terça-feira, 3 de junho de 2025

"Entre a Memória e o Poder: as sinucas políticas da história em repetição"

Sinuca de Bico
O palácio Guanabara na manhã de 11 de maio, logo após o ataque dos integralistas 1938 11 de maio Integralistas tentam derrubar Getúlio Residência oficial é cercada; família do presidente fica cinco horas sob tiroteio Do Palácio Laranjeiras em 1937 à Praça dos Três Poderes em 2025, os antigos companheiros de viagem agora se confrontam sob novas máscaras — intentonas ideológicas, alianças tácitas e o eterno retorno das disputas pelo Estado, enquanto o cidadão zapeia entre canais, buscando sentido na política que se repete e se reinventa.
Breve histórico Construído entre 1909 e 1913 para servir de residência do empresário Eduardo Guinle, o Palácio das Laranjeiras foi projetado pelos arquitetos Armando Carlos da Silva Telles e Joseph Gire, no estilo Luís XIII. O Palácio das Laranjeiras foi durante anos utilizado por presidentes da República e governadores para receber autoridades estrangeiras em visita ao Brasil. O palacete foi vendido pela família Guinle ao governo brasileiro em 1946. Com a morte de Getúlio Vargas no Catete, o presidente eleito Juscelino Kubistchek resolveu usar o Laranjeiras como residência oficial. No ano de 1975, o presidente general Ernesto Geisel passou o Palácio das Laranjeiras para o governo do recém-criado Estado do Rio de Janeiro, transformando o palacete em residência oficial dos governadores.
@poesia.flix Ilustrações para te fazer refletir (por Pawel Kuczynski) 🎨 Construção Chico Buarque Amou daquela vez como se fosse a última Beijou sua mulher como se fosse a última E cada filho seu como se fosse o único E atravessou a rua com seu passo tímido Subiu a construção como se fosse máquina Ergueu no patamar quatro paredes sólidas Tijolo com tijolo num desenho mágico Seus olhos embotados de cimento e lágrima Sentou pra descansar como se fosse sábado Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago Dançou e gargalhou como se ouvisse música E tropeçou no céu como se fosse um bêbado E flutuou no ar como se fosse um pássaro E se acabou no chão feito um pacote flácido Agonizou no meio do passeio público Morreu na contramão atrapalhando o tráfego Amou daquela vez como se fosse o último Beijou sua mulher como se fosse a única E cada filho seu como se fosse o pródigo E atravessou a rua com seu passo bêbado Subiu a construção como se fosse sólido Ergueu no patamar quatro paredes mágicas Tijolo com tijolo num desenho lógico Seus olhos embotados de cimento e tráfego Sentou pra descansar como se fosse um príncipe Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo Bebeu e soluçou como se fosse máquina Dançou e gargalhou como se fosse o próximo E tropeçou no céu como se ouvisse música E flutuou no ar como se fosse sábado E se acabou no chão feito um pacote tímido Agonizou no meio do passeio náufrago Morreu na contramão atrapalhando o público Amou daquela vez como se fosse máquina Beijou sua mulher como se fosse lógico Ergueu no patamar quatro paredes flácidas Sentou pra descansar como se fosse um pássaro E flutuou no ar como se fosse um príncipe E se acabou no chão feito um pacote bêbado Morreu na contramão atrapalhando o sábado Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir A certidão pra nascer, a concessão pra sorrir Por me deixar respirar, por me deixar existir Deus lhe pague Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir Pela fumaça desgraça que a gente tem que tossir Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair Deus lhe pague Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir Deus lhe pague Composição: Chico Buarque.
