Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
quinta-feira, 6 de outubro de 2022
Quem liga para a democracia?
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O que é democracia?
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quinta-feira, 6 de outubro de 2022
Malu Gaspar – Quem liga para a democracia?
O Globo
Votação expressiva de candidatos que exaltam a ditadura ou defendem o fechamento do STF frustrou centro político e a esquerda
Os resultados do primeiro turno causaram perplexidade pelas discrepâncias entre os números das pesquisas e o resultado final, pelo tamanho da votação de Bolsonaro e pelo crescimento da direita bolsonarista no Congresso. Esses temas vêm sendo discutidos à exaustão, mas uma pergunta ainda paira aqui e ali. Afinal, o brasileiro não dá importância à democracia?
A votação estrondosa de candidatos que exaltam a ditadura militar ou defendem o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF) — além, é claro, do próprio Jair Bolsonaro — causou frustração nos intelectuais, na esquerda e no centro.
Parte dos apoiadores de Lula concluiu que faltou ao petista gritar mais alto para “mostrar ao povo” o risco autoritário que o Brasil corre com uma hipotética vitória de Bolsonaro. Outra ala, mais pragmática, chegou à conclusão de que grande parte do eleitorado, no fundo, não está nem aí para a democracia. Quer saber é de comer, trabalhar, pagar as contas.
"Para o eleitor, fascista é aquele que faz as coisas, e genocida é o irmão do Emicida", ironiza um apoiador de Lula de primeira hora que vive da política. "Não adianta fazer assembleia com o pessoal do todes, tem de gastar sola de sapato e falar com o povo".
A pesquisadora Esther Solano, que estuda o comportamento de eleitores como evangélicos e integrantes das classes C e D, expressou a mesma ideia de forma bem mais elaborada ao dizer, em entrevista ao GLOBO, que “o conceito de democracia é mobilizador para uma classe média e alta, mas está distante demais da realidade concreta de eleitores em situação econômica emergencial”. Para ela, parte do eleitorado também está aflita com questões morais como o aborto e a “ideologia de gênero”.
O mesmo aliado de Lula acha que o risco à democracia será um não assunto no segundo turno. Primeiro, porque Bolsonaro não teria forças para dar um golpe. Depois, porque ele acha que ganhará. Evidente que a situação é bem mais complexa, e nada disso impede o presidente da República de tumultuar o ambiente político se lhe for conveniente. Mas a noção de que o risco à democracia será um não assunto nesta eleição vem se consolidando entre os políticos.
Será mesmo?
Apesar da baixaria virtual dos últimos dias — com bolsonaristas acusando Lula de ser ligado ao satanismo, enquanto os lulistas disseminam vídeos de Bolsonaro na maçonaria para assustar os evangélicos —, fora das redes sociais a eleição nunca pareceu tão “normal”.
O que se vê nas duas campanhas são cenas de tradicional disputa democrática, com cada lado tentando enfileirar o maior número possível de apoios institucionais. Bolsonaro vestiu um terno bem passado, penteou os cabelos e saiu pelo Brasil negociando em gabinetes, fazendo promessas e prestando contas de seus apoios diante de microfones.
De seu lado, Lula reuniu a tropa nos bastidores para avaliar os erros e corrigir o rumo, enquanto diante das câmeras era cobrado a assumir compromissos.
Essa movimentação é consequência direta do primeiro turno. O fato de ter se tornado imperativo a qualquer político com algum projeto futuro assumir posição é, em si, um ganho para a democracia. Tirou das sombras quem andava escondido e será cobrado por seus atos.
Isso não quer dizer que o risco de degradação democrática tenha desaparecido. Como já constataram Steven Levitsky e outros autores, o autocrata 3.0 mina a democracia por dentro, enfraquecendo as instituições.
Bolsonaro já demonstrou inúmeras vezes que segue a cartilha. Agora mesmo, enquanto ele se apresenta como governante preocupado, seus aliados propõem uma CPI no Senado para investigar as pesquisas eleitorais.
