https://cdn.oantagonista.net/cdn-cgi/image/fit=contain,width=1020,height=555/uploads/2020/09/mafalda-qunio.jpg
Quino
era todas as Mafaldas do mundo
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhLugZMBVm49idIEWo1fK-H5qONPa4oqkg1_KXChJVuHTeBSUvhyphenhyphenrXEN_fMCDBz7D53scRWhLo06esfG9XdbCMZ8mCT5Zmoaas4281etIBf2oFWf3Bzi_aYH5S2RqZMDezgZ-yXk2nmgc2h/s0/QUINO.jpg
Desenhista
argentino tinha olhar crítico e politizado de uma sociedade que não mudou
Janaína
Figueiredo | O Globo
quinta-feira, 1 de outubro de 2020
RIO — Filho de republicanos espanhóis,
com uma avó comunista e um avô anticlerical, Joaquín Salvador Lavado, conhecido
por todos como Quino, cresceu numa família de imigrantes na Argentina
profundamente politizada, que marcou seu pensamento e sua obra. Entre os dez e
os 18 anos, esteve de luto pelas sucessivas mortes de seu avô, sua mãe e seu
pai, o que o obrigou a usar uma faixa preta no braço que lhe provocava a
“terrível sensação”, como ele mesmo descreveu, de sentir-se um nazista. Desde
criança, rechaçou qualquer tipo de opressão social e essa aversão o acompanhou
pelo resto da vida. Através do desenho, Quino, falecido nesta quarta-feira, aos
88 anos, vítima de complicações de um AVC, expressou suas angústias,
frustrações, temores e visões de mundo.
A pequena e simpática Mafalda foi
sua principal criação e seu trampolim para uma carreira de projeção
internacional. Mas foi, também, uma prisão da qual o desenhista tentou sair em
1973, após nove anos de dedicação quase exclusiva, mas não conseguiu. Mafalda,
para a incompreensão de seu pai artístico, continuou brilhando e tem uma legião
de fãs no mundo inteiro.
Órfão desde muito cedo, Quino morou
vários anos com seu tio, o desenhista e publicitário Joaquín Tejón, de quem
aprendeu a paixão por um trabalho que desempenhou até a cegueira se tornar um
pesadelo em sua vida, antes de completar 80 anos. Nascido em 17 de julho de
1932 na província de Mendoza, Quino começou a desenhar aos três anos, como
muitas crianças, e decidiu que esse seria seu ofício aos 14. Chegou a se
inscrever na Escola de Belas Artes de Mendoza, mas abandonou a carreira
acadêmica e aos 18 anos instalou-se na capital do país, onde começou a
trabalhar em revistas.
Em entrevistas, Quino reconheceu ser um
desenhista obsessivo e revelou que o desenho era central em sua vida e o fez até
mesmo adiar o descobrimento do sexo. Os primeiros erros cometidos o afligiram
profundamente. Em uma das primeiras páginas de humor que conseguiu publicar
desenhou um toureiro que tinha matado um touro e estava vestindo sua
tradicional capa. Um leitor enviou uma carta tratando o desenhista de burro e
explicando que, antes de matar o touro, todos os toureiros jogam a capa a
alguém a quem dedicam a vitória. Numa longa entrevista ao jornal “Página 12”
quando completou 80 anos, Quino reconheceu que “aquilo me marcou. Por isso
depois me transformei num obsessivo da pesquisa e documentação”.
O desenhista passou por várias
redações e conseguiu publicar sua primeira página de humor gráfico na revista
“Esto Es”. Era uma época em que as revistas faziam grande sucesso na
Argentina e Quino passou por várias até que em 1964 a famosa “Primera Plana”
apresentou quem seria sua personagem mais famosa: a curiosa, intempestiva,
sagaz e provocadora Mafalda. Antes dela, o desenhista lançou o livro “Mundo
Quino”, uma recopilação de quadrinhos humorísticos.
Pode-se dizer que Mafalda nasceu por
acaso. Uma marca nacional de eletrodomésticos pediu a Quino que criasse uma
típica família de classe média para uma campanha publicitária. A campanha nunca
saiu do papel, mas Mafalda foi um sucesso imediato no mundo das histórias em
quadrinhos. A partir de 1965, suas tirinhas passaram a ser publicadas pelo
jornal “El Mundo”, e posteriormente pela revista “Siete Dias Ilustrados”.
— Quino foi o melhor herdeiro da
escola francesa de desenhistas dos anos 50. Ele sempre disse que se sentia
preso em Mafalda e, de fato, como humorista é muito mais do que Mafalda — disse
Martín Pérez, editor do “Página 12” e do livro “Distinta”, uma compilação de histórias
em quadrinhos argentinas.
