domingo, 4 de julho de 2021

A ROSA

A Rosa Elza Soares ***
*** Ouvir "A Rosa" A rosa que eu te dei é pra você guardar É pra você guardar Meu amor, eu vou partir e nem sei quando vou voltar Essa rosa vai ficar em meu lugar A rosa, a rosa que eu te dei é pra você guardar É pra você guardar Meu amor, eu vou partir e nem sei quando vou voltar Essa rosa vai ficar em meu lugar Essa rosa vai me substituir Na minha ausência vai fazer você sorrir Essa rosa será a segurança do nosso amor Não jogue a rosa fora, por favor Essa rosa será a segurança do nosso amor Não jogue a rosa fora, por favor A rosa, a rosa que eu te dei é pra você guardar É pra você guardar Meu amor, eu vou partir e nem sei quando vou voltar Essa rosa vai ficar em meu lugar A rosa, a rosa que eu te dei é pra você guardar É pra você guardar Meu amor, eu vou partir e nem sei quando vou voltar Essa rosa vai ficar em meu lugar Essa rosa vai me substituir Na minha ausência vai fazer você sorrir Essa rosa será a segurança do nosso amor Não jogue a rosa fora, por favor Essa rosa será a segurança do nosso amor Não jogue a rosa rosa fora, por favor Ah! Que legal *** *** https://www.letras.mus.br/elza-soares/a-rosa/ *** *** ***
*** domingo, 4 de julho de 2021 Míriam Leitão - Clarice conversa com a História O Globo Um grito cortou a ordem dada por agentes de segurança do Exército, presentes à cerimônia fúnebre. “Não! Não enterrem.” Era a voz de Clarice exigindo que os militares, que queriam se livrar do corpo de Vladimir Herzog, esperassem a chegada da mãe do jornalista, Zora. Eles obedeceram. O tom era imperioso. E era 1975. Zuenir Ventura me contou sobre outro momento em que a voz dela se levantou: “Foi quem disse primeiro ‘mataram o Vlado’”. E ela seguiu dizendo isso. Em 2017, a voz de Clarice foi ouvida na Corte Interamericana de Justiça, quando o advogado Alberto Toron defendia, em nome do governo Temer, que o caso Herzog já tinha sido julgado e prescrito. “Não é nada disso”, disse alto Clarice. No dia primeiro de julho, Clarice Herzog fez 80 anos. Ela nunca desistiu da verdade no país que decidiu não encarar a realidade do que houve na ditadura. Clarice nos leva, inevitavelmente, à reflexão sobre a História do Brasil, na qual a verdade tem sempre que ser resgatada das falsificações. São quase 46 anos desde o martírio do Vlado. O Brasil é hoje governado por Jair Bolsonaro, que defende a ditadura e glorifica torturadores. Tem sido áspero o caminho de Clarice, mas ela marcou a História. A frase “Mataram o Vlado” foi dita por ela, pela primeira vez, antes que lhe contassem que ele havia morrido. Ela viu os diretores da TV Cultura, onde ele era diretor de jornalismo, chegando à noite em sua casa e intuiu a tragédia. Foi ela que comunicou à família, aos amigos, à História do Brasil que ele havia sido assassinado no II Exército. Era a voz de uma mulher contra o regime de força que impunha a mentira do suicídio. Clarice cuidou de tudo naqueles dias terríveis. Decidiu que seria uma cerimônia judaica, esteve na preparação da Missa Ecumênica na Catedral da Sé. Devastada pela morte do homem amado, pai dos filhos, ela não perdeu o fio da História que lhe coube conduzir. Entrou na Justiça para responsabilizar a União, sem pedir compensação financeira. “Não estava atrás de um dinheiro sujo de sangue.” Ela queria que o governo fosse considerado culpado. Por que entrar na Justiça em plena ditadura? Perguntei isso a ela. A resposta: “Fui à Justiça porque era Justiça. Eles estavam matando as pessoas. Queria mostrar que isso estava acontecendo no país. Eu tinha que fazer por mim, meus filhos e o país. Eu tinha que provar que ele fora assassinado.” Escrevi um texto sobre ela para o livro “Heroínas desta História”, com vários perfis de mulheres, lançado em 2020 pelo Instituto Vladimir Herzog. A atitude de Clarice, em plenos anos 1970, quando a ordem militar pairava opressiva sobre todos os poderes, inclusive o Judiciário, conversa com a decisão de pessoas escravizadas que, no Brasil escravocrata, recorreram à Justiça nas chamadas Ações de Liberdade. Muitos venceram. O governo militar proibiu o juiz João Gomes Martins, da 7ª Vara Federal, de proferir sua sentença, e o aposentou compulsoriamente. O juiz substituto, com dois anos de magistratura, Márcio José de Moraes, não se intimidou e condenou a União. A sentença histórica saiu em 27 de outubro de 1978, três anos após o dia do enterro de Vlado. O governo militar descumpriu a ordem judicial. Ela continuou brigando. “Eu sou briguenta, não me amedronto”, ela me disse. Em 2018, o Brasil foi condenado, em San José, pela Corte Interamericana de Justiça. Ao depor naquele tribunal, ela narrou os eventos, desde o ponto em que os pais do Vlado, judeus perseguidos, fugiram da Iugoslávia, ocupada pelos nazistas, atravessando a fronteira a pé com o filho pequeno nos braços, até a morte desse filho sob tortura aos 38 anos num quartel do Exército brasileiro. No julgamento de San José, me impressionou a juventude das defensoras da Advocacia-Geral da União (AGU) que sustentavam, junto com o perito contratado pelo governo brasileiro, Alberto Toron, que as reparações haviam sido