Não se trata, portanto, de dourar a pílula, pelo contrário. Mas a história do segundo turno ainda está por ser escrita. Embora seja inevitável termos novos momentos de baixaria e jogo sujo, também é verdade que Lula e Bolsonaro agora estão sozinhos sob os holofotes, sem o escudo do candidato-laranja, da ameaça comunista, do voto útil ou do sigilo de cem anos.
Com tempo de sobra na TV e debates pela frente, terão de se enfrentar de verdade a respeito do orçamento secreto, da corrupção do PT, dos planos para a economia e para a educação.
Não que estejam loucos para fazê-lo. Mas o recado das urnas também deveria ser compreendido por aqueles que estão genuinamente preocupados com nossa democracia. A tarefa começa por cobrar de Lula e de Bolsonaro propostas coerentes, sem passar pano para populismo, autoritarismo e demagogia. Mais do que gritar pela democracia, é preciso praticá-la. Pode parecer pouco para quem está diante do abismo. Mas não se apresentou ainda uma alternativa melhor.
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Prezi
A POLÍTICA INTERESSA A TODOS E A CADA UM by Gabryelle Viana
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Indicação de leitura para o 9º ano:
No texto abaixo, João Ubaldo Ribeiro, jornalista e escritor baiano, reflete sobre o que é a política,
como estamos ligados a ela e se é possível que alguém viva totalmente alheio à política. Leia o
texto, sublinhe as partes que considera mais importante e busque o significado das palavras que
não conhece:
Como a política interessa a todos e a cada um1
João Ubaldo Ribeiro
As formas de exercício do poder são às vezes
difíceis de listar. Quando nos dizem que não nos é
permitido (no caso dos brasileiros do sexo masculino)
passar dos 17 anos sem nos alistarmos nas Forças
Armadas, é evidente que um poder se exerce sobre nós
de forma bastante palpável. Entretanto, ao pensarmos
ou agirmos de determinadas maneiras que, não raro,
julgamos naturais ou espontâneas, esse poder é menos
fácil de visualizar. É o que se dá, por exemplo, quando
mantemos preconceitos contra o nosso semelhante, por
ser ele negro ou branco, protestante ou católico, ou por
falar com um sotaque diferente do nosso. A existência
de preconceitos não é natural. O homem não nasce
com preconceitos, ele os aprende socialmente. Ao
aprendê-los, é claro que seu comportamento está sendo
influenciado.
É igualmente claro, por conseguinte, que ele está
sendo submetido a algum poder. Daí raciocinar-se que
o preconceito racial, para ficarmos somente em um dos
muitos que o espírito humano infelizmente ainda
abriga, tem origem e funcionalidade políticas, ou seja,
tem servido para justificar formas de exploração e
dominação, assumindo muitas faces, de acordo com as
circunstâncias. O que se pretende mostrar com isso é
que, queiramos ou não, estamos imersos num processo
político que penetra todas as nossas atitudes, toda a
nossa maneira de ser e agir, até mesmo porque a
educação, tanto a doméstica quanto a pública, é
também uma formação política.
1
Adaptado de RIBEIRO, João Ubaldo. Política. Quem
manda, por que manda, como manda. 3ª edição. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1998. Capítulo 2.
(...)
Após ler um texto é muito interessante tentar resumir o
que entendemos dele. Para ajudar a resumir nossas
ideias e refletir sobre o texto o autor nos convida a
fazer uma reflexão com base em algumas questões.
Vamos tentar anotar nossas respostas?
1. Será que existe algum “poder” que só dependa de quem o
exerce e nem um pouco daqueles sobre os quais é exercido?
A obediência é sempre uma coisa imposta, mesmo que não
pareça?
2. Se fizermos uma lista, digamos, de cinco problemas que
estamos enfrentando no momento, é possível ver em alguns
deles, ou em todos eles, implicações políticas?
3. O pai toma todas as decisões por seus filhos adolescentes,
inclusive quanto a vestuário, escolha da profissão etc. Existe
algo de político nisso?
