Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
quinta-feira, 1 de julho de 2021
O SUS É O MEU PARTIDO
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"Meu partido é o SUS", desabafa servidor do Ministério da Saúde que denuncia compra da Covaxin
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A CPI da Pandemia ouvirá nesta sexta-feira (25), às 14h, os depoimentos de Luis Ricardo Fernandes Miranda, servidor do Ministério da Saúde, e de seu irmão, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF). Eles denunciaram possíveis irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin pelo governo federal.
Fonte: Agência Senado
*** *** https://www.youtube.com/watch?v=kJ-S3d9oczw *** ***
FUNCIONÁRIO PÚBLICO EM EXCELÊNCIA CONCURSADO
Enunciado
Augustus, brasileiro, solteiro, residente e domiciliado em Rio Claro/SP é engenheiro civil e possui 33 anos de idade. Atualmente, Augustus estuda para concursos publicos. O Municípioo de Campinas, por meio do Secretário de Finanças, realizou concurso público para diversos cargos, dentre os quais de administador de finanças, realizou concurso público para diversos cargos, dentre os quais de administrador de finanças. Para este cargo foram designadas 20 vagas, com vencimentos mensais de R$ 15.000,oo (quinze mil reais).
O Edital do concurso foi publicado em 28.04.2015 e o concurso terá validade de dois anos. Interessado na vaga. Augustus inscreveu-se no certame e após muito estudo e dedicação passou em 10º lugar.
A homologação do resultado ocorreu em 28.04.2015. Não obstante, passados 03 (três) meses da homologação do resultado, o Município de Campinas contratou, sem realização de concurso público, 15 funcionários para exercer o cargo de administrador de finanças, sem ter nomeado nenhum dos aprovados.
A justificativa do Secretário foi no sentido de que estes contratados onerariam menos as finanças do município, pois seus vencimentos eram menores aos indicados no edital do concurso, bem como a justificativa de demanda pela demanda.
Passados 180 dias após ter tomado ciência de contratação de funcionários temporários e inconformado com esta situação, pois é sabedor de seus direitos e que está sendo prejudicado nos subsídios mensais que receberia com a nomeação. Augustus procura seus serviços de advocacia.
Na qualidade de advogado de Augustus adote a medida judicial cabível, considerando a competência e legitimidade, os fundamentos de direito, a urgência e o pedido.
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TREINANDO - ENUNCIADO
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Qual a peça?
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Quem é o cliente?
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O que ele deseja (objeto)?
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Por quê? Tema central?
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Inicial ou recurso?
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É urgente?
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Estruturando a peça
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Endereçamento
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Preâmbulo
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Autor
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Réu
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Nome da peça
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Fundamento
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Fatos
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Direito (teses)
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Tutela de urgência
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Pedidos e requerimentos
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Formalidades da peça
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RESPOSTA - AÇÃO PELO PROCEDIMENTO COMUM
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Qual a peça?
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Quem é o cliente? Augustus.
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O que ele deseja (objeto)? Nomeação no cargo para o qual foi aprovado em concurso público.
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Por que? Tema central? Município que realizou o certame preteiu os candidatos aprovados em concurso para contratar sem realização de concurso público, conforme exige a Constituição da República. Imperioso destacar que sequer havia situação emergencial para que houvesse a contratação de temporários.
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Inicial ou recurso? Inicial.
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É urgente? Sim, necessidade de ingressar no cargo para o qual foi aprovado.
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Estruturando a peça
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Endereçamento Excelentíssimo Senhor Doutor de Direito da ___ Vara Cível (ou da Fazenda Pública) da Comarca do Estado.
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Preâmbulo
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Autor Augustus
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Réu Município de Campinas/SP
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Nome da peça Ação pelo procedimento comum com pedido de Tutela Provisória de Urgência Antecipada.
Obs.: não é cabível Mandado de Segurança em virtude do prazo decadencial de 120 dias (art. 23 da Lei 12.016/2009).
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Fundamento Art. 319 c/c arts. 294 e 300 do CPC/2015
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Fatos Augustus foi aprovado em concurso público para o cargo de administrador de finanças do Município de Campinas///SP. Sua classificação final foi o 10º lugar, sendo que foram abertas 20 (vinte) vagas. Não obstante, após a aprovação no concurso, o Secretário de Finanças do citado Município realizou contratação de funcionários sem observar a norma constitucional que exige a realização de certame, preterindo os aprovados. Tal conduta, como será demonstrada a seguir é inconstitucional e ilegal.
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Direito (teses) No caso há diversas teses, entres os quais:
1. Princípio constitucional do concurso público (art. 37, I e II da CF/1988).
2. Direito de nomeação (não é mera expectativa de direito). Art. 37, IV da CF/1988.
3. Dever de boa-fé da administração pública. A administação deve se pautar pelos princípios da moralidade e da legalidade, de modo que não pode, sob pena de violação da boa-fé, agir de um modo e, posteriormente, quebrar a relação de confiança com a sociedade atuando de modo contraditório.
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Tutela de urgência Cabível pedido de Tutela Provisória de Urgência Antecipada, nos termos do art. 294 c/c art. 300 do CPC/2015. Demonstrar a probabilidade do direito(aprovação no concurso público dentro do número de vagas e a contratação irregular de voluntários sem concurso) e o perigo de dano (prejuízo ao candidato que está sendo preterido em cargo para o qual foi aprovado).
Obs.: por se tratar de matéria enfrentada de forma reiterada pelos tribunais superiores, seria admissível também formular pedido de tutela provisória de evidência, nos termos do art. 311, II, do CPC/2015, que prescinde da demonstração do perigo de dano.
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Pedidos e requerimentos Concessão da Tutela de Urgência Antecipada para que Augustus seja nomeado e tome posse no cargo e ao final, seja confirmada a Tutela Provisória de Urgência Antecipada, obrigando o Município de Campinas a nomear o candidato aprovado.
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Formalidades da peça Citação dos réus deixa-se de formular pedido de designação de ausência de conciliação por ser inviável autocomposição (art. 319, VII c/c art. 334, par. 4º, II, do CPC/2015), pedido de produção de provas, valor da causa.
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Fonte: REVISÃO E TREINO
CADERNO DE
DIREITO CONSTITUCIONAL
COORDENADORES
Darlan Barroso
Marco Antonio Araujo Junior
Marcelo Romão Marinelli
2ª edição
revista e atualizada
THOMSON REUTERS
REVISTA DOS
TRIBUNAIS
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Publicado em23/06/21 11:45Atualizado em23/06/21 11:53
Em entrevista, servidor da Saúde relata que avisou Bolsonaro sobre suspeitas na importação da vacina Covaxin
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O servidor Luis Ricardo Miranda com o presidente Jair Bolsonaro, em encontro no dia 20 de marçoO servidor Luis Ricardo Miranda com o presidente Jair Bolsonaro, em encontro no dia 20 de março Foto: Reprodução
Natália Portinari, Julia Lindner e Thiago Bronzatto
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Após se recusar a assinar um recibo que previa um pagamento antecipado pela importação da vacina indiana Covaxin, o servidor concursado do Ministério da Saúde Luis Ricardo Fernandes Miranda diz, em entrevista ao GLOBO, ter se encontrado pessoalmente com o presidente Jair Bolsonaro no dia 20 de março para denunciar as suspeitas sobre a importação do imunizante. Segundo ele, o presidente teria se comprometido a encaminhar o caso para a Polícia Federal.
O contato entre Luis Ricardo e Bolsonaro foi feito por meio do irmão do servidor, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF). Ambos estiveram no Palácio da Alvorada num encontro registrado com fotos e mensagens que serão apresentadas à CPI da Covid na próxima sexta-feira.
Ao GLOBO, Luis Ricardo diz ter denunciado ao presidente as suspeitas envolvendo a Covaxin e apresentado um material que comprovaria que houve um pedido de pagamento fora do contrato para importar três lotes com data próxima do vencimento.
Caso esse documento tivesse sido assinado pelo servidor, a empresa poderia cobrar um pagamento que considerava indevido no valor de US$ 45 milhões (R$ 222,6 milhões). O contrato para a compra da Covaxin com o Ministério da Saúde não prevê pagamento antecipado.