feitas. Jamais um sequer dos torturadores foi punido, seus nomes foram protegidos pelo Exército, o legista Harry Shibata, que escreveu o laudo mentiroso, morou durante anos a 500 metros de Clarice. Em um país que não encara a verdade histórica —e por isso corre, ainda hoje, o risco de cair na mesma armadilha autoritária — uma voz corajosa e insistente como a de Clarice tem um valor incalculável. Ela é uma heroína. *** *** https://gilvanmelo.blogspot.com/2021/07/miriam-leitao-clarice-conversa-com.html *** *** A Rosa/ Flor que não se cheira Arlindo Cruz ***
*** *** Ouvir "A Rosa/ Flor que n…" A rosa que eu te dei é pra você guardar É pra você guardar Meu amor eu vou partir E não sei quando vou voltar Essa rosa vai ficar em meu lugar Essa rosa vai me substituir Na minha ausência vai fazer você sorrir Essa rosa será a segurança do nosso amor Não jogue a rosa fora, por favor Você não é flor que se cheira, amor Um dia vai padecer com a dor Vai sofrer como eu sofri Passar o que eu passei Sentir o que eu senti Chorar o que eu chorei Penar como eu penei, perder até a cor Você não é flor que se cheira, amor Tem que cair como eu caí Viver como eu vivi Morar onde eu morei Comer o que eu comi Ficar como eu fiquei Sentir a mesma dor Você não é flor que se cheira, amor Beber como eu bebi Pagar o que eu paguei Não ter pra quem sorrir Andar como eu andei Sem ter de onde tirar e ainda ter que pôr Você não é flor que se cheira, amor Composição: Barbante / Darcy Maravilha / Efson / Neguinho Da Beija-Flor. *** *** https://www.letras.mus.br/arlindo-cruz/1303397/ *** *** ***
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*** Congressso em Foco *** sábado, 3 de julho de 2021 Marcus Pestana* A complicada geometria política Conceitos de centro, direita e esquerda estão embaralhados 03/07/21 - 03h00 A arte da política é produzir consensos progressivos diante das divergências presentes. Líderes como Tancredo Neves, Ulysses Guimarães, Franco Montoro, FHC, Petrônio Portela, Marco Maciel se esmeravam na construção de convergências. Foi assim na anistia, na eleição de Tancredo no colégio eleitoral, na Assembleia Nacional Constituinte eleita em 1986. No cenário atual, não. Num ambiente de radicalização extremada, os populistas autoritários, os “engenheiros do caos”, não querem o diálogo. Dentro de sua lógica, a exacerbação, a obstrução do contraditório e a anulação da legitimidade dos adversários operam em favor da manutenção do quadro de polarização radical e fidelização de suas bases sociais. Hoje, abordo o diálogo o ex-governador e senador Cristovam Buarque, ator político comprometido com o interesse público e portador de grande inquietação intelectual. Recentemente, ele, no artigo “O PT é Centro” introduziu uma saudável provocação, reivindicando que o PT deveria ter sido convidado para a reunião dos líderes dos partidos do chamado “centro democrático”, que buscam construir uma alternativa nas presidenciais de 2022. Depois de análise onde caracteriza o PT como um partido de centro, concluí: “Por sua força e por sua posição centrista, o PT deveria ter sido convidado. Salvo se aqueles que fizeram a reunião se considerarem de direita, onde realmente o PT não se situa”. Mas como disse a ele, nem uma coisa, nem outra. Nem o PT é centro, se situando no campo da esquerda brasileira, nem os partidos reunidos são de direita. Fato é que a geometria política contemporânea é extremamente complexa. Os conceitos de centro, direita e esquerda estão embaralhados. O debate no século XX era polarizado entre reacionarismo, liberalismo, socialdemocracia e comunismo. O reacionarismo continua presente em algumas ditaduras e ameaças antidemocráticas. O liberalismo mostrou suas debilidades na crise global de 2008. A socialdemocracia tropeçou nos limites fiscais de expansão dos Estados de Bem Estrar europeus. E o comunismo veio abaixo com a queda do Muro de Berlim e a dissolução da URSS e do Leste Europeu. Diante disto é preciso, mais do que nunca, desprender-se dos paradigmas clássicos e dos rótulos, e se concentrar na agenda de transformações necessárias. Quais são as questões que devem unir? Os eixos essenciais são: i. defesa radical da democracia e da liberdade, individual, política, coletiva, econômica; ii. Construção de um novo modelo econômico eficiente e inclusivo; iii. Ação contundente contra as iniquidades sociais, através da transferência direta de renda aos mais pobres e de políticas públicas sociais criativas; iv. Defesa da sustentabilidade ambiental e v. Construção do Estado socialmente necessário, enxuto, forte e moderno com intervenções calibradas coerentes com os demais objetivos. Norberto Bobbio deu uma notável contribuição teórica a esta busca. O Partido Comunista Italiano produziu o “aggiornamento” que resultou em sua extinção e na criação do PD italiano. Biden, Merkel, Macron buscam construir alternativas às perspectivas extremadas. Para além dos rótulos, na complexa geometria política, precisamos unir como bem resumiu o ex-governador e ministro Moreira Franco “a esquerda da direita e a direita da esquerda” em torno da agenda substantiva que realmente interessa ao futuro do Brasil. *Marcus Pestana, ex-deputado federal (PSDB-MG) *** *** https://gilvanmelo.blogspot.com/2021/07/marcus-pestana-complicada-geometria.html *** ***
