Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022
FACES DA DEMOCRACIA
Weffort mostrou que populismo é a face “dependente” da democracia
Professor da USP, que morreu no dia 1º, foi um dos grandes intérpretes da política brasileira e latino-americana
Post category:Cultura
https://jornal.usp.br/?p=442049
06/08/2021 - Publicado há 6 meses Atualizado: 11/08/2021 as 13:10
Por Luiz Prado
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O cientista político e professor da USP Francisco Weffort – Arte de Lívia Magalhães com fotos de Wikimedia Commons
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No dia 1º de agosto, domingo, a vida intelectual e política brasileira perdeu Francisco Correa Weffort (1937-2021), Professor Emérito do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Ministro da Cultura durante o governo Fernando Henrique Cardoso, Weffort foi também um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT), chegando a ser secretário-geral do partido.
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Weffort tinha 84 anos – Foto: IEA-USP
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Weffort se destacou por seus estudos sobre o populismo e a democracia. Durante a ditadura militar, suas pesquisas buscaram entender por que o golpe e o regime de exceção conseguiram interromper a experiência democrática brasileira iniciada em 1945, após a queda de Getúlio Vargas e o fim do Estado Novo.
“Populismo é a categoria que Weffort usou para explicar as fragilidades do regime democrático, que não havia sido capaz de organizar uma estrutura política forte, resistente ao golpe”, comenta Daniela Mussi, professora do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). De 2016 a 2020, Daniela atuou como pesquisadora de pós-doutorado na USP, em um projeto sobre o Centro de Estudos de Cultura Contemporânea (Cedec), fundado por Weffort em 1976. Durante sua estada na USP, Daniela teve oportunidade de se aprofundar na obra do professor.
De acordo com Daniela, o tema do populismo já aparece em Weffort ainda nos anos 1960, em escritos anteriores ao golpe, e entra nos anos 1970, em uma agenda de pesquisa bastante associada à cultura intelectual da USP que se exilara no Chile, como é o caso de Fernando Henrique Cardoso. Disso decorre a aproximação da obra de Weffort com as discussões sobre dependência de FHC. Foi durante o exílio no Chile que Weffort e Fernando Henrique, ao lado de outros exilados como José Serra e Maria da Conceição Tavares, se aprofundaram na compreensão da realidade política, econômica e social da América Latina.
“Podemos dizer que, na elaboração de Weffort, o populismo é a face política da dependência. É o arranjo político de uma situação democrática de dependência”, afirma Daniela. “Weffort pensa essa forma política que os Estados da América Latina adquirem na tentativa de experimentar a democracia, nunca conseguindo, de fato, levar a termo a construção de partidos fortes, com interesses próprios, tradição e visão estratégica. Os grupos políticos sempre mantêm algum grau de dependência em relação à estrutura estatal que os antecede.”
Aos poucos, conta Daniela, o populismo foi ganhando novos contornos no pensamento de Weffort e sendo identificado em outros campos, como é o caso do sindicalismo. O professor analisou como a estrutura sindical guardava a herança do Estado Novo e carecia de autonomia. “Aqueles arranjos jurídicos que haviam forjado os sindicatos nos anos do Estado Novo acabam sobrevivendo ao tempo e sendo reproduzidos na dinâmica sindical, inclusive pelas oposições”, explica a pesquisadora, citando como exemplo o complexo debate, ainda hoje inconcluso, sobre o imposto sindical.
É nesse contexto, em 1978, que Weffort publica a coletânea O Populismo na Política Brasileira, um de seus livros mais conhecidos, que reúne textos escritos entre 1963 e a data da publicação e condensa sua produção sobre o tema. A partir dos anos 1980, o professor se debruçaria sobre o problema da democracia, tentando responder, de acordo com Daniela, a uma pergunta: “Qual é a democracia que o Brasil pode alcançar e construir nesse novo momento da sua experiência?”.
Após décadas, ambos os temas – democracia e populismo, agora pensado também em seu viés direitista – continuariam na perspectiva de Weffort, como atesta sua participação, ao lado do também professor da FFLCH José Álvaro Moisés, do programa Desafios, do Jornal da USP, em maio passado.
“A principal contribuição de Weffort foi produzir uma reflexão original sobre a política na democracia brasileira e, para isso, o populismo foi só uma espécie de impulso”, reflete Daniela. “O conceito de populismo nunca foi único, mudou ao longo do tempo, à medida que a reflexão e os problemas analisados se transformavam. Não é uma categoria que possui rigidez ou um caráter abstrato. O que está em jogo é tomar conceitos como ferramentas para pensar a construção democrática no Brasil. E, por isso, são ideias que mantêm o vigor e a atualidade. Porque, ainda hoje, pensar a experiência democrática no Brasil e suas dificuldades se revela atual”, pontua a pesquisadora.
Professores da USP destacam legado de Francisco Weffort
Docentes do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP lamentaram a morte de Francisco Weffort, destacando contribuições intelectuais e a importância do professor para a institucionalização da ciência política no País.
“Weffort foi muito importante para a área de política da USP, tendo feito parte, ainda na época das cátedras, da Cadeira de Política e, durante a ditadura, tendo sido fundamental para a manutenção da pesquisa e do ensino do que se tornou o Departamento de Ciência Política”, comenta o professor Bernardo Ricupero. “Seus estudos sobre populismo tiveram grande influência, contribuindo para a criação do Centro de Estudos de Cultura Contemporânea (Cedec), que se destacou pela reflexão a respeito dos movimentos sociais que emergiam no final da ditadura. Sua obra teve impacto político, tendo influenciado, nos seus primeiros anos, o Partido dos Trabalhadores (PT), do qual foi secretário-geral. Foi importante para que a esquerda, sob o impacto do autoritarismo, valorizasse a democracia, tema sobre o qual escreveu. Depois de ser ministro da Cultura de Fernando Henrique Cardoso, estudou ainda o pensamento político brasileiro. Em resumo, teve uma trajetória muito rica, em que a reflexão e a atuação política se mesclam.”
Já o professor Rogério Arantes relembra o contato que teve com Weffort ainda como estudante. “Morreu Francisco Weffort, um dos fundadores da moderna ciência política brasileira e um dos construtores do Departamento de Ciência Política da USP”, escreveu o docente em texto publicado também nas redes sociais. “Autor de várias obras importantes, ensinou toda uma geração a pensar a democracia e a tê-la como valor universal. Tenho várias lembranças dele, a mais especial é de ter sido seu aluno no primeiro ano da graduação. Weffort tinha um jeito encantador de expor as ideias políticas, que mesclava rigor e paixão, tudo que um aluno precisa quando está começando sua formação. Tive esse privilégio e devo a professores como ele o fato de estar aqui hoje, mirando seu exemplo e tentando fazer o melhor para a geração pela qual somos responsáveis.”
“Francisco Weffort era uma pessoa de uma generosidade e abertura intelectual incomparáveis”, recorda o professor Fernando Limongi. “Com Leôncio Martins Rodrigues, que também faleceu este ano, Weffort foi um dos responsáveis por construir o Departamento de Ciência Política da USP, do qual nunca se afastou, mesmo durante os anos mais repressivos da ditadura. Fui seu aluno e, até hoje, quase 40 anos depois, ainda me recordo das suas aulas, da sua clareza, de seu pensamento penetrante e inquietante. A meu juízo, sua contribuição intelectual mais duradoura e marcante foi o reconhecimento da limitação do marxismo para pensar a democracia política, expressa em seu livro Qual Democracia. O livro foi publicado em 1992, mas essa dimensão já estava presente em seu pensamento e prática política fazia algum tempo. Weffort, além disso, foi secretário-geral do PT por um bom tempo, em boa parte de seus anos de formação, contribuindo decisivamente para a adesão do partido ao jogo eleitoral democrático. Seu legado, portanto, é incomensurável. Pessoalmente, como muitos dos que se formaram sob sua influência, sinto-me órfão. Mais um mestre, como Leôncio Martins Rodrigues, que se foi.”
O professor André Singer, por sua vez, ressalta o valor que as análises de Weffort representaram para a identificação das classes sociais na política brasileira. “Weffort teve uma importância decisiva para a ciência política brasileira de dois pontos de vista”, explica. “Do ponto de vista institucional, durante o período mais difícil da ditadura militar, que começou após o AI-5, com pesquisadores de diferentes partes do Brasil, fez um esforço muito bem-sucedido no sentido da institucionalização da disciplina em nosso País. Em boa medida, nós devemos a atual estrutura institucional que a disciplina tem a lideranças como a do professor Weffort. Do ponto de vista intelectual, sua contribuição foi a de, a partir de uma análise muito original do populismo no Brasil, identificar o papel das classes sociais na política brasileira. Além disso, o professor Weffort articulou os problemas das classes sociais ao problema da construção da democracia no Brasil. Por fim, fez parte de uma tradição a que deu um desenvolvimento grande, a de pensar o socialismo democrático no Brasil”, conclui Singer.
FONTE: JORNAL DA USP
https://jornal.usp.br/cultura/weffort-mostrou-que-populismo-e-a-face-dependente-da-democracia/
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Revista Inteligência - Insight
O sorteio na democracia: uma alternativa viável – Revista Inteligência
https://inteligencia.insightnet.com.br/o-sorteio-na-democracia-uma-alternativa-viavel/
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Pesquisa Quaest/Genial
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há 2 dias
O Globo
Genial/Quaest: Lula tem 45% das intenções de voto em 1º turno, e Bolsonaro, 23% - Jornal O Globo
"Na pesquisa espontânea, em que os entrevistados dizem livremente o nome de quem votaria para presidente, Lula obtém 28%, Bolsonaro, 16%, e os demais concorrentes somam 4%. Quase metade, 48%, afirmaram estar indecisos, e 4% indicaram querer anular ou votar em branco."
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28 + 16 + 4 = 48
48 + 4 = 52
DATA DA PUBLICAÇÃO DA PESQUISA: 9 DE FEVEREIRO DE 2022
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Confira as principais datas do calendário eleitoral de 2022
Eleições serão realizadas no dia 2 de outubro; eventual segundo turno será no dia 30
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03.01.202213:35
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Resolução sobre o Calendário Eleitoral - 03.01.2022
Aprovada pelo Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Resolução nº 23.674/2021 disciplina o Calendário Eleitoral de 2022 com as principais datas a serem observadas pelos partidos e candidatos.
As eleições estão marcadas para o dia 2 de outubro, quando os brasileiros vão às urnas para eleger presidente da República, governadores, senadores e deputados federais, estaduais e distritais. Eventual segundo turno será realizado no dia 30 de outubro.
Alguns prazos já começaram a valer desde o dia 1º de janeiro, como a obrigatoriedade de registro de pesquisas eleitorais, a limitação de despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais e a proibição da distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios a cidadãs e cidadãos por parte da Administração Pública. Há exceção em casos de estado de calamidade ou emergência pública e programas sociais que já estavam em andamento.
Janela partidária
Entre 3 de março e 1º de abril, acontece a janela partidária, período em que deputadas e deputados federais, estaduais e distritais poderão trocar de partido para concorrer às eleições sem perder o mandato.
Registro de estatutos no TSE
Dia 2 de abril, seis meses antes do pleito, é data-limite para que todas as legendas e federações partidárias obtenham o registro dos estatutos no TSE. Este também é o prazo final para que todas as candidatas e candidatos tenham domicílio eleitoral na circunscrição em que desejam disputar as eleições e estarem com a filiação deferida pela agremiação pela qual pretende concorrer. Presidente da República, governadoras ou governadores de Estado e prefeitas ou prefeitos que pretendam concorrer a outros cargos em 2022 têm até esta data para renunciar aos respectivos mandatos.
Formação de coligações
O órgão de direção nacional do partido político ou federação devem publicar, do Diário Oficial da União (DOU), as normas para a formação de coligações nas eleições majoritárias até 5 de abril, 180 dias antes das eleições. Entre este dia e a data da posse das eleitas e dos eleitos, é vedado aos agentes públicos realizar reajuste de servidoras e servidores públicos que exceda a recomposição da perda de poder aquisitivo ao longo do ano da eleição.
Transferência do título
No dia 4 de maio, 151 dias antes do pleito, vence o prazo para que eleitoras e eleitores realizem operações de transferência do local de votação e revisão de qualquer informação constante do Cadastro Eleitoral. Quem tem mais de 18 anos e ainda não possui título eleitoral também tem até este dia para solicitar a emissão do documento pelo sistema TítuloNet.
Pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida que queiram votar em outra seção ou local de votação da sua circunscrição têm entre os dias 18 de julho e 18 de agosto de 2022 para informar a Justiça Eleitoral.
Quantitativo do eleitorado
Em 11 de julho, o Tribunal Superior Eleitoral publicará, na internet, o número oficial de eleitoras e eleitores aptos a votar. Esse número servirá de base para fins de cálculo do limite de gastos dos partidos e candidatos nas respectivas campanhas.
Teste de Confirmação do TPS e lacração dos sistemas
Entre os dias 11 e 13 de maio de 2022 acontece, na sede do TSE, em Brasília, o Teste de Confirmação. No evento, as investigadoras e os investigadores participantes do Teste Público de Segurança do Sistema Eletrônico de Votação (TPS), ocorrido no período de 22 a 27 de novembro do ano passado, voltam ao Tribunal para conferir se as soluções aplicadas pela equipe técnica foram suficientes para corrigir os achados encontrados durante a realização do TPS. No dia 30 de maio, o TSE publicará toda a documentação e as conclusões produzidas pela Comissão Avaliadora do TPS 2021.
