domingo, 5 de junho de 2022

O morcego

"Liberalismo, como se entende aqui, é coisa de país rico." *** *** Meia-noite. Ao meu quarto me recolho. Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede: Na bruta ardência orgânica da sede, Morde-me a goela igneo e escaldante molho. "Vou mandar levantar outra parede..." — Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho, Circularmente sobre a minha rede! Pego de um pau. Esforços faço. Chego A tocá-lo. Minh'alma se concentra. Que ventre produziu tão feio parto?! A Consciência Humana é este morcego! Por mais que a gente faça, à noite, ele entra Imperceptivelmente em nosso quarto! *** Augusto dos Anjos (1884 — 1914) foi um poeta e professor brasileiro extremamente original, que deixou um grande legado na nossa literatura. Carolina Marcello Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes https://www.culturagenial.com/poemas-augusto-dos-anjos/ ****************************************************************
Párias em seu próprio país O Estado de S. Paulo Desmonte de conquistas civilizatórias precede a ‘câmara de gás’ da PRF; há quem ganhe eleições defendendo que certos brasileiros não devem ter direitos A cena de Genivaldo de Jesus Santos, de 38 anos, trancado no porta-malas de uma viatura da Polícia Rodoviária Federal (PRF) tomada por gás lacrimogêneo, correu o mundo. Além da fumaça que saía do veículo, é possível ver a perna de Genivaldo para fora do carro, enquanto dois agentes da PRF diligentemente impedem que a porta se abra. Lá dentro, asfixiado, o homem que minutos antes havia sido abordado por andar de moto sem capacete, agonizava até a morte. A abordagem policial, em Sergipe, desafia os adjetivos para retratar tamanha barbárie. À medida que as imagens da “câmara de gás” em que se converteu a viatura da PRF passaram a circular, uma onda de perplexidade e indignação espalhou-se pelo País. Enquanto a sociedade brasileira, atônita, acompanhava a reação pusilânime e cínica das autoridades, veio do Ministério Público Federal em Goiás (MPF-GO) a notícia de que a Direção-Geral da PRF, no início de maio, havia acabado com as comissões de direitos humanos no âmbito da corporação. Os procuradores recomendaram, então, o imediato restabelecimento das comissões, bem como a retomada da oferta da disciplina de direitos humanos nos cursos de formação e reciclagem de policiais rodoviários federais. A iniciativa dos procuradores é louvável. Das forças policiais, espera-se efetividade técnica e operacional no combate ao crime, o que requer preparo para lidar com as mais variadas situações. Quanto mais clareza tiverem sobre o papel da polícia e os limites de sua atuação, melhor será o trabalho dos milhares de integrantes da PRF. Beira a ingenuidade, porém, imaginar que a mera presença em aulas de direitos humanos fosse capaz de mudar o comportamento dos agentes envolvidos na abordagem de Genivaldo. Infelizmente, o Brasil tem assistido a uma espécie de ataque sistemático contra princípios basilares da vida em sociedade. Na esteira da polarização política, da disseminação de notícias falsas e do florescimento de discursos de ódio, ganhou força uma visão de mundo que se opõe à democracia e ao Estado de Direito naquilo que este último tem de melhor, isto é, a garantia de que o exercício do poder e os conflitos sociais serão regidos pela lei − e não pela violência. O conceito de direitos humanos foi uma das primeiras vítimas desse verdadeiro desmonte de conquistas democráticas, base para o desenvolvimento de qualquer país civilizado. A partir de uma visão de mundo simplificadora e, por isso, completamente equivocada, disseminou-se a ideia de que defender direitos humanos seria o mesmo que defender bandidos ou ser complacente com a criminalidade. Por óbvio, nada mais falso, uma vez que a aplicação da lei, fundamento do Estado Democrático de Direito, prevê punição e prisão para quem comete crimes − da mesma forma que resguarda direitos fundamentais de todo e qualquer cidadão. Entre eles, o direito à vida, à dignidade e a um julgamento justo. Não é democrático nem de direito o Estado que nega a determinados cidadãos a condição de sujeito de direitos. Contudo, há tempos o Estado brasileiro faz essa discriminação, de que são testemunhas os milhares de presos sem julgamento, sem falar nos outros tantos que nem chegam a ser presos, pois são mortos em operações policiais truculentas. Tornou-se trivial considerar que há brasileiros (“bandidos”, como são chamados mesmo antes de qualquer julgamento) que não fazem jus a direitos fundamentais. Não são poucos os que até ganham eleições defendendo a execução sumária desses cidadãos – transformados em párias dentro de seu próprio país, posto que, na prática, não têm os mesmos direitos que seus concidadãos considerados “de bem”. Não é preciso fazer “curso de