Em entrevista, o servidor relatou também uma "pressão anormal" no processo para agilizar o envio da documentação à Anvisa e pedir a importação da vacina Covaxin. A agência reguladora negou o pedido, já que a farmacêutica indiana não tinha cumprido os requisitos necessários para conseguir a emissão de um certificado de boas práticas.
O Palácio do Planalto foi procurado, mas não respondeu até a publicação desta reportagem.
Leia abaixo a entrevista.
Qual é o seu trabalho no ministério?
Eu trabalho no ministério como servidor público, concursado desde 2011. Sempre lotado no departamento de logística. Estou à frente da importação do ministério desde 2016. Somos responsáveis por toda a importação de insumos estratégicos para a Saúde. Vacina, medicamentos, enfim. Somos a ponta do processo. Após a construção de assinaturas de contrato, de todo o processo, somos a parte final, a ponta para que o medicamento, a vacina chegue ao Brasil e seja distribuída a toda a população.
O senhor relatou ao Ministério Público Federal (MPF) que houve pressão no caso da Covaxin. Como se deu essa pressão?
A gente executou primeiro o embarque internacional de vacina do consórcio Covax (Facility, da OMS). A OPAS, devido à dificuldade de todos os países quererem adquirir as vacinas do consórcio, a OPAS conseguiu algumas doses para o Brasil. A documentação ficou pronta só vinte e quatro horas, se eu não me engano, antes do voo chegar no Brasil. A gente fez todo o processo de importação, junto com a Anvisa, a Receita Federal e o aeroporto. Conseguimos realizar o desembaraço. Não teve nenhuma pressão, ligação, reunião, algo muito intenso, por parte dos gestores para a realização desse processo. No caso máximo, se eu não me engano, foi quando chegou essa vacina, o primeiro embarque.
No caso da Covaxin, houve muito questionamento, como estava a documentação, muita reunião e faltava documentação técnica. A documentação apresentada estava muito divergente do que estava estipulado no contrato. A equipe por parte nossa, da importação, não se sentiu segura e confortável para a execução daquele processo, daquela importação.
Veio ordens superiores para que fosse solicitada a autorização pela Anvisa, mesmo não tendo toda a documentação completa. Eu me isentei como chefe de assinar esse processo. É um ofício que solicita uma excepcionalidade, que chama. Foi assinado por um outro gestor e a gente fez a solicitação para a Anvisa, a qual foi negada.
Quando o senhor diz que recebeu ordens, essas ordens partiram de quem?
No relato ao Ministério Público, eu (disse) que sou subordinado a um coordenador geral, o qual eu citei no meu depoimento, que é o Alex Lial Marinho, era o coordenador da CGLOG, coordenação logística de insumos estratégicos da Saúde, que cuida da distribuição e recebimento de vacinas. O diretor do departamento de logística, Roberto Ferreira Dias. E tive contato também com um assessor da Secretaria Executiva. Coronel Pires.
Como foi essa ligação do coronel Pires fora do horário de trabalho?
Eu recebi esse contato, né? Da Secretaria Executiva, desse coronel Pires. “Precisamos fazer tudo para ajudar, o representante da empresa veio agora à noite falar. Com o secretário executivo, Élcio, para agilizar as licenças de importação para embarcar as vacinas ainda esta semana.” (Essa ligação ocorreu em 19 de março, segundo o servidor, às 23h de sexta-feira.)
Como foi o contato com o seu irmão naquele momento? Qual a informação que o senhor queria levar adiante?
Devido à falha de documentação, a inconsistência com o contrato e também as pressões, a equipe se sentiu desconfortável. Eu como tenho um irmão, Luis Miranda, ao qual eu confio muito, né, por ser meu irmão de sangue, relatei toda a situação pra ele. E passamos a situação para a autoridade superior. Ele me convidou se eu estava disposto a levar isso ao presidente Bolsonaro.
Como foi esse encontro com o presidente Jair Bolsonaro?
Eu apresentei toda a documentação, o contrato assinado, as pressões que estavam acontecendo internamente no Ministério, e a gente levou até a casa do presidente, conversamos com ele, mostramos todas as documentações, as pressões, e ele ficou de, após a reunião, falar com o chefe da Polícia Federal para investigar. Isso foi no dia 20 de março.
Como foi a reação de Bolsonaro?
Ele disse que realmente estava muito estranha a situação. Ele ficou, posso dizer, não sei, surpreso. Disse que confia no pessoal do Ministério e não tinha conhecimento de tudo, de detalhe, e que ia investigar.
Por que decidiram levar esse caso ao presidente?
Ele é o chefe do Poder Executivo, ao qual detém conhecimento de todas as situações que estão passando no governo, e ao qual cabe a sua responsabilidade verificar todas as inconsistências, às vezes que não chegam até ele.
Depois do encontro com o presidente Bolsonaro, mudou alguma coisa no Ministério?
Como teve a negação da autorização pela Anvisa, ficou um desgaste entre o Ministério e a Anvisa. Então, eles evitaram de ter que acontecer isso novamente e se reuniram, o ministério com a empresa, para ver toda documentação completa e depois dar entrada.
O que você explicou exatamente ao presidente sobre possíveis irregularidades?
Toda a documentação é fornecida pela empresa, são documentos à respeito da carga, documentos técnicos, de certificados, estudos da vacina, a gente recebe esse documento pela empresa. A invoice é similar a uma nota fiscal no Brasil, um documento que demonstra aos órgãos responsáveis que foi feita uma compra, uma venda ou qualquer tipo de transação internacional importada. O que foi apresentada pela empresa foi essa invoice.
O que te chamou atenção nesse recibo?
A gente não faz parte de licitação, somos área de execução, somos a ponta para que a vacina chegue ao país. É passado o contrato para a nossa área para execução. O que a gente faz é verificar o que diz o contrato e a documentação que a empresa apresentou para a gente seguir o contrato. Esses levantamentos que a gente fez, questão de pagamento, quantidade de doses, a questão da empresa que estava divergente, a gente verificou essas inconsistências.
(A empresa que consta no recibo se chama Madison Biotech PTE Ltd.)
Essa terceira empresa que apareceu no processo, divergindo do contrato, traria prejuízo ao país?
Sim, há questão de prejuízo por envolver o recebimento de uma quantidade menor, num valor altíssimo, fora do acordado, essa empresa é totalmente divergente do contrato, algo que não é legal, porque se você tem um contrato assinado com um fornecedor quem tem que te fornecer é aquele fornecedor, não uma empresa terceira que você desconhece, que não assinou.
E a forma como tudo isso aconteceu diverge totalmente de processos que você lidou antes?
Sim. Acontecem erros pontuais na invoice que não são tão discrepantes em relação ao contrato.
O que foi mais estranho no processo todo para você?
Achei estranho a questão da pressão, porque a gente é uma área que é a ponta final. A gente está acostumado a lidar com urgências, com pressões, mas elas foram muito fora do comum. Fora essa questão da documentação não estar completa, tudo isso. A gente está acostumado a ter pressão, mas isso foi muito além.
Como era essa pressão?
Acontecia muita reunião, muita ligação, inclusive na sexta-feira à noite e final de semana para perguntar ‘e aí, a empresa mandou documentação?’, ‘como é que tá?’, ‘cobra a empresa’.
O coronel Alex Lial, coordenador da área, também pressionava?
Ele sempre perguntava, como está a Covaxin, como está a importação, tem mensagem de texto dizendo que era prioridade máxima. Ele sempre questionava a gente para saber se está tudo ok. Era constante.
Qual foi a sua preocupação como servidor que te levou a sentir desconfortável para levar isso até o presidente?
Como havia muita inconsistência, bastante pressão, isso gerou suspeita, né, insegurança. Nosso baseado é o contrato, que é a lei, e ele estava divergente. Então falei com meu irmão para verificar se estava legal.
*** *** https://extra.globo.com/noticias/brasil/em-entrevista-servidor-da-saude-relata-que-avisou-bolsonaro-sobre-suspeitas-na-importacao-da-vacina-covaxin-25073440.html *** ***
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Livro
Machado de Assis Funcionário Público
R. Magalhães Junior
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RSP Revisitada
Machado de Assis
funcionário público
Texto publicado na RSP de out/dez 1981 (Ano 38, v. 109, n. 4)
Raymundo Magalhães Jr.