Em 12 de setembro termina o prazo para que os sistemas eleitorais e programas de verificação desenvolvidos pelas entidades fiscalizadoras sejam lacrados, mediante apresentação, compilação, assinatura digital e guarda das mídias pelo TSE em Cerimônia de Assinatura Digital e Lacração dos Sistemas.
Financiamento coletivo
Em 15 de maio, pré-candidatas e pré-candidatos poderão iniciar a campanha de arrecadação prévia de recursos na modalidade de financiamento coletivo, desde que não façam pedidos de voto e obedeçam às demais regras relativas à propaganda eleitoral na internet.
Fundo Eleitoral
Dia 1º de junho marca o prazo final para que partidos políticos comuniquem ao TSE a renúncia ao Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). A quantia a ser disponibilizada deverá ser divulgada pelo TSE até 16 de junho.
Composição da mesa receptora de votos
Entre 5 de julho e 3 de agosto, juízas e juízes eleitorais nomearão eleitoras e eleitores que farão parte das mesas receptoras de votos e de justificativas. Também serão escolhidas as pessoas que darão apoio logístico nos locais de votação.
Convenções partidárias e registros de candidatura
Entre 20 de julho e 5 de agosto é permitida a realização de convenções partidárias para deliberar sobre coligações e escolher candidatas e candidatos à presidência da República e aos governos de Estado, bem como aos cargos de deputado federal, estadual e distrital. Legendas, federações e coligações têm até 15 de agosto para solicitar o registro de candidatura dos escolhidos. Todos os pedidos de registro aos cargos de presidente e vice-presidente devem ser julgados pelo TSE até 12 de setembro.
Propaganda eleitoral
Dia 12 de agosto é a data final para que o TSE publique tabela com a representatividade do Congresso Nacional, decorrente de eventuais novas totalizações do resultado das últimas eleições gerais efetivadas até 20 de julho de 2022, para fins de divisão do tempo de propaganda eleitoral gratuito no rádio, na televisão e também dos debates entre candidatas e candidatos. A realização de comícios, distribuição de material gráfico, caminhadas ou propagandas na internet passa a ser permitida a partir do dia 16 de agosto.
Data da eleição
O primeiro turno do pleito acontecerá no primeiro domingo de outubro, dia 2. Eventual segundo turno será realizado no dia 30 do mesmo mês. A votação começará às 8h e terminará às 17h, quando serão impressos os boletins de urna. Em 2022, a hora de início da votação será uniformizada pelo horário de Brasília em todos os estados e no Distrito Federal.
Prestação de contas
Partidos e candidatas ou candidatos têm entre 9 e 12 de setembro para apresentar a prestação de contas parcial da campanha, com registro de movimentação financeira ou estimável em dinheiro ocorrida desde o início da campanha até o dia 8 de setembro. A respectiva documentação será divulgada pelo TSE na internet no dia 15 de setembro. Dia 1º de novembro é a data final para o envio das prestações de contas referentes ao primeiro turno das eleições. A prestação de contas final daqueles que participarem do segundo turno devem ser encaminhadas à Justiça até 19 de novembro, 20 dias após o pleito.
Datas de diplomação e posse
Eleitas e eleitos serão diplomados pela Justiça Eleitoral até 19 de dezembro. Para os cargos de presidente e vice-presidente da República, bem como de governador, a posse ocorre em 1º de janeiro de 2023. Parlamentares assumem os mandatos em 1º de fevereiro do próximo ano.
Confira a íntegra do Calendário Eleitoral de 2022.
BA/CM, DM
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Gestor responsável: Assessoria de Comunicação
https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2022/Janeiro/confira-as-principais-datas-do-calendario-eleitoral-de-2022
Pesquisa Quaest/Genial: Lula tem 45%; Bolsonaro, 23%; Moro e Ciro, 7%
Levantamento mostra que 6 em 10 eleitores consideram escolha do voto definitiva
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Iuri Pittada CNN
São Paulo
09/02/2022 às 07:01 | Atualizado 09/02/2022 às 09:31
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O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lidera as intenções de voto com possibilidade de vitória em primeiro turno na corrida pelo Palácio do Planalto, de acordo com a mais recente pesquisa Quaest/Genial divulgada nesta quarta-feira (9).
O percentual obtido pelo petista supera numericamente a soma de seus adversários nos quatro cenários simulados, mas está dentro da margem de erro do levantamento.
Além disso, a pesquisa indica que mais da metade dos eleitores considera a escolha do voto definitiva, o que explicaria a consolidação do cenário registrado nos últimos meses e mantido sem variações significativas.
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Quaest/Genial: 49% reprovam consultoria de Moro e 51% não veem Lula inocentado por tríplex
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Os índices registrados por Lula variam entre 45% e 47%, conforme é reduzido o número de candidatos na disputa. Em todos os cenários, o petista é seguido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), que pontua entre 23%, na simulação mais pulverizada, e 26%, no quadro com menos postulantes.
Nenhum dos outros nomes incluídos no levantamento supera os dois dígitos.
Na pesquisa espontânea, em que os entrevistados dizem livremente o nome de quem votaria para presidente, Lula obtém 28%, Bolsonaro, 16%, e os demais concorrentes somam 4%. Quase metade, 48%, afirmaram estar indecisos, e 4% indicaram querer anular ou votar em branco.
No primeiro cenário estimulado, em que o entrevistador apresenta uma lista de candidatos, Lula lidera com 45%, seguido por Bolsonaro, com 23%. Sergio Moro (Podemos) e Ciro Gomes (PDT) empatam na terceira posição, com 7% cada.
João Doria (PSDB) e André Janones (Avante) também coincidiram nas intenções de voto, com 2%, e Simone Tebet (MDB) marcou 1%. Rodrigo Pacheco (PSD) e Felipe D’Ávila (Novo) não pontuaram, nulos e brancos somam 8%, e os indecisos são 5%. Assim, Lula marca 3 pontos percentuais a mais que a soma dos votos de seus adversários.
Intenção de voto para presidente no 1º turno – Cenário 1 – Estimulada
Lula (PT) – 45%
Bolsonaro (PL) – 23%
Moro (Podemos) – 7%
Ciro Gomes (PDT) – 7%
João Doria (PSDB) – 2%
André Janones (Avante) – 2%
Simone Tebet (MDB) – 1%
Rodrigo Pacheco (PSD) – 0%
Felipe d’Ávila (Novo) – 0%
Branco/nulo/não vai votar – 8%
Indecisos – 5%
No segundo cenário, todas as variações ocorrem dentro da margem de erro, de 2 pontos percentuais para mais ou para menos: Lula fica com 45%; Bolsonaro, 24%; Moro, 9%; Ciro, 8%; e Doria, 3%.
Quando Janones substitui o tucano, os índices dos quatro primeiros colocados se mantêm, e o mineiro marca 2%. Por fim, o quarto cenário, sem Moro, Lula vai a 47%; Bolsonaro, 26%; Ciro, 9%, e Janones, 3%. Nos três cenários, os indecisos são 4% e os nulos e brancos variam de 8% a 10%.
Intenção de voto para presidente no 1º turno – Cenário 2 – Estimulada
Lula (PT) – 45%
Bolsonaro (PL) – 24%
Moro (Podemos) – 9%
Ciro Gomes (PDT) – 8%
João Doria (PSDB) – 3%
Branco/nulo/não vai votar – 8%
Indecisos – 4%
Intenção de voto para presidente no 1º turno – Cenário 3 – Estimulada
Lula (PT) – 45%
Bolsonaro (PL) – 24%
Moro (Podemos) – 9%
Ciro Gomes (PDT) – 8%
André Janones (Avante) – 2%
Branco/nulo/não vai votar – 8%
Indecisos – 4%
Intenção de voto para presidente no 1º turno – Cenário 4 – Estimulada
Lula (PT) – 47%
Bolsonaro (PL) – 26%
Ciro Gomes (PDT) – 9%
André Janones (Avante) – 3%
Branco/nulo/não vai votar – 10%
Indecisos – 4%
Segundo turno
O instituto simulou cinco cenários de segundo turno, todos com vitória de Lula: sobre Bolsonaro (54% a 30%); Moro (52% a 28%); Ciro (51% a 24%); Doria (55% a 16%); e Janones (56% a 14%). O índice de nulos e brancos cresce respectivamente em cada uma dessas simulações, variando de 13% a 26%.
Cenário 1
Lula (PT) – 54%
Bolsonaro (PL) 30%
Branco/nulo/não vai votar – 13%
Indecisos – 3%
Cenário 2
Lula (PT) – 52%
Moro (Podemos) – 28%
Branco/nulo/não vai votar – 17%
Indecisos – 3%
Cenário 3
Lula (PT) – 51%
Ciro Gomes (PDT) – 24%
Branco/nulo/não vai votar – 22%
Indecisos – 4%
Cenário 4
Lula (PT) – 55%
João Doria (PSDB) – 16%
Branco/nulo/não vai votar – 26%
Indecisos – 3%
Cenário 5
Lula (PT) – 56%
André Janones (Avante) – 14%
Branco/nulo/não vai votar – 25%
Indecisos – 4%
Definição de voto
A Quaest também perguntou aos entrevistados o quanto a escolha de voto é definitiva. Quase 6 em cada 10 eleitores (58%) consideram sua decisão tomada, ante 40% que não descartam mudança caso algo aconteça.
E são justamente os dois líderes da pesquisa que registram, entre seus eleitores, os maiores índices de certeza de voto, o que torna ainda mais difícil o caminho para os candidatos que tentam quebrar a polarização entre Lula e Bolsonaro.
Dos eleitores do atual presidente, 65% disseram que a decisão é definitiva, ante 35% que afirmam poderem mudar caso ocorra algo inesperado. No caso do petista, a consolidação é ainda maior: 74% disseram que é uma escolha definitiva e 25% não descartam mudança se algo acontecer.
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Em seguida, Ciro registra 38% de eleitores convictos, mas 62% admitem mudar de ideia. Com Moro, a certeza é de 30% de seus eleitores e 70% os que não descartam alterar a decisão, índices próximos dos obtidos por Doria, com 27% de convictos e 73% admitindo possibilidade de mudança.
Foram entrevistados presencialmente 2 mil eleitores, de 16 anos ou mais, nas 27 unidades da Federação, entre os dias 3 e 6 de fevereiro. A margem de erro é de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos.
O nível de confiança é de 95% (se 100 pesquisas fossem realizadas, 95 apresentariam os mesmos resultados dentro da margem de erro). A pesquisa foi registrada na Justiça Eleitoral com o número BR-08857/2022.
Fotos – Veja os possíveis candidatos à Presidência da República em 2022
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1 de 11
Jair Bolsonaro, atual presidente da República, se filiou em 30 de novembro de 2021 ao Partido Liberal (PL). Veja outros possíveis candidatos a presidente em 2022
Crédito: Alan Santos/PR
2 de 11
Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente, governou o país entre 2003 e 2010 e deve se candidatar pelo PT
Crédito: ESTADÃO CONTEÚDO
3 de 11
Ciro Gomes, ex-governador do Ceará e ex-ministro da Fazenda e da Integração Nacional, candidato a presidente pelo PDT
Crédito: LUCAS MARTINS/PHOTOPRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
4 de 11
Sergio Moro, ex-juiz federal e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, pode se candidatar pelo Podemos, partido ao qual se filiou
Crédito: Marcos Corrêa/PR
5 de 11
João Doria, governador de São Paulo, ganhou as prévias do PSDB para a definição de pré-candidato e concorrerá em 2022 pelo partido
Crédito: FÁTIMA MEIRA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
6 de 11
Rodrigo Pacheco cumpre o primeiro mandato como senador por Minas, é presidente do Senado, acabou de trocar o DEM pelo PSD e pode entrar na corrida pelo Planalto
Crédito: Waldemir Barreto/Agência Senado
7 de 11
Simone Tebet cumpre o primeiro mandato como senadora por Mato Grosso do Sul e foi anunciada como a pré-candidata do MDB ao Planalto no dia 8 de dezembro de 2021
Crédito: Jefferson Rudy/Agência Senado
8 de 11
Alessandro Vieira cumpre o primeiro mandato como senador por Sergipe e pode ser candidato a presidente pelo Cidadania
Crédito: Jefferson Rudy/Agência Senado
9 de 11
Felipe d'Avila, pré-candidato do Partido Novo, à Presidência da República
Crédito: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO
10 de 11
O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta afirmou que seu nome continua à disposição do União Brasil para concorrer à Presidência da República
Crédito: José Dias/PR
11 de 11
O partido Avante oficializou no sábado, dia 29 de janeiro, a pré-candidatura à presidência de André Janones, que atualmente é deputado federal por Minas Gerais
Crédito: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados Fonte: Agência Câmara de Notícias
Debate
A CNN realizará o primeiro debate presidencial de 2022. O confronto entre os candidatos será transmitido ao vivo em 6 de agosto, pela TV e por todas as plataformas digitais.