4. Um deputado se elege, passam-se três anos de um
mandato de quatro, ele nunca faz um discurso, nunca
apresenta um projeto, raramente aparece nas comissões e no
plenário. Ele é um político?
5. Fulano é apenas um técnico em controle de natalidade,
que está procurando ensinar às famílias pobres da
coletividade métodos anticonceptivos e distribuir material
adequado. Ele diz que seu trabalho é meramente científico e
social, não tem nada de político. Ele tem razão?
6. “É tempo de murici, cada um cuide de si.” Este velho
ditado é apolítico?
7. “Quem manda nesta casa sou eu, porque quem traz o
dinheiro sou eu.” Isto é uma declaração política?
http://www.cp2.g12.br/blog/saocristovao2/files/2020/05/9%C2%BA-ano-Leitura-Como-a-pol%C3%ADtica-interessa-a-todos-e-a-cada-um.pdf
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quinta-feira, 6 de outubro de 2022
Luiz Carlos Azedo - Adesismo e derrota na federação PSDB-Cidadania
Correio Braziliense
Com todos os seus defeitos, Doria tinha uma proposta programática social-liberal. Já o grupo liderado por Garcia não tem proposta alguma. O PSDB declara neutralidade, o Cidadania apoia Lula
A coligação PSDB-Cidadania elegeu 18 deputados, de uma bancada de 29 parlamentares. Os tucanos eram 22, agora são 13. Os “cidadânios”, digamos assim, eram sete, e agora são cinco. A coligação foi feita para consolidar a hegemonia interna dos deputados paulistas de ambas as legendas, em torno da candidatura à reeleição do governador Rodrigo Garcia, que não chegou ao segundo turno. À época, o candidato do PSDB era o governador João Doria, candidato à Presidência, mas havia uma conspiração armada para defenestrá-lo tão logo se desincompatibilizasse do cargo para disputar a eleição.
No começo, Doria não acreditou que isso poderia ocorrer, mas levou um xeque-mate tão logo Garcia assumiu controle pleno do Palácio dos Bandeirantes. O vice que assumira o governo fazia a política municipalista, enquanto Doria se digladiava com o presidente Jair Bolsonaro (PL) durante a pandemia, diga-se de passagem, em defesa da causa mais justa naquele momento: a política de distanciamento social e a corrida para produção de vacinas.
O governador foi vitorioso do ponto de vista da política sanitária, mas a superexposição aumentou sua taxa de rejeição no plano eleitoral. Garcia era um articulador suave, que conquistou o apoio da maioria dos prefeitos e da bancada tucana. Conduziu com competência a operação de cerco e aniquilamento de seu padrinho político no partido.
O PSDB não queria Doria como candidato, ou melhor, não queria ter candidato algum à Presidência. Isso seria um estorvo para a maioria da sua bancada federal, que estava grudada como bigode no Centrão, ou seja, na boca do Orçamento Secreto, mas do lado de fora do governo Bolsonaro.
A federação com o Cidadania facilitava a montagem das chapas proporcionais e trazia um aliado para disputa contra Doria. A preferência do Cidadania era o governador gaúcho Eduardo Leite, que jogou a toalha na disputa com Doria, ao perceber que os paulistas também não queriam que fosse candidato. Para o Cidadania, a federação resolveria suas dificuldades para ultrapassar a cláusula de barreira e poderia garantir a sobrevivência do partido, que sucedeu o antigo PPS (ex-PCB).
A salvação da lavoura foi a candidatura de Simone Tebet (MDB), um dos raros produtos da alta política dessas eleições, que sobreviveu a todos os assédios para que retirasse seu nome da disputa. O presidente do Cidadania, Roberto Freire, obsessivo articulador de uma alternativa de centro democrático à polarização Lula x Bolsonaro, e o deputado Baleia Rossi, presidente do MDB, que bancou a candidatura, foram os artífices dessa empreitada. Simone fez uma bela campanha, apesar de “cristianizada” pelo MDB e pelo PSDB. O Cidadania investiu em sua candidatura, mesmo sem possibilidade de ir ao segundo turno, vislumbrando que seria uma aposta para o futuro, ou seja, para 2026.