direitos humanos” para saber que atirar uma pessoa no porta-malas de uma viatura e sufocá-la com gás não é um procedimento policial aceitável num país civilizado. Se os policiais se sentiram à vontade para fazê-lo à luz do dia, diante de incontáveis testemunhas, é porque se sentiram chancelados pelo Estado. Quando o chefe desse Estado é alguém que louva torturadores, tudo faz sentido. ****************************** *** GREG NEWS | MEDO 536.072 visualizações Estreou em 3 de jun. de 2022 Confira o 12º episódio da sexta temporada do Greg News, com Gregorio Duvivier! Toda sexta, às 23h, você assiste a um novo episódio na HBO Brasil. https://www.youtube.com/watch?v=rZmbBH_FF44 ********************************************* "Liberalismo, como se entende aqui, é coisa de país rico." Agora eu acho que... talvez eu concorde com você. Talvez o liberalismo como se tem falado por aqui talvez seja coisa de país rico. *** REINALDO AZEVEDO: COMO VAI A FRENTE ANTIFASCISTA? - 20 Minutos Entrevista 77.660 visualizações Transmitido ao vivo em 3 de jun. de 2022 A frente antifascista contra o bolsonarismo nas eleições de 2022 foi o tema principal na conversa do jornalista Reinaldo Azevedo ao fundador de Opera Mundi, Breno Altman, no programa 20 MINUTOS ENTREVISTA desta sexta-feira (03/06). Azevedo afirmou que, no Brasil, conservadores e liberais erram em dar prioridade às pautas privatistas em detrimento da inclusão social e do combate à pobreza. “É preciso cuidar das contas públicas, mas não se pode ter uma rigidez tal a ponto de matar o próprio crescimento. É preciso buscar um entendimento intermediário, que os liberais não souberam fazer. O PT fez uma política de inclusão, o que um governo liberal, com os liberais que temos, não teria feito”, afirmou ele, declarando que o liberalismo "seja de fato coisa de país rico". Âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM, e colunista da Folha de S.Paulo e do UOL, Azevedo criticou o baixo crescimento atual associado com a volta brutal da fome ao Brasil. “Outra tara dos liberais à moda brasileira é cortar direitos para salvar as pessoas. Temos a eliminação de direitos e a taxa de desemprego foi para as alturas, é o pior dos mundos. Em algum momento, os liberais têm de parar de falar para os pobres ‘espere um pouco que uma hora chega’”, disse, observando que, se bem aplicado, o liberalismo é tolerante e plural e que esses são valores necessários. Reinaldo Azevedo, jornalista, é âncora do programa “O É da Coisa” na BandNews FM e colunista da Folha e do UOL. Veja a matéria completa: https://operamundi.uol.com.br/20-minu... ---- https://www.youtube.com/watch?v=tGxhnJLCHpk ************************************************ O corvo, o morcego e o pássaro azul: as representações da consciência na poesia Amanda Leonardi20:06 3 comentários
*** O título deste artigo quase poderia ser uma fábula, mas não é. O que os três animais citados no título acima têm em comum? Todos eles foram utilizados, em algum momento, por um poeta para representar a consciência (ou talvez o inconsciente, em alguns casos) do eu-lírico. Quase seria possível dizer que eles escolheram aves para dar asas a uma consciência sufocada, mas isso não pode ser dito, pois Augusto dos Anjos não escolheu uma ave, mas um morcego, o único mamífero voador – ainda assim o poeta escolhera uma criatura alada para representar a consciência do eu-lírico. O que faz com que estes influentes poetas desejem representar algo tão intrínseco ao ser humano por meio de criaturas capazes de voar? Vejamos aos poucos e, comparando cada um dos exemplos, veremos o que eles trazem de semelhante e no que se diferem também. Comecemos pelo exemplo mais clássico e provavelmente mais famoso deles: O Corvo de Edgar Allan Poe. Dentre as diversas interpretações que podem ser feitas do poema de Poe, uma das mais freqüentes é a de que a sombria ave dos maus tempos ancestrais utilizada pelo poeta é uma representação da lembrança do eu-lírico referente à amante morta, a jovem Lenore. Ou seja, ela é uma recordação que o poeta fazia de tudo para esquecer, para sufocar em seu inconsciente, mas em uma noite fria a lembrança o invade novamente, em forma de um pássaro sombrio que repete incessantemente as palavras de sua despedida com Lenore. Isso pode ser interpretado de outras formas, é claro, desde como uma narrativa sobrenatural, em que o corvo é uma espécie de fantasma de Lenore ou enviado por ela, mas também podemos ver a ave como a agonia já quase inconsciente do narrador tomando forma, ganhando vida e se sobrepondo sobre o consciente dele, sobrevoando sua existência e o afogando em suas sombras. Inclusive, um detalhe que chama a atenção é o fato de o corvo pousar sobre o busto de Atenas, a deusa da sabedoria, ou seja: a ave se coloca acima da sabedoria do eu-lírico, acima de tudo