Tópicos
André Janones
Ciro Gomes
Eleições 2022
Jair Bolsonaro
João Doria
Luiz Inácio Lula da Silva (Lula)
Pesquisa Genial/Quaest
Rodrigo Pacheco
Sergio Moro
Simone Tebet
https://www.cnnbrasil.com.br/politica/pesquisa-quaest-genial-lula-tem-45-bolsonaro-23-moro-e-ciro-7/
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• Lua Nova (50) • 2000 • https://doi.org/10.1590/S0102-64452000000200005 COPIAR
Sorteios e representação democrática
Choice by lot and democratic representation
Luis Felipe MiguelSOBRE O AUTOR
Resumos
Diferentes propostas de reintrodução da escolha por sorteio como forma de preencher funções políticas são estudadas. A seleção aleatória de legisladores ou governantes reduziria o impacto do poder econômico, permitiria uma representação mais fidedigna de grupos minoritários ou desprovidos de recursos políticos e promoveria o rodízio entre governantes e governados, impedindo a cristalização de uma elite oligárquica. No entanto, haveria perda de continuidade legislativa e, em especial, de responsividade dos governantes em relação aos governados. Apesar de suas debilidades, as propostas são úteis como forma de compreender os problemas da representação eleitoral e identificar suas causas.
representação política; mecanismos de representação; sorteio
Different proposals for the reintroduction of choice by lot as a way of performing political functions are studied. Selecting legislative or governing positions by chance would reduce the impact of economic power, would allow a more trustworthy representation of minority groups, and would prevent the rise of an oligarchy. However, there would occur a loss of legislative continuity and, specially, of accountability of the governing towards the governed. Despite their weak points those proposals are useful for a better understanding of the problems of electoral representation and for detecting their causes.
political representation; representation mechanisms; lot
FACES DA DEMOCRACIA
Sorteios e representação democrática*
Choice by lot and democratic representation
Luis Felipe Miguel
Professor do Departamento de Ciência Política da Universidade de Brasília UnB
RESUMO
Diferentes propostas de reintrodução da escolha por sorteio como forma de preencher funções políticas são estudadas. A seleção aleatória de legisladores ou governantes reduziria o impacto do poder econômico, permitiria uma representação mais fidedigna de grupos minoritários ou desprovidos de recursos políticos e promoveria o rodízio entre governantes e governados, impedindo a cristalização de uma elite oligárquica. No entanto, haveria perda de continuidade legislativa e, em especial, de responsividade dos governantes em relação aos governados. Apesar de suas debilidades, as propostas são úteis como forma de compreender os problemas da representação eleitoral e identificar suas causas.
Palavras-chave: representação política; mecanismos de representação; sorteio
ABSTRACT
Different proposals for the reintroduction of choice by lot as a way of performing political functions are studied. Selecting legislative or governing positions by chance would reduce the impact of economic power, would allow a more trustworthy representation of minority groups, and would prevent the rise of an oligarchy. However, there would occur a loss of legislative continuity and, specially, of accountability of the governing towards the governed. Despite their weak points those proposals are useful for a better understanding of the problems of electoral representation and for detecting their causes.
Keywords: political representation; representation mechanisms; lot
A representação política vive uma crise de legitimidade. Isto ocorre tanto em países como o Brasil, em que as instituições representativas foram restauradas há relativamente pouco tempo, quanto nas democracias "consolidadas" do hemisfério norte. Partidos tradicionais foram engolfados por escândalos de corrupção, como os democrata-cristãos italianos e alemães, os socialistas franceses, italianos e espanhóis ou os liberais japoneses. Padrões de lealdade partidária foram erodidos com rapidez, em especial após o colapso do sistema soviético, quando as disputas eleitorais deixaram de ser vistas como o momento de optar entre modelos significativamente diferentes de ordenamento social. Mas a "diferença" política renasce no outro extremo do espectro, com o crescimento, na Europa, de movimentos neofascistas e xenófobos, como a Frente Nacional francesa, de Le Pen, o Partido da Liberdade austríaco, de Jörg Haider, e a Liga do Norte italiana. Onde o voto é facultativo, a abstenção eleitoral bate recordes1. Nenhum destes indícios é, por si só, conclusivo; em conjunto, porém, sinalizam com bastante clareza o alheamento, em relação ao sistema político, de parcelas significativas das populações dos países com regime de tipo ocidental. Outro sintoma aparece no resultado de diversas pesquisas de opinião, em diferentes países, que mostram baixa confiança no políticos e no Parlamento2. Os cidadãos se sentem cada vez menos representados e nisto, precisamente, reside a crise da representação política.
Não se trata de um fenômeno passageiro, mas de um quadro que se agrava há cerca de quatro décadas. Um ponto-chave para entendê-lo é a consciência crescente de que os corpos de representantes não são representativos (como amostragem) do conjunto da representação. Há, na esmagadora maioria dos parlamentos do mundo, uma participação desproporcional de homens, integrantes da etnia dominante, proprietários, com educação superior e renda maior do que a média. Nunca foi diferente, e antes a disparidade era até maior: a novidade é o crescimento das manifestações de descontentamento com a situação. Entender esta desproporção como um grave problema político parece indicar a valorização daquilo que Anne Phillips chamou de "política da presença"3; isto é, a idéia de que os mecanismos eleitorais de accountability (responsividade dos eleitos perante seus eleitores) não são suficientes e que os grupos minoritários precisam estar representados fisicamente para que seus interesses sejam levados em conta.
Contra esta distorção na representação, uma solução que vem sendo adotada em inúmeros países, inclusive o Brasil, é a fixação de quotas de candidaturas em geral, obrigando os partidos a indicarem uma porcentagem mínima de mulheres candidatas. Os resultados efetivos têm variado de experiência para experiência, devido a diversos fatores, marcadamente as diferenças nos sistemas eleitorais. As quotas têm sido usadas também com o intuito de minorar a desigualdade de oportunidades no acesso ao mercado de trabalho e ao ensino superior, sobretudo nos Estados Unidos. A polêmica sobre a "ação afirmativa" é grande; seus críticos julgam que, sob o pretexto de favorecer a igualdade entre os grupos sociais, ela fere direitos individuais fundamentais.
Além disso, as quotas podem causar "efeitos colaterais" indesejados, que precisam entrar no cálculo a respeito da conveniência ou não de sua adoção. O mais importante deles é a perpetuação da relevância política das diferenças que pretende abolir. Isto é, quer-se gerar uma sociedade na qual sexo e cor da pele não sejam handicaps para se entrar no parlamento ou na universidade, mas, ao mesmo tempo, origem-se sexo e cor da pele como critérios prioritários de admissão. Por fim, as quotas se prestam bem à aplicação sobre variáveis discretas (sexo ou crença religiosa), mas não sobre variáveis contínuas (cor, classe social e renda, por exemplo)4.
Este artigo vai explorar uma outra espécie de proposta de superação dos problemas atuais da representação política, mais extrema e (exatamente por isto) até o momento não implementada. São projetos de substituição parcial das eleições por sorteios, que têm aparecido com freqüência na literatura anglo-americana recente. Do ponto de vista da organização política das democracias representativas, são extravagâncias; muitos deles são mesmo fantasistas e pouco exeqüíveis. Mas o fato da loteria estar sendo discutida a sério, por pensadores respeitados, revela o desencanto com o mecanismo eleitoral, visto como possuidor de vícios graves (sub-representação das minorias, oligarquização, susceptibilidade à influência do dinheiro, passividade dos governados) e que não podem ser sanados dentro dos marcos de sua própria lógica.
SORTE E MÉRITO
A rigor, trata-se do ressurgimento da idéia de sorteio, já que a seleção aleatória dos magistrados era regra corrente na democracia grega e permaneceu presente nas cidades-Estado republicanas italianas até o Renascimento. Longe de ser uma característica marginal, o sorteio era um dos traços definidores da democracia, tal como entendida desde os filósofos gregos até, pelo menos, o século 18. A frase de Montesquieu resume esta concepção: "O sufrágio pela sorte faz parte da natureza da democracia; o sufrágio por escolha, da natureza da aristocracia"5. Anos depois, Rousseau, pregando a democracia direta como forma de Estado, não hesitava em classificar como "aristocrático" o governo que preferia, e que era eletivo6.
Para alguns autores, a instituição do sorteio, na democracia grega, está ligada a suas crenças religiosas. A formulação clássica desta teoria foi dada, no século 19, por Fustel de Coulanges, para quem os cidadãos "persuadiam-se de que os deuses sempre lhes designavam os mais dignos quando faziam sair um nome da urna"7. Mas esta interpretação está desacreditada há muito tempo8. O sorteio dos governantes foi uma instituição laica, vinculada a dois postulados centrais para a concepção grega da democracia: a igualdade fundamental entre todos os homens e o princípio do rodízio entre governantes e governados, isto é, que cada cidadão deveria governar e ser governado, alternadamente.
Contra isto, ergueu-se a crítica platônica da democracia, sustentada na idéia de que existem diferenças significativas de competência entre os diversos indivíduos e que, portanto, a condução do governo deveria ser destinada aos melhores. Numa parábola famosa, Platão compara o Estado a um navio; na democracia, ele careceria de um bom comandante, ficando à mercê dos palpites dos simples marinheiros e da luta entre os grupos que disputam o poder9. Tratar-se-ia, portanto, de reconhecer que os homens são desiguais e de dazr o comando aos mais capacitados, deixando de lado a fantasia perniciosa da rotação entre governantes e governados.
Ao optarem pela eleição como forma de seleção dos governantes, os fundadores dos regimes eleitorais mostravam-se sensíveis à crítica platônica e introduziam um elemento aristocrático. Conforme demonstrou Bernard Manin, a "democracia representativa" não foi pensada como uma solução técnica para a impossibilidade da democracia direta em sociedades extensas, mas como forma de gerar um corpo governante superior, em qualidade, ao conjunto do povo uma aristocracia10. Isto não quer dizer que propostas de "representação descritiva"11, isto é, do corpo de representantes como uma miniatura perfeita do povo, não tenham surgido. Mas foram vozes minoritárias, seja nos debates sobre a Constituição dos Estados Unidos, seja na Constituinte francesa12.
Assim, no "Federalista nº 35", Hamilton expressa sua confiança na sub-representação das classes trabalhadoras: "Mecânicos e manufatureiros sempre estarão inclinados, com poucas exceções, a dar seus votos para comerciantes, de preferência a pessoas de suas próprias profissões ou ocupações"13. Outra formulação do princípio aristocrático aparece no "Federalista nº 57": "O objetivo de qualquer constituição política é, ou deve ser, primeiro, conseguir, para governantes, homens que possuam mais sabedoria para discernir, e mais virtude para perseguir o bem comum da sociedade"14.
Não há tensão entre a distinção de classe, presente na primeira citação, e a de sabedoria e virtude, na segunda: os autores seguramente acreditavam que as classes superiores eram mais sábias e mais virtuosas. Seja como for, o corpo de representantes é distinto do povo. É um corpo selecionado, onde se apresenta não um retrato da sociedade, mas aquilo que nela haveria de melhor. O regime representativo, portanto, seria superior à democracia direta. E possível, como faz Ellen Meiksins Wood, ler o argumento dos escritos federalistas pelo avesso da inteipretação corrente: não é a representação que é necessária porque a república é extensa, mas uma república extensa que é desejável por tornar a representação inevitável15.
A defesa da superioridade intrínseca do governo representativo vai culminar, no século 19, no pensamento de John Stuart Mill. Nele, são perceptíveis as tensões entre os aspectos democráticos e aristocráticos da combinação. Fiel à máxima utilitarista de que cada um é o melhor juiz dos próprios interesses, ele precisa dar espaço à participação política de todos. Por outro lado, há o medo da "tirania da maioria", que se traduz concretamente no "duplo perigo" causado pela predominância de trabalhadores manuais no eleitorado perigo do "padrão demasiadamente baixo da inteligência política" e da "legislação de classe"16. Assim, a representação deveria favorecer as minorias e, em especial, uma minoria específica: as classes proprietárias (e cultas).
Afastado o risco próprio à democracia, o sistema representativo poderia revelar todos os seus méritos, o mais importante dos quais seria o amplo desenvolvimento dos talentos individuais, proporcionado pela participação política (eleitoral). Ao se envolver nos debates públicos, para escolher seu representante, o cidadão comum sairia do casulo de seus negócios privados, ampliaria seus horizontes, ganharia um conhecimento maior da sociedade. Tudo isto repercutiria de maneira positiva na vida cotidiana. Os indivíduos se tornariam mais ativos e mais capazes. Por isso, a democracia representativa é, para Stuart Mill, a melhor forma de governo, mesmo que por vezes chegue a decisões errôneas e possa mostrar déficits de competência. Um despotismo esclarecido e bem-intencionado, mesmo que fosse possível garantir tais atributos, geraria apatia e passividade na população, já que todas as decisões viriam prontas de cima. Por outro lado, uma democracia direta, caso se pudessem superar os obstáculos físicos à sua consecução, tomaria demasiado tempo e energia dos cidadãos, impedindo que se dedicassem às atividades produtivas.
DO JÚRI AO APOCALIPSE
É no âmbito do poder judiciário que os sorteios continuam presentes, no funcionamento burocrático (distribuição dos processos, por exemplo) e, caso mais relevante, na instituição do júri popular. Herança da common law inglesa, o júri é adotado em diversas democracias contemporâneas, inclusive no Brasil. A Carta de 1988, seguindo a tradição constitucional brasileira, estatui o júri e lhe assegura "a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida" (art. 5º, XXXVIII, d). A idéia é que o acusado seja julgado por pessoas de sua própria comunidade, que compartilham de um mesmo código moral e não tenderiam, como os juizes profissionais, a um rigor excessivo. Montesquieu já observava que "é necessário que os juizes sejam da condição do acusado, ou seus pares, para que ele não possa imaginar que está à mercê de pessoas inclinadas a lhe fazerem violência"17. Também está presente a crença de que o bom senso, qualidade que todas as pessoas possuem, é suficiente para o discernimento da culpa e da inocência.