*** Qual a diferença entre axioma, teoria e teorema? / Super *** Capítulo 1 Conceitos Básicos 1.1 O Que Provar: Teoremas O primeiro passo para a resolução de um problema é defini-lo correta e precisamente. Tentar encontrar uma solução sem que isso seja feito é receita certa para o insucesso. A definição do problema envolve as seguintes questões: 1. Qual o objeto (ou quais os objetos) em análise? Deve-se definir claramente qual o “objeto” sobre o qual se deseja provar algum fato: um triângulo, um conjunto de n´umeros inteiros, a trajet´oria de um proj´etil. 2. Quais são as características desse objeto (ou desses objetos)? Em muitos casos, os objetos identificados possuem características especiais importantes para o problema: o triãngulo é retãngulo, os números do conjunto são primos, o projétil é arremessado no vácuo próximo à superfície da Terra. Todas as informações sobre o objeto relacionadas ao problema devem ser explicitamente mencionadas. 3. O que se deseja provar? Resta agora definir o problema em si. Especificados o objeto e suas características conhecidas, qual outra característica se deseja determinar como verdadeira? A soma dos quadrados dos catetos é igual ao quadrado da hipotenusa? O conjunto é infinito? A trajetória é parabólica? Um teorema nada mais é do que uma afirmação apresenta essas três características. Alguns exemplos: Teorema Se em um campeonato sem empates todos os times jogam entre si, então é possível, independentemente dos resultados, organizar as equipes em uma “fila” de forma que cada uma (a menos da última) tenha sido vitoriosa sobre a seguinte. Teorema A trajetória de um projétil arremessado no vácuo próximo a superfície da Terra é parabólica. Tradicionalmente, um teorema é dividido em duas partes: a hipótese apresenta as informaçõoes conhecidas sobre o problema; a tese representa o que de fato se deseja provar. A forma “padrão” de um teorema, portanto, seria: Cap´ıtulo 1 Conceitos B´asicos 1.1 O Que Provar: Teoremas O primeiro passo para a resolu¸c˜ao de um problema ´e defini-lo correta e precisamente. Tentar encontrar uma solu¸c˜ao sem que isso seja feito ´e receita certa para o insucesso. A defini¸c˜ao do problema envolve as seguintes quest˜oes: 1. Qual o objeto (ou quais os objetos) em an´alise? Deve-se definir claramente qual o “objeto” sobre o qual se deseja provar algum fato: um triˆangulo, um conjunto de n´umeros inteiros, a trajet´oria de um proj´etil. 2. Quais s˜ao as caracter´ısticas desse objeto (ou desses objetos)? Em muitos casos, os objetos identificados possuem caracter´ısticas especiais importantes para o problema: o triˆangulo ´e retˆangulo, os n´umeros do conjunto s˜ao primos, o proj´etil ´e arremessado no v´acuo pr´oximo `a superf´ıcie da Terra. Todas as informa¸c˜oes sobre o objeto relacionadas ao problema devem ser explicitamente mencionadas. 3. O que se deseja provar? Resta agora definir o problema em si. Especificados o objeto e suas caracter´ısticas conhecidas, qual outra caracter´ıstica se deseja determinar como verdadeira? A soma dos quadrados dos catetos ´e igual ao quadrado da hipotenusa? O conjunto ´e infinito? A trajet´oria ´e parab´olica? Um teorema nada mais ´e do que uma afirma¸c˜ao apresenta essas trˆes caracter´ısticas. Alguns exemplos: Teorema Se em um campeonato sem empates todos os times jogam entre si, ent˜ao ´e poss´ıvel, independentemente dos resultados, organizar as equipes em uma “fila” de forma que cada uma (a menos da ´ultima) tenha sido vitoriosa sobre a seguinte. Teorema A trajet´oria de um proj´etil arremessado no v´acuo pr´oximo a superf´ıcie da Terra ´e parab´olica. Tradicionalmente, um teorema ´e dividido em duas partes: a hip´otese apresenta as informa¸c˜oes conhecidas sobre o problema; a tese representa o que de fato se deseja provar. A forma “padr˜ao” de um teorema, portanto, seria: 2 1 Conceitos B´asicos Teorema Se hip´otese, ent˜ao tese. Essa forma, no entanto, n˜ao ´e obrigat´oria. E o caso do segundo teorema apresentado como ´ exemplo. Apesar de n˜ao haver necessidade, ele pode ser facilmente reescrito no formato “padr˜ao”: Teorema Se um proj´etil for arremessado no v´acuo pr´oximo `a superf´ıcie da Terra, ent˜ao sua trajet´oria ser´a parab´olica. 