Joaquim Maria Machado de Assis, uma das maiores figuras do mundo literário
brasileiro do século passado e do início deste século, teve duas carreiras paralelas,
a de homem de letras e a de burocrata. Na primeira iniciou-se mais cedo, quando,
apenas um adolescente de pouco mais de 15 anos, publicou um soneto – por sinal
bem ruinzinho – no Periódico dos Pobres, a 3 de outubro de 1854. Nascido no morro
do Livramento, perto da Gamboa e do Saco do Alferes, a 21 de junho de 1839,
deu mostras de impressionante precocidade, ao assinar um Soneto, no mesmo
jornalzinho. Nota-se que, nessa época, o Rio de Janeiro ainda não tinha sequer
iluminação a gás – só contratada pelo governo imperial em 1859 – nem sabia
ainda o que fossem estradas de ferro. Seu ingresso no serviço público só se daria
quase treze anos depois dessa estréia literária, que em nada fazia prever o grande
escritor que viria a ser. E isto se deu a 8 de abril de 1867, com a sua nomeação
para “ajudante do diretor de publicação do Diário Oficial”, então subordinado ao
Ministério da Fazenda, durante o 22o gabinete ministerial da monarquia, chefiado
pelo então deputado-geral Zacarias de Góis e Vasconcelos.
RSP Revisitada: Machado de Assis funcionário público
Revista do Serviço Público Brasília 56 (2): 237-248 Abr/Jun 2005
RSP
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Entre essas duas datas do primeiro
escrito publicado na imprensa e a admissão no serviço público do Império,
Machado de Assis realizara uma brilhante
carreira jornalística e literária. Colaborara
nas revistas A Marmota Fluminense, O Espelho,
A Semana Ilustrada, O Futuro, Jornal das
Famílias, e nos jornais Diário do Rio de Janeiro,
Correio Mercantil, O Paraíba, Imprensa
Acadêmica (de São Paulo), Correio da Tarde e
outros. Publicara seus primeiros trabalhos
em livro: a peça teatral Desencantos, o
volume intitulado Teatro (contendo as
comédias O caminho da porta e O protocolo),
as comédias Quase ministro e Os deuses de
casaca (em volumes separados) e, ainda, seu
primeiro livro de versos, intitulado
Crisálidas. Além disso, exercitara a sua pena
como tradutor de peças teatrais para a
Companhia Furtado Coelho, numa delas,
Obarbeiro de Sevilha, de Beaumarchais; fizera
parte da equipe de tradutores de O Brasil
pitoresco, obra em dois grandes volumes,
escrita por Charles Ribeyrolles e ilustrada
pelo fotógrafo Victor Frond; traduzira a
obra anônima Queda que as mulheres têm pelos
tolos e, ainda, o romance de Victor Hugo,
Os trabalhadores do mar, publicado em
folhetim no Diário do Rio de Janeiro. O que é
mais singular é que Machado de Assis,
embora sendo autodidata, não apenas traduzia correntemente do francês para o
português, mas ainda escrevia diretamente
em francês versos bastante razoáveis, principalmente paródias cômicas de poesias de
Victor Hugo e de Alfred de Musset. A
publicação das Crisálidas, em 1864, colocara seu nome em evidência, como um dos
mais promissores entre os novos poetas
brasileiros.
Como jornalista, ligado ao Partido
Liberal, pois o Diário do Rio de Janeiro, para
onde entrou em 1860, antes dos 21 anos,
era antes de tudo um órgão partidário,
comprometido com aquela agremiação –
a mais inquieta, progressista e turbulenta
da monarquia (de sua ala extremada
tinham irrompido as revoluções em 1842,
em Minas e São Paulo, e a de 1848 em
Pernambuco) – Machado de Assis várias
vezes atacara Zacarias de Góis e Vasconcelos, que ainda não se desligara inteiramente de seus antigos vínculos com o
Partido Conservador. Mas, quando Zacarias adotou a posição liberal, mudou de
atitude, o que não lhe foi difícil, pois seus
ataques não tinham sido extremados ou
agressivos. Foi o próprio gabinete de
Zacarias que, a 16 de março de 1867, fez
condecorar Machado de Assis com a
insígnia de cavaleiro da Ordem da Rosa,
destinada a premiar o mérito literário e
artístico. E, vinte e dois dias depois,
assinava, como Ministro da Fazenda, o ato
que lhe assegurava o ingresso no serviço
público. Neste, entrara Machado de Assis
com o pé direito, pois que, pouco antes,
tivera o seu valor reconhecido e oficialmente proclamado.
Que fizera ele para merecer tanto? Em
primeiro lugar, esses dois fatos se verificaram em plena guerra da Tríplice Aliança
(Brasil, Argentina e Uruguai) contra o
Paraguai de Francisco Solano López. Além
de apoiar, como jornalista, as posições do
governo, Machado de Assis escreveu
poesias patrióticas. Três anos antes, por
ocasião da Questão Christie, já havia escrito
um hino cantado nos teatros do Rio de
Janeiro, em desagravo da honra nacional,
ultrajada pela intervenção inglesa em
nossos portos, com o apresamento de
vários dos nossos navios mercantes. Além
disso, durante três anos, Machado de Assis
exercera, sem remuneração, a função de
censor teatral, como membro do Conservatório Dramático Brasileiro, entidade
particular reconhecida pelo governo.
RSP
Revista do Serviço Público Brasília 56 (2): 237-248 Abr/Jun 2005 239
Raymundo Magalhães Jr.
Machado de Assis deixou o Diário do
Rio de Janeiro ao entrar para o Diário Oficial,
mas continuou a atuar no jornalismo,
colaborando em várias publicações sem
filiação partidária declarada. Dois anos e
oito meses depois de seu ingresso no
serviço público, Machado de Assis se
casava com a portuguesa Carolina Augusta
Xavier de Novais, que chegara ao Brasil a
18 de junho de 1868, para cuidar do irmão
enfermo, Faustino Xavier de Novais, poeta
e jornalista, fundador e diretor de O Futuro,
a revista efêmera em que o autor das
Crisálidas muito colaborara em prosa e
verso. Com o aumento de suas responsabilidades, Machado desdobrou-se em
trabalhos, principalmente como tradutor.
Traduziu novas peças teatrais. Traduziu
como folhetim para o Jornal da Tarde o
longo romance de Charles Dickens Oliver
Twist, e para a revista A Instrução Pública, a
obra do médico e educador francês T.
Gallard, Notions d’hygiene à l’usage des
instituteurs primaires, a que deu o título de
Higiene para o uso dos mestres-escolas, cuja
publicação se prolongou até 1874. Em
1871, retornou à função de censor teatral,
ainda uma vez sem receber qualquer
remuneração. E, em abril de 1872, foi
designado pelo Ministro da Marinha a fazer
parte da comissão do Dicionário Marítimo
Brasileiro, em substituição a Henrique César
Muzzio, que, cego e em tratamento na
Europa, morrera em Paris. Muzzio havia
sido o secretário do Diário do Rio de Janeiro,
quando Machado nele começara a trabalhar. Essa nova função era um mero
“bico” e não atendia às suas necessidades
mais prementes.
Mas, nesse mesmo ano, quando se
achava na presidência do gabinete o
visconde do Rio Branco (José Maria da
Silva Paranhos), notável estadista imortalizado por ter feito aprovar na Câmara e
no Senado do Império a famosa “Lei do
Ventre-Livre” – segundo a qual não mais
nasceram escravos no Brasil – Machado
de Assis conseguiu obter um cargo de primeiro oficial, ou de amanuense, do Ministério de Agricultura, Comércio e Obras
Públicas, cujo ministro era, então, o deputado José Fernandes da Costa Pereira
Júnior. Durante algum tempo, Machado
de Assis se manteve nos dois cargos – o
do Diário Oficial e o do Ministério – trabalhando primeiro neste e depois naquele,
onde o expediente se prolongava noite
adentro. Machado de Assis ingressou no
Ministério da Agricultura, Comércio e
Obras Públicas quando tinha passado dos
33 anos e já era uma figura destacada das
letras brasileiras. Em 1868, José de Alencar
o consagrara como a mais importante
figura da crítica literária de seu tempo, ao
pedir-lhe que apresentasse ao meio intelectual do Rio de Janeiro o jovem poeta
Castro Alves. Em 1870, publicara os Contos fluminenses e o segundo livro de versos,
Falenas. Em 1872, publicara o seu primeiro
romance, Ressurreição. E, em 1873, novo
livro de contos, das Histórias fluminenses. Ia
ter, a partir daquela nomeação, vida mais
tranqüila e segura, mas não menos laboriosa, por sua inexcedível dedicação, tanto
às letras como às funções burocráticas,
exemplarmente desempenhadas.