No entanto, a instituição do júri está longe de ser uma unanimidade. Seus críticos são sensíveis, em especial, ao argumento da competência. Classificado de julgamento "ditado pelo arbítrio e pela intuição cega", é contrastado ao do juiz profissional, "inspirado na lei e na razão, no direito e no conhecimento técnico"18. Ou, segundo a frase de efeito de Émile Faguet, "o Júri nada mais é do que o requinte do culto da incompetência"19. O cidadão comum seria incapaz de compreender a lei ou avaliar as evidências, sendo presa fácil da emocionalidade e do jogo teatral dos advogados.
Mas a vinculação dos júris com a crença democrática da igualdade de todos é, no mínimo, problemática. Há uma tensão entre a idéia de que os jurados devem ser representativos (no sentido amostrai) da população, ou, pelo contrário, serem "cidadãos exemplares"20. O Código de Processo Penal brasileiro, instituído em 1941, afirma que "os jurados serão escolhidos dentre cidadãos de notória idoneidade" (art. 436, caput), deixando a interpretação da expressão ao arbítrio do juiz-presidente do júri, que alista anualmente os jurados a serem sorteados, "sob sua responsabilidade e mediante escolha por conhecimento pessoal ou informação fidedigna" (art. 439, caput). Ao mesmo tempo em que exige a "notória idoneidade", a lei estabelece que "o exercício efetivo da função de jurado ...estabelecerá presunção de idoneidade moral", garantindo prisão especial e preferência nas concorrências públicas (art. 437).
O exercício da função de jurado é obrigatória para os cidadãos entre 21 e 60 anos, com isenção para certos profissionais e ocupantes de cargos públicos, além das "mulheres que não exerçam função pública e provem que, em virtude de ocupações domésticas, o serviço do júri lhes é particularmente difícil" (art. 436, § único, IX). Embora a lei seja omissa, são excluídos também surdos-mudos, cegos e analfabetos21. Trata-se, portanto, de uma escolha cuja aleatoriedade é bastante limitada. Em outros países, como a Grã-Bretanha, as relações de eleitores servem de base para o sorteio de jurados; neste caso, o viés na composição do júri tende a seguir o eventual viés do alistamento eleitoral22.
Existem outros casos em que a utilização do sorteio é considerada aceitável, em especial quando os bens a serem distribuídos não podem ser repartidos e a situação é de incerteza decisoria ou há a crença na igualdade dos participantes. É discutida sua implementação para resolver o problema da destinação de recursos médicos escassos23, o que pode parecer cruel, mas não o é mais do que a maneira habitual de alocar tais recursos, destinando-os a quem pode pagar e com a vantagem de ser mais eqüitativo. Outro exemplo extremo, mas ficcional, está no filme hollywoodiano "Impacto profundo", dirigido por Mimi Leder (1998). Diante de uma catástrofe anunciada, o choque de um cometa com a Terra, o governo estadunidense promove uma loteria nacional, envolvendo todos os cidadãos, para preencher 800 mil vagas em abrigos subterrâneos. Está subjacente a idéia de que todos possuíam igual direito à vida24 ou, caso contrário, que não haveria tempo hábil para fazer uma seleção justa dos mais merecedores ou que ninguém desejaria assumir a responsabilidade moral por tal escolha.
Num caso destes, o sorteio se mostra intuitivamente mais atraente do que outras formas de seleção. Basta contrastar a solução dada em Impacto profundo a outra fantasia apocalíptica, o romance clássico de ficção científica de Mordecai Roshwald, Plano sete25, uma crítica à guerra fria. Também se trata da distribuição de lugares em abrigos subterrâneos, desta vez no contexto de uma guerra atômica. Em vez de loteria, os lugares são atribuídos segundo a hierarquia social, com as classes dirigentes (a começar pelos chefes militares) sendo alojadas nos níveis mais profundos, mais confortáveis e mais seguros. O caráter elitista e antidemocrático do procedimento é evidente.
ACCOUNTABILITY E REPRESENTAÇÃO
As propostas contemporâneas de reintrodução da loteria como forma de escolha de governantes defrontam-se com três objeções básicas. A primeira, já vista, é a que repercute de maneira mais intensa no senso comum: a descrença na premissa democrática da igualdade entre todos. A segunda está ligada à idéia da eleição como autorização para que o representante aja em nome dos representados. A rigor, esta não é uma objeção muito séria, já que hoje se considera que a autorização é dada mesmo por aqueles que votaram nos candidatos derrotados. Ou seja, a participação no processo eleitoral significaria que há concordância quanto à justeza do processo de escolha, o que poderia valer também para o sorteio.
A terceira objeção se refere à accountability, isto é, o fato de que os representantes são responsáveis perante seus constituintes26. Ela seria eliminada se os governantes não devessem seus mandatos à vontade expressa da maioria da população, mas ao simples acaso. Seria grave a ausência da disputa eleitoral, em que os candidatos enunciam seus pontos de vista, e, sobretudo, da sanção facultada aos cidadãos, que é a possibilidade da não-recondução de seus representantes ao cargo.
Este é o ponto crucial, já que todas as propostas de reintrodução do sorteio estão ancoradas num mesmo diagnóstico: a inoperância (ou, pelo menos, insuficiência) dos mecanismos de accountability eleitoral. A busca da eleição e da reeleição não torna os políticos especialmente sensíveis à vontade do cidadão comum, e sim dos "grandes eleitores" controladores de máquinas políticas locais, grupos de mídia e financiadores de campanha. Por outro lado, o papel limitado que o sistema concede ao simples cidadão, condenado a dissolver seu voto em meio a milhares ou milhões de outros, não poderia promover a participação ativa visada por Stuart Mill, mas apenas, como de fato ocorreu, o desinteresse e a passividade27.
Com o sorteio, o escolhido deixa de depender dos grupos poderosos, que perderiam influência política. O contra-argumento é que, sem a sanção da não-reeleição, o governante estaria muito mais exposto às tentações da corrupção e do exercício do poder em benefício próprio. A resposta, em parte, estaria em outro benefício esperado do sorteio: o rodízio de cidadãos nos cargos de governo. Um dos problemas relacionados à democracia representativa é precisamente o fato de que os representantes, ao se especializarem nesta função, desenvolvem interesses particulares, diferentes daqueles de seus constituintes o fenômeno que, há quase 90 anos, Robert Michels chamou, com exagero retórico, de "a lei de ferro da oligarquia"28. Com a escolha ao azar, deixa de existir o político profissional. Cada mandato será, provavelmente, o único daquele indivíduo. Ou seja, seu interesse a médio e longo prazos não é o interesse do governante, mas do governado que em breve voltará a ser. Este era um elemento não-desprezível na arquitetura da pólis grega.
Com este rodízio nas funções públicas, aumentaria em muito o número daqueles que teriam alguma experiência de governo. Cada cidadão ou cidadã já teria cumprido um mandato ou estaria na expectativa de cumpri-lo. No seu ambiente de moradia e de trabalho, encontraria muitos outros na mesma situação. Isto geraria o interesse e a qualificação políticas, que se contrapõem à apatia e à passividade próprias dos regimes eleitorais.
Uma última vantagem da seleção aleatória é a garantia de representatividade (no sentido mimético) da população. Com base na lei dos grandes números, é possível afirmar que haverá uma proporcionalidade aproximada dos diferentes setores no corpo governante. A busca de uma proporcionalidade mais estrita, com a aplicação de técnicas de amostragem, coloca problemas idênticos aos das quotas, já que teriam que ser definidas a priori tanto as clivagens sociais relevantes quanto a alocação de cada indivíduo dentro dos grupos.
UM PARLAMENTO TÍPICO
As propostas para a incorporação do sorteio são variadas. Em algumas, trata-se apenas de incorporar um novo elemento lateral de aleatoriedade aos já existentes nos sistemas eleitorais atuais29. É o caso da proposta, nos Estados Unidos, de determinar pela sorte quais serão os primeiros eventos para a indicação dos candidatos à presidência, para evitar o impacto psicológico causado pelos resultados do caucus (convenção aberta) de Iowa e das primárias de New Hampshire30; ou de fixar ao azar a data das eleições, impedindo a manipulação do calendário das políticas públicas por parte dos governantes31. Em outras, é prevista uma transformação radical da sociedade, como na provocativa proposta de Barbara Goodwin, de fazer do sorteio o meio universal de alocação de recursos escassos, a começar pelas posições de poder e prestígio.
A autora observa que, hoje, tais recursos são "resolvidos" por mecanismos de mercado, em prejuízo sistemático dos mais pobres e mais fracos. Isto é, em si, o resultado de uma loteria a loteria do nascimento, que determina a posição inicial de cada indivíduo e, assim, em grande medida, suas chances na sociedade32. A instituição de um sorteio "às claras" e periódico seria mais justa para todos. Cargos públicos, riquezas materiais e empregos atraentes seriam distribuídos aleatoriamente (e por prazo determinado). Na visão de Goodwin, esse método é mais imparcial, dando a todos oportunidades idênticas. Ao mesmo tempo, como existiriam diferentes posições de poder, prestígio e prosperidade, estaria garantida a diversidade social, evitando os males de um igualitarismo extremado.
Para a discussão aqui empreendida, interessam mais as propostas com amplitude intermediária aquelas que introduzem elementos aleatórios significativos nos processos de seleção dos ocupantes das funções políticas. O caminho mais simples é o apresentado por Callenbach e Phillips, que propõem que a câmara baixa (nos Estados Unidos) seja composta por 435 cidadãos sorteados entre a população33. Isto garantiria a formação de um corpo de representantes que fosse "típico" do conjunto do povo, com a presença proporcional de seus diversos subgrupos, aí incluídos negros, mulheres e outros setores hoje sub-representados. A influência do dinheiro na escolha dos legisladores seria anulada.
Existe uma premissa, na proposta de Callenbach e Phillips (e na defesa da seleção por loteria, em geral), que merece discussão. Para eles, há uma identificação automática entre a posição social e os interesses que o indivíduo possui. Isto é, qualquer mulher que seja sorteada estará capacitada a falar em nome do conjunto das mulheres; qualquer negro representa os interesses dos negros e assim por diante. Na verdade, a própria idéia de que existem interesses objetivamente identificáveis, ligados às diversas posições sociais, é questionável. Mulheres, negros ou integrantes de qualquer outro grupo social, subalterno ou dominante, podem discordar sobre quais são seus reais interesses ou qual tipo de medida política os beneficia34. Falta à proposta, portanto, a reflexão sobre a construção das identidades coletivas. Sem um espaço no qual os grupos sociais possam pensar a si mesmos e às políticas que desejam, a legislatura aleatória não passará de um punhado de indivíduos atomizados.
Os autores se mostram conscientes de outros problemas associados à proposta. O rodízio de legisladores, próprio à escolha aleatória, provocaria perda de continuidade política. Mais grave, já que cada legislatura empossaria um time completo de novatos, a inexperiência coletiva seria enorme, ampliando o poder relativo da burocracia profissional um poder que reside precisamente em seu conhecimento especializado superior. Embora argumentem que tais problemas seriam menores, diante dos ganhos esperados com a educação política popular e a neutralização de influências espúrias, Callenbach e Phillips mantêm a disputa eleitoral para o Senado, além dos cargos executivos. Desta forma, os defeitos inerentes a cada um das formas de seleção (sorteio e eleição) seriam contrabalançados pela existência da outra casa legislativa, escolhida por um método diferente.
Mais cauteloso é o cientista político Robert Dahl, conhecido por seu conceito de "poliarquía" (regimes pluralistas, competitivos e abertos à participação) como a melhor aproximação possível ao ideal democrático de governo do povo. Dahl vem esboçando algumas alternativas para o aperfeiçoamento das poliarquías existentes; uma delas seria a criação do que chamou de "minipopulus" Como o nome já indica, seriam miniaturas da população, escolhidas por sorteio. Numa formulação da proposta, no livro Democracy and its Critics, haveria um minipopulus que decidiria a agenda de questões relevantes e uma série de outros que debateriam, cada, um dos temas indicados. Sua abrangência poderia ser local, regional ou nacional, sem custos operacionais significativos ou grandes transtornos para seus integrantes, já que as reuniões seriam via telecomunicações. Da mesma forma, especialistas e funcionários públicos poderiam ser consultados, reduzindo o nível de incompetência decisória associado à seleção lotérica. Dahl imagina que cada minipopulus seria integrado por mil cidadãos e que o prazo de um ano para alcançar uma decisão seria razoável.
Nesta formulação, é esclarecido apenas que a instituição dos minipopulus não é vista "corno um substituto dos corpos legislativos, mas como um complemento"35. Uma explicação mais detalhada é apresentada em After the Revolution?, onde os corpos escolhidos por sorteio são descritos como órgãos consultivos vinculados aos funcionarios eleitos de todos os níveis, no executivo e no legislativo36. Ou seja, seu poder decisorio é nulo. A eleição permanece como a forma fundamental de alocação de poder político.
No entanto, Dahl havia avançado a tese contestável e ingênua de que o veredito determinado pelo minipopulus, auxiliado pelos experts que estariam à sua disposição, "seria o veredito do próprio demos, se o demos fosse capaz de levar em conta o melhor conhecimento disponível para decidir quais políticas eram mais apropriadas para alcançar os fins que visasse"37. Neste caso, porque não dar a ele a força da lei? Dahl responde alegando a reduzida competência dos cidadãos sorteados, o que é contraditório com a afirmação anterior; a ineficiência de conselhos tão numerosos e que, também devido à inexperiência política, demandariam muito tempo para chegar a resultados; e o risco de uma seleção desviante, que pode ser estatisticamente desprezível, mas é real38.