1.1.1 Lemas, Corol´arios e Conjecturas Em algumas situa¸c˜oes, teoremas recebem denomina¸c˜oes especiais. Quando um teorema ´e provado apenas para auxiliar na prova de um outro teorema (mais complexo), utiliza-se o termo lema para descrevˆe-lo. Em outros casos, um teorema ´e conseq¨uˆencia imediata de outro teorema mais complexo. Nesse caso, ele recebe a denomina¸c˜ao de corol´ario. Considere o seguinte exemplo: Teorema A soma dos ˆangulos internos de um triˆangulo ´e 180 graus. Corol´ario Cada ˆangulo de um triˆangulo equil´atero tem 60 graus. Como a prova de um corol´ario ´e por defini¸c˜ao muito simples, ela ´e freq¨uentemente omitida. No entanto, isso deve ser feito com cautela. A decis˜ao de se omitir uma prova (ou mesmo de se considerar que um teorema ´e de fato um corol´ario) deve levar em conta n˜ao s´o o teorema em si, mas o p´ublico ao qual ele ´e apresentado. O que ´e ´obvio para alguns pode n˜ao sˆe-lo para outros. O ´ultimo caso especial ´e a conjectura, termo usado para descrever teoremas em potencial cuja veracidade ou n˜ao ainda est´a indeterminada. Apesar de freq¨uentemente ocorrerem abusos de linguagem, uma asser¸c˜ao s´o poder´a ser considerada um teorema se tiver sido provada. Caso contr´ario, trata-se de uma conjectura. Um exemplo famoso ´e a seguinte assertiva, formulada pelo matem´atico francˆes Pierre de Fermat (1601–1665): Conjectura Para qualquer valor de n inteiro e maior que 2, n˜ao existem trˆes inteiros positivos x, y e z tais que x n + y n = z n. O pr´oprio Fermat provou que a afirma¸c˜ao ´e verdadeira para n = 3, mas uma prova para valores arbitr´arios de n s´o foi encontrada em 1995, pelo inglˆes Andrew Wiles. Portanto, apesar de a proposi¸c˜ao acima ser h´a muito conhecida como o Ultimo Teorema de Fermat ´ , a rigor apenas recentemente ela foi al¸cada `a condi¸c˜ao de teorema. Antes disso, tratava-se apenas de uma conjectura. A Ultima Conjectura de Fermat ´ . 1.1.2 O Que N˜ao Provar: Axiomas e Defini¸c˜oes A prova de um teorema pode utilizar outros teoremas, desde que eles tamb´em tenham sido devidamente provados. E dessa forma que se desenvolvem diversas ´areas de conhecimento: resultados ´ cada vez mais complexos podem ser provados a partir de resultados mais simples. Essa cadeia, no entanto, n˜ao ´e infinita. H´a dois tipos de enunciados que n˜ao precisam (e n˜ao podem) ser provados, as defini¸c˜oes e os axiomas. Em ´ultima an´alise, todos os teoremas s˜ao provados a partir unicamente deles. Defini¸c˜ao ´e a enumera¸c˜ao das propriedades que um determinado objeto (matem´atico ou n˜ao) deve obrigatoriamente ter (ou deixar de ter) para pertencer a uma determinada classe de objetos. 1.2 Quantificadores e Nega¸c˜ao 3 Para que um objeto seja considerado um triˆangulo, por exemplo, ele deve ser um pol´ıgono e deve possuir exatamente trˆes lados. Portanto, Defini¸c˜ao Um triˆangulo ´e um pol´ıgono de trˆes lados. Alguns outros exemplos familiares: Defini¸c˜ao Um inteiro p ´e primo se e somente se for divis´ıvel por exatamente quatro n´umeros: 1, −1, p e −p. Defini¸c˜ao O m´odulo |r| de um n´umero real r ´e r, se r ≥ 0, ou −r, se r < 0. Evidententemente, toda defini¸c˜ao ´e correta. N˜ao h´a necessidade (ou maneira) de prov´a-la. H´a casos, contudo, em que uma mesma entidade recebe duas diferentes defini¸c˜oes. Quando isso ocorre, ´e necess´ario provar que as defini¸c˜oes se equivalem. Um axioma ´e uma afirma¸c˜ao b´asica aceita por todos acerca de um algo. Axiomas s˜ao normalmente informa¸c˜oes ´obvias, baseadas no senso comum: Axioma Todo n´umero inteiro tem um ´unico sucessor. Axioma Entre dois pontos distintos no plano existe uma ´unica reta. Repare que axiomas s˜ao distintos de defini¸c˜oes. Enquanto os axiomas podem tratar de uma propriedade qualquer de um objeto, defini¸c˜oes devem necessariamente descrever todas as propriedades que um objeto deve possuir (ou deixar de possuir) para fazer parte de uma classe de objetos. 1.2 Quantificadores e Nega¸c˜ao Um teorema (ou uma assercao qualquer, correta ou incorreta) pode tratar de um objeto fixo. Por exemplo: Asser¸c˜ao O n´umero 31.234.971 ´e divis´ıvel por 3. A utilidade desse tipo de resultado ´e limitada, no m´ınimo. E comum, portanto, que enunciados ´ contenham quantificadores para expressar resultados mais gerais: Asser¸c˜ao Todo n´umero cuja soma dos d´ıgitos (na base 10) ´e um m´ultiplo 3 ´e divis´ıvel por 3. Asser¸c˜ao Existe uma tripla de n´umeros inteiros x, y e z tal que x 2 + y 2 = z 2 . O quantificador todo ´e representado por ∀, e muitas vezes utilizamos o termo qualquer que seja em seu lugar. Por sua vez, o quantificador existe ´e denotado por ∃. Frequentemente, torna-se necess´ario encontrar a nega¸c˜ao de uma asser¸c˜ao. Nesse momento ´e fundamental compreender perfeitamente o significado dos quantificadores. Por exemplo, a negativa (ou forma complementar) das asser¸c˜oes acima podem ser apresentadas nas formas abaixo. Asser¸c˜ao Existe um n´umero que n˜ao ´e divis´ıvel por 3 cuja soma dos d´ıgitos (na base 10) ´e um m´ultiplo de 3. Asser¸c˜ao Toda tripla de n´umeros inteiros x, y e z ´e tal que x 2 + y 2 6= z 2 . 4 1 Conceitos B´asicos Uma outra forma v´alida de negar as asser¸c˜oes originais seria: Asser¸c˜ao Nem todo n´umero cuja soma dos d´ıgitos (na base 10) ´e um m´ultiplo de 3 ´e divis´ıvel por 3. Asser¸c˜ao N˜ao existe uma tripla de n´umeros inteiros x, y e z tal que x 2 + y 2 = z 2 . Verifique que todas as negativas das duas primeiras asser¸c˜oes s˜ao falsas, visto que suas formas originais s˜ao verdadeiras (i.e. s˜ao teoremas). 