segunda-feira, 26 de julho de 2021

«sentimento do mundo»

101 anos de Celso Furtado *** "Um brasileiro honrado, decente e culto. Exemplar." Luiz Sérgio Henriques ***
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*** *** Roda Viva | Especial Celso Furtado | 25/07/2020 26.213 visualizaçõesTransmitido ao vivo em 25 de jul. de 2020 Roda Viva A TV Cultura presta tributo a um dos mais importantes intelectuais brasileiros: o economista Celso Furtado. Ex-ministro de dois governos, embaixador e autor de mais de 30 livros, ele completaria 100 anos em 26 de julho de 2020. Para homenageá-lo, a emissora exibe uma edição especial do Roda Viva realizado em 1987 com Furtado. *** *** https://www.youtube.com/watch?v=wPOJMGxBIoA *** *** *** Celso Monteiro Furtado (Pombal, 26 de julho de 1920 — Rio de Janeiro, 20 de novembro de 2004) foi um economista e pensador brasileiro, responsável pela arquitetura de muitas das políticas de cunho econômico arquitetadas no Brasil nas últimas décadas. *** A vida de Celso Furtado se distingue pela infatigável peleja, pela vontade jamais enfraquecida, de combinar e conduzir, no projeto brasileiro, de modo algum insensível ao latino-americano e ao internacional, democracia e justiça social. São instâncias éticas e políticas, com as quais vive pela vida afora, levando juntos a ancestralidade nordestina e, se me permitir Carlos Drummond de Andrade, o «sentimento do mundo». Discurso de recepção por Eduardo Portela *** *** https://www.academia.org.br/academicos/celso-furtado/discurso-de-recepcao *** *** ***
*** Biografia Oitavo ocupante da Cadeira 11 , eleito em 7 de agosto de 1997, em sucessão a Darcy Ribeiro e recebido pelo Acadêmico Eduardo Portella em 31 de outubro de 1997. Celso Furtado (C. Monteiro F.) nasceu em 26 de julho de 1920 em Pombal (Paraíba) e faleceu em 20 de novembro de 2004 no Rio de Janeiro. Filho de Maurício de Medeiros Furtado, de família de magistrados, e de Maria Alice Monteiro Furtado, de família de proprietários de terra. Foi casado com a jornalista Rosa Freire d`Aguiar. Estudos secundários no Liceu Paraibano, em João Pessoa, e no Ginásio Pernambucano, no Recife. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1944), Doutor em Economia (1948) pela Universidade de Paris (Sorbonne). Estudos de pós-graduação na Universidade de Cambridge, Inglaterra (1957), sendo Fellow do King`s College. Participou da Força Expedicionária Brasileira durante a Segunda Guerra Mundial. Técnico de Administração do Governo Brasileiro (1944-45). Economista da Fundação Getúlio Vargas (1948-49); Como Diretor da Divisão de Desenvolvimento da CEPAL (1949-57), contribuiu de forma decisiva, ao lado do economista argentino Raúl Prebish, para a formulação do enfoque estruturalista da realidade socioeconômica da América Latina; Diretor do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE) (1958-59); No Governo de Juscelino Kubitschek, elaborou o Plano de Desenvolvimento do Nordeste, que deu lugar à criação da SUDENE, órgão que dirigiu por cinco anos (1959-64); No Governo João Goulart, foi o primeiro titular do Ministério do Planejamento (1962-63); Com o golpe militar de 1964, teve seus direitos políticos cassados por dez anos, dedicando-se então à pesquisa e ao ensino da Economia do Desenvolvimento e da Economia da América Latina em diversas universidades como as de Yale (EUA, 1964-65), Sorbonne (França, 1965-85), American University (EUA, 1972), Cambridge (“Cátedra Simon Bolívar”- Inglaterra, 1973-74), Columbia (EUA, 1976-77); Com a redemocratização, foi embaixador do Brasil junto à Comunidade Econômica Européia (1985-86), em Bruxelas, e Ministro da Cultura do Governo Sarney (1986-88), quando elaborou a primeira legislação de incentivos fiscais e fez a defesa da identidade cultural brasileira; Membro do Conselho Editorial das revistas Econômica Brasileira (1954-64), Desarollo Ecnómico (Buenos Aires, 1966-70), El Trimestre Econômico (México, 1965- ), Revista de Economia Política (São Paulo, 1981- ), Pensamiento Iberoamericano (Madri, 1982- ); Membro do Conselho Acadêmico da Universidade das Nações Unidas (Tóquio, 1978-82), do Committee for Development Planning das Nações Unidas (1979-82), da South Commission (1987-91), da Commission mondiale pour la Culture et lê développement (ONU/UNESCO, 1993-95), do Comitê International de Bioéthique (UNESCO, 1995-97); Doutor Honoris Causa das Universidades: Técnica de Lisboa (Portugal, 1987), da Estadual de Campinas-UNICAMP (Campinas, SP, 1990), Federal de Brasília (Brasília, 1991), Federal do Rio Grande do Sul (Porto Alegre, 1994), Federal da Paraíba (João Pessoa, 1996), Pierre Mendès-France (Grenoble, França, 1996), Estadual do Ceará (Fortaleza, 2001), Estadual de São Paulo-UNESP (São Paulo, 2002), Federal do Rio de Janeiro (Rio de Janeiro, 2002); Membro do PEN Clube do Brasil (1991); Em 1997, a Academia de Ciências do Terceiro Mundo, sediada em Trieste, criou o “Prêmio Celso Furtado”, outorgado a cada dois anos a um cientista social do Terceiro Mundo; Em 2001 a Fundação