O que deu errado? O maquiavelismo provinciano de Garcia e seus aliados, que não contavam com a força do presidente Jair Bolsonaro (PL) na alavancagem da candidatura de Tarcísio de Freitas (Republicanos), que virou o primeiro turno como franco favorito. Garcia ainda tentou desbancá-lo, fazendo pilhérias com o fato de o adversário não ser paulista e sequer saber onde ficava a seção eleitoral na qual votou. Mas não contava com o desgaste da longa permanência do PSDB no poder e das defecções que legenda sofreu desde quando Doria passou a controlar seu diretório regional. A mais importante foi a do ex-governador Geraldo Alckmin, que virou vice de Lula, mas houve outras, como a do ex-senador Aloysio Nunes Ferreira.
Troca-troca
O fato de o PT tratar Garcia como inimigo principal foi um equívoco grave, porque deixou Tarcísio solto e acabou empurrando toda a base do governador paulista para o colo do candidato que encarnava a polarização nacional. Isso criou as condições para que Garcia anunciasse apoio a Bolsonaro no segundo turno, para horror dos tucanos históricos, que estão vendo a legenda se transformar num partido meramente fisiológico. Com todos os seus defeitos, Doria tinha uma proposta programática social-liberal. Já o grupo liderado por Garcia não tem proposta alguma.
Liderado por Roberto Freire, o Cidadania tenta resistir ao arrastão bolsonarista em São Paulo, mas o líder da bancada na Câmara, Alex Manente, que se elegeu com grande votação, fez questão de marcar posição e anunciou que a bancada ficaria neutra na disputa nacional. A maioria apoiará a reeleição do presidente da República nos estados.
Entretanto, a legislação permite a troca de legendas dentro da federação, sem perda de mandato. Os dois partidos teriam mais nitidez se fizessem um troca-troca: quem apoia Lula no segundo turno fica ou vai para o Cidadania, quem apoia Bolsonaro permanece ou muda para o PSDB. Ou vice-versa. Seria mais coerente.
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quinta-feira, 6 de outubro de 2022
Conrado Hübner Mendes* - Como autocracias nascem
Folha de S. Paulo
Eventual reeleição de Bolsonaro pode lhe dar a carta branca que faltava
Bolsonaro ensina muitas lições sobre democracia e constituição. Ensina, por exemplo, que presidente engajado na supressão de limites jurídicos, se não enfrentado à altura, vai levar instituições à fadiga e esgotamento. O regime de irresponsabilidade, corrupção e anomia. Com a complacência de juristas da corte.
Valores imateriais como liberdades civis e políticas deixam de ter lastro real e passam a depender apenas da boa vontade e das boas relações. E da sua condição social. Deixam de ser liberdades, portanto. Já a promoção de valores materiais como desenvolvimento econômico e redução da pobreza, na ausência de regras estáveis, coordenação institucional e confiança, torna-se inviável e ineficiente.
Neutralizadas as instituições, a Constituição vai se tornando literatura de ficção, cartilha de legalismo fantástico. Essas não são lições novas, mas lições mal aprendidas pela análise política hegemônica. A sacralização das instituições e o apagamento dos indivíduos que as operam promovem miopia cognitiva.
O primeiro turno das eleições de 2022 suscitou avaliações variadas.
A gestão competente da máquina eleitoral pelo TSE mereceu destaque. Mas não se pode esquecer as falhas do TSE e do STF em coibir práticas que comprometem a integridade da competição eleitoral. Orçamento secreto e os diferentes gastos criados para fins exclusivamente eleitorais são exemplos clássicos do menu de manipulação eleitoral. Controlar depois do estrago já feito é uma arte judicial.