'A Enciclopédia de Istambul' | Crítica da Sinopse enciclopédica: A dialética da fragmentação política: de 1937 à geopolítica fragmentada de 2025 Entrada: Fragmentação Política e Alianças Tácitas no Brasil e no Ocidente Descrição: A análise da fragmentação política brasileira, tradicionalmente marcada pela rivalidade estéril entre forças antagônicas que se neutralizam, perpetuando a hegemonia de um poder adaptável e resiliente, ganha novos contornos em 2025. O paralelo histórico entre as “intentonas” de 1937 e os rearranjos políticos contemporâneos — com destaque para a Alinhada Aliança "Branca" Tácita (AABT) — revela como alianças frágeis, dissimuladas e funcionais perpetuam uma lógica de exclusão e cooptação. O percurso reflexivo deste ensaio articula os seguintes pontos: A tentativa de apagamento da história: o esforço de Jair Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro em reescrever a narrativa da CPI da Lava Toga, bem como a ofensiva bolsonarista contra Alexandre de Moraes, enquanto repetição contemporânea das práticas de manipulação memorialista. A crise da governabilidade na Europa: a derrocada da esquerda portuguesa e a ascensão da extrema-direita, refletindo tendências globais de erosão das alianças tradicionais e a necessidade de novas coalizões para isolamento de forças autoritárias. O cenário brasileiro de 2025: o projeto de reeleição de Lula, sua tensão interna com aliados, e a permanência do vice “decorativo” Geraldo Alckmin, contrastando com as movimentações oposicionistas lideradas por Tarcísio de Freitas e a família Bolsonaro. O risco de repetição da “sinuca de bico”: a impossibilidade de superação das fragmentações e o retorno das lógicas políticas de 1937 sob novas roupagens. Ensaio: Fragmentação e permanência: a anatomia da política brasileira e ocidental em 2025 I. O retorno do recalcado: a tentativa de apagamento e a reescrita da história Ao comentar a tentativa de Jair Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro de apagar a CPI da Lava Toga da memória política, o programa Papo Antagonista assinala um fenômeno característico dos regimes e grupos que não conseguem assumir integralmente o peso de suas escolhas políticas: a necessidade de suprimir as evidências de seus próprios erros históricos. Esse movimento insere-se na tradição autoritária da manipulação da memória, cuja linhagem pode ser traçada até os eventos de 1937, quando as tentativas fracassadas de integralistas e comunistas foram, em seguida, obliteradas e reconfiguradas pela narrativa oficial do Estado Novo. O bolsonarismo, ao reescrever sua participação na ofensiva contra o Judiciário e na deslegitimação das instituições democráticas, busca negar a própria marca que inscreveu na história recente: a tentativa de instrumentalização do aparato legislativo para enfraquecer o Supremo Tribunal Federal, agora projetada na figura de Alexandre de Moraes, alvo preferencial da nova ofensiva político-midiática e diplomática da direita brasileira, inclusive com articulações junto ao governo Trump. II. A Aliança Branca Tácita (AABT): governabilidade sem clareamento O governo Lula, em sua terceira encarnação, representa uma expressão renovada, mas não superada, da velha lógica da aliança branca tácita: o pacto heterogêneo, funcional mas opaco, onde os que estão dentro não necessariamente participam do clareamento das decisões. Geraldo Alckmin é o emblema máximo desta configuração: vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, mas, conforme relatado pela imprensa, encontra-se “desanimado”, informado tardiamente sobre decisões que impactam sua pasta. Sua figura pública é a de um “cargo decorativo”, funcional para a ampliação eleitoral, mas politicamente irrelevante para a condução efetiva do governo. Tal configuração remete diretamente ao dilema histórico de alianças frágeis e contraditórias: a união do PT com setores liberais e conservadores para barrar a ascensão da extrema-direita resulta numa coalizão que não só é instável, mas também incapaz de estabelecer uma hegemonia política clara e coesa. III. A Europa como espelho: a crise do socialismo democrático em Portugal A crise do Partido Socialista (PS) em Portugal, com a renúncia de Pedro Nuno Santos e a ascensão de José Luís Carneiro, sinaliza um fenômeno paralelo ao brasileiro: a dificuldade das forças tradicionais de centro-esquerda em manter coesão e apoio popular