Carlos Chagas de Apoio à Pesquisa do estado do Rio de Janeiro instituiu o “Prêmio Celso Furtado de desenvolvimento”; Membro da Academia Brasileira de Ciências (2003). O economista Celso Furtado não se considerava “homem de letras”, mas homem de pensamento. Como pensador o reconhecem também críticos e estudiosos da economia, como o economista Francisco de Oliveira, ao afirmar que a obra de Celso Furtado vai além de outras interpretações da realidade brasileira, “não porque seja teoricamente superior, senão porque foi escrita in actione. Enquanto as obras anteriores explicaram e “construíram” o país do passado, a de Furtado explica e “constrói” o Brasil de seus dias”. Na revista Estudos Avançados da USP (n.15-43,2001), Tomás Szmrecsányi, professor do Instituto de Geociências da UNICAMP, escreve que “Celso Furtado continua sendo até hoje o economista brasileiro mais conhecido e melhor conceituado no mundo todo (...) não tanto pelos cargos que ocupou aqui e no exterior, mas principalmente ao interesse e à qualidade dos seus trabalhos científicos e técnicos em áreas tão diversas como a História Econômica, a Teoria do Desenvolvimento, a Política Econômica e o Planejamento. Já se contam às dezenas os estudos monográficos, as teses universitárias e os livros que foram publicados a respeito dos seus trabalhos”. No Correio das Artes n. 400 (de 31 de outubro de 1997), suplemento mensal de A União, de João Pessoa, Evandro Nóbrega, Coordenador Geral e Editor dessa edição comemorativa de sua recepção na ABL, registrou esse depoimento de Celso Furtado: “Quando, finalmente, aos 26 anos de idade, comecei a estudar Economia de maneira sistemática, minha visão do mundo já estava definida. Assim, a Economia não chegaria a ser mais que um instrumental, que me permitia com maior eficácia tratar problemas que vinham da observação da História ou da vida dos homens em Sociedade.Pouca influência teve a Economia, portanto, na conformação do meu espírito. Nunca pude compreender a existência de um problema “estritamente econômico”. Por exemplo, a inflação nunca foi, em meu espírito, outra coisa senão a manifestação de conflitos de certo tipo entre grupos sociais. Da mesma forma, uma empresa nunca foi outra coisa senão a materialização do desejo e Poder de um ou vários agentes sociais, em uma de suas múltiplas formas”. Celso Furtado está entre os grandes economistas do mundo que estudaram, no pós-guerra, e de forma pioneira, os problemas do desenvolvimento econômico relacionando-os com problemas históricos, como Gunnar Myrdal, Raúl Prebisch, Ragnar Nurkse, Hans Singer e outros. *** *** https://www.academia.org.br/academicos/celso-furtado/biografia *** *** *** *** Celso Furtado - Homenagem ***
*** Celso Furtado - Homenagem Assistir Enviado por: Planalto, 1 de dez. de 2010 *** *** *** https://www.youtube.com/watch?v=H4xuZMxCu5U *** *** Celso Furtado: uma homenagem Gérard Destanne de Bernis DOSSIÊ NORDESTE I Celso Furtado: uma homenagem Gérard Destanne de Bernis O QUE ESTAVA ESCRITO já em 1950 haveria de se concretizar um dia. O senhor trabalhava na CEPAL quando entrou no universo de Pierre Mendes France e, desse relacionamento, logo nasceu uma estima recíproca. A Universidade que leva o nome de Mendes France não o acolheria, então, na qualidade de um de seus grandes veteranos; posteriormente, porém, o senhor uniu-se a ela e, melhor ainda, na qualidade de um Mestre para nós todos, de um amigo! Se associo essas duas palavras é porque o senhor é dessas pessoas para quem é impossível ser um verdadeiro Mestre sem ser um grande amigo. Assim, estamos hoje reunidos. Pressinto que suas palavras serão sobre Mendès France; as minhas, entretanto, serão a seu respeito. Faço-o, evidentemente, em nome de meus colegas que, respeitando a tradição das antigas tribos, designaram o mais velho dentre todos eles para lhe dizer que daqui a pouco sentiremos grande honra, mais ainda, imenso prazer quando lhe forem entregues as insígnias que o tornarão um de nossos colegas, no mais alto nível que uma Universidade pode conceber. Doutor em Direito em 1944 e técnico em finanças do governo brasileiro, o senhor vem a Paris para aprofundar seus estudos de economia e é portador de uma carta. Ainda não conhece seu destinatário embora, por uma dessas artimanhas que a história aprecia, ele tenha permanecido longo tempo em seu país antes de se incorporar às Forças Francesas Livres que se preparavam para libertar a África. Foi uma temporada que ele jamais esqueceu, e, melhor ainda, lhe despertou essa paixão pela economia internacional e pelo desenvolvimento, a mesma que já era a sua, e o trouxe a Paris para estudar. O senhor entrega-lhe a carta, segue os seus cursos, descobre esse Mestre inesquecível que foi Maurice Byé, o qual também o descobre. Como fez com outros, sugere-lhe que escreva uma tese. Será L'économie coloniale brésilienne, já caracterizada pelo recurso à história para compreender a realidade presente, método que define todo o seu trabalho posterior. O senhor enxerga em Maurice