Em suma, trata-se de uma proposta tímida, que restringe o papel do sorteio para preservar a accountability dos governantes em relação aos governados. Os órgãos consultivos, com integrantes escolhidos de forma aleatória, serviriam sobretudo de contraponto às assembléias eletivas, detentoras de poder. O divórcio entre os resultados dos trabalhos de uns e outras estaria demonstrando o distanciamento entre a elite política e a população que ela deveria representar. Mas isto poderia ser interpretado tanto como um sintoma da oligarquização desta elite, que defenderia interesses diferentes daqueles de seus constituintes, quanto como um sinal de sua superior competência para tratar dos assuntos políticos, cuja sutileza e complexidade não são acessíveis ao cidadão comum.
A "VOTAÇÃO LOTÉRICA"
Uma mistura engenhosa de sorteio e votação foi proposta por Akhil Reed Amar sob o nome de "votação lotérica" (lottery voting)39. Trata-se de um modelo destinado a favorecer a representação de minorias que estejam dispersas geograficamente, mantendo, quanto ao resto, o sistema eleitoral vigente nos Estados Unidos, o chamado "voto distrital" (eleição majoritária em circunscrições uninominais). O voto distrital prejudica tais minorias, já que um determinado grupo, mesmo que seja bastante significativo, pode ficar sem nenhum representante, caso não seja majoritário em nenhum distrito. Para remediar o problema, às vezes se utiliza o gerrymandering, a prática de redesenhar as circunscrições eleitorais para gerar uma determinada maioria; nos EUA, foi o expediente experimentado para acomodar grupos raciais40. Mas a legitimidade de tal procedimento é maculada por seu excessivo artificialismo e caráter manipulatório. Sua história está mais associada à busca da criação de feudos eleitorais inexpugnáveis por chefes políticos locais do que ao intento, mais simpático, de proteger minorias.
Pela votação lotérica, há primeiro uma eleição e em seguida um sorteio, no qual cada candidato tem tantas chances quantos votos recebeu. Isto é, se um determinado candidato obteve 30% dos votos, terá 30% de chance de ser sorteado. Em alguns casos, candidatos minoritários seriam declarados vitoriosos, mas, no cômputo geral, a estatística nos diz que a composição da assembléia estaria próxima da representação proporcional. Se, em cem distritos, os candidatos do grupo X obtiveram 30% dos votos, é de esperar que, no final, cerca de 30 candidatos deste grupo estejam entre os cem sorteados.
O principal resultado é a representação justa das minorias eleitorais. Mas a votação lotérica também gera novos incentivos à participação eleitoral, pelo simples fato de que cada voto passa a contar. O candidato que sabe contar com 51% dos eleitores não pode se sentir seguro da vitória; pelo contrário, precisa ampliar sua margem, para aumentar suas chances. Ou seja, ele também precisará levar em conta as minorias, para conquistá-las. Da mesma forma, o eleitor que sabe antecipadamente que seu candidato preferido possui a maioria (ou, pelo contrário, não tem como alcançá-la) não sente seu voto como inútil41. A racionalidade da apatia eleitoral, devido ao peso insignificante do eleitor individual, que Olson procurou demonstrar42, seria minada pela votação lotérica.
Com base nas características de seu modelo, Amar afirma que a votação lotérica é uma forma de representação proporcional. Cabe indagar, então, porque não adotar a representação proporcional tradicional, que ele chama de "votação cumulativa"43. Ele faz um balanço das vantagens relativas dos dois sistemas, reconhecendo que a votação lotérica diminui a possibilidade de reeleição de legisladores, o que reduz o acúmulo de experiência no parlamento e este viés atingiria em especial os pequenos partidos. Além disso, gera descompasso entre voto e representação, já que um eleitor cujo candidato preferido não é sorteado em seu distrito seria "compensado" pela escolha de outro candidato, do mesmo grupo, porém em outro local.
Mas as vantagens do modelo são, aos olhos do autor, compensadoras. A votação cumulativa, com suas amplas circunscrições plurinominais, exige campanhas eleitorais custosas e fortes máquinas partidárias. A votação lotérica, ao contrário, preservaria as vantagens do voto distrital, como a relação mais próxima entre os candidatos e os eleitores locais. Amar destaca, em especial, as "implicações teóricas" (melhor seria dizer "simbólicas") de seu projeto, que chama a atenção para as noções de que "todos os votos devem contar igualmente, de uma forma que não ocorre hoje; que uma maioria local de 51% não dá direito a vencer 100% do tempo; e que representantes atualmente eleitos muitas vezes não representam 'o povo' de seus distritos locais, mas apenas uma parte"44.
Dada a intenção de gerar proporcionalidade entre os diferentes grupos, o sistema é aplicável a todo o tipo de órgão colegiado, mas não para as chefias dos poderes executivos afinal, o risco do sorteio eventual de um único "excêntrico" para o governo é bem maior do que o do sorteio de uma maioria de "excêntricos" num parlamento45. O autor também alerta para a possibilidade do modelo degenerar em pura loteria, com todos os eleitores apresentando suas próprias candidaturas e tendo, cada um, apenas o próprio voto. A solução seria a fixação de uma barreira de exclusão, determinando que só seriam elegíveis para o sorteio aqueles candidatos que tivessem obtido um percentual mínimo de sufrágios. Este percentual precisaria ser baixo, para não comprometer o efeito desejado de promoção da representação política dos setores minoritários.
A proposta de Amar objetiva estimular a participação eleitoral e dar às minorias uma representação mais justa. Entretanto, outros problemas, que as propostas mais "ortodoxas" de sorteio pretendem sanar, permanecem intocados. A votação lotérica é, como qualquer outra votação, sensível ao poder do dinheiro. E não há a preocupação de contrabalançar os efeitos dos preconceitos sociais que fazem com que grupos da população sejam sub-representados mesmo sob sistemas de representação proporcional como, por exemplo, as mulheres.
Além disso, existem candidaturas, o que exclui de antemão da seleção um grande número de pessoas: aquelas que não querem se candidatar. Trata-se de um problema significativo, no âmbito das propostas de loteria. A candidatura voluntária certamente viciaria a representatividade mimética do corpo legislativo. Haveria uma presença excessiva de indivíduos politizados, militantes e ativos; ou, sob um ponto de vista mais negativo, de carreiristas, ambiciosos e oportunistas. Aliás, um dos atrativos da seleção aleatória é reduzir o peso destas pessoas nas esferas de decisão política como na história de ficção científica The songs of distant Earth, de Arthur C. Clarke, na qual o chefe de Estado era escolhido por sorteio, mas todos os que almejavam o cargo eram previamente desqualificados46.
A candidatura voluntária também tende a excluir os indivíduos que introjetam sua pretensa incapacidade política e, portanto, julgam-se impossibilitados para qualquer participação mais ativa; em especial, as mulheres e os trabalhadores47. No entanto, a inclusão obrigatória na loteria poderia produzir uma legião de governantes que, além de inexperientes, seriam desmotivados e desinteressados. Mais ainda, feriria aquilo que Hannah Arendt chamou de "liberdade em relação à política", isto é, o direito de não participar da vida política48.
DEMOCRACIA DELIBERATIVA
Parte importante das propostas de loteria está ligada a uma corrente da teoria democrática aquela que, a partir de uma crítica às limitações das "democracias realmente existentes", enfatiza a necessidade de debate público sobre as questões políticas, como forma de gerar deliberações coletivas justas e bem fundadas. Nas palavras de um dos principais divulgadores da corrente, Joshua Cohen, a democracia se realiza quando as decisões políticas são tomadas por aqueles que estarão submetidos a elas, através do "raciocínio público livre entre iguais"49. O principal inspirador da corrente é o filósofo alemão Jürgen Habermas, cuja teoria do agir comunicativo apresenta o consenso oriundo da discussão livre e racional como única forma de legitimação das normas sociais.
O viés utópico da obra de Habermas é apontado com freqüência. O padrão comunicativo ideal que ele propõe despreza aspectos relevantes da interação real entre indivíduos nas sociedades humanas. Habermas afirma a igualdade entre os participantes da discussão, mas, na prática, o acesso a ela é determinado pela posse de competências específicas, desigualmente distribuídas. Na situação ideal, a identidade do falante deve ser irrelevante para a consideração que é concedida a seu discurso, ou seja, o reconhecimento social e o acesso a recursos econômicos e políticos não devem pesar, o que também é irrealista. Além disso, os interesses associados à situação do indivíduo na sociedade não devem influenciar suas posições, já que ele deve agir com base numa racionalidade pura. Por fim, a ênfase habermasiana na obtenção do consenso não leva em conta a possibilidade de conflito entre valores divergentes e irredutíveis uns aos outros o que é, no entanto, uma das características fundantes da modernidade50.
Do ponto de vista da busca de modelos que orientem uma prática democrática renovada, são outros, talvez, os principais problemas da teoria de Habermas: seu elevado grau de abstração e o fato de apresentar, sempre, a comunicação face-a-face como modelo. Ou seja, há uma completa desatenção aos problemas de escala existentes nas democracias de massa contemporâneas e que tornam obrigatórias formas de mediação, seja através da mídia, seja através da representação política. Cohen admite que, diante da objeção de que a noção de deliberação pública é incompatível com as condições políticas atuais, nada tem a responder, pois trata-se de uma objeção incompatível com o "nível de generalidade" da teoria51.
As propostas de operacionalização da democracia deliberativa como as de Barber, Fishkin e Burnheim, que são analisadas abaixo precisam enfrentar, em primeiro lugar, estes problemas de escala. As duas soluções mais freqüentes, e que muitas vezes aparecem combinadas, são a utilização das novas tecnologias de comunicação, que solucionariam a questão da reunião de milhares ou milhões de pessoas num mesmo espaço físico (mas não resolveriam outro problema crucial, o tempo da discussão), e o sorteio, que reduziria o demos a um número pequeno o suficiente para que se instaurasse a comunicação interpessoal direta. Está sempre presente, ao menos de forma implícita, a crença expressa por Dahl, e citada acima, de que as decisões resultantes da discussão na amostra são idênticas àquelas que o conjunto da população tomaria, caso pudesse deliberar.
O aumento da capacidade deliberativa dos sorteados ocorreria a expensas do restante da população. Não é difícil prever que o método levaria ao declínio ainda maior da discussão política entre os cidadãos comuns, já que suas opiniões de nada valeriam nem mesmo para decidir o voto em algum candidato. É possível esperar um fosso entre as decisões "esclarecidas" da amostra e a opinião comum. Os ganhos na educação política, portanto, dependeriam por completo do rodízio nas funções de governo.
Entre as tentativas de operacional ização da "democracia deliberativa" abordadas neste artigo, a que concede menor espaço para o sorteio é a de Benjamin Barber, cientista político e ex-assessor do presidente Bill Clinton. Partindo de uma polêmica contra os teóricos conservadores, como Samuel Huntington, que apontavam a "ingovernabilidade das democracias", ele afirma que a crise atual ocorre porque existe pouca (e não excessiva) democracia. Seu projeto é o de gerar uma "democracia forte", com ampla presença popular na política. O primeiro passo seria reformar as premissas sobre a natureza humana e a política, que na democracia liberal são antidemocráticas', egoístas, individualistas e elitistas. Por isso, para a democracia liberal, os valores democráticos são "provisórios, opcionais e condicionais", subordinados a fins privados52.
Contra isso, Barber se propõe o desafio de todos os democratas radicais, desde Rousseau e Marx: nutrir a comunidade sem destruir a autonomia individual53. Não interessa, aqui, discutir o grau em que sua proposta vence este desafio; apesar de todas as afirmações eloqüentes em contrário, sua "democracia forte" parece ter dificuldade em enfrentar conflitos de interesses e tende para o paroquialismo. Embora o autor classifique-a de "democracia direta"54, trata-se de uma proposta de política participatória, sem abolição de mecanismos representativos, inclusive eletivos, e com ênfase na criação de um sentido de comunidade. Para tanto, ele destaca a importância da livre discussão coletiva, com abertura para a compreensão das posições opostas55, de uma maneira que ecoa a ação comunicativa de Habermas. A forma-padrão da manifestação política nas democracias liberais, o voto secreto, é condenada por furtar a decisão do eleitor ao debate público56. Aqui, Barber remete aos argumentos de Stuart Mill, para quem o voto secreto limitava o papel educativo, fundamental no processo eleitoral, e favorecia a busca egoísta dos interesses privados, em vez do bem comum57
A "democracia forte" seria estabelecida sobre assembléias de vizinhança, com ampla participação direta, e encontros televisionados que as interligariam58. É fácil perceber que Barber busca um sucedâneo para a esfera pública burguesa do século 18, descrita (e idealizada) por Habermas, na qual os cidadãos discutiam os assuntos públicos nos cafés e os jornais serviam de elo de ligação entre os diversos espaços de debate59. A partir daí, as decisões seriam tomadas através de um modelo plebiscitario complexo, com múltiplas escolhas que envolveriam a exposição dos motivos, realizados em dois turnos, com seis meses de distância entre si, para que a reflexão sobre a questão pudesse amadurecer60. O autor propõe ainda programas de serviço cívico (ou militar) universal, formas de democracia no local de trabalho (embora se esclareça que a propriedade privada não será ameaçada)61 e medidas de renovação urbanística e arquitetônica, com o objetivo de gerar um espaço comunitário atraente62.