Análises políticas interpretaram o significado do volume surpreendente de votos em candidaturas bolsonaristas, que pesquisas não detectaram. Projetaram a imensa força que eventual governo bolsonarista poderá ter no Congresso para fazer as anunciadas reformas autocratizantes que quiser.
Análises sociológicas reafirmaram as evidências de aprofundamento desse conjunto eclético e retrógrado de valores, chamado de bolsonarismo, na sociedade. As eleições teriam mostrado que ele "se consolida e se decanta, costurou a direita tradicional, está mais potente e capilarizado, e não foi mero acidente".
Independentemente do acerto das análises descritivas, que tentam retratar o que passa, deixamos a dever na análise normativa. Primeiro, pelo ângulo da teoria política, de onde vem o conceito de democracia. É preciso se perguntar se e quando o que estamos assistindo não poderá mais ser chamado de democracia mesmo pelos modestos parâmetros da ciência política. E combinar quais devem ser nossos detectores.
Segundo, pelo caminho próprio da análise jurídica, que examina a legalidade do que já aconteceu e do que pode vir a ser a agenda "reformista" de um segundo governo Bolsonaro. Porque muitas propostas dessa agenda, sabemos, são incompatíveis com a Constituição de 1988.
Mesmo que análises descritivas estejam certas, cabe à análise normativa alertar para o que o que podemos deixar de ser. Democracia constitucional não é para qualquer Bolsonaro.
Entre vitórias e derrotas no embate dos poderes, Bolsonaro ajudou a produzir democracia imunossuprimida. Sua obra de deterioração institucional é magnífica.
Eventual reeleição deve dar a carta branca que faltava para acelerar o projeto. A reeleição do líder autoritário, como mostram casos da onda de autocratização pelo mundo, da Hungria à Índia, da Venezuela às Filipinas, é o grande gatilho dessa virada de regime que muitos continuarão a chamar de democracia por observar que as "eleições estão funcionando".
Runciman alertou que a "democracia pode entrar em falência mesmo permanecendo intacta". E que a ciência política "tem pouco a dizer sobre as novas maneiras como a democracia pode falhar". Estaria mais preocupada em entender "como a democracia continua a funcionar" (Como as Democracias Chegam ao Fim, Ed. Todavia).
Do ventre de democracias podem nascer autocracias. Sem alarde, sem espetáculo, com ou sem a corneta tuiteira de general. Para quem a democracia nunca fez diferença, porque sempre foi excluído e violentado pelo estado, tanto faz. Para quem a democracia atrapalha projetos de acúmulo de poder, a transição é bem-vinda.
Para quem ainda quer ter a chance de invocar direitos e participar da vida coletiva, o voto de 2022 nunca foi tão decisivo.
*Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC
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quinta-feira, 6 de outubro de 2022
Entrevista | Simone Tebet: 'Não estou pensando em 2026, nem em cargos'
O GLOBO
Em entrevista ao podcast "Dois+Um", emedebista também afirmou que eleitores estavam esperando o 'mínimo de propostas' do petista, por isso o segundo turno
Horas depois de declarar apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno, a senadora Simone Tebet (MDB-MS), terceira colocada na disputa, afirmou, no podcast "Dois+Um", do GLOBO, que o petista não entendeu que o eleitor estava esperando dele o "mínimo de propostas" para "temas básicos" como fome, miséria, desemprego, pauta econômica e social e segurança pública, e por isso "decidiu levar a eleição para o segundo turno". Tebet também foi bem direta sobre a decisão: "Não estou pensando em 2026, nem em cargos."
Na entrevista à CBN, a emedebista disse que a equipe da campanha de Lula presente no almoço de hoje na casa da ex-prefeita Marta Suplicy reconheceu que é preciso dar um sinal mais claro em relação à pauta econômica e se "posicionar mais ao centro". A senadora disse ainda que não deseja cargos ou ministérios e que sua entrada na campanha depende do quanto Lula está disposto a incorporar o projeto de país que ela afirma sonhar.
Por quais razões a senhora tomou a decisão de apoiar Lula?