o que ele entende seguindo razão e lógica e domina sua consciência o revelando em palavras aquilo que ele deixava no abstrato subsolo de suas memórias, fortalecendo uma assombração que ele tentava ocultar de si mesmo. “E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais. Seu olhar tem a medonha cor de um demônio que sonha, E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão há mais e mais, Libertar-se-á... nunca mais!” O Corvo (The Raven), Edgar Allan Poe, tradução de Fernando Pessoa Poe utiliza um corvo para dar um tom melancólico e sombrio ao poema, mas na Filosofia da composição, ele não chega a citar porque resolver escolher um ser alado – fato este que observaremos aqui, em comparação ao morcego e ao pássaro azul. Partindo agora para O Morcego, de Augusto dos Anjos: neste poema do jovem que revolucionou a poesia nacional, é dito claramente porque o poeta escolhera um morcego para representar a consciência do eu-lírico e exatamente que é isso mesmo que ele quer representar, o que vemos nos versos finais do poema: “Que ventre produziu tão feio parto?! A consciência humana é este morcego! Por mais que a gente faça, à noite, ele entra Imperceptivelmente em nosso quarto.” O Morcego, Augusto dos Anjos Neste caso, o poeta se refere à consciência como algo que ele deseja evitar, mas que à noite acaba por encontrá-lo, quando o mundo consciente e inconsciente se misturam envoltos por uma atmosfera surreal de sonho e trevas. A descrição de tal cena poderia muito bem se referir ao narrador do Corvo, tentando fugir de suas memórias de Lenore e de sua terrível maldição de viver sob tal sombra, não é mesmo? Mas a consciência humana tem asas, e por mais que tentemos afogá-la, sucofá-la, uma hora quando estivermos perdidos entre sonhos e realidade, ela dá um jeito de nos alcançar e de se sobrepor sobre nós, por vezes nos levando à estados de loucura ou melancolia, como vemos nos narradores dos dois poemas citados acima. Agora, e quando queremos esconder de nós mesmos algo que, por algum motivo o outro, tememos que o mundo não aceite, mas que faz parte de nós ainda assim? Quando não são trevas que queremos ocultar, mas alguma espécie de luz que tememos que a sociedade condene? Talvez isso venha à tona de uma forma mais delicada, mas sutil: em forma de um pássaro azul, que podemos prender em uma gaiola (gaiola feita de costelas humanas), mas deixá-lo livre quando nos sentimos confortáveis para tal. Quando sentimos a liberdade necessária para expor tal parte de nossa personalidade, quando ninguém estiver por perto para condenar nem julgar o singelo canto do pássaro azul, este que não invade a casa de madrugada, mas que ganha permissão para sair e cantar um pouco de vez em quando. E é isso que descreve Bukowski no clássico poema Pássaro azul. Não é uma recordação ruim nem uma consciência melancólica, mas uma liberdade que por mais que o eu-lírico tente sufocar, ele se sente mais livre quando o permite que saia e cante. “Há um pássaro azul em meu peito que quer sair mas sou bastante esperto, deixo que ele saia somente em algumas noites quando todos estão dormindo. eu digo: sei que você está aí, então não fique triste. depois, o coloco de volta em seu lugar, mas ele ainda canta um pouquinho lá dentro, não deixo que morra completamente e nós dormimos juntos assim como nosso pacto secreto” Pássaro azul (Blue Bird), Charles Bukowski, tradução de Pedro Gonzaga Todos os três poetas utilizam animais alados para se referir à consciência do narrador, ou a algo da personalidade deles que permanece oculto até determinado momento. Até a alma do poeta alçar vôo, até que aquilo que o poeta tenta de todas as formas esconder de si mesmo acaba por sair do subsolo, sobrevoar sua consciência mais superficial e revelar a ele algo que o afeta profundamente. É isso que os poetas fazem, muitas vezes, deixar que seu inconsciente ganhe vida nas palavras e/ou rimas para se libertar. Nos casos aqui observados, eles literalmente dão asas aos seus semi-ocultos sonhos ou pesadelos e os deixam voar pelos versos. Arte da capa: John Kenn http://www.revistaconexaoliteratura.com.br/2016/06/o-corvo-o-morcego-e-o-passaro-azul-as.html *********************** Música | Elba Ramalho, Zé Ramalho, Geraldo Azevedo: Asa Branca (Luiz Gonzaga) ******************************************************************************* ***
*** Brasil de Fato - Pernambuco Setenta anos de Asa Branca: o hino do Rei do Baião | Cultura https://www.brasildefatope.com.br/2017/05/25/setenta-anos-de-asa-branca-o-hino-do-rei-do-baiao *** Luiz Gonzaga - Asa Branca ft. Fagner, Sivuca, Guadalupe 39.163.165 visualizações 16 de jul. de 2015 Videoclipe oficial da música Asa Branca de Luiz Gonzaga feat. Fagner, Sivuca and Guadalupe de seu álbum, Danado De Bom.

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