Neste modelo, o sorteio cumpre uma função apenas secundária. Barber reconhece as qualidades da seleção aleatória, citando a neutralização do poder do dinheiro, a melhor distribuição das responsabilidades cívicas e o engajamento de um número maior de pessoas nos negócios públicos. Mas restringe sua aplicação a assembléias regionais e agências de poder local que não exijam grande conhecimento especializado63. Portanto, a "democracia forte" mostra permanecer sensível à crítica platônica relativa à desigualdade das competências. A loteria, outra vez, é encarada como sendo uma forma de promover educação política, mais do que de alocação efetiva de poder político.
A proposta de James Fishkin é bem menos ambiciosa que a de Barber, mas nela o sorteio ocupa uma posição mais central. Seu objetivo é aprimorar a representação política, fortalecendo os constituintes, sem fazer declinar o desempenho do sistema político. Segundo Fishkin, existe um dilema: ou as decisões são tomadas de forma igualitária, pela massa, que é incompetente, ou de forma competente, pela elite, mas com desigualdade64. A solução seria a instituição da "pesquisa de opinião deliberativa". Enquanto a pesquisa de opinião comum indica aquilo que o povo pensa65, a deliberativa indicaria aquilo que o povo pensaria, se pudesse refletir sobre as questões66.
Seriam sorteados cidadãos que reproduzissem, em seu conjunto, as características demográficas da população. A eles seriam fornecidas as condições materiais para que estudassem e debatessem as diversas questões da agenda política. Assim, diz Fishkin, a pesquisa de opinião deliberativa uniria a igualdade uma vez que, devido às técnicas de amostragem, todos teriam as mesmas chances de serem escolhidos ao debate intensivo face-a-face.
No entanto, como o nome já indica, não há a intenção de dotar estes corpos deliberativos de poder: são pesquisas de opinião. A idéia é fazer com que, depois de um período de reflexão e debate, os integrantes da amostra possam discutir os problemas nacionais com os candidatos às indicações à Presidência pelos partidos políticos. Televisionados, os debates com os candidatos poderiam influenciar nos resultados das eleições primárias. Também proporcionariam um meio de contato direto entre a elite dirigente e os cidadãos comuns um contato efetivo, com troca de idéias e argumentos, ao contrário da ilusão de conexão entre o povo e os líderes, criada pelos meios de comunicação de massa67.
Fishkin não esconde seu mal-estar com a democracia de massas atual, com sua comunicação direta, unidirecional e demagógica, via mídia, entre governantes e governados. Julga que o modelo atual não permite mais do que uma reflexão superficial sobre os temas da agenda política e promove a incompetência decisória, funcionando como um plebiscito permanente, dada a influência das sondagens de opinião sobre as ações do governo e dos parlamentares68. Sua proposta, portanto, visa reduzir o peso da população despreparada sobre nas decisões políticas, gerando uma amostra aleatória que, possuindo tempo e recursos, vai qualificar a si mesma para o debate público.
É uma proposta "realista", exeqüível o autor critica alternativas mais arrojadas, como a de John Burnheim, por seu utopismo69 e, talvez por isso mesmo, com menor impacto transformador. Em janeiro de 1996, foi realizada, nos Estados Unidos, a National Issues Convention, uma "pesquisa de opinião deliberativa" nos moldes preconizados por Fishkin e voltada para as eleições presidenciais daquele ano70. Ela não obteve nenhuma repercussão perceptível nas eleições primárias ou, adiante, no pleito presidencial.
O realismo de Fishkin contrasta com o radicalismo da transformação proposta pelo australiano John Burnheim. Seu projeto elimina o Estado, as fronteiras nacionais, as administrações centralizadas e os corpos representativos. Em seu lugar, coloca uma intrincada rede de agências especializadas, com integrantes escolhidos por sorteio, que discutiriam questões específicas e teriam diferentes jurisdições territoriais.
Ele começa com a denúncia de que, na prática, não existem regimes democráticos; são, no máximo, "oligarquias eletivas com fortes elementos monárquicos"71. A caracterização não é nova, mas a indicação do culpado é mais original: é o direito de voto. Segundo Burnheim, hoje os indivíduos têm o direito de contribuir para a decisão de questões que não lhes dizem respeito. Isto é, a camponesa elege um deputado que vai deliberar sobre as condições de trabalho nas fábricas; o morador de uma cidade elege um governador que vai construir uma ponte a centenas de quilômetros de distância. Este direito de votar em questões que não interessam ao indivíduo seria a base para a utilização do voto como barganha e, portanto, da degeneração da idéia de vontade popular.
Assim, o primeiro passo seria a eliminação dos poderes políticos tradicionais legislativos que legislam sobre tudo, executivos com autoridade sobre um determinado território. Em vez disso, Burnheim propõe a criação de inúmeras agências especializadas, que se coordenariam entre si e substituiriam as agências multifuncionais hoje existentes (de nações-Estado a municipalidades). Para cada questão polêmica na sociedade, haveria uma agência, cuja tarefa seria chegar a uma solução para aquele ponto e então encerraria suas atividades. Torna-se claro que as fronteiras fixas de nações, estados ou municípios também desapareceriam, pois um problema poderia interessar a parte do Brasil, outro ao Brasil todo e parte da Argentina, outro a partes de Brasil e Argentina etc. O modelo é batizado de "demarquia".
As agências teriam seus integrantes sorteados, mas sorteados apenas entre aquelas pessoas que tivessem interesse objetivo e direto na questão. Assim, Burnheim nos incita a substituir o "ilusório controle" do eleitor sobre o representante, bem como a agregação cega de votos irrefletidos, em eleições e referendo, pela igualdade de chances de ser selecionado como participante ativo na tomada de decisões sobre os problemas realmente relevantes do ponto de vista individual72. É de se notar que, contra a visão liberal clássica da representação, Burnheim diz que são representados os interesses, não os indivíduos, o que justifica a exclusão dos "desinteressados". De forma curiosa, ele combina esta ênfase no interesse, único salvo-conduto que torna legítima a participação na tomada de decisões, com a valorização do debate racional, própria do ideal democrático-deliberativo, que em sua fonte a obra de Habermas está associado justamente à idéia de discussão desinteressada.
A escolha por loteria é uma necessidade da demarquia', já que a existência de múltiplas agências decisorias geraria um excesso de eleitorados diferentes e de votações. O resultado seria que os eleitores estariam ainda mais desmotivados e desinformados sobre as opções em jogo73. O sorteio proposto, porém, é complexo. O primeiro passo seria a realização de uma sondagem (amostrai) sobre cada questão relevante, para saber como se distribuem as opiniões dentro da população. A partir daí, excluem-se os que se dizem desinteressados da questão. Quanto aos outros, verifica-se quais são as proporções entre as diferentes opiniões e sorteia-se um grupo que respeite esta proporcionalidade. A amostra vai estudar o assunto, debater entre si, negociar concessões mútuas e tomar decisões.
Burnheim está consciente dos problemas das pesquisas de opinião, que colhem respostas impensadas e, portanto, pouco representativas. Mas, no caso, estes problemas não teriam grande impacto, já que a pesquisa seria apenas um "exercício exploratório"; depois, os verdadeiros tomadores de decisão poderiam pensar à vontade e, o que é mais importante, pensar coletivamente74. Estes argumentos, por si só, já afirmariam a superioridade da demarquia sobre a idéia de democracia plebiscitária. Na verdade, todo o argumento platônico é voltado, por Burnheim, contra as democracias atualmente existentes e em defesa de sua proposta.
Em contraste com a prática democrática existente, a demarquia não assume que a maioria da população está em posição de fazer avaliações com base razoável sobre todas os principais temas de governo ou mesmo de calcular os méritos de elites rivais competindo por votos. O que ela assume é que a maior parte das pessoas, se confrontadas com questões concretas limitadas sobre assuntos que as afetam diretamente, são capazes de alcançar uma compreensão suficiente, sobre os temas, para fazer escolhas sensatas75.
Na medida do possível, os representantes sorteados devem ser voluntários, sinal de que vão se dedicar à questão e de que têm, de fato, interesse nela. Assim, uma etapa intermediária do processo é alistar os candidatos, para depois proceder ao sorteio. Cada voluntário teria que declarar qual opinião está defendendo (a princípio, já que as posições podem e devem mudar com a discussão). Para evitar má-fé, Burnheim observa que eles devem ser judicialmente responsabilizados, caso não ajam de acordo com o que diziam defender76. Com isso, ressurge apesar de seus protestos em contrário a idéia de accountability: quem iria denunciar o mau representante, senão alguém que se coloca na posição de constituinte? E o Estado, que deveria ter acabado, reencarna na figura de um judiciário poderoso, que controla a atuação dos integrantes das diferentes agências especializadas e compatibiliza suas decisões, que podem ser contraditórias.
Burnheim se mostra mais atento aos problemas que sua proposta de transformação radical da sociedade (em especial, o sorteio) apresenta. Justamente por isso, seu modelo é intrincado, combinando diversos procedimentos para neutralizar os inconvenientes que trariam caso estivessem isolados: sondagens de opinião de caráter plebiscitário, sorteio, voluntariado, órgãos de controle e arbitração, deliberação coletiva. O resultado parece pouco funcional, sobretudo na ausência, como deseja o autor, de um aparato burocrático.
A BUSCA DE ALTERNATIVAS
As propostas de reintrodução do sorteio são encaradas, em geral, como irrealistas e utópicas, quando não bizarras e insensatas. Num movimento notável, a eleição, que da Antigüidade até o século 18 era a marca da aristocracia, hoje é quase um sinônimo de democracia. Eliminar ou reduzir o papel dos mecanismos eleitorais, portanto, feriria de morte as instituições democráticas. Este artigo procurou mostrar que os projetos de loteria, por extravagantes que sejam em relação às práticas políticas atuais, merecem atenção. Einstein escreveu, certa vez, que "se, à primeira vista, a idéia não é absurda, então não há esperança para ela". As idéias absurdas de seleção aleatória de governantes nos ajudam a ver melhor as limitações e os problemas das democracias eletivas, e até a procurar por soluções.
Isto não quer dizer que as alternativas propostas sejam viáveis ou convenientes. Na verdade, sua fragilidade é patente. O sorteio que funcionava na democracia grega era uma instituição entre outras, com as quais se combinava. Em Atenas, o sorteio gerava um efetivo rodízio nos cargos públicos, com a participação de virtualmente todos os cidadãos. Estima-se que um em cada dois cidadãos teria participado da boulé a magistratura decisiva, pois fixava a agenda da assembléia popular pelo menos uma vez na vida77. Num país como o Brasil, seria diferente. Considerando o eleitorado de 1998 (com mais de 106 milhões de eleitores), uma expectativa de vida de 70 anos e mantendo o número de cadeiras e os mandatos da Câmara dos Deputados e do Senado, o brasileiro teria uma chance em 14745 de ocupar, por uma vez, uma cadeira no Congresso. A possibilidade de alcançar uma das 1405 vagas nas assembléias estaduais também seria pequena, inferior a 0,02% ou seja, a esmagadora maioria da população estaria excluída do rodízio no poder ou, então, fadada à política paroquial.
Mais importante ainda, a democracia grega era uma democracia direta. Este fato possui pelo menos três implicações relevantes para a presente discussão. Em primeiro lugar, a assembléia popular era, muito mais do que a participação eventual nos cargos públicos, o local da educação política78. Em segundo lugar, o contato direto e imediato entre magistrados e cidadãos comuns ampliava a capacidade de controle por parte dos últimos79. Fossem sorteados ou eleitos (como os chefes militares), os magistrados precisavam prestar contas à assembléia popular e estavam submetidos a seu voto de desconfiança. Não faltava, assim, uma forma de accountability ao modelo ateniense.
A rigor, o poder político permanecia nas mãos da assembléia, com os magistrados, eleitos ou sorteados, cumprindo funções administrativas80. O contrário do que ocorre hoje, quando praticamente todas as propostas de loteria, dos tímidos órgãos consultivos de Dahl ao projeto mais radical de Callenbach e Phillips, deixam de fora o poder executivo. Há, aqui, tanto a permanência da desconfiança sobre a igualdade de competências81 quanto uma consciência mais clara a respeito da diversidade dos interesses existentes na sociedade, que pode ser refletida num corpo colegiado, mas não num cargo individual. Cabe lembrar que o direito de cidadania, na Grécia, era restrito, dele ficando excluídos escravos, metecos e mulheres. Embora pudessem ocorrer importantes conflitos de interesse entre os cidadãos, como de fato acontecia, eles formavam um grupo relativamente uniforme, ao menos diante da maioria da população, excluída da esfera publica.
Por fim, o fato de que a assembléia popular retinha o poder político permitia, no modelo grego, o exercício da liderança política82. Todos possuíam direito igual à fala na assembléia (o princípio da isegoria, crucial para a democracia grega), mas uma minoria efetivamente o utilizava. Os oradores cumpriam a função de liderança, garantindo a continuidade política e o acúmulo de experiência. Mas não formavam uma elite dirigente, pois o poder decisorio permanecia com o conjunto dos cidadãos.
