiro é secundário, porque, para quem tem poder, dinheiro não é nada, apenas mais um item na conta dos amigos. Vale para todos os lados, porque há bons amigos em todo o arco da sociedade.
Os mais velhos devem se lembrar dessa expressão, “arco da sociedade”. Era muito comum no século passado, mais ou menos como “estado democrático de direito” é hoje. Não se ouvia um Discurso Sério, feito por Pessoa Ilibada, que não tivesse um “arco da sociedade” embutido.
Eu não quero mais falar dessas coisas, mas há sempre um escândalo mais recente para encobrir o último escândalo, e aos poucos os escândalos passados vão caindo no esquecimento. Alguém tinha que fazer um placar gigantesco em praça pública listando os escândalos todos, um por um, rolando em neon, para que ninguém se esquecesse nunca.
E aí nós cronistas de variedades poderíamos voltar a escrever sobre livros, gatos e capivaras (sim, há uma família nova na Lagoa).
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Ainda é cedo para prever o que vai acontecer em 2022, sobretudo num país sem vacinas e sem vergonha como o nosso, mas que desgraça não conseguir virar a página e ficar rodando em falso desse jeito, remoendo um passado ancorado em si mesmo, sem visão para o futuro.
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