Machado de Assis era ainda chefe da
2a
Seção do Ministério da Agricultura,
Comércio e Obras Públicas, quando deu
um memorável parecer sobre importante
assunto submetido à sua apreciação, que
dizia respeito ao registro de escravos,
regulado pela Lei do Ventre-Livre, de 28
de setembro de 1871. O registro tinha
como finalidade manter um cadastro da
população escravizada, fazer com que as
crianças nascidas depois da promulgação
dessa lei tivessem os nascimentos
RSP Revisitada: Machado de Assis funcionário público
Revista do Serviço Público Brasília 56 (2): 237-248 Abr/Jun 2005
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registrados como pessoas livres, além de
outras medidas no interesse dos cativos.
Aquela lei instituíra também ações de liberdade, ou causas de liberdade, propostas pelos
escravos, ou em nome destes, para que
objetivassem a condição de pessoas livres.
Dessas ações, quando as decisões judiciais
fossem contrárias a seus autores, haveria
sempre a apelação ex-officio para a instância
superior. Ora, um proprietário da comarca
de Resende, na província do Rio de Janeiro,
ganhara uma ação ordinária e, não tendo
havido apelação, por parte dos escravos
envolvidos no pleito, pretendia o interessado, José Pereira da Silva Porto, obter o
registro desses mesmos escravos, mediante
apresentação de traslado da sentença que
lhe dera ganho de causa. O presidente da
província do Rio de Janeiro, Francisco
Xavier Pinto Lima (depois agraciado com
o título de barão de Pinto Lima) achou
que a situação não estava suficientemente
clara e, por isso, submeteu o assunto ao
exame do Ministério da Fazenda. O ministro, na época o barão de Cotejipe, decidiu
que fosse ouvido o Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, por ser
deste a competência, pois lhe estavam
subordinados os assuntos referentes aos
escravos, cartas de alforria, manumissões,
e todos os demais, exceto a cobrança das
taxas de registro.
As questões suscitadas eram as
seguintes:
1) Poderia o coletor de Resende
inscrever na matrícula especial os escravos
do cidadão José Pereira da Silva Porto, que
não haviam sido matriculados em tempo
hábil, isto é, no prazo determinado pela
lei de 28 de setembro de 1871?
2) Em vista do artigo 7o, § 2 o, da
mesma lei – o qual estabelecia que, nas
causas em favor da liberdade, haveria
apelação ex-officio quando as decisões lhes
fossem contrárias – produziria efeitos a
sentença obtida com base no artigo 19 do
regulamento da mesma lei, sem que da
mesma houvesse sido interposta apelação
ex-officio ou voluntária? O ministro Tomás
José Coelho de Almeida pediu que fossem ouvidos os funcionários do Ministério
da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, de maior graduação e com a necessária
competência para opinar sobre o assunto.
E pediu também a opinião do procurador
da coroa, desembargador João Evangelista
de Negreiros Saião Lobato.
Os funcionários que opinaram foram
os seguintes: José Diniz de Vilas-Boas,
oficial da Secretaria; Augusto José de
Castro e Silva, antigo diretor de Agricultura;
José Pedro Xavier Pinheiro, oficial da
Secretaria; Francisco Leopoldino Gusmão
Lobo, chefe da Diretoria Central; e, finalmente, Joaquim Maria Machado de Assis,
chefe da 2a
Seção de Agricultura. Esse
episódio é, sem dúvida, um dos mais significativos da carreira de Machado de Assis,
sobretudo por ter sido vitorioso o ponto
de vista de um funcionário que, sem ser
bacharel em direito, demonstrou grande
tino jurídico, vendo o seu ponto de vista
vencedor. As opiniões foram de início
divergentes. Saião Lobato manifestou-se
contra a concessão da matrícula. No seu
entender, como não houvera apelação,
também não podia haver registro. VilasBoas opinou no mesmo sentido. Mas em
sentido contrário opinaram três altos
funcionários: Xavier Pinheiro, Castro e Silva
e, finalmente, Gusmão Lobo, que foi
citado por Joaquim Nabuco, no livro Minha
formação, como um adepto da causa
abolicionista. Castro e Silva afirmou se
tratava da “libertação de escravos que
deixaram de ser matriculados, e cuja
reivindicação era permitida por ação
ordinária, nos termos do artigo 19 da lei
RSP
Revista do Serviço Público Brasília 56 (2): 237-248 Abr/Jun 2005 241
Raymundo Magalhães Jr.
de 28 de setembro, e que o artigo 7o
se
referia ao processo, aliás sumário, para a
alforria por indenização do valor ou
remissão”. E concluía dizendo pensar que,
“sendo independentes os poderes políticos
do Império, ao Executivo cabia acatar as
decisões do Judiciário e, conseqüentemente, ordenar ao coletor de Resende que
matriculasse os escravos de José Pereira da
Silva Porto.”
Xavier Pinheiro fez várias considerações sobre o problema, para por fim
declarar: “Examinando atentamente os
papéis, cabe me dizer que, para resolvê-lo,
basta considerar que duas são as ações
concernentes à alforria de escravos. Em
uma, a favor da liberdade, em que o autor
é escravo, o processo é sumário e, quando a
decisão do juiz é contrária à liberdade,
haverá apelação ex-officio(artigo 7o da lei no
2.040). Noutra, a favor da escravidão, em
que o senhor é o autor, o processo é ordinário, e não há recurso ex-officio, sem que,
no entanto, às partes seja tolhido o direito
de apelar. No caso presente, a causa é
ordinária, e o juiz não está na obrigação
de apelar ex-officio. Os interessados, isto é,
os três escravos, não recorreram da sentença, que assim passou em julgado. Resta,
portanto, expedir ordens a fim de que
produza os devidos efeitos”.
Gusmão Lobo, pelo menos aparentemente, dava visível apoio a essa tese. Disse
tratar-se de uma questão “muito grave” e
alegou que era com pesar que discordava
“do parecer do Sr. Procurador da Coroa”.
Finalmente, declarou que, “ainda que a
matéria esteja largamente discutida, conviria
que sobre ela dissesse o atual chefe da 2a
Seção”, Tal chefe, ainda em caráter interino,
era Machado de Assis, que assim foi provocado a manifestar-se. Nesse processo
encontram-se palavras de Gusmão Lobo
que valem como um atestado de seu zelo e
capacidade funcional: “Recomendo- lhe que
o faça em prazo curto, como costuma fazer,
pois trata-se de negócio pendente há quase
um ano./ 15 de julho de 1876./ Gusmão
Lobo”. Seis dias depois, dava Machado de
Assis seu magistral parecer, em que começava por declarar: “2a
Seção./ Obedecendo
ao despacho da Diretoria, examinei detidamente estes papéis e, à vista deles e das
disposições legais, direi resumidamente o
que me parece./ No art. 7o, § 2o
da lei de 28
de setembro de 1871 se diz que das decisões contrárias à liberdade, nas causas em
favor desta, haverá apelação
ex-officio. Pelo artigo 18 do regulamento de
1o
de dezembro do mesmo ano, os escravos que não forem dados à matrícula por
culpa ou omissão dos senhores serão considerados libertos, salvo aos mesmos
senhores o meio de provar, em ação ordinária, o domínio que têm sobre eles, e não
ter havido culpa, ou omissão sua, na falta da
matrícula./ Pergunta- se: Das sentenças que,
na hipótese do artigo 19, forem contrárias à
liberdade, cabe apelação ex-ofício?/ Minha
resposta é afirmativa. Para responder de
outro modo, fora preciso fazer entre os dois
casos uma distinção que não existe, e que, a
meu juízo, repugna ao espírito da lei”.