1.3 Tipos de Provas Uma vez estudadas as caracter´ısticas dos teoremas, resta agora determinar como prov´a-los. Conforme se ver´a, h´a diversos tipos de provas, todos igualmente v´alidos. Cada teorema possui caracter´ısticas que tornam mais adequado um ou outro m´etodo, ou mesmo uma combina¸c˜ao de m´etodos. Independentemente da natureza da prova, deve-se garantir que ela seja inequ´ıvoca. Depois de rigorosamente provado, um teorema jamais deixar´a de ser verdadeiro. Para isso, todas as informa¸c˜oes utilizadas para a prova devem ser verdadeiras, de forma absoluta (sempre) ou por hip´otese (ou seja, v´alidas nas condi¸c˜oes `as quais o teorema se aplica). Isso inclui n˜ao s´o as hip´oteses apresentadas no enunciado do teorema, mas tamb´em defini¸c˜oes, axiomas e at´e outros teoremas, desde que j´a devidamente provados e compat´ıveis com as hip´oteses. Relacionado a isso est´a o fato de que, se o enunciado trata de um objeto gen´erico (ou arbitr´ario), a prova tamb´em deve fazˆe-lo. Ela deve utilizar como propriedades apenas as hip´oteses ou o que for deriv´avel a partir delas, de axiomas e de defini¸c˜oes. Se uma propriedade n˜ao ´e mencionada, n˜ao se pode assumir ela ´e v´alida ou que n˜ao ´e v´alida. A prova deve ser completamente independente desse fato. Por exemplo, se o enunciado do teorema ´e “a soma dos ˆangulos internos de um triˆangulo ´e 180 graus”, a prova n˜ao pode usar em momento algum o “fato” de que o triˆangulo ´e equil´atero, pois ele n˜ao ´e verdadeiro em todos os casos. Se o enunciado nada diz sobre a rela¸c˜ao entre os lados do triˆangulo, deve-se supor que qualquer rela¸c˜ao ´e poss´ıvel. 1.3.1 Exemplos e Contra-exemplos Alguns tipos especiais de teoremas prestam-se a provas relativamente simples: a mera apresenta¸c˜ao de um exemplo ou contra-exemplo. Quando o enunciado afirma que existe um objeto com determinadas caracter´ısticas, apresentar um tal objeto ´e suficiente para provar o teorema. Por exemplo: Teorema Existem trˆes inteiros positivos x, y e z tais que x 2 + y 2 = z 2 . Prova Os n´umeros x = 3, y = 4 e z = 5 s˜ao inteiros que satisfazem `a restri¸c˜ao (32 + 42 = 52 ). ✷ Observe que, apesar de haver outros exemplos — (5, 12, 13), (11, 60, 61), (48, 55, 73), etc. — basta apresentar um ´unico para que o teorema seja considerado provado. Da mesma forma, se o enunciado do teorema afirmar a existˆencia n˜ao de um, mas de N (uma constante) objetos com uma dada caracter´ıstica, basta apresentar N objetos distintos como prova. Mas cuidado: se o teorema tratar da existˆencia de infinitos objetos com uma certa caracter´ısticas, apenas apresentar exemplos n˜ao ´e uma prova satisfat´oria. 1.3 Tipos de Provas 5 Contra-exemplos s˜ao usados de forma semelhante aos exemplos, mas para provar que uma determinada conjectura est´a errada. Para isso, ´e necess´ario que o enunciado afirme que todos os objetos de certo tipo possuam uma determinada propriedade ou que nenhum a possui. No primeiro caso, a conjectura ser´a considerada falsa se for apresentado um objeto que n˜ao possui a propriedade para; no segundo caso, o objeto apresentado deve possuir a propriedade. (Na verdade, conforme discutido na se¸c˜ao anterior, os dois casos s˜ao equivalentes.) Vejamos um exemplo: Conjectura Nenhum n´umero primo ´e par. Contraprova A conjectura est´a incorreta, pois o n´umero 2 ´e primo e ´e par. ✷ Esse ´e um exemplo extremamente simples, mas nem sempre ´e esse o caso. H´a casos em que se passam anos, ou mesmo s´eculos, entre a formula¸c˜ao de uma conjectura e o surgimento de um contra-exemplo. Considere a seguinte conjectura, tamb´em proposta por Pierre de Fermat (como se pode perceber, um matem´atico muito afeito a conjecturas): Conjectura Todos os n´umeros da forma 2 2 n + 1 s˜ao primos. “Prova” Testes triviais mostram que essa afirma¸c˜ao ´e verdadeira para valores pequenos de n. Os cinco primeiros n´umeros com a forma proposta (a partir de n = 0) s˜ao 3, 5, 17, 257 e 65537. E relativamente simples verificar que todos s˜ao primos. No entanto, para o n´umero ´ seguinte, 22 5 + 1 = 4, 294, 967, 297, a verifica¸c˜ao n˜ao ´e t˜ao f´acil. Ainda assim, com base na certeza da primalidade dos 5 primeiros termos, Fermat formulou sua conjectura. Em 1732 (quase 70 anos depois da morte de Fermat), entretanto, o matem´atico sui¸co Leonhard Euler (1707–1783) conseguiu demonstrar que 4,294,967,297 n˜ao ´e um n´umero primo: 641 e 6,700,417 s˜ao seus divisores. Portanto, n = 5 ´e um contra-exemplo que torna falsa a conjectura de Fermat. (Ainda assim, os n´umeros da forma 22 n + 1 s˜ao hoje conhecidos como n´umeros de Fermat.) ✷ Como esse problema ilustra, encontrar um contra-exemplo nem sempre ´e simples. No caso, foi preciso fatorar um n´umero de 10 d´ıgitos. Com os computadores atuais e novos m´etodos de fatora¸c˜ao, divisores de n´umeros dessa magnitude podem ser facilmente determinados. Na verdade, ´e poss´ıvel tratar problemas muito maiores; no caso dos n´umeros com a forma sugerida por Fermat (22 n + 1), em especial, foram encontrados divisores para todos os valores de n entre 6 (264 + 1) e 13 (28192 + 1). Em alguns dos casos, contudo, ainda n˜ao foi poss´ıvel realizar a fatora¸c˜ao completa: ´e poss´ıvel que um ou mais dos fatores j´a encontrados n˜ao sejam primos. De qualquer forma, o fato de todos os valores de n testados possu´ırem divisores faz com que atualmente se acredite na conjectura oposta `a de Fermat: Conjectura Para n > 4, todos os n´umeros da forma 2 2 n + 1 s˜ao compostos. No entanto, essa conjectura padece do mesmo mal da original: ela se baseia unicamente em alguns poucos exemplos. Um segundo contra-exemplo pode demonstrar que tamb´em ela est´a errada. No entanto, encontrar contra-exemplos ´e uma tarefa especialmente dif´ıcil nesse caso. O n´umero seguinte da seq¨uˆencia (216384 + 1) tem aproximadamente 5000 d´ıgitos! 