A Resposta do Amigo
Urso:
Minha continha eu
pagarei no Pólo Norte...
Mas, hoje, tua
cartinha relendo,
Foi que fiquei sabendo
Que és expedicionário
Adeus, meu irmão
bem-amado, tu me alegraste, não esperava de ti tanta coragem. David
In VI AS FLORES DA MISÉRIA ILUSÕES
PERDIDAS BALZAC
A Resposta do
Amigo Urso
Moreira da Silva
https://youtu.be/38aPhdlPNgg
Amigo velho, aí vai tua resposta
Quem é pobre nesse mundo
Sempre come do que gosta
E o que não gosta...
Eis porque fiquei furioso
Recebendo do amigo
Um tratamento desdenhoso
Mas a minha raiva logo se reprimiu
Eu não posso querer mal
A quem tanto, tanto me serviu.
Tua cartinha causou-me admiração
És perfeito na cobrança,
Como o gringo Salomão
(Que vende roupa a prestação)
Há muito eu andava persuadido
Que tu eras um sabido
Com carinha de otário
Mas, hoje, tua cartinha relendo,
Foi que fiquei sabendo
Que és expedicionário
Fostes ao Pólo sem gastar do teu algum
Enquanto eu fiquei sem nenhum
Aqui na velha dura sorte
Manda mais cem, eu sei que tu não negas
E receba do colega
O teu abraço forte
Minha continha eu pagarei no Pólo Norte...
Composição: Moreira da Silva.
https://www.letras.mus.br/moreira-da-silva/1361131/
Amigo Urso
Moreira da Silva
Amigo urso, saudação polar
Ao leres esta hás de te lembrar
Daquela grana que eu te emprestei
Quando estavas mal de vida e nunca te cobrei
Hoje estás bem e eu me encontro em apuros
Espero receber e pode ser sem juros
Este é o motivo pelo qual te escrevi
Agora quero que saibas como me lembrei de ti
Conjecturando sobre a minha sorte
Transportei-me em pensamentos ao Pólo Norte
E lá chegando sobre aquelas regiões
Vai vendo só quais as minhas condições
Morto de fome, de frio e sem abrigo
Sem encontrar em meu caminho um só amigo
Eis que de repente vi surgir na minha frente
Um grande urso, apavorado me senti
E ao vê-lo caminhando sobre o gelo
Porque não dizê-lo, foi que me lembrei de ti
Espero que mandes pelo portador
O que não é nenhum favor
Estou te cobrando o que é meu
Sem mais, queiras aceitar um forte amplexo
Deste que muito te favoreceu
Eu não sou filho de judeu
Dá cá o meu
Composição: Henrique Gonçalez.
https://www.letras.mus.br/moreira-da-silva/543171/
Moreira da Silva
– “Amigo Urso” (1958; Odeon, Brasil)
https://camarilhadosquatro.files.wordpress.com/2008/03/moreiradasilva_001a.jpg?w=170&zoom=2
A prosódia é uma característica geral
da canção, mas, no samba particularmente, ela constitui uma arte complexa,
misteriosa. Estruturada de um lado pelo costume e pela memória, e, de outro,
pela “luz do repente”, isto é, pela criação e pelo acaso, a prosódia do samba
não possui regras muito rígidas, mas convém sobretudo que se respeite o “2/4”
característico do ritmo. Sobre esse vai-e-vem, solidamente marcado sobre o
tempo fraco, vale quase tudo: as palavras cortam-se umas às outras, numa dança
que, conforme a sensibilidade do compositor, pode adquirir os mais diversos
aspectos. No entanto, deve-se frisar que a prosódia dá o ar de sua graça tanto
pelas mãos do compositor quanto pelas do intérprete: o compositor cria acentos,
entonações e métricas, indicando prescrições rítmicas ao intérprete; por sua
vez, o intérprete ilumina certas articulações que o compositor, talvez, não
tenha previsto. A presença de Henrique Gonçalez (Gonçalves, em algumas
publicações) na discografia de Moreira da Silva é tímida e concentra-se nos
discos de 78 rotações, além de um faixa gravada em 1979, “Diplomata”. Em todas
elas, mas especialmente nessa obra-prima que é “Amigo Urso”, percebe-se que a
composição contém as células rítmicas que devem orientar o intérprete, da mesma
forma que o compositor ao maestro. E é justamente quebrando a exatidão complexa
com que Gonçalez compôs “Amigo Urso” que Moreira da Silva criou aquela que é,
sem exagero, uma das mais geniais interpretações de toda música brasileira. Da
“saudação polar” até o caco “anti-semita” (“eu não sou filho de judeu / dá cá o
meu…”) o que se ouve é a perfeição de uma arte que, embora permaneça viva,
passa por momentos difíceis… (Bernardo Oliveira)
*#*
Moreira da Silva parece ser daqueles
artistas em que obra e biografia traçam caminhos paralelos, se não são um só.
