quarta-feira, 3 de setembro de 2025

Toró de Palpites, Minhocas e Pássaros: A Crônica de um Golpe Anunciado

Epígrafes "Foi um toró de ‘parpite’." — Matheus Milanez, 2025 "A cada enxadada uma minhoca." — Reinaldo Azevedo, 2022 Sabiá ♫ Quarteto em CY "Quero deitar à sombra de uma palmeira que já não há Colher a flor que já não dá" Vou voltar Sei que ainda vou voltar Para o meu lugar Foi lá e é ainda lá Que eu hei de ouvir cantar Uma sabiá Vou voltar Sei que ainda vou voltar Vou deitar à sombra de uma palmeira Que já não há Colher a flor Que já não dá E algum amor Talvez possa espantar As noites que eu não queria E anunciar o dia Vou voltar Sei que ainda vou voltar Não vai ser em vão Que fiz tantos planos De me enganar Como fiz enganos De me encontrar Como fiz estradas De me perder Fiz de tudo e nada De te esquecer Vou voltar Sei que ainda vou voltar Para o meu lugar Foi lá e é ainda lá Que eu hei de ouvir cantar Uma sabiá Vou voltar Sei que ainda vou voltar E é pra ficar Sei que o amor existe Eu não sou mais triste Que a nova vida já vai chegar E que a solidão vai se acabar hei de ouvir cantar uma sabiá Compositor: Chico Buarque E Tom Jobim
Sabiá Quarteto em CY Chico Em Cy Na Linha do Tempo Victor & Leo Eu te dei o ouro do Sol, a prata da Lua Te dei as estrelas pra desenhar o teu céu Na linha do tempo, o destino escreveu Com letras douradas, você e eu Há quanto tempo eu esperava encontrar alguém assim Que se encaixasse bem nos planos que um dia fiz pra mim Você e eu Vou dizer Que nessas frases tem um pouco de nós dois Que não deixamos o agora pra depois Quando te vejo eu me sinto tão completo por onde eu vou E nesses traços vou tentando descrever Que mil palavras é tão pouco pra dizer Que um sentimento muda tudo, muda o mundo Isso é o amor Na linha do tempo, o destino escreveu Com letras douradas, você e eu Há quanto tempo eu esperava encontrar alguém assim Que se encaixasse bem nos planos que um dia fiz pra mim Você e eu Vou dizer Que nessas frases tem um pouco de nós dois Que não deixamos o agora pra depois Quando te vejo eu me sinto tão completo por onde eu vou E nesses traços vou tentando descrever Que mil palavras é tão pouco pra dizer Que um sentimento muda tudo, muda o mundo Isso é o amor Que nessas frases tem um pouco de nós dois Que não deixamos o agora pra depois Quando te vejo eu me sinto tão completo por onde eu vou E nesses traços vou tentando descrever Que mil palavras é tão pouco pra dizer Que um sentimento muda tudo, muda o mundo Isso é o amor Isso é o amor (isso é o amor) Amor Composição: Sergio Porto / Marcelo Martins.
I. Linha do tempo de um processo histórico 2019 – Posse e tensões institucionais Jair Bolsonaro assume a Presidência em janeiro de 2019, trazendo para dentro do Planalto um núcleo militarizado, marcado pela presença de generais e oficiais de alta patente. Desde cedo, surgem sinais de atrito com o Supremo Tribunal Federal (STF), prenunciando os embates que se desdobrariam nos anos seguintes. 2020 – Ato no Alvorada e a presença da Anvisa Em 15 de março de 2020, em plena pandemia, Bolsonaro recebeu no Palácio da Alvorada o então presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, almirante e médico. Acompanhou-o a um ato de apoiadores que afrontava medidas sanitárias e o próprio equilíbrio institucional. O gesto simbólico transformou-se em marco de alinhamento político e militar em torno do presidente. 2021 – Helicópteros e provocação No 1º de maio de 2021, Bolsonaro sobrevoou a Esplanada em helicóptero, numa cena televisionada ao vivo. O deslocamento curto, do Palácio da Alvorada até os ministérios, foi interpretado como demonstração de poder e afronta simbólica. Em atos subsequentes, o general Augusto Heleno, chefe do GSI, esteve ao seu lado, enquanto o vice-presidente Hamilton Mourão era preterido e, em um episódio, alvo indireto de provocação quando o pouso ocorreu em frente ao prédio de sua vice-presidência. 2022 – Escalada e violência A radicalização atingiu novos patamares em dezembro de 2022, quando manifestantes cercaram o Alvorada e promoveram atos de violência em Brasília — ataques a ônibus, incêndio de veículos e até uma tentativa frustrada de atentado com bomba no aeroporto. Estes episódios já compunham o caldo golpista descrito pela Procuradoria-Geral da República (PGR). 2023 – 8 de janeiro A invasão e depredação das sedes dos Três Poderes foi o ponto culminante. Para a PGR, não foi apenas um ato de multidão, mas parte de uma engrenagem previamente alimentada: “convulsões sociais como instrumento de convencimento militar”. 2025 – O julgamento Chegamos a setembro de 2025. O ex-presidente Bolsonaro está em prisão domiciliar, réu junto a generais e um almirante, na Primeira Turma do STF. A denúncia do procurador-geral Paulo Gonet sustenta que o “Punhal Verde e Amarelo” não foi mera cogitação, mas execução de tentativa de golpe de Estado. Foram ouvidas 149 testemunhas, analisados 80 terabytes de documentos, e os atos golpistas foram enquadrados nos artigos 359-L e 359-M do Código Penal: tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito por violência ou grave ameaça.