1.3.2 For¸ca Bruta Como os problemas apresentados na se¸c˜ao anterior ilustram, exemplos e contra-exemplos s˜ao m´etodos muito simples de se provar um teorema, com uma pequena ressalva: ´e preciso encontr´a-los, 6 1 Conceitos B´asicos o que nem sempre ´e f´acil. A estrat´egia normalmente utilizada para encontrar um contra-exemplo ou exemplo ´e a verifica¸c˜ao de cada um dos objetos sobre os quais trata o teorema. No caso da conjectura proposta por Fermat apresentada na se¸c˜ao anterior, por exemplo, o que se fez foi testar para n = 0, 1, 2 . . .. Felizmente, um contra-exemplo foi encontrado para n = 5, um valor relativamente pequeno. No caso da conjectura oposta, sabe-se que esta ´e v´alida para n = 5, . . . , 12 e 13 o que a faz permanecer na condi¸c˜ao de conjectura. Nem sempre ´e esse o caso. Algumas outras conjecturas podem ter sua validade completamente determinada testando-se cada um dos objetos aos quais elas se aplicam. Para tornar a discuss˜ao mais simples, considere que a conjectura seja expressa com o quantificador todos (express˜oes que utilizam quantificadores como existe ou nenhum podem ser facilmente reescritas usando o quantificador todos). Se durante os testes for encontrado pelo menos um objeto que falsifique a conjectura, pode-se afirmar que ela est´a errada; se, ao contr´ario, nenhum dos objetos testados tornar falsa a conjectura, ela poder´a ser considerada verdadeira. Repare que, para provar que a conjectura ´e verdadeira, ´e necess´ario enumerar todos os objetos poss´ıveis. Por raz˜oes ´obvias, esse m´etodo de prova ´e denominado enumera¸c˜ao completa, busca exaustiva ou for¸ca bruta. Evidentente, o m´etodo s´o poder´a se constituir numa prova se o n´umero de objetos for finito. Esse n˜ao ´e o caso, por exemplo, do Ultimo Teorema de Fermat (se¸c˜ao 1.1.1). Para determinar sua ´ validade por enumera¸c˜ao completa, seria necess´ario testar todas as qu´adruplas (x, y, z, n) com x, y e z positivos e n > 2, o que ´e claramente imposs´ıvel. O m´aximo que se pode esperar de uma busca exaustiva em situa¸c˜oes como essa ´e que seja encontrado um contra-exemplo que invalide a conjectura. Provar que ela est´a correta, no entanto, n˜ao ´e poss´ıvel por esse m´etodo. Mesmo nos casos em que o n´umero de possibilidades ´e finito, ele pode ser grande demais para ser analisado. Testes de primalidade de um n´umero inteiro, por exemplo, s˜ao normalmente baseados em busca exaustiva. As t´ecnicas atuais permitem que se fatorem n´umeros com at´e poucas centenas de d´ıgitos, mesmo se houver um grande poder computacional dispon´ıvel para a tarefa. Apesar dessas limita¸c˜oes, provas por enumera¸c˜ao de complexidade cada vez maior tˆem se tornado poss´ıveis gra¸cas ao desenvolvimento dos computadores. Conjecturas h´a muito propostas tˆem sido resolvidas gra¸cas a esse m´etodo. E o caso do seguinte problema, proposto no s´eculo XIX: ´ Conjectura E imposs´ıvel colocar em um tabuleiro de xadrez as 8 pe¸cas mais poderosas (rainha, ´ torres, bispos, cavalos e rei) de forma que todas as 64 casas estejam sob ataque. Esse foi considerado um problema em aberto por mais de um s´eculo, pois n˜ao havia sido encontrada uma solu¸c˜ao que o invalidasse nem havia garantias de que em todas as poss´ıveis configura¸c˜oes pelo menos uma casa est´a protegida. Em 19??, contudo, Robison, Hafner e Skiena, utilizando um m´etodo baseado em busca exaustiva, conseguiram provar que a conjectura est´a correta: o n´umero m´aximo de casas simultaneamente sob ataque ´e 63. A prova, no entanto, requereu quase 24 horas de processamento em computador. Al´em desse, h´a muitos outros problemas — com grande utilidade pr´atica — para os quais a melhor solu¸c˜ao conhecida ´e a busca exaustiva ou uma varia¸c˜ao dela. Entre eles, talvez o mais conhecido seja o Problema do Caixeiro Viajante, que pode ser enunciado da seguinte forma: Teorema Dados um conjunto de n cidades, os comprimentos das estradas existentes entre elas e 1.3 Tipos de Provas 7 um n´umero positivo D, determinar se ´e poss´ıvel sair de uma cidade, passar por todas as demais uma ´unica vez e retornar `a origem percorrendo uma distˆancia inferior D quilˆometros. Uma ´ultima observa¸c˜ao sobre provas baseadas em busca exaustiva: apesar de ser necess´ario verificar todas os poss´ıveis objetos analisados, muitas vezes isso pode ser feito de forma apenas impl´ıcita. Considere, por exemplo, o problema do caixeiro viajante da forma como foi enunciado. O objetivo ´e determinar se existe uma permuta¸c˜ao das n cidades tal que, se elas forem percorridas nessa ordem, a distˆancia total ser´a inferior a D. A solu¸c˜ao “´obvia” seria enumerar todas as n! permuta¸c˜oes e testar uma a uma. Para n = 8, por exemplo, suponha que as primeiras trˆes cidades de uma solu¸c˜ao sejam, na ordem, C1, C2 e C3. Se a soma dos