Pelo meu histórico, pela minha vida pública. Primeiro que não cabe a neutralidade num momento tão importante da História do Brasil. E, segundo, que não há escolha: reconheço (em Lula) um democrata que serve à Constituição Federal e respeita a Constituição. E não encontro no atual presidente da República alguém que eu entenda que vá cumprir a Constituição e defender os valores democráticos. Não há opção a não ser ter coragem. Não cabe voto branco neste momento. Não vale voto nulo. O que vale é escolhermos de acordo com a nossa consciência. Minha consciência de brasileira e a minha razão de democrata me trazem a apoiar e declarar meu voto ao atual candidato à Presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva.
Como a senhora vê os apoios que foram quase incondicionais a Bolsonaro?
Os apoios que são dados são do jogo do campo democrático e da política. Só, lamentavelmente, quero dizer que eu não acredito que um lobo se transforme em cordeiro da noite para o dia. Eu conheci o presidente como senadora nesses três anos e meio. Eu vi o que foi feito e o que deixou de ser feito na CPI (da Covid). Lamentavelmente, quantos perderam as vidas porque ele não acreditou na pandemia, negou vacina no braço do povo brasileiro e atrasou a compra dessas vacinas em 45 dias? Só por isso já me impediria (de declarar voto em Bolsonaro) e acho que impede os grandes homens públicos do Brasil a aceitarem, de novo, apostar as suas fichas em nome de um candidato que flerta com o autoritarismo, não respeita as instituições democráticas e virou as costas para o povo brasileiro no momento em que o povo brasileiro mais precisava. Por saber de tantos retrocessos, saber que o que está em jogo são os avanços que a democracia tem condições de garantir ao povo brasileiro no futuro, que fiz a minha opção. É uma opção pela democracia, pela Constituição e por políticas públicas. Acredito que estou do lado certo da história e isso me basta.
O apoio da senhora consiste numa declaração de voto ou num compromisso de participação ativa na campanha?
O meu voto já está dado. Eu fiz um manifesto ao povo brasileiro dizendo que incondicionalmente, sem qualquer condição, o meu voto é pela democracia e pela Constituição. Eu não fiz um voto de adesão, eu fiz um voto de projetos para o país. Apresentei ao ex-presidente Lula, atual candidato, cinco propostas. Agora vão ser analisadas pela equipe econômica e do programa de governo. O meu voto o ex-presidente Lula já tem. Se vamos entrar na campanha, depende do quanto ele está disposto a incorporar um projeto de país que eu sonho. A bola está com a equipe de campanha do atual candidato Luiz Inácio Lula da Silva.
A senhora coloca a necessidade de uma âncora fiscal. Encontrou acolhida na proposta?
É preciso uma ancoragem fiscal. Qual vai ser? Não me interessa. Não me preocupa se vai ser teto de gastos, se vai ser a meta de superávit. O meu projeto é de país. Não estou aqui para impor nada, nem a minha vontade, até porque serei uma crítica construtiva do futuro governo se o presidente Lula ganhar as eleições. Quis deixar o mais amplo possível.
A senhora, uma vez acolhido esse conjunto de propostas, consideraria a hipótese de compor num eventual ministério do governo Lula?
A minha adesão é por projeto de país e eu quero estar no Brasil, servindo ao Brasil, nos próximos quatro anos onde quer que eu seja necessária. Eu não quero cargos, eu não quero ministério, quero ter liberdade para que depois, com uma ampla reflexão, as pessoas que me ajudaram possam dizer: "Simone, o melhor caminho é aqui." Eu não sei qual é o papel, mas sei que tenho um papel hoje importante. Quero servir ao Brasil, não preciso de cargos, graças a Deus eu tenho profissão, então posso me dar ao luxo de andar o Brasil sem precisar de ministério ou cargo para precisar fazer aquilo que precisa ser feito. Há um Brasil a ser reconstruído e há um povo a ser novamente reunificado. Quero poder só fazer parte desse processo.