Em seguida, Machado de Assis começava a expor suas razões: “O argumento
principal que acho nestes papéis, favorável
à negativa, é que as causas de que trata o
artigo 19 do regulamento não são a favor
da liberdade, isto é, não são propostas pelo
escravo, mas pelo senhor, a favor da
escravidão, entenda-se a favor da propriedade./ Esta diferença não é radical, mas
aparente e acessória. As causas do artigo
19 é certo que não as propõe o escravo,
mas o senhor; não têm por objeto a libertação, mas a prova da propriedade do
senhor e da força maior que deu lugar à
falta de matrícula. Mas em que tal
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diversidade de origem pode eliminar o
objeto essencial e superior do pleito, isto
é, a liberdade do escravo?/ Importa
pouco ou nada que o recurso à justiça parta
do escravo ou do senhor, desde que o
resultado do pleito é dar ou retirar a condição livre ao indivíduo nascido na escravidão. Acresce que, na hipótese do artigo
19, a decisão contraria a liberdade, é contrária à liberdade adquirida, anula um efeito
da lei, restitui à escravidão o indivíduo já
chamado à sociedade livre; neste, como
no caso do artigo 7o
da lei, é a liberdade
que perece; em favor dela deve prevalecer
a mesma disposição”.
Ainda não esgotara, no entanto, sua
argumentação. E assim concluiu: “Na diferença entre ação sumária (artigo 7o
da lei) e
ação ordinária(artigo 19 do regulamento) não
estará, presumo eu, a razão da diferença
para a aplicação do recurso de que se trata.
Ser sumário ou ordinário o processo,
suponho que apenas lhe diminui ou multiplica os trâmites, circunstância alheia ao
ponto litigioso./ Outrossim, convém não
esquecer o espírito da lei. Cautelosa, eqüitativa, correta, em relação à propriedade dos
Senhores, ela é, não obstante, uma lei de
liberdade, cujo interesse ampara em todas
as suas partes e disposições. É ocioso apontar o que está no ânimo de quantos a têm
folheado; desde o direito e facilidades da
alforria até à disposição máxima, sua alma
e fundamento. Sendo este o espírito da lei,
é para mim manifesto que num caso como
o do artigo 19 do regulamento, em que,
como ficou dito, o objeto superior e essencial é a liberdade do escravo, não podia o
legislador consentir que esta perecesse sem
aplicar em seu favor a preciosa garantia
indicada no artigo 7 o da lei./ Tal é o meu
parecer, que sujeito à esclarecida competência da Diretoria. Em 21 de julho de
1876./Machado de Assis”.
Mas isso não foi bastante para convencer o diretor Gusmão Lobo, que voltou
a insistir em seu ponto de vista e terminou
por sugerir: “A questão é grave e, dada a
diversidade de pareceres, penso que deve
ser submetida ao exame da ilustrada Seção
dos Negócios da Justiça do Conselho de
Estado, cujo esclarecido voto exercerá
decisiva influência sobre o ânimo dos
julgadores, concorrendo para firmar uma
interpretação segura e invariável./3 de
agosto de 1876./ Gusmão Lobo”. Os membros da Seção dos Negócios da Justiça do
Conselho de Estado eram três juristas
ilustres: o conselheiro José Tomás Nabuco
de Araújo, pai de Joaquim Nabuco e
antigo ministro da Justiça; Francisco de
Paula Saião Lobato (visconde de Niterói),
antigo magistrado e ex-ministro da Justiça;
e José Ildefonso de Sousa Ramos, bacharel
em direito, parlamentar do Império e
também antigo ministro da Justiça. O parecer dos três ilustres homens de estado concluiu no mesmo sentido pelo qual se havia
manifestado Machado de Assis. É uma
peça longa, que examina minuciosamente
a questão e apresenta essas conclusões:
“A lei não diz ações de liberdade, mas
causas de liberdade; a lei refere-se ao objeto
e não ao meio. Mas, então, a ação do artigo
19 citado devia ser sumária? Não; porque
a lei só tem por fim favorecer a liberdade
e não a escravidão; as exceções são só em
favor da liberdade; a escravidão fica como
antes dela, no princípio ou regra de direito
comum, que é a ação ordinária. Portanto,
o argumento legal em que se apóia a
afirmativa é o argumento a simile, que
consiste em aplicar a um caso não previsto
na lei a regra estabelecida para caso semelhante, quando a razão de decidir é a
mesma. Esse argumento ainda tem mais
valor à vista da regra das Ordenações,
Livro 4o
, título II – que em favor da
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Raymundo Magalhães Jr.
liberdade são muitas coisas outorgadas
contra as regras gerais. Se em caso análogo e semelhante, tanto na espécie como
no motivo, não cabe a regra da Ordenação citada, não há mais hermenêutica, e as
leis devem ser casuísticas”. Remetendo o
processo ao despacho da princesa regente
(D. Isabel ocupava pela segunda vez o
trono do Império, enquanto o imperador
Pedro II viajava pela Europa depois de
ter representado o Brasil nas festas do
primeiro centenário da independência dos
Estados Unidos), o parecer acrescentava:
“Vossa Alteza mandará o que for melhor”.
O despacho de D. Isabel foi o clássico –
“como parece” – ou seja, a aprovação do
mesmo, datado do “Palácio do Rio de
Janeiro, 20 de outubro de 1876”. Encerrou-se, assim, a questão. Por falta de
matrícula, adquiriram a liberdade os três
escravos resendenses, pois que, muito
embora o senhor deles, José Pereira da
Silva Porto, houvesse ganho a ação
ordinária, esta não produzira efeitos para
o registro, por não ter havido apelação e,
logo, não existir sentença confirmatória de
segunda instância.
Quando dei conhecimento desse parecer de Machado de Assis ao jurisconsulto
brasileiro Levi Carneiro, que foi um dos
constituintes de 1934 e membro da Academia Brasileira de Letras, disse ele que,
embora não sendo formado em direito –
nem em qualquer outra coisa – Machado
de Assis demonstrara “uma clara consciência jurídica, um verdadeiro sentimento
de justiça, uma perfeita compreensão do
espírito da lei”. Foi depois de tal parecer
que o ministro da Agricultura, Comércio
e Obras Públicas, Tomás José Coelho de
Almeida, efetivou Machado de Assis no
cargo de chefe de seção, que ele exercia
interinamente. Isso foi feito por decreto
de 7 de dezembro de 1876, quando estava
no poder o último gabinete presidido pelo
senador Caxias (elevado a duque depois
da guerra com o Paraguai). Com as novas
responsabilidades e as vantagens financeiras decorrentes de sua efetivação em tal
posto, pôde Machado de Assis deixar o
cargo que exercia no Diário Oficial, consagrando-se daí por diante, como funcionário, apenas ao Ministério da Agricultura,
Comércio e Obras Públicas, que ainda em
vida dele começaria a ser desdobrado,
dando origem a outras pastas – como a
da Viação e a do Comércio.
Arranjou Machado de Assis outros
meios de aumentar os seus proventos, passando a escrever romances folhetins para
jornais, como O Globo e O Cruzeiro, ou para
revistas, como a Revista Brasileira. Em O
Globo, dirigido a partir do ano de 1874 por
seu amigo Quintino Bocaiúva – que viria a
ter grande evidência na República, como
ministro das Relações Exteriores, deputado
à Constituinte, senador e governador do
Estado do Rio de Janeiro – publicou
sucessivamente os romances A Mão e a luva,
em 1874, e Helena, em 1876. Em O
Cruzeiro, que começou a circular em 1878,
publicou o romance Iaiá Garcia. E, na
Revista Brasileira, iniciou em 1880 a publicação do romance Memórias póstumas de Brás
Cubas, uma de suas obras-primas, que se
prolongaria de março a dezembro, saindo
em volume no ano seguinte.
Por doze anos e quase quatro meses
permaneceu Machado de Assis como simples chefe de seção, muito embora tenha
exercido a função de oficial de gabinete
de dois ministros, durante esse período.
Quando, a 8 de março de 1880, passou a
exercer o cargo de ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas o
engenheiro Manuel Buarque de Macedo,
que se formara na Escola Politécnica do
Rio de Janeiro e, em seguida, fizera em
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Paris um curso de aperfeiçoamento profissional, Machado de Assis foi por ele
chamado para servir em seu gabinete. Mas
pouco durou a gestão do ilustre engenheiro.
