quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Bons Dias!

 

"É uma ousadia confrontar o movimento negro"

Oswaldo de Camargo sobre falas do filho

 

 

Presidente da Fundação Palmares exclui Marina Silva da lista de personalidades negras da instituição

Sérgio Camargo insultou Marina Silva, o ex-deputado Jean Willys e os deputados Talíria Petrone e David Miranda, do PSOL, e a cantora Preta Gil, afirmando que eles se declaram negros por conveniência.

Por Jornal Nacional

13/10/2020 21h57  Atualizado há 20 horas

    


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Presidente da Fundação Palmares exclui Marina Silva da lista de personalidades

O presidente da Fundação Palmares anunciou em uma rede social que excluiu o nome da ex-ministra e ex-candidata à presidência Marina Silva da lista de personalidades negras da instituição.

Sérgio Camargo fez o anúncio com uma série de insultos: “Marina Silva foi excluída da lista de personalidades negras da Fundação Cultural Palmares. Marina não tem contribuição relevante para a população negra do Brasil. Disputar eleições não é mérito. O ambientalismo dela vem sendo questionado e não é o foco das ações da instituição.”

E acrescentou: “Segundo críticos, enquanto o povo da Amazônia definhava, Marina Silva recebia prêmios de sustentabilidade na Europa. A permanência dela na galeria de personalidades negras da Fundação Palmares era insustentável e injustificável”.

Marina Silva foi empregada doméstica. Só conseguiu se alfabetizar aos 16 anos. Se formou em história, foi vereadora em Rio Branco, deputada estadual e duas vezes senadora, ministra do Meio Ambiente por cinco anos e disputou a eleição para presidente do país três vezes.

O presidente da Fundação Palmares, instituição dedicada à promoção da cultura afro-brasileira e ao enfrentamento do racismo também atacou outras personalidades.

“Marina Silva autodeclara-se negra por conveniência política. Não é um caso isolado. Jean Willys, Talíria Petrone, David Miranda (branco) e Preta Gil também são pretos por conveniência. Posar de ‘vítima’ e de ‘oprimido’ rende dividendos eleitorais e, em alguns casos, financeiros”, escreveu ele.

Em 2020, Sérgio Camargo já havia retirado da lista de personalidades negras da Fundação Palmares, a ex-governadora do Rio de Janeiro, ex-senadora e atual deputada federal do PT Benedita da Silva e José Francisco dos Santos, mais conhecido como Madame Satã, que ficou famoso como um dos primeiros travestis artísticos do teatro brasileiro.

A nomeação de Sérgio Camargo para a presidência da Fundação Palmares, em novembro de 2019, causou uma onda de manifestações. Ele deu declarações que minimizaram os efeitos da escravidão e do racismo no Brasil. Uma liminar da Justiça Federal chegou a obrigar o governo a voltar atrás. Mas Sérgio Camargo retornou ao cargo assim que o governo conseguiu derrubar a decisão.

A deputada Benedita da Silva disse que Sérgio Camargo "age como capitão-do-mato, repito, capitão-do-mato, tentando tirar da história do Brasil pessoas que representam o povo negro".

O deputado David Miranda, do PSOL, disse que “a permanência de Sérgio Camargo na Fundação Palmares envergonha todo brasileiro e brasileira”, e que ele “é um inimigo da luta antirracista, um sujeito completamente despreparado e indigno do cargo que ocupa”.

A deputada federal Talíria Petrone, do PSOL, disse que “a postura de Sérgio Camargo definitivamente não condiz com o cargo que ocupa. Não é este homem, com esta postura que reproduz o racismo e envergonha nossa história de resistência, que irá questionar minha realidade enquanto mulher negra”.

O ex-deputado Jean Wyllys disse que “as decisões administrativas de um desqualificado não mudam a maneira como me identifico tampouco a etnia de meus antepassados por parte da família de meu pai, fator sobre o qual ele não tem nenhuma autoridade para se manifestar”.

Marina Silva afirmou que Sérgio Camargo tenta distorcer a história.

“Todas as pessoas que foram excluídas com certeza não foram excluídas por serem irrelevantes, mas exatamente pela importância das causas que defendiam, porque geralmente aqueles que são contrários a tudo que é defesa dos direitos humanos, do meio ambiente, do combate às formas preconceituosas de lidar com o diferente acabam tentando não ir para o debate, mas tentar eliminar, ocultar. E eu acho que a gente tem que encarar isso com altivez de quem sabe de que a história não é feita por aqueles que têm uma visão autoritária e que eventualmente estão no poder. A história é feita por aqueles que persistem na democracia e nos valores da civilização.”

A cantora Preta Gil não quis se manifestar.