Byé o que ele é, um verdadeiro professor, e tornam-se amigos. Enquanto viveu, ele lhe manifestou uma amizade que se tornaria afeição, e cada vez mais admirativa, disse-me várias vezes; era um sentimento recíproco, disse-me o senhor várias vezes. Doutor em ciências econômicas, Cambridge o convida, e como o seu desejo é percorrer o mundo para compreendê-lo – o que fará 15 anos depois em outras circunstâncias –, o senhor para lá se dirige. Como Fellow do King's College, trabalha com Kaldor e Joan Robinson. Já em 1949, de volta ao seu país, Raul Prebisch o contata de imediato, melhor dizendo, o mobiliza. O encontro ocorre na CEPAL, a mais conhecida, porque a mais ativa, sobretudo a mais inovadora das comissões econômicas das Nações Unidas, na qual o seu cargo será de diretor da Divisão de Desenvolvimento Econômico. A dupla Raúl Prebisch-Celso Furtado tem um objetivo: transformar a Terra, fazer com que ela se torne enfim capaz de alimentar e humanizar todos os seus habitantes sem qualquer discriminação, e permitir que eles se realizem. Isso passava por uma análise, e deixo Prebisch explicar o trabalho de ambos: "Buscávamos compreender a natureza, as causas e a dinâmica das desigualdades internacionais, estudávamos algumas de suas manifestações, as diferenças de elasticidades e a tendência à deterioração dos termos do intercâmbio para as exportações de produtos primários que a industrialização ou outras medidas políticas podiam modificar. Procurando uma explicação para esses fenômenos, assinalamos o fato de que os países latino-americanos pertenciam a um sistema de relações econômicas internacionais a que chamávamos de Centro-Periferia (...). Favorecidos por suas posições e por seu avanço tecnológico, os países industrializados organizavam um sistema global em interesse próprio. Os países que produziam e exportavam matérias-primas estavam então ligados ao Centro por seus recursos naturais. Isso condicionava a estrutura e a dinâmica de cada país (...). Da mesma maneira, o sistema de relações internacionais acentuava o grau em que as riquezas da Periferia eram aspiradas (siphoned off) pelo Centro". Tomei o texto de Prebisch para não citar todos os outros em que o senhor desenvolve essa análise, mas também porque quando a Encyclopaedia Universalis, em seu volume 18 da primeira edição de 1968, refere-se à CEPAL, leio que "o economista brasileiro Celso Furtado foi por vários anos um dos especialistas mais destacados da Comissão à qual insuflou a um só tempo um dinamismo inegável e uma orientação de estudos duradoura." A sua equipe, à qual devemos tantos ensinamentos, deu-nos uma lição que tentamos preservar em Grenoble: foram a história e a economia internacional que lhe permitiram compreender o presente da América Latina, sua terra natal. O senhor não raciocina em termos de dependência, e lamento que uma recente Histoire des pensées economiques haja deformado seu pensamento a esse ponto, mas, tal como Perroux, em termos de dominação, ou, para ser ainda mais preciso, de uma dupla dominação, a externa apoiando-se na interna, inicialmente reforçando-a para melhor fundar seu poder. Como Perroux, o senhor afirma que o subdesenvolvimento, produto da dominação exercida por outros, não é uma fase, mas uma situação histórica, um fenômeno estrutural. O senhor é um teórico do desenvolvimento, porém necessita agir concretamente. Troca a CEPAL pela direção do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico do Brasil. Mas não se esquece de suas raízes profundas, que estão no Nordeste, longe do Rio, de São Paulo e dos negócios, uma região agrícola, difícil, pobre, com uma renda média que é um terço da renda do resto do país, sendo ali mais duro do que em outras partes o jogo dessa dupla dominação. A estagnação e muitas vezes a regressão não são recentes: o produto per capita diminui desde cerca de fins do primeiro século da colonização (1650), sendo acompanhado pela longa desagregação da economia açucareira na faixa litorânea e pelo isolamento do sertão, que o breve surto da produção algodoeira por ocasião da guerra de Secessão dos Estados Unidos não chega a compensar. Enquanto o Centro-Sul promove seu crescimento a partir de 1850 em torno da expansão cafeeira, das vagas de imigração e das primeiras indústrias de transformação, a renda per capita do Nordeste continua a diminuir em cerca de 0,6% ao ano. Mais ainda, as desigualdades não cessarão de aumentar com o início da industrialização: a contribuição do Nordeste ao PNB, que era da ordem de 30% em 1939, já não passa de 11% em 1959. Mais ainda, desde o fim da guerra, por diversos meios o poder público subtraiu durante mais de dez anos uma renda estimada em US$ 25 milhões por ano do Nordeste exportador em benefício do Centro-Sul. Não estou inventando nada. Trata-se de uma síntese do que o senhor explicou ao meu amigo Jean Marie Martin, quando teve a gentileza de recebê-lo em Recife, em 1963. Lamentável coincidência, ele está neste exato momento em seu país, e encarregou-me de lhe transmitir