Ele morreu repentinamente a 21 de agosto
de 1881, quando acompanhava o imperador D. Pedro II a Minas, na viagem
destinada a inaugurar o ramal ferroviário
de São João del Rei. Foi então designado
para responder pela pasta vaga o deputado-geral fluminense Pedro Luís Pereira
de Sousa, que era em caráter efetivo
ministro dos estrangeiros. Assoberbado
com o trabalho de duas pastas – a segunda
ainda mais trabalhosa que a primeira –,
Pedro Luís Pereira de Sousa confiou a
Machado de Assis grande parte de suas
tarefas na última. Durante os meses que se
seguiram, Machado de Assis foi praticamente um vice-ministro. Era quem recebia, em nome do ministro, as pessoas brasileiras e estrangeiras que tinham interesse a
tratar no seu Ministério. Quando o senador
José Antônio Saraiva passou a ocupar a
pasta, em caráter efetivo, Machado
retornou a seu posto de chefe de seção.
Só a 30 de março de 1889, quando
era ministro da Agricultura, Comércio e
Obras Públicas o senador Rodrigo
Augusto da Sirva, integrante do gabinete
chefiado por João Alfredo Corrêa de
Oliveira, que no ano anterior promovera
a abolição total da escravatura, é que
Machado de Assis foi novamente promovido. Passou, nessa data, a diretor de um
dos departamentos em que se dividia o
ministério. Seu título era o de diretor de
Viação. Com a República, proclamada a
15 de novembro de 1889, sua situação
permaneceu inalterada. O primeiro
ministro da Agricultura do novo regime,
foi, em caráter interino, o seu velho amigo
Quintino Bocaiúva, seu companheiro por
vários anos na redação do Diário do Rio de
Janeiro e, mais tarde, diretor de O Globo,
onde publicara dois romances. Quintino,
que era o ministro efetivo das Relações
Exteriores (novo nome do antigo Ministério dos Estrangeiros), pouco tempo
depois entregou a segunda pasta ao
ministro efetivo, Demétrio Ribeiro, que nela
pouco demorou, sendo a 30 de janeiro de
1800 substituído por Francisco Glicério.
Durante a gestão deste, Machado de Assis
sofreu uma tentativa de agressão, por parte
de outro funcionário, que, aliás, era também
escritor – Luís Francisco da Veiga –, mas
o ministro deu mão forte ao agredido. O
assunto chegou a ser tratado numa das
reuniões do chefe do Governo Provisório,
marechal Manuel Deodoro da Fonseca,
com seus ministros. Francisco Glicério disse
ter determinado a suspensão de Luís Francisco da Veiga, que entretanto, não se conformara. Assim, propunha a aposentadoria imediata de Luís Francisco da Veiga.
Tal proposta foi aprovada por unanimidade pelos presentes: Deodoro, Campos
Sales, Eduardo Wandenkolk, Cesário
Alvim, Benjamim Constant e o próprio
Francisco Glicério (dois ministros tinham
deixado de comparecer: Quintino e Rui
Barbosa, que era o titular da Fazenda).
Machado de Assis sofreu, durante o
último ano do governo do Marechal
Floriano Peixoto, injustos ataques de um
inimigo gratuito, o exaltado panfletário e
agitador político Deocleciano Mártir, que
então publicava um pequeno jornal
intitulado O Jacobino. Pouco depois de
encerrada a “revolta da esquadra”, o exaltado verrineiro começou a estampar nos
“a pedidos” dos jornais listas de pessoas
que eram por ele apresentadas como
“monarquistas impenitentes” e “adversários encapuzados do regime republicano”, exigindo que todos os denunciados fossem afastados, quanto antes, do
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Revista do Serviço Público Brasília 56 (2): 237-248 Abr/Jun 2005 245
Raymundo Magalhães Jr.
serviço público. Entre eles, além de
Machado de Assis e de numerosos outros,
estava o barão do Rio Branco, que então
pertencia ao serviço consular e viria a ser
um benemérito da República, além de ter
sido quem, até hoje, exerceu por mais
tempo o cargo de ministro das Relações
Exteriores – nada menos de dez anos –
servindo nos governos de Rodrigues Alves,
Afonso Pena, Nilo Peçanha e Hermes da
Fonseca. Machado de Assis não respondeu às acusações de Deocleciano Mártir.
Mas foi defendido por um “republicano
histórico”, Lúcio de Mendonça, sob o
pseudônimo de Z. Marcas, na revista A
Semana, de Valentim Magalhães. Lúcio de
Mendonça, que exercia importante cargo
no Ministério da Justiça, fez ao mesmo
tempo o elogio do escritor e do funcionário, ambos merecedores de consideração, estima e reconhecimento.
Na verdade assim era. Lúcio de Mendonça não citou, mas poderia ter citado
casos específicos, em que Machado de Assis
demonstrara seu espírito público, evitando
que erros fossem cometidos pela administração, como no parecer sobre os escravos
de Resende e episódios semelhantes. Um
destes era bem recente.
Ocorrera dois anos antes, quando
lavrara a grande crise financeira, que deu
lugar às especulações do chamado “encilhamento”. Em maio de 1892, quando o
governo do marechal Floriano Peixoto
ainda não havia completado um ano,
Machado de Assis vira, no Diário Oficial, a
publicação de um “relatório de invenção”,
firmado por um norte-americano, George
Boyngton Boyngton, que dizia ter descoberto “um processo engenhosíssimo e
inteiramente novo para a obtenção do
capital necessário a um empreendimento
qualquer”. E acrescentava: “A idéia do
inventor é aproveitar o bem conhecido
espírito de especulação do povo, a fim de
dirigir, a um destino novo e útil, o dinheiro
empregado em especulações arriscadas”.
E adiante explicava que se tratava da
“venda de cartões, em tal número e tal
preço, que de seu produto, deduzidas as
despesas, ficaria como lucro líquido o
capital desejado.” E ainda: “Exemplificando para maior clareza: dado que se
precise, para uma empresa reunir o capital
de 550:000$, anunciava-se a venda de
200.000 cartões, a 5$ cada um, o que
produzirá 1.000:000$. Dessa quantia há a
deduzir: o desconto de 10% dos vendedores, 100:000$; as despesas dos anúncios
e outras, 20:000$; os prêmios pagos em
dinheiro, 330:000$; 450:000$. Restam os
desejados 550:000$, que constituem o
capital da companhia, dividido em ação
de 200$ cada uma, das quais umas serão
distribuídas por segundo sorteio e outras
ficarão pertencendo ao inventor da distribuição sistemática”... Era uma arapuca,
uma dupla loteria – e a patente já havia
sido concedida, pelo Ministério da
Fazenda, sob o número 1.140.
Machado de Assis, por puro espírito
público, ainda que se tratasse de assunto
de outro ministério, resolveu intervir para
promover a cassação de tal patente, aprovada por inadvertência do jovem ministro
da Fazenda, Inocêncio Serzedelo Correia.
Em caso anterior, quando outra patente
fora concedida, para outra loteria dissimulada, a anulação fora promovida por via
judicial, pois que fora outorgada pelo
Governo Provisório, que tinha poderes
não só executivos, mas legislativos. Depois
de ouvir o parecer da 2a
Seção da Diretoria de Comércio, Machado de Assis
submetera o assunto à decisão do ministro da Agricultura, Comércio e Obras
Públicas, Antão Gonçalves de Faria,
pedindo que fosse promovida a anulação
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da patente de Boyngton. Apesar dos
protestos de Boyngton, que ameaçou promover uma ação por perdas e danos, a
Diretoria de Comércio, pela qual respondia Machado de Assis, obteve que o
ministro interviesse, para anular a concessão, o que acabou sendo feito, por
despacho de 8 de setembro de 1892, por
se ter “transformado a concessão em
loteria e em fonte de jogo”. Lúcio de Mendonça não citou em defesa de Machado
de Assis essa recente demonstração de zelo,
mas condenou as maliciosas denúncias de
Deocleciano Mártir, dirigindo-se a esse
desabusado panfletário: “Com um nome,
então, foi você caipora como nos seus
piores dias: com o nome de Machado de
Assis. Quem é este homem, sabem-no
todos, menos talvez o Sr. Deocleciano
Mártir. É um filho de si próprio, ex se natus,
na enérgica expressão de Tácito; obscuro,
artista anônimo, tipógrafo, depois revisor
de provas, depois noticiarista, depois cronista e poeta, depois chefe incontestado da
literatura brasileira. Apenas isto: uma
reputação nacional, feita a pouco e pouco,
passo a passo, dia a dia, na modéstia, na
perseverança e no trabalho para o pão de
cada dia, e no estudo e no esforço nobre
para a conquista do saber e da glória. Se
há um homem para honrar toda uma
democracia moderna é este. Quem quer
que tenha uma leve intuição de justiça, uma
centelha de paixão republicana, há de
venerar este homem. O Sr. Deocleciano
Mártir apedreja-o. É medonho para você,
jacobino”.