 

No link:

https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/10/14/maioria-dos-ministros-vota-no-stf-pela-manutencao-da-prisao-do-traficante-andre-do-rap.ghtml

 

 

Abolições e (re) elaborações literárias: Dostoiévski, Machado de Assis e o fim da servidão e da escravidão.1

 

Ana Carolina Huguenin Pereira

 

“Feliz o escritor que, passando ao largo das personagens enfadonhas, repugnantes, que nos repelem com seu triste realismo, aproximam-se das personagens que mostram a elevada dignidade humana [...]. [...] Diversa é a sorte [...] do escritor que se atreveu a descortinar tudo aquilo que está diante dos olhos [...] – todo o terrível, espantoso limbo da mesquinharia que enlameia a nossa vida, toda a profunda, assustadora frieza dos caracteres fragmentados e vulgares que pululam no nosso tantas vezes amargo e tedioso caminho terrestre; o escritor que, com o vigor do seu cinzel impiedoso, ousou expô-los em alto e nítido relevo aos olhos do mundo!” (N. Gógol. Almas mortas.)

 

1 Uma versão preliminar deste artigo foi publicada em 2016, na Revista Passagens. Ver: PEREIRA, Ana Carolina Huguenin. “Dostoiévski e Machado de Assis: “Que fazer” do fim da servidão e da escravidão”. Em: Passagens. Revista Internacional de História Política e Cultura Jurídica. Rio de Janeiro: vol. 8, n.2, maio-agosto 2016, p. 331-354. O texto passou por revisões e modificações, incorporando novas temáticas e referências bibliográficas.

 

[...]

 

 

Cerca de um mês após a Abolição, Machado de Assis utilizou a obra gogoliana como motivo, em crônica de 26 de junho de 1888, publicada na Gazeta de Notícias. Se o autor russo, com seu “cinzel impiedoso” não hesitara em “descortinar tudo aquilo que estava diante dos olhos”2 , nos quadros de uma aberração legal vinculada ao sistema (aberrativo ele mesmo) servil; Machado, sempre munido da “pena da galhofa e [d]a tinta da melancolia”3 , se remeteu às “almas mortas” de Gógol para expor, em Bons Dias, o escravagismo brasileiro. Na crônica machadiana, um vigarista – um entre muitos dos “caracteres fragmentados e vulgares”4 que compõem a galeria de personagens machadianos (e gogolianos) –, espécie de versão nacional de Tchítchikov, apresenta seu projeto de enriquecimento por meio de um plano “que é tão fino como esse [de Tchítchikov], e muito mais honesto. Sabem que a honestidade é como a chita, há de todo o preço, desde meia pataca”5 . A tramoia, fiel à inspiração russa, só é possível, sem dúvida, dentro do contexto histórico que Machado “descortina” com ironia e sem condescendência. “Tchítchikov” brasileiro desejaria arranjar emprestado “uns vinte contos de réis” com os quais compraria quinhentos libertos. A proposta era pagar, pelos antigos escravos que haviam partido e aqueles que, por falta de perspectivas, permaneceram nas terras dos senhores, dez mil réis por cabeça. Na escritura de compra, porém, constaria data imediatamente anterior à Lei Áurea - 29 de abril de 1888.

 

2 GÓGOL, Nikolai. Almas mortas. São Paulo: Perspectiva, 2008, p. 172.

3 ASSIS, J. Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ed. FTD, 1992.

4 GÓGOL, Nikolai. Ibid.

5 ASSIS. J.M. Machado de. Obra completa, volume 3. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1973, p. 494.

No link:

http://www.casaruibarbosa.gov.br/arquivos/file/eBooks/instituicoes_Nefandas.pdf

 

26 de junho

Bons dias!

 

 

Eu, se tivesse crédito na praça, pedia emprestados a casamento uns vinte contos de réis, e ia comprar libertos. Comprar libertos não é expressão clara; por isso continuo.

 

Conhece o leitor um livro do célebre Gógol, romancista russo, intitulado Almas Mortas? Suponhamos que não conhece, que é para eu poder expor a semente da minha idéia. Lá vai em duas palavras.

 

Chamam-se almas os campônios que lavram as terras de um proprietário, e pelos quais, conforme o número, paga este uma taxa ao Estado. No intervalo do lançamento do imposto, morrem alguns campônios e nascem outros. Quando há déficit, como o proprietário tem de pagar o número registrado, primeiro que se faça outro recenseamento, chamam-se almas mortas os campônios que faltam.

 

Tchitchikof, um espertalhão da minha marca, ou talvez maior, lembra-se de comprar as almas mortas de vários proprietários. Bom negócio para os proprietários, que vendiam defuntos ou simples nomes, por dez-réis de mel coado. Tchitchikof, logo que arranjou umas mil almas mortas, registrou-as como vivas; pegou dos títulos do registro, e foi ter a um Monte de Socorro, que, à vista dos papéis legais, adiantou ao suposto proprietário uns 200.000 rublos; Tchitchikof meteu-os na mala e fugiu para onde a polícia russa o não pudesse alcançar.