seu pesar por estar ausente a este evento. Mas é isso também o que o senhor escreve em A operação Nordeste, em 1959, e desenvolve, no mesmo ano, na Formação econômica do Brasil, o livro que o torna conhecido no mundo inteiro por suas seis traduções, sendo que a francesa é a antepenúltima, só em 1972... e em A pré-revolução brasileira, publicada na França em 1964. Voltarei ao assunto. No Banco de Desenvolvimento, o senhor insiste em cuidar prioritariamente do Nordeste. Torna-se o chefe da Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste, conhecida no resto do mundo por sua sigla – SUDENE – e, simultaneamente, por algum tempo, é ministro do Planejamento de Goulart, ao ser o Ministério criado por sua iniciativa. O ano de 1959 é histórico: Castro derruba o regime de Batista e tudo parece possível; começa-se mesmo a pensar que um mundo novo poderia nascer. Eu teria, assim como meus colegas, grande satisfação em ver Albert Hirschmann ao seu lado nesta cerimônia de homenagem e amizade respeitosa: os dois juntos iriam nos contar as conversas que tiveram quando ele foi visitá-lo na SUDENE. Ele diz algo a respeito em seus Development projects observed, de 1967. Não foi o único a se interessar por seu trabalho. Sirius, a quem por vezes chamávamos de Beuve-Méry, pede-lhe para visitar a SUDENE. De volta, redige um artigo, um desses longos artigos documentados que hoje já não se escrevem, para explicar como o senhor trabalhava, como encontrava os camponeses ajudando-os a se organizar numa verdadeira força social, para desespero da burguesia latifundiária que não lhe perdoará tal prática de mobilização social. Afirmar que ele se entusiasmou é pouco! E nós mesmos, na pequena equipe de Grenoble, às vezes com Maurice Byé quando estava presente, acompanhávamos atentamente o que a SUDENE fazia. Nessa época, iríamos constatar que a estratégia de industrialização ia sendo abandonada no México, apesar das promessas oferecidas pelas novas tecnologias siderúrgicas, provavelmente porque foi esquecida a mobilização da massa camponesa. Então, veja bem, o Brasil era para nós, nesta Universidade honrada por sua presença, o modelo de uma política de desenvolvimento que se apoiava na população para realizar, num só projeto, tanto a industrialização quanto a reforma agrária, os dois pilares indissociáveis, embora cada um deva ser organizado segundo sua especificidade. Dirigir a SUDENE era, obviamente, conscientizar – que maravilhoso termo latino-americano! -; não se tratava de conceber planos abstratos, mas de trabalhar em todas as direções ao mesmo tempo, pois o desenvolvimento é global ou não existe. Os documentos da SUDENE, no mais das vezes sucintos, mas densos, precisos, voluntaristas, falam por si só: em 1961, o senhor expõe as bases da política de desenvolvimento do Nordeste, e começa pela água e pela irrigação, isto é, pela agricultura, a primeira base; em 1962, menciona um Plano Diretor com suas modalidades de execução, abordando o problema da expansão e da modernização das indústrias existentes na região, a segunda base a ser valorizada, e define as importações indispensáveis de novos equipamentos; em 1963, um documento conciso (35 páginas, se não me engano), anuncia o último Plano Diretor da SUDENE que eu conheço. Creio que esse plano é bem mais do que o último de minha lista: seria o último da verdadeira SUDENE. Aqui não é o lugar para nos interrogarmos sobre as razões do golpe de Estado. Talvez não estivesse totalmente desvinculado do temor das potências dominantes externas de verem o país escapar à sua dependência, graças a uma política de desenvolvimento; talvez as forças dominantes internas tivessem medo de perder o controle de um povo que ia construindo novas estruturas socio-econômicas; talvez fosse também uma reação do grande país liberal do Norte, às voltas com dificuldades econômicas crescentes e com o declínio de sua taxa de lucro. O senhor nos dará algumas respostas amanhã, num ambiente mais adequado à análise econômica. Professor Furtado, serei discreto sobre os acontecimentos de 1964. O senhor suportou demasiado seus efeitos diretos e sofreu demasiado para que sejam evocados sem magoá-lo. Os militares destróem tudo, arrancam a alma da SUDENE, que era em grande parte o senhor mesmo, e a do Brasil. Pretendendo hipocritamente conservar a instituição para manter as aparências, submetem por longo tempo o seu país à dominação sem limites do grande país do Norte, que se diz liberal, aniquilam 20 anos de esforços coerentes, sujeitam o seu povo a uma junta militar que substituirá a democracia pela violência: sim, o senhor tinha razão quando na CEPAL vinculava dominação externa e dominação interna. Mas quero lhe dizer com pudor, embora claramente e com profundo respeito por sua pessoa e seus próximos, que nós todos aqui consideramos que só o honra ter sido privado de seus direitos políticos por servir a seu povo. E se esta noite vestimos as becas acadêmicas, não imagine um fútil disfarce ou um prazer de retornar a um passado