Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
quinta-feira, 6 de novembro de 2025
Não, Senhor Advogado
A Polícia Federal, o Poder Judiciário e a Supremacia Constitucional
Por Cristiano Lima
Jurista / Professor de Direito Constitucional / Advogado
Introdução
Não, Senhor Advogado — a Constituição Federal de 1988 não prevê que a Polícia Federal (PF) realize investigações “a mando do Judiciário” de forma direta ou hierárquica.
A Polícia Federal exerce, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União, mas atua sob a direção da autoridade policial (Delegado de Polícia Federal), por iniciativa própria ou mediante requisição do Ministério Público.
O Poder Judiciário, por sua vez, não comanda investigações; sua função é garantir direitos fundamentais e autorizar medidas que impliquem restrição de direitos, como interceptações telefônicas, prisões cautelares e buscas e apreensões.
🖼️ Legenda da imagem:
Representação esquemática da hierarquia das normas no ordenamento jurídico brasileiro, destacando a supremacia da Constituição Federal sobre o Código de Processo Penal e os decretos. A ilustração também simboliza a atuação harmônica e independente entre a Polícia Federal, o Ministério Público e o Poder Judiciário, conforme os princípios constitucionais analisados neste artigo.
1. Atribuições Constitucionais da Polícia Federal
O artigo 144, §1º, da Constituição Federal estabelece que a Polícia Federal tem, entre suas atribuições, “exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União” e apurar infrações penais contra bens, serviços e interesses da União.
A função de polícia judiciária consiste em apurar infrações penais e reunir elementos de autoria e materialidade que embasam eventual ação penal. Essa apuração é formalizada, em regra, no Inquérito Policial, presidido por delegado de polícia.
O Ministério Público, conforme o artigo 129, inciso VIII, da Constituição, pode requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquéritos. É o titular da ação penal pública e exerce controle externo sobre a atividade policial, garantindo o respeito às garantias constitucionais.
2. Autonomia e Limites Institucionais
A autoridade policial conduz o inquérito com autonomia técnica e jurídica, sem subordinação hierárquica ao Ministério Público ou ao Judiciário.
Contudo, deve cumprir ordens judiciais e requisições ministeriais fundamentadas, observando sempre a legalidade e o devido processo legal.
O Supremo Tribunal Federal (STF) já firmou entendimento de que a polícia judiciária não detém o monopólio da investigação criminal. O Ministério Público pode realizar Procedimentos Investigatórios Criminais (PICs), desde que respeitados os direitos e garantias fundamentais.
Ainda assim, o Judiciário não pode comandar investigações, limitando-se ao controle jurisdicional das medidas restritivas e à proteção das liberdades individuais.
3. O Código de Processo Penal e a Pirâmide de Kelsen
O Código de Processo Penal (CPP) não ocupa o vértice da hierarquia normativa no sistema jurídico brasileiro.
O ordenamento nacional é estruturado sob o princípio da supremacia da Constituição Federal, conforme a teoria da Pirâmide de Kelsen.
Níveis da Hierarquia Normativa:
Nível Constitucional: Constituição Federal e emendas constitucionais; tratados de direitos humanos com quórum qualificado (art. 5º, §3º).
Nível Supralegal: Tratados internacionais de direitos humanos aprovados sem quórum constitucional.
Nível Legal: Leis complementares, leis ordinárias (como o CPP), leis delegadas e medidas provisórias.
Nível Infralegal: Decretos, portarias e instruções normativas.
O CPP é uma lei ordinária e, portanto, subordinada à Constituição, jamais podendo contrariar seus princípios fundamentais ou dispositivos expressos.
4. Contexto Histórico e Referências Doutrinárias
Circulam, no meio jurídico, textos de tom crítico que aludem à hierarquia normativa e à aplicação do CPP, mencionando nomes como Hermes Lima — ex-ministro do STF e notável professor de Direito Constitucional — e o atual ministro Cristiano Zanin.
Essas referências, ainda que envoltas em ironia, destacam uma verdade incontestável: a Constituição é o fundamento e o limite de todas as normas do ordenamento jurídico brasileiro.
Como ensinava Hermes Lima, “a Constituição é a bússola que orienta a navegação jurídica em meio às tempestades da política e do poder.”
5. Conclusão
A Constituição Federal de 1988 é o eixo normativo e axiológico do Estado Democrático de Direito.
Nela se encontram os limites e as competências de cada Poder, assegurando que a Polícia Federal, o Ministério Público e o Poder Judiciário atuem de modo coordenado, mas independente e harmônico, conforme o artigo 2º da Constituição.
Compreender a supremacia constitucional e a correta hierarquia das leis é essencial para preservar o equilíbrio institucional e a legitimidade do sistema de justiça.
Nenhuma autoridade, nem mesmo o intérprete da lei, está acima da Constituição — que permanece como o farol da República e guardiã das liberdades fundamentais.
Por Cristiano Lima
Jurista, advogado e professor de Direito Constitucional.
Artigo submetido à seção de opinião institucional.
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