comprimentos dos caminhos que levam C1 a C2 e C2 a C3 j´a for maior que a distˆancia D, pode-se considerar que todas as permuta¸c˜oes iniciadas com as trˆes cidades nessa ordem foram devidamente analisadas, mesmo que isso n˜ao seja feito explicitamente. Em muitos casos, ´e poss´ıvel adotar argumentos de simetria para reduzir ainda mais o n´umero de permuta¸c˜oes analisadas. Para o caixeiro viajante, por exemplo, pode-se supor que todos os caminhos come¸cam na cidade C1 (por quˆe?). Essas e outras t´ecnicas, algumas extremamente elaboradas, s˜ao rotineiramente utilizadas para tratar de forma mais eficiente problemas pr´aticos. Para muitos deles, isso ´e tudo o que se pode fazer, pois ´e pequena a probabilidade de que eles admitam um m´etodo que n˜ao seja baseado em for¸ca bruta. 1.3.3 Prova Direta Provas diretas s˜ao as mais comumente encontradas e, portanto, s˜ao extremamente intuitivas. Elas seguem uma seq¨uˆencia natural: a partir das informa¸c˜oes fornecidas (hip´oteses), apresentam uma s´erie de passos l´ogicos interrelacionados at´e que se chegue ao resultado desejado (tese). Teoremas relativos `a Geometria Plana, por exemplo, em geral tˆem provas diretas: Teorema A altura h de um triˆangulo equil´atero de lado a ´e h = a √ 3 2 . Prova Por defini¸c˜ao, o segmento AH, que representa altura de um triˆangulo equil´atero ∆ABC, forma um ˆangulo reto com a base BC. Forma-se assim o triˆangulo retˆangulo ∆AHB, que tem como hipotenusa o segmento AB (que mede a) e como catetos AH (que mede h) e HB. Como todo triˆangulo equil´atero ´e is´osceles, a altura divide a base em duas partes iguais; portanto, HB mede a 2 . Aplicando o Teorema de Pit´agoras ao triˆangulo ∆AHB, temos: h 2 + a 2 2 = a 2 . Resolvendo essa equa¸c˜ao, encontramos h = a √ 3 2 . ✷ Nesse caso, foram utilizados apenas argumentos geom´etricos e alg´ebricos simples para a prova do teorema. Repare que uma prova (n˜ao s´o direta) pode utilizar, al´em de axiomas e defini¸c˜oes, outros teoremas mais b´asicos. No exemplo, o ´unico mencionado explicitamente ´e o Teorema de Pit´agoras. A rigor, no entanto, o fato de que a altura um triˆangulo is´osceles divide a base em duas partes iguais tamb´em necessitaria de uma prova. 8 1 Conceitos B´asicos 1.3.4 Prova Construtiva Uma prova construtiva apresenta um m´etodo, procedimento ou f´ormula para que se obtenham os objetos sobre os quais trata o teorema. O m´etodo ´e bastante semelhante `a apresenta¸c˜ao de exemplos (se¸c˜ao 1.3.1), mas sua aplica¸c˜ao ´e menos restrita. De maneira geral, uma prova construtiva mostra como construir n˜ao um ´unico exemplo, mas um conjunto deles (infinitos, possivelmente). Para melhor compreens˜ao do m´etodo, considere o seguinte teorema: Teorema Existem infinitas triplas (x, y, z) de n´umeros inteiros positivos tais que x 2 + y 2 = z 2 . Prova Conjuntos infinitos tˆem uma propriedade interessante: ´e poss´ıvel determinar subconjuntos que tamb´em s˜ao infinitos. Para provar que o teorema est´a correto, basta mostrar como construir um conjunto infinito de triplas em que x 2 + y 2 = z 2 , mesmo esse conjunto n˜ao inclua algumas triplas com essa propriedade. Comecemos com a tripla (3, 4, 5). Ela atende `a propriedade requerida, pois 32 + 42 = 52 . Consideremos agora as triplas da forma (3k, 4k, 5k), com k assumindo qualquer valor inteiro positivo. Vale a seguinte rela¸c˜ao: (3k) 2 + (4k) 2 = 32 k 2 + 42 k 2 = (32 + 42 )k 2 = (52 )k 2 = (5k) 2 Portanto, todas as triplas da forma (3k, 4k, 5k) tˆem a propriedade desejada. Como h´a infinitos valores de k, h´a infinitas triplas: (3, 4, 5), (6, 8, 10), (9, 12, 15), e assim por diante. Note que, apesar de n˜ao incluir v´arias (infinitas) triplas v´alidas, como (5, 12, 13), o conjunto constru´ıdo ´e infinito, o que basta para provar o teorema. ✷ Em resumo, para provar que um certo conjunto ´e infinito, apresentou-se uma prova que d´a origem a um subconjunto que em si j´a ´e infinito. Provas construtivas s˜ao ´uteis tamb´em quando o objeto constru´ıdo ´e finito, mas arbitrariamente grande. Teorema A s´erie harmˆonica (1 + 1 2 + 1 3 + 1 4 + 1 5 + . . .) ´e divergente. Prova Basta provar que, dado um inteiro M qualquer, ´e poss´ıvel encontrar um inteiro n tal que: Xn i=1 1 i > M. Em outras palavras, o valor de n deve ser tal que uma s´erie harmˆonica terminada em 1 n (finita, portanto) tenha soma maior que M, independentemente do valor dessa constante (basta que seja finito). Para que a prova seja mais simples, ignore momentaneamente o primeiro termo da s´erie (1), fazendo-o come¸car em 1 2 . Com a retirada de um elemento n˜ao aumenta o valor da soma (pelo contr´ario), ela n˜ao invalida a prova. Considere as seq¨uˆencias em que n = 2k (k inteiro). Divida uma seq¨uˆencia desse tipo em subseq¨uˆencias terminadas por elementos cujos demominadores s˜ao potˆencias de 2 ( 1 2 , 1 4 , 1 8 , etc.). E simples verificar que cada uma das subseq¨uˆencias tem soma pelo menos 1 ´ /2. Para construir uma seq¨uˆencia cuja soma ´e maior que M, basta adicionar subseq¨uˆencias terminadas em potˆencia de 2 at´e que a soma seja maior que M. O fato de que cada uma delas ´e finita e tem um valor m´ınimo (ou limite inferior ) garante que, ap´os um n´umero finito de opera¸c˜oes, a seq¨uˆencia gerada ter´a soma maior que M. 1.3 Tipos de Provas 9 1 2 ≥ 1 · 1 2 = 1 2 1 3 + 1 4 > 1 4 + 1 4 = 2 · 1 4 = 1 2 1 5 + 1 6 + 1 7 + 1 8 > 1 8 + 1 8 + 1 8 + 1 8 = 4 · 1 8 = 1 2 . . . . . . . . . 