No almoço que a senhora e esses outros líderes tiveram na casa da ex-ministra e ex-senadora Marta Suplicy, ela ergueu um brinde e depois disse ao ex-presidente Lula: "Você agora não é mais o candidato do PT, da coligação. Você é candidato do Brasil”. A senhora entendeu isso como um recado pela necessidade de ampliar o palanque, as propostas, trazer mais clareza no que se pretende fazer? Isso é necessário?
Ele (Lula) não entendeu que o eleitor estava esperando dele o mínimo de propostas. O que fazer no futuro para temas básicos, como fome, miséria, desemprego, pauta econômica, educação, saúde, segurança pública. Faltaram pequenos pontos a serem colocados. Quando o ex-presidente Lula não apresentou, a população falou: preciso de mais tempo, então vou levar essa eleição para o segundo turno. Foi aí que nós desidratamos, eu e Ciro. Foi aí que houve uma movimentação do eleitor até acho que a favor do atual presidente e o jogo não acabou no primeiro tempo, ele foi para o segundo tempo, e agora é uma nova eleição. Então, sim, acho que é isso. Vi da equipe que estava ali (no almoço) um reconhecimento de que agora eles precisam apresentar propostas, eles estão prontos para apresentar, e esperou que estejam prontos para receber as nossas sugestões também.
Na conversa, houve algum aceno, alguma projeção de apresentação de um plano econômico, voltado para a classe média que está massacrada no Brasil?
Houve, sim, uma sinalização de que eles precisam sinalizar em relação à pauta econômica e à pauta de políticas públicas alguma coisa mais objetiva. A sensação que tive quando saí ali é que há, sim, o entendimento de que é preciso se posicionar mais ao centro e que o mundo mudou, a economia mudou, e é preciso evoluir em relação a esse sentido. Não cheguei a pregar uma economia liberal, como eu defendo, é óbvio, mas falei da importância da livre iniciativa, de se valorizar o agronegócio, ao mesmo tempo o meio ambiente, ou seja, um desenvolvimento sustentável.
A senhora pensa numa candidatura a presidente novamente, em 2026?
Eu aprendi na minha vida pública que a gente não vai para as eleições apenas para vencer, embora essa seja a prioridade absoluta. Mas para apresentar projetos, disseminar ideias, iluminar caminhos, para plantar a boa semente para uma colheita coletiva, foi o que coloquei no meu manifesto que eu mesma redigi nas 48 horas que tive sem dormir pela primeira vez desde que começou a campanha. A minha campanha foi muito tranquila, mas as últimas 48 horas foram muito difíceis, porque eu sabia e sei o que estava e está em jogo, e eu estou preparada para essa perda do capital político, se ela vier, porque é a minha verdade, a minha certeza. A democracia é algo muito maior do que cada um de nós que está em jogo. Diante de tudo isso, eu estou pronta para defender o Brasil, eu não estou pensando em 2026, nem em cargos. Acho que temos um longo caminho antes, eu quero servir ao Brasil. Há um Brasil para ser reconstruído, eu não sei onde eu me encaixo nisso, vocês me ajudem a me fazer útil dentro desse processo..
Dá para fazer um governo Lula com orçamento secreto e essa bancada ideológica que foi eleita? Como desarmar essas duas bombas-relógios?
Conheço bem o Congresso. Dá exatamente, pois dentro dessas bancadas fisiológicas nós temos os partidos de Centro que estão prontos, para numa análise crítica, num apoiamento crítico, avançar e dar os votos necessários para as reformas estruturantes e bons projetos do próximo presidente da República. O Congresso tem essa consciência, a responsabilidade, porque nós estamos no fundo do poço. Precisou ir para o fundo do poço para a gente agora tentar emergir com projeto que gere emprego e renda, garanta a dignidade, tire o Brasil do mapa da fome e miséria.
Senadora, sem falsa equivalência, no começo da campanha a senhora fez críticas duras ao candidato Lula, muitas vezes centradas em corrupção, que houve naquele período. Isso foi tratado na conversa? É um compromisso?