 

Creio que entenderam; vejam agora o meu plano, que é tão fino como esse, e muito mais honesto. Sabem que a honestidade é como a chita; há de todo o preço, desde meia pataca.

 

Suponha o leitor que possuía duzentos escravos no dia 12 de maio, e que os perdeu com a Lei de 13 de Maio. Chegava eu ao seu estabelecimento, e perguntava-lhe:

 

— Os seus libertos ficaram todos?

 

— Metade só; ficaram cem. Os outros cem dispersaram-se; consta-me que andam por Santo Antônio de Pádua.

 

— Quer o senhor vender-mos?

 

Espanto do leitor; eu, explicando:

 

— Vender-mos todos, tanto os que ficaram, como os que fugiram.

 

O leitor assombrado:

 

— Mas, senhor, que interesse pode ter o senhor...

 

— Não lhe importe isso. Vende-mos?

 

— Libertos não se vendem.

 

— É verdade, mas a escritura de venda terá a data de 29 de abril; nesse caso, não foi o senhor que perdeu os escravos, fui eu. Os preço marcados na escritura serão os da tabela da lei de 1885; mas eu realmente não dou mais de dez mil-réis por cada um.

 

Calcula o leitor:

 

— Duzentas cabeças a dez mil-réis são dois contos. Dois contos por sujeitos que não valem nada, porque já estão livres, é um bom negócio.

 

Depois refletindo:

 

— Mas, perdão, o senhor leva-os consigo?

 

— Não, senhor: ficam trabalhando para o senhor; eu só levo escritura.

 

— Que salário pede por eles?

 

— Nenhum, pela minha parte, ficam trabalhando de graça. O senhor pagar-lhes-á o que já paga.

 

Naturalmente, o leitor, à força de não entender, aceitava o negócio. Eu ia a outro, depois a outro, depois a outro, até arranjar quinhentos libertos, que é até onde podiam ir os cinco contos emprestados; recolhia-me à casa, e ficava esperando.

 

Esperando o quê? Esperando a indenização, com todos os diabos! Quinhentos libertos, a trezentos mil-réis, termo médio, eram cento e cinqüenta contos; lucro certo: cento e quarenta e cinco.

 

Porquanto, isto de indenização, dizem uns que pode ser que sim, outros que pode ser que não: é por isso que eu pedia o dinheiro casamento. Dado que sim, paga e casava (com a leitora, por exemplo); dado que não, ficava solteiro e não perdia nada, porque o dinheiro era de outro. Confessem que era um bom negócio.

 

Eu até desconfio que há já quem faça isto mesmo, com a diferença de ficar com os libertos. Sabem que no tempo da escravidão, os escravos eram anunciados com muitos qualificativos honrosos, perfeito cozinheiros, ótimos copeiros, etc. Era, com outra fazenda, o mesmo que fazem os vendedores, em geral: superiores morins, lindas chitas, soberbos cretones. Se os cretones, as chitas e os escravos se anunciassem, não poderiam fazer essa justiça a si mesmos.

 

Ora, li ontem um anúncio em que se oferece a aluguel, não me lembra em que rua, — creio que na do Senhor dos Passos, — uma insigne engomadeira. Se é falta de modéstia, eis aí um dos tristes frutos da liberdade; mas se é algum sujeito que já se me antecipou...

 

Larga Tchitchikof de meia tigela! Ou então vamos fazer o negócio a meias.

 

Boas noites.

Texto-fonte:

 

Obra Completa de Machado de Assis.

Rio de Janeiro: Nova Aguilar, Vol. III, 1994.

Publicado originalmente na Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, de 05/04/1888 a 29/08/1889.

No link:

file:///C:/Users/User/Downloads/bonsDias%20(4).pdf

 

 

 

No link:




 

https://youtu.be/NANcq_5Z4gs

"É uma ousadia confrontar o movimento negro", diz Oswaldo de Camargo sobre falas do filho

 

Jornalismo TV Cultura

 

O poeta, escritor e militante do movimento negro, Oswaldo de Camargo é pai do atual presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Camargo. Nomeado para o cargo pelo presidente Jair Bolsonaro, Sérgio causou polêmica por suas críticas à atuação do movimento negro no Brasil. A apresentadora do Jornal da Tarde, Joyce Ribeiro, conversou com ele sobre a postura do filho. Assista a segunda parte da entrevista. Para comentar essas e outras notícias, Ana Paula Couto recebe o economista Gesner Oliveira e o médico cardiologista Dante Senra.

https://www.youtube.com/watch?v=NANcq_5Z4gs

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