1 n 2 + 1 + 1 n 2 + 2 + . . . 1 n > n 2 · 1 n = 1 2 ✷ Exerc´ıcio: determinar o n´umero de termos da seq¨uˆencia resultante. Observe que as provas construtivas apresentam uma forma para se obter o objeto referido no teorema, que nos casos acima s˜ao: um conjunto infinito de triplas satisfazendo as condi¸c˜oes especificadas e para um valor M dado uma s´erie harmˆonica com valor superior `a M. 1.3.5 Prova por Contradi¸c˜ao Conforme vimos at´e aqui, teoremas podem ser enunciados de diversas formas equivalentes. Do mesmo modo, as respectivas provas tamb´em podem ser diferentes. Vimos tamb´em que teoremas que podem ser provados por exemplos e conjecturas que podem ser refutadas por contra-exemplos s˜ao em geral tarefas mais f´aceis que demonstrar a validade de uma asser¸c˜ao para um conjunto infinito de objetos. Assim, matem´aticos utilizam frequentemente essa liberdade de representa¸c˜ao de uma asser¸c˜ao para facilitar sua respectivas provas. A prova por contradi¸c˜ao consiste provar que a negativa de um teorema ´e falsa. Consequentemente, esta prova demonstra que o teorema ´e verdadeiro. Seja T o teorema a ser provado. O que acabamos de descrever ´e que se a implica¸c˜ao T =⇒ falso for verdadeira, T ´e verdadeiro. Exemplo: Teorema Existe uma quantidade infinita de n´umeros primos. Prova Por contradi¸c˜ao. Vamos provar que a hip´otese Existe uma quantidade finita de n´umeros primos ´e falsa. Assumimos ent˜ao que o conjunto de n´umeros primos ´e finito ou, em outras palavras, que este conjunto pode ser escrito na forma P = {p1, p2, . . . , pn}, onde pi ´e o i-´esimo menor n´umero primo. Para provar que isto ´e falso, basta apresentarmos um n´umero primo que n˜ao pertence a este conjunto. Um tal n´umero primo q pode ser obtido da seguinte forma: q = p1.p2. . . . .pn + 1. Bom, falta ainda demonstrarmos que este n´umero ´e primo. Para isto utilizamos a defini¸c˜ao de n´umero primo, i.e. um n´umero que s´o ´e divis´ıvel por 1 e por ele mesmo (e os sim´etricos destes). Portanto, n´umeros compostos (n˜ao primos) s˜ao aqueles que s˜ao divis´ıveis por algum n´umero primo. Agora basta verificar que n˜ao existe nenhum n´umero em P que divide q, o que permite concluir que q tamb´em ´e primo. Esta conclus˜ao indica que qualquer que seja o conjunto finito exaustivo de n´umeros primos que apresentemos, podemos encontrar um outro n´umero primo que n˜ao pertence a este conjunto e portanto deve ser acresentado a este conjunto. Logo a hip´otese ´e falsa e consequentemente o teorema ´e verdadeiro. ✷ 10 1 Conceitos B´asicos Portanto, devemos sempre considerar a possibilidade de uma prova por contradi¸c˜ao, visto que o trabalho pode ser significativamente simplificado. 1.4 Erros Comuns Esta se¸c˜ao apresenta erros freq¨uentemente cometido na tentativa de se provar um teorema. O objetivo ´e ilustrar a importˆancia de algumas das recomenda¸c˜oes e observa¸c˜oes feitas no item anterior. Lembre-se: todas as provas desta se¸c˜ao est˜ao incorretas. Teorema Em um triˆangulo de lados a, b e c, vale a rela¸c˜ao a 2 = b 2 + c 2 − 2bc cos α, sendo α o ˆangulo oposto a a. “Prova” O enunciado trata de um triˆangulo arbitr´ario. Consideremos um triˆangulo qualquer, portanto; um triˆangulo retˆangulo, por exemplo. De acordo com o teorema de Pit´agoras, vale a rela¸c˜ao a 2 = b 2 + c 2 . Substituindo o valor de a 2 na equa¸c˜ao que se deseja provar, temos: b 2 + c 2 = b 2 + c 2 − 2bc cos α =⇒ 2bc cos α = 0 Como os lados de um triˆangulo tˆem comprimento estritamente positivo, para que essa equa¸c˜ao seja verdadeira devemos ter cos α = 0. No entanto, como se trata de um triˆangulo retˆangulo, isso ´e imediato: α = 90 =⇒ cos α = 0. Portanto, a rela¸c˜ao ´e v´alida. ✷ Apesar de o teorema estar correto, a prova est´a completamente equivocada. Ela ilustra uma “interpreta¸c˜ao” comum — e errada — da no¸c˜ao de arbitrariedade. Corretamente, a “prova” afirma que se trata de um triˆangulo arbitr´ario. Ou seja: o teorema vale para qualquer triˆangulo. No entanto, o que se faz em seguida ´e justamente “escolher” o “qualquer”: um triˆangulo retˆangulo. Nesse momento, deixa de haver a arbitrariedade, e tudo o que se diz em seguida ´e v´alido somente para o caso particular selecionado. Portanto, em vez de se provar que a rela¸c˜ao ´e v´alida para todos os triˆangulos, provou-se que ela vale para algum triˆangulo (o retˆangulo). Em outras palavras, a prova apenas mostra que um ter um ˆangulo reto ´e uma condi¸c˜ao suficiente para que a rela¸c˜ao seja v´alida em um triˆangulo. Contudo, essa condi¸c˜ao n˜ao ´e necess´aria. Exerc´ıcios 1. Determine os fatores primos de 4,294,967,297. 2. Calcule o n´umero de tabuleiros de xadrez formados apenas pelas 8 pe¸cas mais poderosas (rainha, rei, torres, bispos e cavalos). *** *** http://www-di.inf.puc-rio.br/~poggi/discrete.pdf *** ***

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