diante do avanço da extrema-direita, simbolizada pelo Chega. O PS, agora fragilizado, busca construir pontes ao centro, em diálogo com o PSD, na tentativa de isolar os setores mais radicais, mas ao custo de sacrificar sua identidade ideológica e programática. Tal arranjo de centro, embora pragmático, carrega o risco clássico de dissolução política, semelhante ao que o PSB propõe no Brasil: a defesa de uma frente ampla, mas carente de clareza ideológica e de coesão programática. Em ambos os casos, o esforço pela manutenção da governabilidade resulta em alianças frágeis, suscetíveis ao colapso frente a uma oposição disciplinada e radicalizada. IV. Lula e a reafirmação da polarização: entre o “bonitão” e o risco estrutural Lula, ao afirmar-se como “bonitão”, “apaixonado” e “motivado”, personifica a tentativa de reafirmação de sua liderança carismática num cenário de polarização crescente e erosão da base governista. Sua presença ao lado de João Campos, na posse do novo presidente do PSB, confirma a aposta na manutenção de Alckmin na vice e na continuidade da aliança que garantiu sua vitória em 2022. No entanto, o presidente está ciente da ameaça latente: a possível vitória da oposição no Senado, que criaria um campo propício para a ofensiva bolsonarista visando a promoção de impeachments de ministros do STF, a começar por Alexandre de Moraes. Esse cenário, de aguda polarização e possibilidade de obstrução institucional, reproduz as armadilhas da fragmentação política histórica: o risco de que a coalizão no poder, ancorada mais na repulsa ao adversário do que na adesão a um projeto, não consiga resistir à ofensiva de uma direita radicalizada e disciplinada. V. A oposição fragmentada ou convergente? As peças no tabuleiro de 2026 Do lado oposicionista, o quadro é igualmente marcado por ambiguidades. Tarcísio de Freitas desponta como candidato natural, mas sua hesitação é proporcional à dependência do bolsonarismo. A possível candidatura de Michele Bolsonaro ou de Eduardo Bolsonaro projeta a continuidade do capital político familiar, independentemente das barreiras jurídicas que pesam sobre Jair Bolsonaro. Esse movimento reproduz uma das marcas do bolsonarismo: a combinação entre perseguição institucional (como réu no processo de tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023) e mobilização política contínua, alimentada pelo ressentimento e pela narrativa de perseguição. O campo de centro e centro-direita permanece disperso: Eduardo Leite, Ronaldo Caiado e Romeu Zema mantêm pretensões próprias, mas sem força suficiente para articular uma candidatura de terceira via sólida. Assim, a repetição do binarismo político parece inexorável, com a democracia como “linha divisória inescapável” no segundo turno, conforme assinalou o novo presidente do PSB. VI. Conclusão: a sinuca de bico como destino ou oportunidade? O Brasil, assim como Portugal e outras democracias ocidentais, encontra-se diante da mesma disjuntiva estrutural: a de escolher entre a persistência da lógica da fragmentação política, com alianças frágeis e opacas, ou a construção de novos pactos republicanos, que permitam superar a repetição histórica do “eterno retorno” das polarizações estéreis. A superação desta “sinuca de bico” exige mais do que acordos eleitorais: demanda uma reforma profunda na cultura política, capaz de estabelecer um compromisso democrático substantivo e de longo prazo. O risco, caso esse desafio não seja enfrentado, é que as democracias ocidentais permaneçam prisioneiras de seus espectros: ora tentando apagar o passado, como faz o bolsonarismo com a CPI da Lava Toga; ora repetindo a fragmentação que impede a construção de alternativas sólidas, como testemunha a derrocada do socialismo democrático em Portugal. E assim, como na canção que celebra a leveza do pensamento, resta perguntar: será que a política pode, enfim, “voar” para além da repetição, ou permanecerá, como sempre, aterrada na lógica paralisante da fragmentação? Epígrafe final “O pensamento parece uma coisa à toa, mas como é que a gente voa quando começa a pensar”Felicidade
Epígrafe “Como pedra que, no leito do rio, é polida pela corrente sem jamais se mover, assim a política, mesmo quando se julga avançar, apenas repete seu formato — geometria fria, forma resistente, imóvel.” (À maneira de João Cabral de Melo Neto, com o rigor de Camões e a melancolia metafísica de Pessoa.)
