sábado, 25 de outubro de 2025

"Se a moda pega..."

O País estacionou. Não voltará a caminhar sem um projeto de governo e com uma lógica política vivida somente como contraposição mal qualificada entre esquerda e direita. Há mais coisas no céu do que aviões de combate. Parados no tempo sábado, 25 de outubro de 2025 Direitas e esquerdas, por Marco Aurélio Nogueira O Estado de S. Paulo A tensão entre esquerda e direita se acentuou, ao passo que o centro moderado se esvaziou. A política se tornou polarizada, sem mediações Quando Norberto Bobbio publicou seu famoso opúsculo Direita e Esquerda, em 1994, corria solta a ideia de que a dicotomia esquerda x direita havia sido devorada pelas transformações do capitalismo e pelo avanço do neoliberalismo. Falava-se que direita e esquerda haviam perdido significado porque teriam os mesmos fins imediatos e poderiam enveredar pelo mesmo padrão de populismo. Bobbio respondeu dizendo que não se pode negar validade àquilo que está colado no imaginário coletivo e na linguagem cotidiana. Esquerda e direita têm uma carga emotiva ineliminável e servem para organizar os conflitos políticos. Distinguem-se pelo modo como se relacionam com o igualitarismo (traço distintivo da esquerda), a democracia política e os direitos. Com as transformações recentes das sociedades contemporâneas, a tensão entre esquerda e direita se acentuou, ao passo que o centro moderado se esvaziou. A política se tornou polarizada, sem mediações. Não há uma só direita, nem uma só esquerda. Ambas congregam várias posições. Trabalhistas, socialistas e social-democratas, sabidamente reformistas, compartilharam a esquerda com comunistas revolucionários. Pelas sendas da direita, o extremismo fanático e reacionário sempre se diferenciou de conservadores e liberais moderados, atacando-os com fúria. Também há distinções entre os liberais. Eles podem flertar com modalidades suavizadas de socialismo ou pender para um conservadorismo vetusto. Podem, além disso, pensar a economia em termos de livre mercado, mas serem sensíveis a políticas de distribuição de renda, direitos e autonomia individual. Todo liberal admira os procedimentos formais da democracia, as liberdades e os valores éticos, por mais que se incline para a direita ou a esquerda. Hoje, o extremismo de direita avançou. Em muitos países, suas pegadas são claras: a grosseria, a submissão fanática a um líder populista, a defesa étnica e territorial do povo-nação, o autoritarismo, a disposição de produzir caos e confusão. Esses traços espalham-se e dão origem a modulações ou partidos diferentes. No Brasil, por exemplo, o cronista Carlos Andreazza, do Estadão, fala em “bolsonarismo eduardista”, para diferenciá-lo das alas mais “light”. Por aqui, o bolsonarismo é direitista, mas há outras modalidades de direita, umas mais fisiológicas, outras mais pragmáticas, além de uma direita ideológica, liberalconservadora. Se reunirmos tudo isso sob o rótulo de “direita”, não estaremos errados, mas perderemos precisão analítica. Na esquerda, a situação é parecida. Há progressistas espalhados por diversos partidos, e é justo que sejam vistos como parte da esquerda. O PT, partido mais forte da esquerda, necessita de composições para governar, mas nem sempre abraça o campo democrático progressista ou inclui os demais partidos de esquerda, o que favorece as oligarquias predominantes. O manto da esquerda recobre não só aqueles que se proclamam de esquerda, mas todos os progressistas e democratas que defendem uma sociedade mais justa e igualitária. O universo é heterogêneo: desenvolvimentistas, ambientalistas, estatistas, neoliberais, assistencialistas, socialistas, moderados, comunistas, radicais, realistas, ideológicos. É difícil encontrar um ponto ótimo que os unifique. O que faz com que não haja, entre eles, unidade política ou de projetos. Alianças surgem em momentos eleitorais, mas se desfazem no fechar das urnas. Falar em esquerda, no singular, só faz sentido se considerarmos essas distinções. A polarização lulismo x bolsonarismo, prevalecente no Brasil, força a realidade e só capta parte dela. Continua a ter força para dificultar o surgimento de outras candidaturas competitivas. Mas não domina a sociedade toda. Flutua sobre ela. Saber valorizar as diferenças específicas nos ajuda a entender melhor o jogo que está sendo jogado. Polarizações são parte da política, mas ficam tóxicas quando turvam a livre manifestação de todos e inscrevem, nas disputas, considerações passionais reciprocamente excludentes e cegas para o quadro abrangente. Criam-se, assim, blocos adversários para servirem de contrapontos ideológicos típico-ideais, que deixam de lado projetos e valores substantivos. Uma metáfora sugerida pelo cientista político Paulo Fábio Dantas Neto nos ajuda a entender: polarizações tóxicas são como “brigas de turma”: os bandos se pegam na praça, os transeuntes passam indiferentes, alguns vaiam e aplaudem. No fim, os brigões debandam. Uns mais esfarrapados, outros mais machucados. As esquerdas, incluídos progressistas e democratas, não morreram, evidentemente. Mas estão sob pressão. Se não forem além dos nichos em que se abrigam e não apresentarem projetos que falem para todos – e não somente contra as direitas –, poderão se isolar e perder identidade. Além disso, se quiserem vencer o extremismo de direita, terão de pedir ajuda à direita moderada, aos liberais, à centro-direita. E explicitar com clareza as ideias com que pretendem governar o mundo.