Fora deste arcabouço institucional e social, o sorteio perde muito de seu sentido. Avultam os riscos que ele carrega: queda de continuidade e de responsividade, aumento do poder das burocracias, como reconhecem mesmo seus defensores mais ardorosos83. Mas as propostas de utilização das loterias são úteis por destacar muitas das mazelas das "democracias realmente existentes". De fato, os mecanismos de responsividade dos representantes perante seus constituintes são insatisfatórios. De fato, as decisões políticas são monopolizadas por uma pequena elite, cujo perfil costuma ser muito distinto do restante da população. De fato, o processo eleitoral é viciado pela influência excessiva do poder econômico. De fato, a base primeira de legitimação do regime o sentimento do cidadão de estar sendo representado está corroída. E, de fato, as democracias eleitorais são construídas sobre a negação da premissa democrática da igualdade entre todos.
Alguns dos autores aqui discutidos apenas propõem que o sorteio complemente ou substitua parcialmente a eleição como forma de escolha de representantes; é o caso de Dahl, Callenbach e Phillips, Amar e Fishkin. Outros o integram num projeto de reforma mais amplo, como Barber e Burnheim; Goodwin sugere sua adoção em muitas outras esferas além da política. Em todos os casos, a loteria é apresentada como uma maneira vigorosa e econômica de afirmar a igualdade entre os cidadãos, de promover a rotação na ocupação dos cargos públicos, de dar voz às pessoas comuns, de equilibrar a presença dos diferentes grupos sociais nas esferas de poder e de reduzir a influência política do dinheiro.
Outras medidas poderiam resolver ou minorar cada um destes problemas. Quotas de representação podem melhorar a participação de grupos politicamente minoritários. Restrições à reeleição, inclusive para o legislativo, contribuiriam para impedir a formação de estratos oligárquicos. Uma legislação severa de financiamento público de campanhas obstaculizaría a ação do poder econômico. Apenas o sorteio, porém, parece capaz de prover soluções a todos estes aspectos, simultaneamente. Ele seria o método ideal para promover a redistribuição do capital político, isto é, da capacidade da tomada de decisões públicas e a concentração deste capital está na raiz da crise das democracias representativas.
No entanto, a ausência de compromisso do sorteado em relação àqueles que deveria "representar" torna a alternativa pouco atraente. Em escala local, onde há a possibilidade de controle direto por parte da população, a seleção aleatória talvez possa alcançar resultados interessantes. Para além disso, significa abrir mão do fiapo de soberania popular que os regimes competitivos ainda conservam. Mesmo diante dos benefícios que a seleção lotérica possa trazer, parece um preço alto demais para ser pago.
O drama da política contemporânea é que há, ao mesmo tempo, uma crise da representação e a impossibilidade de retorno a formas de democracia direta. Para sociedades tão extensas, populosas, complexas e plurais como as de hoje, o sorteio de governantes e legisladores também não parece ser a saída. Mas, ao menos, as propostas para sua adoção sinalizam com clareza os principais defeitos da organização representativa atual, assinalando, com correção, a desconcentração do capital político como o desafio fundamental a ser superado. Frágeis como sejam, elas são tentativas de repensar a organização da democracia, em vez de optarem pela solução mais fácil e palatável de promover a acomodação.
1 Nas eleiçőes presidenciais de 1996, nos Estados Unidos, menos da metade dos cidadăos em idade de votar compareceram ŕs urnas, o que parece indicar que se desceu mais um patamar numa tendęncia iniciada na década de 1960 (dados do site "Dave Leip's atlas of U.S. presidential elections", no endereço http:// uselectionsatlas.org). Para dados sobre outros países desenvolvidos, ver Manuel Castells. O poder da identidade. Trad, de Klauss Brandini Gerhardt. Săo Paulo. Paz e Terra, 1999, pp. 401-8.
2 Embora sejam, por vezes, encarados como uma "verdade" já pronta, os resultados de tais pesquisas precisam ser interpretados com cuidado. De qualquer forma, săo um indício eloqüente do alheamento político. No caso brasileiro, para a manifestaçăo do sentimento de que os políticos năo representam os interesses de seus eleitores, ver os dados em José Álvaro Moisés, Os brasileiros e a democracia. S. Paulo: Ática, 1995, p. 207.
Para dados referentes aos Estados Unidos, ver David B. Magleby e Kelly D. Patterson, "Congressional reform". Public Opinion Quaterly. vol. 58, nş 3. Chicago, 1994, pp. 419-27 (ver tabelas ŕs pp. 423-4).
3 Anne Phillips, The Politics of Presence. Oxford: Oxford University Press, 1995.
4 Para uma discussăo sobre este ponto, ver Anne Phillips, Democracy and Difference. University Park: The Pennsylvania State University Press, 1993, p. 100.
5 Montesquieu, De I'esprit des lois, livro II, capítulo II; cito de CEuvres complčtes, t. II. Paris: Gallimard, 1951, p. 242.
6 Jean-Jacques Rousseau, Du contraí social, livro III, capítulo V; cito de (Euvres completes, t. III. Paris: Gallimard, 1964, pp. 406-7.
7 Fustel de Coulanges, A cidade antiga. Trad, de Fernando de Aguiar. 4Ş ed. S. Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 198.
8 Bernard Manin, The Principles of Representative Government. Cambridge: Cambridge University Press, 1997, pp. 26-7.
9 Platăo, A República, 488a-e; cito da traduçăo de Carlos Alberto Nunes. Belém: UFPA, 1988, pp. 248-9.
11 Ver, sobre a questăo, o livro seminal de Bernard Manin, citado. É possível dizer que a representaçăo proporcional, que encontraria importantes advogados a partir do século 19, em especial Stuart Mill (e, no Brasil, José de Alencar), é "descritiva", na medida em que se propőe ser urna amostra, razoavelmente exata, da divisăo das opiniőes no seio do eleitorado. No entanto, permanece a indiferença quanto ŕ similaridade de composiçăo social entre o corpo de representantes e seus constituintes. Aliás, o próprio Stuart Mill propunha a adoçăo de artifícios que garantissem a super-representaçăo das minorias instruídas (cf. John Stuart Mill, Consideraçőes sobre o governo representativo. Trad, de E. Jacy Monteiro. 3Ş ed. S. Paulo: Ibrasa, 1995, pp. 116-21).
12 O conceito remete a Hanna Fenichel Pitkin, The Concept of Representation. Berkley: University of California Press, 1967; ver o capítulo 4, "Standing for: descriptive representation" (pp. 60-91).
13 Alexander Hamilton, James Madison e John Jay, The Federalist. Chicago: Encyclopaedia Britannica, 1990, p. 113.
15 Ellen Meiksins Wood, Democracy against Capitalism: Renewing Historical Materialism. Cambridge: Cambridge University Press, 1995, p. 216.
16 John Stuart Mill, Consideraçőes sobre o governo representativo. Trad, de E. Jacy Monteiro. 3Ş ed. S. Paulo: Ibrasa, 1995, p. 115.
18 José Frederico Marques, A instituiçăo do júri, vol. 1. S. Paulo: Saraiva, 1963, p. 5.
19Apud Alcides de Mendonça Lima, "Júri: instituiçăo nociva e arcaica". Revista Forense, nş 196. Rio de Janeiro, 1961, pp. 16-24 (citaçăo ŕ p. 19).
20 Sobre a questăo, ver Barbara Goodwin, Justice by Lottery. Chicago: The University of Chicago Press, 1992, pp. 163-7;
Akhil Reed Amar, "Chosing representatives by lottery voting". The Yale Law Journal, vol. 93, nş 7. New Haven, 1984, pp. 1287-8;
Jon Elster, Salomonic Judgements. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, pp. 93-103.
25 Mordecai Roshwald, Plano sete. Trad, de Alfredo Margando. Lisboa: Livros do Brasil, s.d. A ediçăo original é de 1959.
26 Deixo de levar em conta, aqui, a distinçăo que paite da literatura especializada faz entre accountability e responsividade (responsiveness); ver Adam Przeworski, Susan C. Stokes e Bernard Manin, "Introduction", em id. (eds.), Democracy, Accountability, and Representation. Cambridge: Cambridge University Press, 1999, pp. 9-10.
27 Pelo menos desde os anos 1940, com os trabalhos de Schumpeter e Lazarsfeld, há o reconhecimento da indiferença, "típica" do eleitor comum. A interpretaçăo dada ao fato varia: é um efeito da "natureza humana", um componente necessário ŕ estabilidade do sistema político (que, de outra forma, seria excessivamente tensionado) ou, numa leitura mais crítica, a conseqüęncia de certos vieses estruturais deste mesmo sistema. Para dua diferentes abordagens desta última corrente, ver Pierre Bourdieu, La distinction. Paris: Minuit, 1979, cap. 8: "Cultures et politique",
e Claus Offe, "Dominaçăo de classe e sistema político: sobre a seletividade das instituiçőes políticas", em Problemas estruturais do Estado capitalista. Trad, de Barbara Freitag. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.
28 Robert Michels, Sociologia dos partidos políticos. Trad, de Arthur Chaudon. Brasília: Editora UnB, 1982, sobretudo a sexta parte (pp. 215-43).
30 A proposta é do ex-vice-presidente Walter Mondale. Apud James S. Fishkin, Democracy and Deliberation: New Directions for Democratic Reforms. New Haven: Yale University Press, 1991, p. 10.
33 Ernest Callenbach e Michael Phillips, A Citizen Legislature. Berkeley: Banyan Tree, 1985.
34 Eleni Varikas, "Refundar ou reacomodar a democracia? Reflexőes críticas acerca da paridade entre os sexos". Estudos Feministas, vol. 4, nş 1. Rio de Janeiro. 1996, pp. 65-94; ver pp. 79-81.
35 Robert A. Dahl, Democracy and its Critics. New Haven: Yale University Press, 1989, p. 340.
36 Robert A. Dahl, After the Revolution? Authority in a Good Society. Revised edition. New Haven: Yale University Press, 1990, pp. 122-3.
38 Dahl, After the revolution?, cit., pp. 122-5. Cabe observar que, fora pequenas correçőes de forma, Dahl optou por manter inalterada a seçăo sobre sorteio na ediçăo revisada de seu livro. Cf. a versăo original: Robert A. Dahl, After the Revolution? Authority in a Good Society. New Haven: Yale University Press, 1970, pp. 149-53.
42 Mancur Olson, The logic of Collective Action: Public Goods and the Theory of Groups. Cambridge (MA): Harvard University Press, 1965.
43 A rigor, o "voto cumulativo" é um sistema eleitoral majoritário, de voto múltiplo, utilizado por mais de um século no Estado de Illinois (ver José Antônio Giusti Tavares, Sistemas eleitorais nas democracias contemporâneas. Rio de Janeiro: Relume-Damará, 1994, p. 91).
47 Evidęncia relativa ŕ França é apresentada e discutida em Pierre Bourdieu, La distinction: critique sociale du jugement. Paris: Minuit, 1979, capítulo 8, "Culture et politique" (pp. 463-541).
48 Para uma discussăo sobre o ponto, ver David Held, Models of Democracy. 2nd edn. Stanford: Stanford University Press, 1996, pp. 325-6.
49 Joshua Cohen, "Democracy and liberty", em Jon Elster (ed.), Deliberative Democracy. Cambridge: Cambridge University Press, 1998, p. 186.
50 Outros autores suavizam ou eliminam a busca do consenso. Manin sustenta que o importante năo é o acordo unânime, mas a ampla participaçăo na discussăo, que legitima a decisăo escolhida (Bernard Manin, "On legitimacy and political deliberation". Political Theory, vol. 15, nş 3. Newbury Park, 1987, pp. 338-68).
51 Joshua Cohen, "Deliberation and democratic legitimacy", em James Bohman e William Rehg (eds.), Deliberative Democracy: Essays on Reason and Politics. Cambridge (MA): The MIT Press, 1997, p. 84.
52 Benjamin R. Barber, Strong Democracy: Participatory Politics for a New Age. Berkeley: University of California Press, 1990, p. 4.
59 Jürgen Habermas, Mudança estrutural da esfera pública. Trad, de Flávio R. Kothe. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984, capítulo II, "Estruturas sociais da esfera pública" (pp. 42-74).
64 James S. Fishkin, Democracy and Deliberation: New Directions for Democratic Reform. New Haven: Yale University Press, 1991, pp. 1-2.
65 Ou nem isso: indica apenas respostas a um questionário. Ver Pierre Bourdieu, "L'opinion publique n'existe pas", em Questions de sociologie. Paris: Minuit, 1984.
70 Para uma discussăo dos aspectos técnicos do evento, ver Daniel M. Merkle, "The National Issues Convention deliberative poll". Public Opinion Quaterly, vol. 60, nş 4. College Park, 1996, pp.588-619.
71 John Burnheim, Ąs Democracy Possible? The Alternative to Electoral Politics. Berkeley: University of California Press, 1985, p. 1.
78 M. I. Finley, Politics in the Ancient World. Cambridge: Cambridge University Press, 1991, pp. 28-9.
79 M. I. Finley, Democracia antiga e moderna. Trad, de Waldéa Barcellos e Sandra Bedran. Rio de Janeiro: Graal, 1988, pp. 30-1.
*
Este artigo se beneficiou da leitura atenta e das observações acuradas do parecerista anônimo de
Lua Nova, a quem agradeço. Também sou reconhecido a Regina Dalcastagnè, pelos comentários sobre todo o texto, e a Claudia Peixoto e Liliane Lustosa Pierre, pelas referências sobre o funcionamento dos tribunais de júri. As falhas e omissões permanecem sendo de minha inteira responsabilidade.