Mais importante ainda que a defesa de
Lúcio de Mendonça – que não tardaria a
ser procurador geral da República em
seguida, ministro do Supremo Tribunal
Federal – foi a carta de agradecimento que
o general Sérgio Bibiano da Fonseca
Costallat – o último ministro da Agricultura,
Comércio e Obras Públicas do governo do
marechal Floriano Peixoto – enviou a
Machado de Assis na data em que deixou o
poder. Nessa carta, louvou ele a capacidade
e a diligência do funcionário Machado de
Assis, dizendo que, sem o seu esclarecido
auxílio e sem o seu profundo conhecimento
dos negócios daquela pasta, com os quais,
como militar, pela primeira vez lidava, não
teria conseguido desempenhar-se a contento
do cargo de ministro, a que fora levado pela
confiança de Floriano.
Machado de Assis viria a sofrer, no
governo do presidente Prudente de
Morais, o que considerou uma grave
injustiça. Julgando lhe ser agradável e
querendo deixar-lhe mais tempo livre para
seus trabalhos literários, o novo ministro,
Sebastião Eurico Gonçalves de Lacerda –
pai do grande tribuno parlamentar
Maurício de Lacerda e avô de Carlos
Lacerda – resolveu substituir Machado de
Assis na Diretoria de Viação, que então
ocupava, deixando-o como simples
“adido à Secretaria de Estado, percebendo
os vencimentos que lhe competirem”.
Machado ficou muito magoado, achando
que o ministro o julgara um inútil. Queixouse muito, em cartas aos amigos, não se
conformando em ficar de braços cruzados,
ganhando o dinheiro da nação sem
trabalhar. Foi durante esse período que
escreveu uma de suas obras-primas, Dom
Casmurro; sempre demonstrara, em seus
romances, contos e crônicas, profunda
aversão aos parasitas. E era sincero. Não
queria ser um deles. E não sossegou
enquanto não voltou à atividade, embora
diminuído funcionalmente: de diretor de
um departamento, passou a ser simples
secretário do ministro Severino Vieira.
Quando este se demitiu, no governo de
Campos Sales, para candidatar-se ao
governo da Bahia, o ministro da Justiça,
RSP
Revista do Serviço Público Brasília 56 (2): 237-248 Abr/Jun 2005 247
Raymundo Magalhães Jr.
Epitácio Pessoa, nomeado para substituir
interinamente Severino Vieira, não se deu
bem com Machado de Assis. Jovem, irrequieto, Epitácio estava então veraneando
em Petrópolis. Pela manhã, atendia ao
expediente da pasta da Justiça. À tarde, ia
para o outro Ministério, onde Machado
de Assis lhe fazia minuciosas exposições
sobre cada assunto, apresentando-lhe em
seguida as minutas dos despachos. Epitácio
queria sempre abreviar as exposições, a fim
de não perder a barca que saía da Prainha
para Mauá, no fundo da baía, de onde nos
fins do século passado partia o trem para
Petrópolis. Algumas vezes perdeu a barca,
só tomando a segunda e chegando à casa
já em plena noite. Por isso disse um dia, de
Machado: “Grande escritor, mas péssimo
secretário!” Talvez Machado, sem o dizer,
pensasse a mesma coisa de Epitácio:
“Moço inteligente, mas muito afobado
para ser um bom ministro!”
Machado passou vários anos constrangido e humilhado até encontrar, em Lauro
Müller – o grande ministro da Viação que
iniciou as obras do Porto do Rio de Janeiro
e fez construir a avenida Central, hoje
avenida Rio Branco – quem lhe fizesse
justiça. Lauro Müller fez Machado voltar a
ser diretor. E diretor-geral de Contabilidade. O sucessor de Lauro Müller, Miguel
Calmon, a 16 de dezembro de 1907,
aumentou ainda mais suas responsabilidades,
nomeando-o juntamente com Luís Rodolfo
Cavalcanti de Albuquerque (diretor das Rendas Públicas do Tesouro Nacional) e com
o engenheiro Francisco Bicalho, para exercer as funções de membro da Comissão
Fiscal e Administrativa das Obras do Porto
do Rio de Janeiro, sem prejuízo de suas
funções de diretor-geral de contabilidade.
Machado de Assis morreu no ano seguinte,
a 29 de setembro, com 69 anos de idade e
com 40 anos e cinco meses de serviço
público. Morreu sem ter se aposentado,
porque teve a preocupação de ser útil à
pátria, enquanto teve forças para tanto.
Seus funerais foram custeados pelo
governo federal e o Ministério da Viação,
Indústria e Obras Públicas, em que ele trabalhava (o da Agricultura já tinha então
existência à parte). O expediente da Diretoria Geral de Contabilidade foi encerrado
ao meio-dia, para que os funcionários
subordinados a Machado de Assis pudessem comparecer ao enterro, que saiu do
Silogeu Brasileiro, à rua Augusto Severo,
onde então a Academia Brasileira de Letras
tinha a sua sede. O senador Rui Barbosa,
membro da Academia, discursou na saída
do enterro. Falaram, no Senado, o senador
Érico Coelho e, na Câmara, o deputado
Alcindo Guanabara, fazendo o seu elogio.
O presidente Afonso Pena, que morreria
no ano seguinte, transmitiu à Academia
Brasileira de Letras este telegrama: “Apresento a essa ilustre corporação os meus
sinceros pêsames pelo falecimento de seu
preclaro presidente, Machado de Assis,
glória da literatura brasileira”.
Todas essas homenagens – e muitas
outras, que seria longo enumerar-se – dirigiam-se, é claro, ao escritor que, nos seus
últimos anos de vida, culminara sua atividade com a publicação de alguns dos seus
mais notáveis livros – os romances Dom
Casmurro, Esaú e Jacó e Memorial de Aires e as
narrativas curtas das Várias histórias, dos
Papéis avulsos e das Relíquias de casa velha.
Porque também nas letras, como na função pública, não se aposentou. E só largou
a pena quando a morte o venceu.
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Diego Amorim entrevista os irmãos Miranda - Papo Antagonista especial
57.487 visualizaçõesTransmitido ao vivo em 26 de jun. de 2021
O Antagonista
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*** *** https://www.youtube.com/watch?v=l5SUxWKowbA *** ***
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Taiguara - Imyra, Tayra, Ipy, Taiguara (1976) - Completo/Full Album
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Heroico disco de Taiguara, com arranjos de Hermeto Paschoal e regência de Wagner Tiso. Contou com um elenco de grandes músicos, dentre eles, Jacques Morelenbaum, Toninho Horta, Nivaldo Ornelas e Novelli.
O álbum é célebre por ter sido recolhido das lojas pela censura da Ditadura Militar, apenas trinta e seis horas após o seu lançamento, permanecendo sem reedição nacional até este ano.
Para maiores informações: http://www.taiguara.art.br
Faixas:
01 - Pianice (Pecinha Sinfônica) 00:00
02 - Delírio Transatlântico e Chegada no Rio 01:28
03 - Público 01:57
04 - Terra das Palmeiras 07:24
05 - Como em Guernica 11:47
06 - A Volta do Pássaro Ameríndio 15:10
07 - Luanda, Violeta Africana 19:25
08 - Aquarela de um País na Lua 20:50
09 - Situação 24:32
10 - Sete Cenas de Imyra 28:26
11 - Três Pontas 33:10
12 - Samba das Cinco 36:51
13 - Primeira Bateria 39:33
14 - Outra Cena 42:19
Todas as faixas compostas por Taiguara Chalar da Silva, com exceção de "Três Pontas", de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos.