sábado, 25 de outubro de 2025 Pior, é difícil, por José Casado Revista Veja PL vai ficar na vitrine eleitoral de 2026 exposto como a central do golpe O maior e mais rico partido político brasileiro, abrigo de Jair Bolsonaro com o seu grupo parlamentar radical, corre risco de atravessar a temporada eleitoral de 2026 no banco dos réus do Supremo Tribunal Federal. Na semana passada, o STF emitiu ordem judicial para retomada das investigações sobre o que o Partido Liberal fez na eleição de 2022 para manter Bolsonaro no poder. Isso vai deixar o PL exposto na vitrine política do ano que vem. O principal partido de oposição estará no alvo por ter sido usado como tapume numa arquitetura de golpe de Estado adornada com plano de triplo homicídio: dos adversários Lula e Geraldo Alckmin, que derrotaram Bolsonaro e, agora, são prováveis candidatos à reeleição; e do juiz Alexandre de Moraes, na época presidente do Tribunal Superior Eleitoral, hoje relator do processo no Supremo sobre a tentativa de golpe. Até agora, o PL era sujeito oculto no julgamento da trama golpista. Permanecia elíptico, raramente nomeado, até em momentos relevantes, como o da confissão de Bolsonaro no tribunal: — A cogitação (do golpe), a conversa (com os chefes militares), o início dessa questão de estado de sítio e estado de defesa teria sido em virtude da impossibilidade de recurso eleitoral, é isso? — quis saber o juiz Moraes. — Sim, senhor — reconheceu Bolsonaro. — Mas o senhor sabe que o seu partido recorreu e perdeu, por unanimidade, no plenário do TSE. —O réu acenou com a cabeça, concordando. Pouco depois da derrota nas urnas, o presidente do PL resolveu dar um presente a Bolsonaro. Valdemar Costa Neto pagou cerca de 1,5 milhão de reais ao empresário Carlos Rocha, dono da empresa Instituto Voto Legal, para produzir “relatório” sobre fraudes na apuração. Um perito contratado desmentiu a trapaça, mas o presidente do PL insistiu em disseminar a versão de “fraude” nas urnas eletrônicas. Ao mesmo tempo, apresentou à Justiça Eleitoral um pedido de auditoria, sugerindo manipulação de mais da metade (56%) dos 118,5 milhões de votos válidos. Valdemar julgou ser retribuição adequada às “gentilezas” de Bolsonaro, desde o arrendamento do partido, em 2021, quando entregou-lhe o comando de um banco federal (Nordeste); do fundo bilionário da Educação (FNDE); de áreas-chave na governança do meio ambiente (Ibama); da política fundiária (Incra); de infraestrutura (Dnit); de saúde e saneamento (Funasa); além de privilégios no pagamento de emendas do orçamento secreto. Para Bolsonaro, mostram os autos do processo, o gesto de Valdemar representou o alento necessário para tentar convencer os comandantes do Exército e da Aeronáutica, resistentes à proposta de golpe de Estado. Na segunda-feira 14 de novembro, chamou para uma conversa no Palácio da Alvorada o chefe da FAB, Carlos Baptista, e o representante da força no comitê militar criado para auditar as urnas eletrônicas — o grupo havia afirmado em relatório oficial não ter encontrado irregularidade, mas a divulgação foi impedida por semanas. Bolsonaro entregou ao brigadeiro uma cópia do relatório com a “auditoria” adquirida por Valdemar. Baptista contou no tribunal ter folheado o papelório, criticado erros de redação e, sobretudo, o ardil usado no texto para enganar o leitor na conclusão sobre fraude. “Sofisma”, nas suas palavras. Na Justiça Eleitoral, enquanto isso, o PL de Valdemar e Bolsonaro defendia uma recontagem de votos limitada ao segundo turno da eleição presidencial, embora as urnas eletrônicas fossem as mesmas utilizadas no primeiro turno, quando o partido festejou a eleição da maior bancada parlamentar, com 99 deputados federais e catorze senadores. O partido teve seu recurso judicial rejeitado e ainda foi multado em 22,9 milhões de reais por “litigância de má-fé”. Entre a compra da “auditoria” e a multa da Justiça Eleitoral, o PL gastou ao menos 24,4 