esquecido, menos ainda a preocupação em imitar as grandes cerimônias teatrais e formais, e, a fortiori, uma mascarada, mas o desejo que sentimos de expressar-lhe, pelo aspecto solene conferido ao encontro, nossa emoção ao acolhermos esta noite um colega, um sábio, um homem que dedicou sua atuação ao desenvolvimento de seu povo, que foi punido por sua ação e pela lucidez de sua análise. Compreenda também que ao recebê-lo esta noite lembramo-nos com emoção de tudo o que o seu povo sofreu, de todos as marcas que conserva, de todo o atraso que acumulou em seu desenvolvimento. Mas não tenha receio, não é por estarmos assim vestidos esta noite que não iremos participar das manifestações populares quando for necessário. Foi essa a homenagem que lhe prestaram Maurice Byé e Maurice Duverger quando o convidaram a voltar a Paris, tão logo souberam o que lhe acontecia. Este gesto muito os honra. No entanto, de início o senhor retorna por alguns meses à CEPAL, e depois será professor visitante em Yale. Recebe convites de todos os lados, mas decide que sua base será na França, em Paris, onde o encontramos uma parte do ano. O senhor já não se circunscreve às faculdades de ciências econômicas. Foi o seu método histórico, e não o fato de ele falar português, que o fez encontrar Braudel, seduzido por seu grande livro Formação econômica do Brasil, que será traduzido no mundo inteiro. Um se identifica facilmente com o outro: ele descobre na sua obra os modelos sucessivos que fizeram o Brasil de hoje: o açúcar, o ouro, o café; as fases da formação do Brasil estão ligadas às suas transformações estruturais, dando origem à sua industrialização. Um e outro são historiadores com uma clara consciência do peso das estruturas. ***
*** Deve-se ver nisso a revanche da história, que não se limita às artimanhas? Homem de pesquisa na CEPAL, homem de ação eficaz e batalhador, êi-lo, o economista itinerante do desenvolvimento, o professor mundialmente conhecido, reconhecido, escutado, que fala e escreve com todo o peso de sua experiência. Não lhe dão um momento de descanso. O senhor é demasiado conhecido em toda parte, é notória a sua capacidade de se interessar por tudo o que toca o desenvolvimento dos povos e todos os aspectos de suas vidas. As revistas dedicadas ao desenvolvimento querem-no em seus Conselhos, as instituições internacionais pedem a sua ajuda – a Universidade das Nações Unidas, o Committee for Development Planning, a South Commission e, mais recentemente, a Comissão Mundial de Cultura e Desenvolvimento, sem esquecer, num campo que lhe é novo, a Comissão Internacional de Bioética da UNESCO, na qual o senhor encontra colegas das ciências sociais e econômicas, mas também juristas – afinal, trata-se de um doutor em Direito – e biólogos com quem desenvolve um diálogo pluridisciplinar. Agora, o seu interesse volta-se para a biologia genética. E mesmo assumindo essas missões, o construtor que o senhor será sempre continua a escrever sobre o Brasil e o desenvolvimento, sobre a dialética do pensamento e da ação, sobre os espaços de desenvolvimento, mas também, mais recentemente, por estar atento a qualquer mudança que adquire importância, sobre o desemprego, a exclusão, e ainda a crise da economia mundial e seus aspectos monetários e financeiros. Seus livros sempre foram traduzidos em inúmeras línguas, em todos os países da Europa, do Oeste e do Leste, do Norte e do Sul, assim como nos dois hemisférios o senhor é conhecido, sem esquecer, é claro, Cuba, Japão ou China, e até mesmo a Pérsia, com essa tradução em farsi que, permita-me dizer, lhe valeu em troca uma caixa de pistaches... Em 1985 o seu país reencontra as estruturas democráticas, mas era quase um outro país, de tal forma se transformara nesses 21 anos, em especial devido ao impacto das novas tecnologias e da forte penetração do capital estrangeiro. Aliás, é o que se passa no mundo todo, conseqüência da crise que se prolonga e dela ninguém sabe como, nem quando, nem sequer se sairemos, não se podendo excluir o risco de degradação generalizada da qual vemos tantos sinais, a menos que ela nos conduza a formas inteiramente novas de atividade econômica e de relações sociais. A Nova República precisa do senhor, mas a transição se faz sob controle, e o senhor se situa demasiado à esquerda para que lhe seja entregue um ministério econômico. Aceita ser embaixador junto à Comunidade Econômica Européia, considerando que é um bom lugar para estudar melhor a economia mundial. Finalmente – terá sido em resposta ao seu Cultura e desenvolvimento em época de crise, de 1984, não sei! – propõem-lhe ser ministro de Estado da Cultura: o país teria trocado o objetivo de seu desenvolvimento pelo de sua cultura? É um cargo que lhe traz inegável satisfação, é uma oportunidade de reencontrar o povo do Brasil por um certo aspecto de sua vida. O senhor organiza em Paris a Exposição de Arte Popular Brasileira e, mais ainda, preocupa-se em salvar a cultura do país, descobrindo também a atração que ela exerce sobre os brasileiros. Que