Bibliografia utilizada BOBBIO, Norberto. Direita e Esquerda: razões e significados de uma distinção política. São Paulo: Unesp, 1995. → Fundamenta a análise sobre a distinção entre alianças de centro, direita e esquerda, bem como os dilemas das frentes amplas. SCHMITT, Carl. O Conceito do Político. Lisboa: Edições 70, 2012. → Fundamenta a oposição amigo/inimigo como estruturante das polarizações políticas, essencial à compreensão da atual política brasileira e portuguesa. SARTORI, Giovanni. Partidos e Sistemas Partidários: um quadro para a análise. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2007. → Fundamenta as análises sobre a fragmentação partidária e os sistemas eleitorais que dificultam governabilidades coesas. MOURA BRASIL, Felipe. Papo Antagonista, episódio de 02/06/2025. → Fonte direta sobre a tentativa de apagamento da CPI da Lava Toga e da articulação bolsonarista. AZEDO, Luiz Carlos. Análise política publicada em 03/06/2025. → Base factual para a análise sobre o projeto de reeleição de Lula e o cenário eleitoral de 2026. OLIVEIRA, Cláudio de. Reportagem sobre a crise no Partido Socialista de Portugal. → Fonte direta para a análise da fragmentação política europeia, especialmente portuguesa. MOURA, Glauber. 1937: O Estado Novo e a Política do Extermínio. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010. → Fundamenta o paralelo histórico entre as intentonas de 1937 e os processos políticos contemporâneos. NORA, Pierre. Entre Memória e História: a problemática dos lugares. Revista História & Crítica, n. 15, 1987. → Fundamenta a concepção de manipulação da memória histórica, central na análise do bolsonarismo e sua tentativa de apagamento da Lava Toga.
STF-Supremo Tribunal Federal | Ele explica Glossário conceitual 1. Alinhada Aliança "Branca" Tácita (AABT) → Expressão cunhada neste ensaio para designar o pacto implícito entre forças políticas que, embora formalmente divergentes, alinham-se para preservar a estabilidade sistêmica, mas sem esclarecer, democratizar ou tornar transparente esse alinhamento aos cidadãos. 2. Coalizão heterogênea → Aliança entre partidos de orientações políticas diversas, usualmente celebrada para a obtenção de maiorias parlamentares, mas que frequentemente resulta em baixa coesão e governabilidade frágil. 3. Intentonas de 1937 → Referência aos movimentos conspiratórios de caráter extremista, tanto de direita (AIB – Ação Integralista Brasileira) quanto de esquerda (ANL – Aliança Nacional Libertadora), que precipitaram o golpe de Getúlio Vargas e a instauração do Estado Novo. 4. Fragmentação partidária → Fenômeno pelo qual o sistema político se torna excessivamente dividido entre múltiplos partidos, dificultando a formação de maiorias estáveis e conduzindo, frequentemente, à paralisia ou à necessidade de alianças pragmáticas e inconsistentes. 5. Polarização política → Processo pelo qual as forças políticas e sociais se distribuem em polos opostos, reduzindo o espaço para moderação e compromissos transversais, aumentando o risco de radicalização. 6. Supressão da memória histórica → Estratégia política que busca apagar ou reescrever eventos do passado para fins de legitimação política, frequentemente associada a regimes autoritários ou a grupos que desejam ocultar erros históricos. 7. Governabilidade frágil → Situação na qual, apesar de formalmente no poder, uma coalizão política não detém força suficiente para implementar de forma consistente sua agenda, sendo constantemente vulnerável a crises internas ou à obstrução parlamentar. 8. Terceira via → Expressão usada para designar tentativas de construir alternativas políticas ao tradicional binarismo esquerda-direita, frequentemente associadas a movimentos de centro, com discurso de superação da polarização. 9. Populismo punitivo → Estratégia política que se baseia na mobilização emocional contra supostos “inimigos” do povo, frequentemente atacando instituições democráticas sob o pretexto de moralização ou purificação política. 10. Sinuca de bico → Expressão popular brasileira que, neste ensaio, é usada conceitualmente para designar situações políticas nas quais todas as saídas possíveis conduzem a impasses ou dilemas graves, sem solução ótima evidente.

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