milhões de reais de dinheiro público naquilo que a Procuradoria-Geral da República descreve como a “última etapa” da “estratégia” de Bolsonaro para “fundamentar a tentativa de execução do golpe de Estado”. Deu errado. A PGR, no entanto, não denunciou a cúpula do partido e, agora, recebeu ordem do STF para retomar o inquérito. Isso vai se estender pelo próximo ano, durante a campanha eleitoral. Então, o Partido Liberal ficará na vitrine, exposto como a central do golpe, com Bolsonaro e Valdemar capitaneando três dezenas de civis e militares — alguns assalariados do PL —, protagonistas num enredo de crimes contra a Constituição e o Código Penal. Pior, é difícil. Quase impossível. Publicado em VEJA de 24 de outubro de 2025, edição nº 2967 No Jornal da Cultura deste sábado (25), Aldo Quiroga recebe a economista Lia Lopes, especialista em gestão pública, e o médico sanitarista Gonzalo Vecina Neto, professor da Faculdade de Saúde Pública da USP. Transmissão ao vivo realizada há 105 minutos #JC #JornalDaCultura #JC #JornalDaCultura JORNAL DA CULTURA | 25/10/2025 Jornalismo TV Cultura
Se a moda pega…: os dilemas de uma diplomacia entre o ideal e o realismo Por [RAÍ MUNDO DA SILVA] Artigo de opinião A política externa do governo Luiz Inácio Lula da Silva voltou a ocupar o centro do debate público. Em um contexto de tensões geopolíticas, guerras regionais e disputas econômicas crescentes, o Brasil procura reafirmar seu papel como ator relevante, mediador e defensor da multipolaridade. Essa ambição é legítima e coerente com a tradição diplomática brasileira, mas também expõe contradições que merecem exame sereno e responsável. Entre princípios e pragmatismo Desde 2023, o governo Lula tem buscado reposicionar o Brasil no sistema internacional com uma postura de autonomia e diálogo. A recusa em aderir a blocos de poder e a tentativa de mediar conflitos refletem o desejo de recuperar a credibilidade e a influência perdidas nos últimos anos. Contudo, o equilíbrio entre a defesa de valores universais e a necessidade de manter relações com parceiros de naturezas políticas distintas constitui um desafio constante. A guerra na Ucrânia exemplifica essa tensão. O Brasil condenou a invasão russa nas Nações Unidas, reafirmando o compromisso com a soberania dos Estados e o respeito ao direito internacional. Ao mesmo tempo, optou por não participar de sanções econômicas contra Moscou, argumentando que o isolamento não favorece a diplomacia da paz. Trata-se de uma posição coerente com a tradição de não alinhamento, mas que suscita críticas tanto internas quanto externas, especialmente de quem espera um posicionamento mais assertivo diante de agressões militares. O caso venezuelano e o retorno do diálogo sul-americano Na América do Sul, Lula tem procurado restabelecer pontes, incluindo a reaproximação com a Venezuela de Nicolás Maduro. A decisão de reabrir a embaixada brasileira em Caracas e reintegrar o país a fóruns regionais foi interpretada por aliados como um gesto de reconstrução da integração continental. No entanto, também gerou controvérsia, dada a persistência de denúncias de violações de direitos humanos e restrições políticas no regime venezuelano. A fala do presidente sobre a necessidade de a Venezuela “construir sua narrativa” foi amplamente criticada, ainda que, no contexto diplomático, o sentido fosse incentivar o país a recuperar legitimidade internacional. O episódio revelou como a linguagem simbólica da diplomacia pode ser mal interpretada e como o Brasil precisa zelar pela coerência entre sua retórica de defesa da democracia e suas alianças regionais. Relações com potências globais No plano global, a política externa brasileira tenta equilibrar-se entre a aproximação com os Estados Unidos, a parceria estratégica com a China e a manutenção de laços históricos com a Rússia. Essa triangulação busca preservar a autonomia nacional, mas não está isenta de dilemas éticos e jurídicos. O