belo coroamento para uma vida a serviço de seu povo! Ministro do Planejamento, ministro da Cultura, talvez não seja nem seu país nem o senhor que mudou, mas o Brasil entendeu o estado de suas reflexões sobre o desenvolvimento e a cultura antes mesmo que nos fossem reveladas naquela belíssima VI Conferência François Perroux que o senhor proferiu no College de France a 15 de junho de 1994. São, pois, as suas palavras que concluirão este ato com o qual meus colegas me encarregaram de recebê-lo na sua Universidade Pierre Mendes France: "O estudo do desenvolvimento tem como tema central a invenção cultural, em particular a morfogênese social, embora até o momento essa temática permaneça praticamente inexplorada. Por que uma sociedade apresenta em determinado período de sua história uma grande capacidade criativa? Eis algo que nos escapa. Menos ainda sabemos por que a criatividade orienta-se numa direção precisa (...). A rigor, só se pode falar de desenvolvimento quando o homem dedica seu potencial criativo à descoberta de si mesmo, enriquecendo seu universo de valores. O desenvolvimento só é real quando a acumulação material leva à criação de valores adotados por importantes segmentos da coletividade (...). Ao colocar no primeiro plano a visão sistêmica das decisões econômicas, cuja ordenação insuficiente seria a causa primária do subemprego dos fatores, lorde Keynes restabelecera a primazia do político sobre o econômico." Meu pronunciamento foi longo demais, ainda que tenha sido abominavelmente breve, perdoem-me uma e outra inconveniência. Uma palavra a mais. Além de tudo o que eu disse, ocorre que diversas universidades o fizeram Doutor Honoris Causa. Mas permita-me dizer que nós, de Grenoble, nos felicitamos imensamente por sermos a primeira a fazê-lo fora do mundo de expressão portuguesa. Saudação proferida pelo professor de economia Gérard Destanne De Bernis em 23 de outubro de 1996, quando o professor Celso Furtado recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Pierre Mendes France, de Grenoble, França. Datas de Publicação Publicação nesta coleção 30 Maio 2005 Data do Fascículo Abr 1997 *** *** https://www.scielo.br/j/ea/a/pyFqGZmZvVGf47yHtLj3j4P/?lang=pt *** *** ***
*** reificação /e-i/ substantivo feminino 1. FILOSOFIA segundo Georg Lukács 1885-1971, alargando e enriquecendo um conceito de Karl Marx 1818-1883, processo histórico inerente às sociedades capitalistas, caracterizado por uma transformação experimentada pela atividade produtiva, pelas relações sociais e pela própria subjetividade humana, sujeitadas e identificadas cada vez mais ao caráter inanimado, quantitativo e automático dos objetos ou mercadorias circulantes no mercado. 2. POR EXTENSÃO qualquer processo em que uma realidade social ou subjetiva de natureza dinâmica e criativa passa a apresentar determinadas características -́ fixidez, automatismo, passividade -́ de um objeto inorgânico, perdendo sua autonomia e autoconsciência. *** *** https://www.google.com/search?q=REIFICA%C3%87%C3%83O%3A&rlz=1C1AVFC_enBR950BR951&oq=REIFICA%C3%87%C3%83O%3A&aqs=chrome..69i57j0l9.2932j0j7&sourceid=chrome&ie=UTF-8 *** *** *** GEORG LUKÁCS E A REIFICAÇÃO: TEORIA DA CONSTITUIÇÃO DA REALIDADE SOCIAL Fábio Luiz Tezini Crocco∗ RESUMO: Este artigo procura refletir sobre a reificação e as antinomias do pensamento burguês, que se edificam numa sociedade dominada pela produção e distribuição de mercadorias. Pautaremos nossa análise na obra História e Consciência de Classes (1923) de Georg Lukács e em sua relação com os estudos sobre a mercadoria realizados por Karl Marx. Assim, pretendemos realizar uma reflexão sobre a constituição da realidade social determinada pelos processos reificados da sociedade capitalista. PALAVRAS-CHAVE: Antinomias, Capitalismo, Mercadoria, Reificação e Totalidade. ABSTRACT: This article aims to reflect on the reification and the antinomies of the bourgeois thought, which are built in a society dominated by merchandise production and distribution. Our review is supported by the work History and Class Consciousness (1923) by Georg Lukács and its relationship with the studies on the merchandise accomplished by Karl Marx. Therefore, we intend to reflect on the constitution of social reality determined by the reified processes of the capitalist society. KEYWORDS: Antinomies, Capitalism, Merchandise, Reification and Totality. Introdução A obra de Georg Lukács, História e Consciência de Classe, de 1923 foi um evento importante no marxismo e promoveu um choque traumático nas gerações posteriores de marxistas. É o texto fundador do marxismo ocidental de inspiração hegeliana, e desenvolve uma postura revolucionária engajada que foi pauta das discussões desenvolvidas pelas diferentes correntes filosóficas a partir dos anos 301 . As principais preocupações das análises posteriores que se apoiaram nesta obra estão relacionadas com temas estruturais da vida social como o fetichismo da mercadoria, a reificação e a razão instrumental. Entretanto, há uma