1
Nas eleições presidenciais de 1996, nos Estados Unidos, menos da metade dos cidadãos em idade de votar compareceram às urnas, o que parece indicar que se desceu mais um patamar numa tendência iniciada na década de 1960 (dados do
site "Dave Leip's atlas of U.S. presidential elections", no endereço
http:// uselectionsatlas.org
). Para dados sobre outros países desenvolvidos, ver Manuel Castells.
O poder da identidade. Trad, de Klauss Brandini Gerhardt. São Paulo. Paz e Terra, 1999, pp. 401-8. No Brasil, mesmo com a obrigatoriedade do voto, a abstenção no primeiro turno das eleições gerais de 1998 alcançou 21,49%; somando-se a ela os votos brancos e nulos, 36,17% dos eleitores registrados declinaram do direito de escolher o presidente da República.
2
Embora sejam, por vezes, encarados como uma "verdade" já pronta, os resultados de tais pesquisas precisam ser interpretados com cuidado. De qualquer forma, são um indício eloqüente do alheamento político. No caso brasileiro, para a manifestação do sentimento de que os políticos não representam os interesses de seus eleitores, ver os dados em José Álvaro Moisés,
Os brasileiros e a democracia. S. Paulo: Ática, 1995, p. 207. Para dados referentes aos Estados Unidos, ver David B. Magleby e Kelly D. Patterson, "Congressional reform".
Public Opinion Quaterly. vol. 58, nº 3. Chicago, 1994, pp. 419-27 (ver tabelas às pp. 423-4).
3
Anne Phillips,
The Politics of Presence. Oxford: Oxford University Press, 1995.
4
Para uma discussão sobre este ponto, ver Anne Phillips,
Democracy and Difference. University Park: The Pennsylvania State University Press, 1993, p. 100.
5
Montesquieu,
De I'esprit des lois, livro II, capítulo II; cito de
CEuvres complètes, t. II. Paris: Gallimard, 1951, p. 242.
6
Jean-Jacques Rousseau,
Du contraí social, livro III, capítulo V; cito de
(Euvres completes, t. III. Paris: Gallimard, 1964, pp. 406-7. O Estado proposto por Rousseau é uma democracia direta porque reside no povo, sem intermediários ou representantes, o poder de fazer as leis; para ele, o governo é apenas um órgão executivo.
7
Fustel de Coulanges,
A cidade antiga. Trad, de Fernando de Aguiar. 4ª ed. S. Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 198.
8
Bernard Manin,
The Principles of Representative Government. Cambridge: Cambridge University Press, 1997, pp. 26-7.
9
Platão,
A República, 488a-e; cito da tradução de Carlos Alberto Nunes. Belém: UFPA, 1988, pp. 248-9. O mesmo tipo de argumento aparece em outro diálogo platônico, o
Protagoras.
10
Manin, op. cit.; ver, em especial, o capítulo 3, "The principle of distinction" (pp. 94-131).
11
Ver, sobre a questão, o livro seminal de Bernard Manin, citado. É possível dizer que a representação proporcional, que encontraria importantes advogados a partir do século 19, em especial Stuart Mill (e, no Brasil, José de Alencar), é "descritiva", na medida em que se propõe ser urna amostra, razoavelmente exata, da divisão das
opiniões no seio do eleitorado. No entanto, permanece a indiferença quanto à similaridade de composição social entre o corpo de representantes e seus constituintes. Aliás, o próprio Stuart Mill propunha a adoção de artifícios que garantissem a super-representação das minorias instruídas (cf. John Stuart Mill,
Considerações sobre o governo representativo. Trad, de E. Jacy Monteiro. 3ª ed. S. Paulo: Ibrasa, 1995, pp. 116-21).
12
O conceito remete a Hanna Fenichel Pitkin,
The Concept of Representation. Berkley: University of California Press, 1967; ver o capítulo 4, "Standing for: descriptive representation" (pp. 60-91).
13
Alexander Hamilton, James Madison e John Jay,
The Federalist. Chicago: Encyclopaedia Britannica, 1990, p. 113.
14
id., pp. 176-7. O texto é atribuido a Hamilton ou Madison.
15
Ellen Meiksins Wood,
Democracy against Capitalism: Renewing Historical Materialism. Cambridge: Cambridge University Press, 1995, p. 216.
16
John Stuart Mill,
Considerações sobre o governo representativo. Trad, de E. Jacy Monteiro. 3ª ed. S. Paulo: Ibrasa, 1995, p. 115.
17
Montesquieu, op. cit., livro XI, capítulo VI (p. 399 da edição indicada).
18
José Frederico Marques,
A instituição do júri, vol. 1. S. Paulo: Saraiva, 1963, p. 5.
19
Apud Alcides de Mendonça Lima, "Júri: instituição nociva e arcaica".
Revista Forense, nº 196. Rio de Janeiro, 1961, pp. 16-24 (citação à p. 19).
20
Sobre a questão, ver Barbara Goodwin,
Justice by Lottery. Chicago: The University of Chicago Press, 1992, pp. 163-7; Akhil Reed Amar, "Chosing representatives by lottery voting".
The Yale Law Journal, vol. 93, nº 7. New Haven, 1984, pp. 1287-8; Jon Elster,
Salomonic Judgements. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, pp. 93-103.
21
Marques, op. cit., p. 91.
22
Goodwin, op. cit., p. 164.
23
Elster, op. cit., p. 73.
24
Em termos, já que outros 200 mil lugares haviam sido destinados, de antemão, para as elites políticas, militares, científicas e intelectuais. E só eram qualificados para o sorteio os menores de 50 anos, em função da necessidade de repovoar o planeta após a colisão.
25
Mordecai Roshwald,
Plano sete. Trad, de Alfredo Margando. Lisboa: Livros do Brasil, s.d. A edição original é de 1959.
26
Deixo de levar em conta, aqui, a distinção que paite da literatura especializada faz entre
accountability e responsividade
(responsiveness); ver Adam Przeworski, Susan C. Stokes e Bernard Manin, "Introduction", em id. (eds.),
Democracy, Accountability, and Representation. Cambridge: Cambridge University Press, 1999, pp. 9-10.
27
Pelo menos desde os anos 1940, com os trabalhos de Schumpeter e Lazarsfeld, há o reconhecimento da indiferença, "típica" do eleitor comum. A interpretação dada ao fato varia: é um efeito da "natureza humana", um componente necessário à estabilidade do sistema político (que, de outra forma, seria excessivamente tensionado) ou, numa leitura mais crítica, a conseqüência de certos vieses estruturais deste mesmo sistema. Para dua diferentes abordagens desta última corrente, ver Pierre Bourdieu,
La distinction. Paris: Minuit, 1979, cap. 8: "Cultures et politique", e Claus Offe, "Dominação de classe e sistema político: sobre a seletividade das instituições políticas", em
Problemas estruturais do Estado capitalista. Trad, de Barbara Freitag. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.
28
Robert Michels,
Sociologia dos partidos políticos. Trad, de Arthur Chaudon. Brasília: Editora UnB, 1982, sobretudo a sexta parte (pp. 215-43).
29
Entre os elementos aleatórios presentes no processo eleitoral brasileiro, por exemplo, estão a determinação do número de identificação dos partidos e, dentro destes, dos candidatos às eleições proporcionais; a ordem de aparição dos partidos e coligações na propaganda eleitoral no rádio e na TV; e (onde não há urna eletrônica) o ordenamento dos nomes na cédula de votação.
30
A proposta é do ex-vice-presidente Walter Mondale.
Apud James S. Fishkin,
Democracy and Deliberation: New Directions for Democratic Reforms. New Haven: Yale University Press, 1991, p. 10.
31
A. Lindbeck,
apud Jon Elster, op. cit., p. 91.
32
Goodwin, op. cit., p. 178.
33
Ernest Callenbach e Michael Phillips,
A Citizen Legislature. Berkeley: Banyan Tree, 1985.
34
Eleni Varikas, "Refundar ou reacomodar a democracia? Reflexões críticas acerca da paridade entre os sexos".
Estudos Feministas, vol. 4, nº 1. Rio de Janeiro. 1996, pp. 65-94; ver pp. 79-81.
35
Robert A. Dahl,
Democracy and its Critics. New Haven: Yale University Press, 1989, p. 340.
36
Robert A. Dahl,
After the Revolution? Authority in a Good Society. Revised edition. New Haven: Yale University Press, 1990, pp. 122-3.
37
Dahl,
Democracy and its critics, cit., p. 340.
38
Dahl,
After the revolution?, cit., pp. 122-5. Cabe observar que, fora pequenas correções de forma, Dahl optou por manter inalterada a seção sobre sorteio na edição revisada de seu livro. Cf. a versão original: Robert A. Dahl,
After the Revolution? Authority in a Good Society. New Haven: Yale University Press, 1970, pp. 149-53.
39
Amar, op. cit., pp. 1283-308.
40
Ver A. Phillips,
The politics of presence, cit., capítulo 4, "Race-conscious districting in the USA" (pp. 85-114).
41
Amar, op. cit., p. 1299.
42
Mancur Olson,
The logic of Collective Action: Public Goods and the Theory of Groups. Cambridge (MA): Harvard University Press, 1965.
43
A rigor, o "voto cumulativo" é um sistema eleitoral majoritário, de voto múltiplo, utilizado por mais de um século no Estado de Illinois (ver José Antônio Giusti Tavares,
Sistemas eleitorais nas democracias contemporâneas. Rio de Janeiro: Relume-Damará, 1994, p. 91). Amar, no entanto, usa a expressão em sentido diferente, para se referir à representação proporcional tradicional.
44
Amar, op. cit., p. 1301.
45
Id., p. 1303.
46
Apud Goodwin, op. cit., p. 159.
47
Evidência relativa à França é apresentada e discutida em Pierre Bourdieu,
La distinction: critique sociale du jugement. Paris: Minuit, 1979, capítulo 8, "Culture et politique" (pp. 463-541).
48
Para uma discussão sobre o ponto, ver David Held,
Models of Democracy. 2nd edn. Stanford: Stanford University Press, 1996, pp. 325-6.
49
Joshua Cohen, "Democracy and liberty", em Jon Elster (ed.),
Deliberative Democracy. Cambridge: Cambridge University Press, 1998, p. 186.
50
Outros autores suavizam ou eliminam a busca do consenso. Manin sustenta que o importante não é o acordo unânime, mas a ampla participação na discussão, que legitima a decisão escolhida (Bernard Manin, "On legitimacy and political deliberation".
Political Theory, vol. 15, nº 3. Newbury Park, 1987, pp. 338-68). Para Elster, uma solução de compromisso pode servir de alternativa ao consenso (Jon Elster, "Introduction", em id. (ed.),
Deliberative Democracy, cit., p. 6).
51
Joshua Cohen, "Deliberation and democratic legitimacy", em James Bohman e William Rehg (eds.),
Deliberative Democracy: Essays on Reason and Politics. Cambridge (MA): The MIT Press, 1997, p. 84.
52
Benjamin R. Barber,
Strong Democracy: Participatory Politics for a New Age. Berkeley: University of California Press, 1990, p. 4. A primeira edição do livro é de 1984.
53
Id., p. 114.
54
Id., p. 141.
55
Id., p. 174.
56
Id., p. 188.
57
Stuart Mill, op. cit., pp. 134-5.
58
Barber, op. cit., pp. 267 e 273.
59
Jürgen Habermas,
Mudança estrutural da esfera pública. Trad, de Flávio R. Kothe. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984, capítulo II, "Estruturas sociais da esfera pública" (pp. 42-74).
60
Barber, op. cit., pp. 286-8.
61
Id., p. 305.
62
Id., pp. 305-6.
63
Id., pp. 290-2.
64
James S. Fishkin,
Democracy and Deliberation: New Directions for Democratic Reform. New Haven: Yale University Press, 1991, pp. 1-2.
65
Ou nem isso: indica apenas respostas a um questionário. Ver Pierre Bourdieu, "L'opinion publique n'existe pas", em
Questions de sociologie. Paris: Minuit, 1984.
66
Fishkin, op. cit., p. 81.
67
id., p. 91.
68
Id., p. 47.
69
Id., p. 98.
70
Para uma discussão dos aspectos técnicos do evento, ver Daniel M. Merkle, "The National Issues Convention deliberative poll".
Public Opinion Quaterly, vol. 60, nº 4. College Park, 1996, pp.588-619.
71
John Burnheim,
¡s Democracy Possible? The Alternative to Electoral Politics. Berkeley: University of California Press, 1985, p. 1.
72
Id., p. 9.
73
Id., p. 110.
74
Id., pp. 111-2.
75
Id., p. 16.
76
Id., p. 111.
77
Manin,
The Principles of Representative Government, cit., p. 30.
78
M. I. Finley,
Politics in the Ancient World. Cambridge: Cambridge University Press, 1991, pp. 28-9.
79
M. I. Finley,
Democracia antiga e moderna. Trad, de Waldéa Barcellos e Sandra Bedran. Rio de Janeiro: Graal, 1988, pp. 30-1.
80
Manin,
The Principles of Representative Government, cit., p. 15.
81
Barbara Goodwin observa que qualquer limitação no alcance dos sorteios indica a permanência de dúvidas quanto ao argumento democrático da igualdade e a aceitação de valores elitistas (Goodwin, op. cit., p. 160).
82
Finley,
Democracia antiga e moderna, cit., capítulo 1, "Líderes e liderados", pp. 17-53.
83
Goodwin, op. cit., pp. 158-9.
Datas de Publicação
Publicação nesta coleção
02 Jun 2010 Data do Fascículo
2000
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