Sim. E, colocando na balança, corrupção por corrupção, a hora que abrirem a caixa preta do orçamento secreto, ela vai se mostrar infinitamente maior do que o petrolão, o que não isenta. Corrupção é corrupção. Quem rouba um, rouba 1 milhão. As duas coisas têm que ser rechaçadas. E eu coloquei (como compromisso) o ministério competente e ético. Eu deixei muito claro essa questão.
Acho que falta ao PT um mea-culpa de reconhecer que no seu governo houve corrupção?
Nesse ponto eu fui dura. E vou repetir, triste Brasil que tem que escolher entre dois grandes escândalos: escândalo do mensalão e do petrolão do passado, (ou) o escândalo do “vacinaço”, da tentativa de superfaturar vacinas, do “ônibuzaço” no Ministério da Educação, e do orçamento secreto desse governo. Dizer que esse governo não tem indícios de corrupção? Por favor, é desconhecer o dia a dia da política brasileira e não ter capacidade de fazer a leitura certa através dos grandes veículos de comunicação. Mas isso a história dirá.
A senhora acha que os 51 milhões de votos dados a Bolsonaro mostram que o país normalizou o que aconteceu na pandemia?
Os retrocessos são tamanhos que o que mais me assusta como cidadã, como brasileira e como cristã, é o quanto o brasileiro conseguiu dos últimos três anos e meio normalizar os absurdos. Como a gente chegou ao ponto de normalizar tragédias, retrocessos. Ver uma criança na rua pedindo um prato de comida e virar o rosto, ver um negro ser espancado e achar que isso é natural. Normalizar as grosserias. Como nós podemos ir às nossas igrejas, fazer a leitura do evangelho e não conseguir pregar o evangelho na rua, nos nossos lares, nos nossos ambientes de trabalho?
O presidente fez muitas críticas à CPI da Covid, em que a senhora foi protagonista. Eu queria que a senhora fizesse um balanço dos efeitos da CPI, considerando que ela não prosperou em termos de denúncias formais, em grande parte devido ao procurador-geral da República. Qual o balanço que se faz agora?
Não com meu voto na recondução. Eu votei na primeira vez, dei um voto de confiança. E, na segunda vez, eu fui até indelicada e sequer o recebi no meu gabinete, porque já tinha visto nele traços de alguém tendencioso que estava ali para servir o presidente e não para servir como órgão de fiscalização e controle ao povo brasileiro.
A CPI cumpriu duas grandes missões: ajudou a colocar vacina no braço do povo brasileiro, portanto, salvar vidas; e, depois, como um grande inquérito concluiu que há denúncias gravíssimas de tentativa de corrupção. Isso a história vai contar e vai ficar claro a partir de primeiro de janeiro do ano que vem se o povo brasileiro escolher como presidente Lula, porque a partir daí nós teremos um outro procurador-geral da República, e as coisas se tornarão públicas.
Senadora, os apoios me parecem ter dois tipos: os apoios como o da senhora e o do PDT, que condicionam esse apoio a alguma assumpção de compromissos; e os apoios recebidos pelo Bolsonaro mais incondicionais, apoios que tem uma máquina pública por trás. Por que de Bolsonaro não se cobra esses compromissos? E o que essas máquinas podem fazer de diferença?
Sinceramente, acho que não vai fazer diferença nenhuma. O eleitor agora vai colocar a mão na consciência e decidir de acordo com o que ele acha que é mais importante para sua vida e para o Brasil. Ele está atento.O povo brasileiro sabe votar. Vota naquele menos pior dentro das circunstâncias. E ele não é tutelado. O voto é dele. É claro que um apoio meu pode fazer um eleitor meu refletir. Mas ninguém é dono do voto do eleitor.
E as pessoas estão colocando na balança: o porquê alguém está dando apoio e colocando propostas, e o outro está apoiando simplesmente por apoiar. O que está por trás? Está por trás discussão de cargos, de ministérios, de manutenção de benesses, de orçamento secreto? O eleitor está atento.
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