Em algumas entrevistas, Quino diz ter
encontrado seu estilo após o nascimento de Mafalda, personagem que, num começo,
calcava em janelas de vidro porque temia não ser fiel ao desenho original.
— Ele chegou a dizer que Mafalda quase
o matou como desenhista. Seu melhor momento como humorista internacional, um
dos melhores do século XX, foi depois de abandonar Mafalda, em 73 — enfatizou
Pérez.
A menina sabida, até hoje a história em
quadrinhos latino-americana mais vendida no mundo, permitiu a Quino ser conhecido
internacionalmente, o que facilitou sua vida no exílio. Em março de 1976,
poucos dias antes do golpe de Estado do dia 24, o desenhista rumou para a Europa
com sua mulher, Alicia Colombo, já falecida. Depois de ter sofrido a censura de
governos militares anteriores, Quino decidiu deixar a Argentina às vésperas de
uma das ditaduras mais violentas de sua História e demorou muitos anos em
voltar a ter uma casa em seu país. Para quem se definia como antiperonista,
anticlerical e anti qualquer tipo de opressão social, o ambiente em Buenos
Aires se tornara irrespirável.
— Quino escapou da violência política.
Foi muito crítico e seu trabalho teve grande impacto no poder — comentou o
editor do “Página 12”.
Na entrevista ao jornal argentino, o
desenhista lembra que quando começou a trabalhar não se podia falar sobre
religião, política ou sexo. O problema com a censura, afirmou Quino, “era que
não estava claro o que se podia e o que não se podia fazer. No Brasil, pelo
menos existiam censores... Ziraldo me mostrou uma vez como lhe devolviam as
charges que mandava com uma cruz vermelha proibindo. Mas aqui ninguém dizia
nada. Por isso havia autocensura, porque se não vão publicar, para que vamos
desenhar”.
Alguns episódios o assustaram. Pouco
depois de sua partida para a Itália, foram assassinados cinco padres Palotinos
na Argentina. Anos depois, jornais locais publicaram uma foto na qual se vê, em
cima dos corpos das vítimas do massacre, o famoso pôster da Mafalda no qual ela
aponta para um policial e diz “este es el palito de abollar ideologias” (este é
o pauzinho de amassar ideologias). “Quando vi pela primeira vez essas fotos foi
algo que me impressionou muito”, disse Quino já na época da redemocratização do
país. Lembrando uma das canções da compositora argentina Maria Elena Walsh, o
desenhista costumava dizer sobre seu país que “me dói se fico, mas morro se
vou”.
Com o passar dos anos e das décadas,
Mafalda se tornou uma celebridade global e Quino passou a dividir seu tempo
entre Madri e Buenos Aires, sempre fugindo do frio invernal. Apesar de ter
reconhecido o peso que representou para ele a existência de sua mais famosa
criação, nunca deixou de ir a exposições, inaugurações de esculturas ou
responder perguntas sobre o que pensaria Mafalda sobre isso ou aquilo. Lembrava,
sempre, que sua personagem surgiu na época do Maio de 68, a ebulição de
guerrilhas na América Latina e no papado de João XXIII. Anos de grandes acontecimentos
e enorme expectativa.
Como ela, Quino, assegurou o desenhista
Miguel Rep, que o considerava seu segundo pai, sentia em suas entranhas a
“indignação com as injustiças do mundo, o abuso de poder, o antifascismo
visceral. Poderíamos dizer que ele viveu amargurado como Mafalda. Quino foi
salvo pela arte. Foi uma maravilha, um anjo nessa vida cheia de seres pesados”.
Ambos conversavam bastante e o último
telefonema, já em plena pandemia, foi em julho passado, quando o desenhista
completou 88 anos.
— Perguntei ‘e aí, Quino?’ e ele respondeu
‘está nublado’. Disse que assim que liberassem os voos eu iria pra lá,
tomaríamos juntos um malbec e lhe daria um beijo na boca. Ele riu, já estava
cego. A última coisa que ouvi foi ‘tchau Miguelito’, naquele tom cuyano
(Mendoza está ca região de Cuyo), com restos de andaluz (os pais de Quino eram
espanhóis), que jamais esquecerei — contou Rep, de 59 anos.
A amizade entre ambos vem de longa
data e para um desenhista como Rep, que começou a despontar na década de 80, em
momentos em que a Argentina iniciava seu período de volta à democracia, foi um
enorme privilégio. Profundamente agradecido, Rep desenhou e prometeu continuar
desenhando Quino. Lembra do mestre como um “republicano espanhol, um homem da
esquerda chique”.
— Ele aceitava o termo mestre como se
fosse um renascentista caminhando pela Florença de Médici (dinastia política
italiana), timidamente, mas sabendo que sua obra entraria no mundo dos
clássicos. Quino foi a pessoa mais veraz que conheci. Dizia o que pensava, como
uma criança, mas com economia e ubiquidade — contou o desenhista.