cisão radical entre o Lukács da obra de 1923 e sua postura desde o início dos anos trinta em diante, considerada sua fase termidoriana, momento em que se afasta da obra HCC2 , classificando-a como uma obra de mero interesse histórico. Em decorrência desta recusa do autor, a obra foi oficialmente reeditada e publicada novamente apenas em 1967 acompanhada de um prefácio autocrítico. Porém, antes desta reedição o livro circulava entre os estudantes alemães em edições piratas, traduzidas em poucas línguas, como é o caso da edição francesa de 1959 (ZIZEK, 2003, p.159). Apesar da autocrítica de Lukács e das críticas dos intelectuais comunistas ao caráter especulativo-hegeliano da obra HCC, ela carrega consigo uma importante análise crítica sobre os limites da filosofia que foi edificada sobre a estrutura reificada da realidade. ∗ Mestre em Filosofia pela UNESP de Marília. E-mail: fabiocrocco@marília.unesp.br. 1 Escola de Frankfurt (Horkheimer, Adorno, Marcuse etc.) o existencialismo francês (Sartre, Merleau-Ponty) e marxistas independentes como Lucien Goldmann. 2 História e Consciência de Classe. Georg Lukács e a reificação: teoria da constituição da realidade social *** *** https://www.marilia.unesp.br/Home/RevistasEletronicas/Kinesis/Artigo04.F.Crocco.pdf *** *** *** Eu, etiqueta Em minha calça está grudado um nome Que não é meu de batismo ou de cartório Um nome... estranho Meu blusão traz lembrete de bebida Que jamais pus na boca, nessa vida, Em minha camiseta, a marca de cigarro Que não fumo, até hoje não fumei. Minhas meias falam de produtos Que nunca experimentei Mas são comunicados a meus pés. Meu tênis é proclama colorido De alguma coisa não provada Por este provador de longa idade. Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro, Minha gravata e cinto e escova e pente, Meu copo, minha xícara, Minha toalha de banho e sabonete, Meu isso, meu aquilo. Desde a cabeça ao bico dos sapatos, São mensagens, Letras falantes, Gritos visuais, Ordens de uso, abuso, reincidências. Costume, hábito, premência, Indispensabilidade, E fazem de mim homem-anúncio itinerante, Escravo da matéria anunciada. Estou, estou na moda. É duro andar na moda, ainda que a moda Seja negar minha identidade, Trocá-lo por mil, açambarcando Todas as marcas registradas, Todos os logotipos do mercado. Com que inocência demito-me de ser Eu que antes era e me sabia Tão diverso de outros, tão mim mesmo, Ser pensante sentinte e solitário Com outros seres diversos e conscientes De sua humana, invencível condição. Agora sou anúncio Ora vulgar ora bizarro. Em língua nacional ou em qualquer língua (Qualquer, principalmente.) E nisto me comprazo, tiro glória De minha anulação. Não sou - vê lá - anúncio contratado. Eu é que mimosamente pago Para anunciar, para vender Em bares festas praias pérgulas piscinas, E bem à vista exibo esta etiqueta Global no corpo que desiste De ser veste e sandália de uma essência Tão viva, independente, Que moda ou suborno algum a compromete. Onde terei jogado fora meu gosto e capacidade de escolher, Minhas idiossincrasias tão pessoais, Tão minhas que no rosto se espelhavam E cada gesto, cada olhar, Cada vinco da roupa Sou gravado de forma universal, Saio da estamparia, não de casa, Da vitrine me tiram, recolocam, Objeto pulsante mas objeto Que se oferece como signo de outros Objetos estáticos, tarifados. Por me ostentar assim, tão orgulhoso De ser não eu, mar artigo industrial, Peço que meu nome retifiquem. Já não me convém o título de homem. Meu nome noco é Coisa. Eu sou a Coisa, coisamente. (Carlos Drummond de Andrade) *** *** http://projetos.educacional.com.br/paginas/pp/47080001/3854/t132.html *** *** * Atividade desenvolvida com a educadora Selogene Batista Ourique, educadora de Língua Portuguesa. * Os educandos, após a leitura em forma de seminário, fizeram uma releitura do texto de Carlos Drummond contextualizando o projeto de pesquisa da turma de 7ª série, referente as Empresas Transnacionais ou multinacionais. *** *** http://projetos.educacional.com.br/paginas/pp/47080001/3854/t132.html *** *** ***
*** Análise do poema Eu, Etiqueta de Carlos Drummond de Andrade Carolina Marcello Carolina Marcello Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes Carlos Drummond de Andrade é considerado um dos poetas mais grandiosos da literatura nacional. Entre a sua vasta produção lírica, encontramos inúmeras composições que se debruçam sobre temáticas sociais, traçando um retrato crítico do seu tempo. Parte da produção lírica da segunda geração do modernismo brasileiro, este é um dos poemas de Drummond que se focam na sociedade contemporânea e nos seus modos de viver e funcionar. Através do uso de verso livre e vocabulário cotidiano, a composição procura se aproximar da vida real e retratá-la, contendo também um tom de ironia e denúncia. No próprio título, assim como nos versos iniciais, percebemos que este sujeito já não é identificado pelo seu nome, mas pelas marcas dos produtos que usa e exibe. Em minha calça está grudado um nome que