eventual convite a Vladimir Putin para visitar o Brasil, diante do mandado de prisão emitido pelo Tribunal Penal Internacional, levantou debate legítimo sobre o alcance das obrigações internacionais do país. Da mesma forma, as tensões comerciais e ambientais com Washington demonstram que, apesar do discurso de cooperação, persistem interesses divergentes. Até o momento, contudo, não há registro de sanções concretas contra o Brasil sob legislações extraterritoriais como a Lei Magnitsky, o que indica que o diálogo institucional segue aberto. Diplomacia em tempos de fragmentação O esforço de Lula para resgatar a influência internacional do Brasil ocorre num cenário em que as regras do jogo global estão sendo reescritas. Em meio à competição entre grandes potências e à emergência de novos polos regionais, a defesa da soberania, da autodeterminação dos povos e do multilateralismo precisa ser reafirmada com clareza. Entretanto, autonomia não deve ser confundida com indiferença. A neutralidade pode ser estratégica, mas jamais deve significar omissão diante de violações de direitos humanos ou de agressões à ordem internacional. O desafio, portanto, é exercer uma diplomacia que combine diálogo e coerência, pragmatismo e princípios. Conclusão A política externa do governo Lula, ambiciosa e multifacetada, busca recolocar o Brasil no centro das negociações globais. Ao fazê-lo, navega entre o idealismo do passado e o realismo das novas dinâmicas internacionais. A crítica subjacente a “Se a moda pega…” não deve ser lida como rejeição a essa ambição, mas como alerta: a credibilidade de uma nação não se constrói apenas com gestos simbólicos, e sim com consistência entre discurso e prática. Em um mundo em transformação, o êxito do Brasil dependerá de sua capacidade de manter a independência sem abrir mão dos valores que fundamentam sua diplomacia — o respeito ao Estado de Direito, aos direitos humanos, à soberania das nações e à autodeterminação dos povos. É nesse equilíbrio, e não na retórica das conveniências, que se mede a grandeza de uma política externa verdadeiramente responsável. Nota complementar: o eco de Santiago Dantas A linha de atuação da diplomacia brasileira sob o governo Lula guarda paralelos evidentes com a formulação doutrinária de Santiago Dantas, chanceler de João Goulart e artífice da chamada “Política Externa Independente” (PEI). Inspirada nos princípios da autodeterminação dos povos, do não alinhamento automático e da defesa do desenvolvimento autônomo, a PEI buscava garantir ao Brasil liberdade de decisão em um mundo dividido pela Guerra Fria. Mais de seis décadas depois, esses mesmos fundamentos ressurgem em um contexto global igualmente polarizado — agora entre potências ocidentais e eurasianas, democracias e regimes autoritários, interesses econômicos e valores universais. A atual diplomacia brasileira, ao reivindicar espaço próprio e propor o diálogo entre todos os lados, retoma o espírito da PEI: a convicção de que a independência política é condição para a verdadeira soberania nacional. A lembrança de Santiago Dantas é, portanto, mais que um tributo histórico — é um lembrete ético e estratégico de que a autonomia internacional do Brasil só tem sentido se estiver amparada na legalidade democrática, na defesa da paz e no compromisso com os direitos humanos. RESUMO: REALISMO X IDEALISMO E A TERCEIRA VIA POSSÍVEL Esse vídeo na verdade é um recorte de um vídeo que fiz sobre Jean-Paul Sartre introduzindo essa relação. Achei conveniente voltar nesse vídeo, fazendo o recorte específico da tentativa de conciliação do realismo e idealismo feita por Kant e posteriormente uma tentativa de superação feita por Husserl. Para mais detalhes sobre os dois filósofos: KANT: • Immanuel Kant: Nova Revolução Copernicana VÍDEO ORIGINAL: • SARTRE: ANTECEDENTES GNOSIOLÓGICOS E ONTOL... Saber em Foco 2 de nov. de 2021

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