A lista de prêmios é grande e inclui o
Príncipe de Astúrias, na Espanha, e a Ordem Pablo Neruda, que recebeu em 2015
da ex-presidente chilena Michele Bachelet (2006-2010 e 2014-2018), em Santiago.
Na época já viajava acompanhado, em geral, por sua sobrinha, Julieta Colombo, e
muitas vezes utilizava uma cadeira de rodas.
Antes de fazer 80 anos, Quino
reconheceu ter ficado de péssimo humor. Depois, confessou, o mal estar passou.
A perda da visão o obrigou a encerrar a carreira de desenhista há mais de dez
anos, mas os que conviveram com ele asseguram que jamais perdeu a doçura. Nem a
capacidade de analisar as penúrias de um mundo que, já na década de 60, Mafalda
definia como doente — e tentava curar com um esparadrapo.
https://gilvanmelo.blogspot.com/2020/10/quino-era-todas-as-mafaldas-do-mundo.html#more
Morre Quino, o
criador de Mafalda
Mundo 30.09.20
13:03
https://cdn.oantagonista.net/cdn-cgi/image/fit=contain,width=1020,height=555/uploads/2020/09/mafalda-qunio.jpg
Reprodução/Quino.com.ar
Morreu o desenhista argentino Quino, o
criador da personagem Mafalda, que marcou gerações entre 1964 e 1973. Ele tinha
88 anos.
O seu editor, Daniel Divinsky, anunciou:
“Quino está morto. Todas as boas pessoas do país e do mundo inteiram vão chorar
por ele”.
Em entrevista ao jornal Le Monde,
em 2014, Quino definiu-se como “um pessimista que, apesar de tudo, tem a ilusão
de que o seu trabalho pode fazer com que as coisas mudem”.
Mafalda foi um raio de luz num
continente dominado por ditaduras. Como disse Umberto Eco, ela encarna o
direito de continuar a ser uma menina que não quer assumir o universo
adulterado dos pais. Foi um belo trabalho de um pessimista.
https://www.oantagonista.com/mundo/morre-quino-o-criador-de-mafalda/
Serenata Para La
Tierra de Uno
María Elena Walsh
No link:
Porque me duele si me quedo
Pero me muero si me voy,
Por todo y a pesar de todo, mi amor,
Yo quiero vivir en vos
Por tu decencia de vidala
Y por tu escándalo de sol,
Por tu verano con jazmines, mi amor,
Yo quiero vivir en vos
Porque el idioma de infancia
Es un secreto entre los dos,
Porque le diste reparo
Al desarraigo de mi corazón.
Por tus antiguas rebeldías
Y por la edad de tu dolor,
Por tu esperanza interminable, mi amor,
Yo quiero vivir en vos.
Para sembrarte de guitarra,
Para cuidarte en cada flor
Y odiar a los que te castigan, mi amor,
Yo quiero vivir en vos
Composição: Maria Elena Walsh.
https://www.letras.mus.br/maria-elena-walsh/1003794/
El palito de abollar ideologias
"Esta viñeta le costó a Quino la
censura en 1973 y luego el exilio. Dos años más tarde, en 1975, el Estado
argentino publicó esta viñeta modificada en el que Manolito estaba junto al
policía y replicaba: “Ves, Mafalda. Gracias a este palito podés ir tranquila al
colegio”
William Finnegan dice haber comprobado
las palabras de lord Acton: “El poder tiende a corromper y el poder absoluto
corrompe absolutamente”. La gente menos civilizada que veo es la gente que
tiene poder. Y no considero a los pobres buenos y a los ricos malos. La
inseguridad, la escasez y el miedo crean sus demonios, pero aun así la gente
que peor se porta son los que tienen poder."
William Finnegan es periodista y escritor, premio Pulitzer de biografía.
https://planosinfin.com/palito-abollar-ideologias/
Se Tomas recusava
sem hesitar a oferta do médico suíço, era por causa de Tereza. Supunha que ela
não queria partir. Afinal, ela passou os sete primeiros dias da ocupação numa
espécie de transe quase semelhante ao da felicidade. Estava na rua com uma
máquina fotográfica e distribuía seus filmes, aos jornalistas estrangeiros, que
brigavam para obtê-las. Um dia em que se mostrou muito temerária, e fotografou
de perto um oficial que apontava o revólver para os manifestantes, foi presa e
teve que passar a noite no quartel-general russo. Ameaçaram fuzilá-la, mas assim
que foi posta em liberdade voltou às ruas para tirar fotos.
Assim, qual não
foi a surpresa de Tomas quando ela lhe perguntou, no décimo dia da ocupação: “Diga
a verdade, por que é você não quer ir para a Suíça?”
MILAN KUNDERA
a insustentável leveza
do ser
Nenhum comentário:
Postar um comentário