Em suas letras estão impressas as marcas de uma vida que se equilibrou entre a
malandragem cultivada e driblar as dificuldades, a capacidade em mudar o rumo,
como todas as profissões que abraçou antes de ser o mestre do breque e malandro
por excelência. Mas sua música não é simples reflexo, mais, ele criou o
personagem e uma obra em cima deste, aproveitando-se da época em que a covardia
e o politicamente correto não o impediriam de compor a ágil e divertida “Amigo
Urso”. Ali estão, a acidez sem agressividade, o jogo de palavras esperto e a
gentileza mordaz. Melhor ainda, a imagem que puxa a canção, a desculpa sem
vergonha para exigir o que lhe é de direito é deliciosa. É claro que se tudo
isto não fosse embalado por uma composição fina, sem excessos de arranjos,
ficaríamos com uma curiosidade datada, mas Moreira da Silva vive ainda mais em
tempos de sambistas/recicladores e tímidos. (Marcus Martins)
*#*
Podem me prender, podem me bater,
podem mesmo me chamar de elitista, que eu não mudo de opinião: foi-se o tempo
em que a cultura popular se imbricava inteiramente com a sofisticação. Assim, é
impossível para mim ouvir “Conjecturando sobre minha sorte, transportei-me em
pensamentos ao pólo norte” e pensar qual é o equivalente disso, em termos da
ousadia lírica (enfiar um verbo polissílabo de uso pouco costumeiro) e de
fineza de imaginário, na música popular brasileira de hoje. Tirando
pouquíssimos funks (quase todos do Catra), não há. É claro, “Amigo Urso” não se
resume a isso apenas: tem um humor fino que não se esgota à medida que se ouve.
Cortesia da extrema elegância da letra mas também da interpretação de Moreira da
Silva, mestre do breque, Rei-Sol do samba humorístico, que sabe o limite entre
a graça e o escracho. A notar que à época da primeira gravação, em 1941,
Moreira ainda macaqueava algumas inflexões dos cantores de mais sucesso do
período, mesmo que já tivesse uma forma característica de cantar – tímida em
relação a seu período de maturidade, mas já lá. Em 1958, data da regravação
em O Último Malandro, ele já é mestre total de seu estilo, apressando
certas sílabas e dilatando a duração de outras, passando com desprendimento do
canto à fala, e criando assim um sentimento de jogo de cintura que o associam
como a nenhum outro à figura do malandro, mas acima de tudo realizam aquilo que
freqüentemente esperamos do samba: a destreza e a fluência do ritmo. Sem mais,
“Amigo Urso” é uma das maiores de um dos maiores. (Ruy Gardnier)
https://camarilhadosquatro.wordpress.com/2008/03/13/moreira-da-silva-%E2%80%9Camigo-urso%E2%80%9D-1958-odeon-bra/
In, Camarilha dos Quatro Revista de
crítica musical.
Prosódia
Márcia Fernandes
Professora
licenciada em Letras
Prosódia é o emprego correto da
acentuação tônica das palavras. Ela está ligada à oralidade.
Há casos em que um erro de prosódia
pode transformar palavras oxítonas em paroxítonas ou uma proparoxítona em
paroxítona. Por exemplo, pronunciar rúbrica e não rubrica, que é o correto.
Os erros de prosódia são
denominados silabada.
Exemplos:
Sútil (errado), sutil (correto)
Côndor (errado), condor (correto)
Interim (errado), ínterim (correto)
https://www.todamateria.com.br/prosodia/
Os dois amigos e
o urso
Dois amigos caminhavam
por um bosque quando, de repente, aparece um urso e começa a prossegui-los. Um
dos amigos, muito assustado, trepou numa árvore. O outro, abandonado à própria
sorte, jogou-se no chão, fingindo-se de morto.
O urso ao vê-lo, aproximou-se
pouco a pouco. Porém, este animal, que não se alimenta de cadáveres, segundo
dizem, começou a olhá-lo, tocá-lo: observá-lo, examina-lo. Mas como nosso amigo
não se movia e quase nem respirava, é abandonado pelo urso, que foi embora
falando: “Está tão morto como meu bisavô”.
Então o amigo que estava
na árvore, alardeando sua amizade, desce correndo e o abraça. Comenta sobre a
sorte que teve o amigo por ter saído ileso de situação tão perigosa e lhe diz:
— Sabe, parece-me que o
urso lhe disse alguma coisa no ouvido, enquanto o cheirava. Diga-me, o que foi
que ele lhe disse?
E nosso amigo responde:
— Só uma coisa: “Retira
tua amizade da pessoa que, se te vê em perigo, te abandona”.
SAMANIEGO. La Fontaine. “Fábulas”.
Tradução de Ferreira Gullar. Rio de Janeiro: Revan, 1997.
https://mundovelhomundonovo.blogspot.com/2020/09/90-anos-deferreira-gullar-no-cenaculo.html
90 anos do
Acadêmico Ferreira Gullar são comemorados em podcast especial da ABL
A Academia Brasileira de
Letras apresenta, através de seu canal de podcast, a série Efemérides
Acadêmicas, uma homenagem especial aos noventa anos do nascimento do Acadêmico
Ferreira Gullar (1930-2016), eleito em outubro de 2014. O episódio, que foi ao
ar no dia 15 de setembro, conta com a participação dos Acadêmicos Arno Wehling,
Antonio Carlos Secchin e Antonio Cicero.
Este quinto episódio dá continuidade à
série de podcasts em comemoração de aniversários “redondos” de Acadêmicos e
celebrará seus feitos e marcos ao longo de suas trajetórias dentro da Casa de
Machado de Assis. A emissão está disponível no site da Academia, assim como nas
plataformas Apple Podcast, Spotify, Deezer e Castbox.
10/09/2020
https://www.academia.org.br/noticias/90-anos-do-academico-ferreira-gullar-sao-comemorados-em-podcast-especial-da-abl
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