não é meu de batismo ou de cartório, um nome... estranho. Como se tomasse consciência, ou tivesse uma epifania, este eu-lírico percebe que as suas roupas referenciam produtos que ele nunca experimentou e aos quais talvez nem tivesse acesso. Ou seja, acaba promovendo coisas que nem sequer conhecesse, só porque são valorizadas socialmente. Olhando em volta, vai enumerando produtos que o rodeiam, que usa diariamente, e que possuem uma etiqueta ou uma marca. Os versos parecem sublinhar que o sistema capitalista influencia os aspetos mais triviais da nossa rotina. Apelando aos desejos de cada um, a propaganda chega por todos os lados, com "mensagens, / letras falantes, / gritos visuais" que confundem os indivíduos e capturam a sua atenção. Perante tudo isso, como se demonstrasse algum espanto, o sujeito verifica que virou um "homem-anúncio itinerante" para seguir as tendências dos seus pares. Estou, estou na moda. É doce estar na moda, ainda que a moda seja negar minha identidade, Para se enquadrar, ele descobre que acabou perdendo a si mesmo. Em nome de futilidades e convenções que apenas se focam nas aparências, foi se desligando do seu jeito de ser, da sua alma. Este eu-lírico, que pode representar cidadãos do mundo inteiro e de várias épocas, reflete sobre os modos como caímos nas armadilhas do consumismo. Sem repararmos, contribuímos para este sistema, porque sentimos a necessidade de provar o nosso valor ou sucesso através da ostentação de bens materiais. Esse tipo de mentalidade pode nos levar a ignorar os nossos sentimentos e até o sofrimento alheio, anulando nosso lado mais humano e solidário. Não sou - vê lá - anúncio contratado. Eu é que mimosamente pago para anunciar, para vender Com um tom sarcástico, o sujeito reforça que compactuamos com esse esquema mesmo quando não somos beneficiados por ele, só para nos sentirmos integrados. Deslumbradas pelos objetos, muitas pessoas esquecem de cuidar da própria essência, algo que "moda ou suborno algum" deveria comprometer ou colocar em jogo. Assim, o eu-lírico questiona o que aconteceu com ele e também com esta forma coletiva de agir e pensar, que exibe prioridades totalmente invertidas. Perdido num movimento contínuo de padronização, verifica que deixou de ter espírito crítico, ficou igual a todo o mundo, sem "gosto e capacidade de escolher". Já não me convém o título de homem. Meu nome novo é coisa. Desprovido de um sentido de individualidade, ou de identidade, este sujeito termina a composição anunciando que tinha se transformado em "coisa". Esta seria, então, a vitória absoluta do capitalismo: o ser humano que vira produto, que encara a si mesmo como um mero objeto. Significado e mensagem do poema Esta é uma das composições de Drummond nas quais o sujeito poético exprime as suas visões sobre o mundo. Dono de um olhar atento e engajado, ele comenta os efeitos que a lógica capitalista provoca nos cidadãos. Uma realidade em que todos vivemos em competição permanente, e na qual o nosso valor é provado através de dinheiro e objetos de luxo, acaba promovendo a desumanização. Através da mídia, somos conduzidos ao consumo exacerbado, como se esse fosse o único caminho para encontrar a felicidade. Aos poucos, o "ter" vai se sobrepondo ao "ser" e deixamos de lado o mais importante: aquilo que não pode ser comprado, que não tem preço. Escute, abaixo, o poema declamado pelo ator Paulo Autran: ***
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*** Sobre Carlos Drummond de Andrade Apontado como o maior poeta brasileiro do século XX, Carlos Drummond de Andrade (1902 — 1987) é um autor fundamental do nosso panorama literário. O modernista rejeitava várias fórmulas e tradições líricas das gerações antecessoras, traduzindo nos seus versos a vida cotidiana e a rotina das grandes cidades. Dando voz a emoções intemporais como o amor, a nostalgia e a solidão, os seus versos também eram atravessados por comentários políticos e sociais sobre a época em que vivia. Se você gosta do poeta, aproveite para conferir também: Melhores poemas de Carlos Drummond de Andrade Poemas de Carlos Drummond de Andrade sobre a amizade Poema E agora, José? de Carlos Drummond de Andrade Poema Congresso Internacional do Medo de Carlos Drummond de Andrade Carolina Marcello Carolina Marcello Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes e licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. ***
*** Sentimentos Paulinho da Viola *** *** Ouvir "Sentimentos" Sentimentos em meu peito eu tenho demais A alegria que eu tinha nunca mais Depois daquele dia em que eu fui sabedor Que a mulher que eu mais amava Nunca me teve amor Hoje ela pensa que estou apaixonado Mas é mentira está dando um golpe errado Agora estou resolvido A não amar a mais ninguém Porque sem ser amado não convém Composição: Mijinha. *** *** https://www.letras.mus.br/paulinho-da-viola/204149/ *** *** "Lindo samba de Mijinha da Portela Irmão do Aniceto e do grande Manacea." Francisco Kuwit

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