Excertos dos créditos e citações retirados do encarte do LP:
"Por motivos de 'edição', as músicas 'Situação', 'Público' e 'Terra das Palmeiras' foram assinadas por Gheisa Gomes Chalar da Silva".
"...ela está tão ocupada sendo árvore..." Joni Mitchell
"... numa América dita latina que é na verdade a América Indígena". Jean Louis Davant
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A moral impõe o impeachment de Jair Bolsonaro
Mario Sabino
Mario Sabino
30.06.21 11:51
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Depois das revelações da Crusoé sobre a oferta de propina a Luis Miranda no caso da Covaxin, o presidente já pode ser acusado de prevaricação
A moral impõe o impeachment de Jair Bolsonaro
Reprodução/Redes Sociais
O repórter Patrik Camporez, da Crusoé, revelou em reportagem publicada ontem à noite que o deputado Luis Miranda, que esteve pessoalmente com o presidente Jair Bolsonaro, ao lado do irmão Luis Ricardo Miranda, servidor do Ministério da Saúde, para alertá-lo sobre um esquema de corrupção na compra da vacina Covaxin, esteve por duas vezes numa dessas casas de encontros noturnos usadas por lobistas em Brasília. De acordo com Luis Miranda, o lobista Silvio Assis, figura notória na Capital Federal, queria convencer Miranda a interceder junto ao irmão, para que ele parasse de impor dificuldades ao contrato firmado com Precisa Medicamentos, intermediária entre o laboratório indiano fabricante da Covaxin e o Ministério da Saúde. Contrato no valor de 1,6 bilhão de reais. Numa das reuniões, estava presente o deputado Ricardo Barros, líder do governo citado pelo presidente da República quando foi alertado sobre o esquema por Luis Miranda e o irmão. “Mais uma desse cara, não aguento mais”, teria dito Jair Bolsonaro aos denunciantes. Ele prometeu acionar a Polícia Federal para investigar o caso, mas nada fez. Aguentou mais.
Depois que a reportagem foi publicada pela Crusoé, Luis Miranda foi ao Twitter para dizer o seguinte: “A revista Crusoé é responsável por suas matérias e certamente arcará com o que escreve! Não quero ser usado para criar narrativas e volto a afirmar que a todas as minhas conversas com Ricardo Barros foram republicanas e não vou me pronunciar sobre fatos que não posso provar!” Pouco tempo depois da publicação do tuíte, Luis Miranda o apagou e deu entrevista exclusiva a Rodrigo Rangel, diretor da revista Crusoé.
Na entrevista publicada hoje de manhã, Luis Miranda confirma que no segundo encontro com Silvio Assis, ao qual estava presente Ricardo Barros, o lobista propôs-lhe uma propina de 6 centavos de dólar por dose de Covaxin comprada pelo Ministério da Saúde — o que totalizaria uma bolada de 1,2 milhão de dólares. De acordo com Luis Miranda, a proposta não lhe foi feita em frente a Ricardo Barros, mas à saída da casa, quando o lobista o acompanhou. A vagabundagem em Brasília segue uma liturgia.
Luis Miranda, em sua conversa com Rodrigo Rangel, definiu assim a casa onde se encontrou com o lobista e o líder do governo: “Para mim, aquela é uma casa como as das frentes parlamentares que fazem jantares… Há vários ambientes (em Brasília) que têm frentes parlamentares e que têm defesas de bandeiras… Oferecem jantares para fazer networking entre parlamentares que precisam fazer ajustes de entendimento. É normal isso. Vou dar um exemplo, o da energia solar. O pessoal da energia solar estava batendo de frente com a opinião do Marcelo Ramos (vice-presidente da Câmara). Então, é normal o pessoal se reunir e tentar convencer os deputados, dizer que não vai ter impacto na conta de energia dos mais pobres. E aí eles usam para tentar explicar para nós. É algo republicano, normal, sem nenhum tipo de oferta. Infelizmente, eu tive o desprazer de receber uma oferta que eu não entendi como uma oferta empresarial. Apesar de não ter citado o nome do meu irmão, ele falar para eu “ajudar com as vacinas” foi mais do que suficiente. Como eu ajudaria? Eu sou um deputado. Sou do Legislativo, e não do Executivo”.
Chega a ser enternecedor como Luis Miranda acha “republicano” e “normal” reuniões feitas na caluda, entre lobistas e parlamentares, em casas utilizadas para esse fim. Talvez ele tenha comparecido duas vezes ao encontro com o lobista, aliás, para mostrar como são sólidas as suas próprias convicções republicanas. É comovente como o deputado ainda tenta livrar a cara de Jair Bolsonaro. Perguntado “se considera que há relação entre essa oferta (de 1,2 milhão de dólares de propina) e a denúncia que o sr. havia feito ao presidente Jair Bolsonaro, semanas antes, sobre as suspeitas em torno da compra da Covaxin”, ele fez uma pausa e respondeu: “Eu juro que, apesar de eu ter achado a oferta imoral naquele momento, com esses últimos desdobramentos eu estou começando a perceber que é o modus operandi de algumas pessoas, e talvez com influência dessa pessoa que me fez a oferta”.
Rodrigo Rangel voltou à carga e questionou se “a denúncia feita ao presidente pode ter deflagrado a ação dessas pessoas interessadas em fazer com que o negócio avançasse”. Luis Miranda afirmou: “não consigo precisar isso porque em nenhum momento ele fala em nome do presidente. Volto a dizer: eu estava indo para o carro, e o cara fala: ‘Deputado, se puder ajudar a gente com a questão da vacina, consigo colaborar com você, com a sua campanha, com 6 centavos de dólar por unidade’. Aí eu falo assim: ‘Está ficando louco, meu irmão? Não estou entendendo o que você está falando. Se você falar isso novamente, vou ter que te dar voz de prisão‘. E ele diz: ‘O que é isso deputado, estou falando com o empresário… O senhor também não é empresário?‘. E eu digo: ‘Não, amigo. Eu sou parlamentar, não trabalho com vacina, como você quer que eu te ajude?‘. Aí ele diz: ‘Então esquece. Se o senhor se incomodou, se eu lhe ofendi, então esquece‘. E deu um sorriso. Eu olhei para ele com cara de quem comeu e não gostou e fui embora”.
As revelações feitas pela Crusoé e confirmadas por Luis Miranda deixam claro que Ricardo Barros, líder do governo de Jair Bolsonaro, está enrolado até o nó da gravata nessa história suspeitíssima sobre a compra da Covaxin — uma vacina que, por recomendação da Anvisa, só poderia ser aplicada em menos de 1% da população, apesar de Ricardo Barros ter movido mundos e, pelo jeito, fundos para que fosse adquirida pelo Ministério da Saúde. O líder do governo também foi convocado pela CPI da Covid e, como disse a senadora Simone Tebet, precisaria ser acareado com Luis Miranda. A revista trouxe ainda para dentro do caso o lobista Silvio de Assis, que dizia agir em nome da Precisa, intermediária da compra da Covaxin produzida na Índia.
A figura cada vez menos oculta dessa trama, contudo, é a do presidente Jair Bolsonaro. Diante de tudo o que foi revelado, ele já pode ser acusado de crime de prevaricação, para dizer o mínimo. O governo que não comprou as vacinas certas no momento certo agora está enlameado por um esquema de corrupção alicerçado sobre uma doença que já matou mais de meio milhão de brasileiros, carnificina para a qual o próprio presidente contribuiu de maneira decisiva com o seu comportamento de sociopata. Nas mãos do Centrão, do qual Ricardo Barros é expoente, Jair Bolsonaro deixou o esquema correr solto, até que o deputado Luis Miranda e o seu irmão colocassem a boca no trombone. A moral impõe o impeachment do presidente da República.
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Em destaque:
Luis Miranda Ricardo Barros propina de 1
Leia mais: O furo de reportagem de O Antagonista sobre a mansão comprada por Flávio Bolsonaro em Brasília é dissecado na edição desta semana da Crusoé
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