➡️ Advogados reconhecem que a absolvição é improvável. Trabalham para reduzir as penas a condenações de 12 a 13 anos, contra a possibilidade máxima de 43 anos Defesas tentam desconstruir denúncia e invalidar delação de Mauro Cid, por Luiz Carlos Azedo Correio Braziliense (Correio Braziliense, 03/09/2025, cobrindo o primeiro dia de julgamento, as falas de Alexandre de Moraes, a delação de Mauro Cid, as estratégias das defesas e a repercussão internacional.) II. O núcleo dos atos apontados pela PGR Entre os episódios elencados na denúncia e já acolhidos pelo STF estão: Pressões diretas de Bolsonaro sobre comandantes militares para aderirem ao plano. Reuniões no Alvorada e no Ministério da Defesa para avaliar cenários de decretação de estado de sítio e intervenção militar. O apoio expresso do então comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, apontado como avalista da empreitada. Episódios de violência: incêndio de ônibus e carros, ataque à sede da PF, bomba no aeroporto e os eventos de 8 de janeiro. A preparação de minuta golpista, revelada por Mauro Cid, que previa prisão de ministros do STF e decretação de GLO (Garantia da Lei e da Ordem) como fachada legal. III. Cultura e resistência A história política recente do Brasil se entrelaça, inevitavelmente, com sua cultura popular. Se as ruas foram palco da tensão democrática, a música e a poesia continuam sendo espaço de memória e de respiro. 1. Cotovia — Manuel Bandeira Manuel Bandeira Cotovia Alô cotovia! Aonde voaste, Por onde andaste, Que tantas saudades me deixaste? — Andei onde deu o vento. Onde foi meu pensamento. Em sítios, que nunca viste, De um país que não existe... Voltei, te trouxe a alegria. — Muito contas, cotovia! E que outras terras distantes Visitaste? Dize ao triste. — Líbia ardente, Cítia fria, Europa, França, Bahia... — E esqueceste Pernambuco, Distraída? — Voei ao Recife, no Cais Pousei da Rua da Aurora. — Aurora da minha vida, — Que os anos não trazem mais! — Os anos não, nem os dias, Que isso cabe às cotovias. Meu bico é bem pequenino Para o bem que é deste mundo: Se enche com uma gota de água. Mas sei torcer o destino, Sei no espaço de um segundo Limpar o pesar mais fundo. Voei ao Recife, e dos longes Das distâncias, aonde alcança Só a asa da cotovia, — Do mais remoto e perempto Dos teus dias de criança Te trouxe a extinta esperança, Trouxe a perdida alegria.
Manuel Bandeira Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho foi um poeta, crítico literário e de arte, professor de literatura e tradutor brasileiro. 1886-04-19 Recife, Pernambuco, Brasil 1968-10-13 Rio de Janeiro, Brasil Passaredo | Francis Hime (Vídeo Oficial) 2. Passaredo — Chico Buarque & Francis Hime
IV. Considerações finais Entre cotovias e sabiás, entre trinados de resistência e sobrevoos de helicóptero, o Brasil atravessa seu julgamento mais difícil desde a redemocratização. Não apenas no STF, mas no tribunal da História.
Apêndice: Documento jornalístico Correio Braziliense — Luiz Carlos Azedo (03/09/2025)
quarta-feira, 3 de setembro de 2025 Defesas tentam desconstruir denúncia e invalidar delação de Mauro Cid, por Luiz Carlos Azedo Correio Braziliense Advogados reconhecem que a absolvição é improvável. Trabalham para reduzir as penas a condenações de 12 a 13 anos, contra a possibilidade máxima de 43 anos No primeiro dia do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e mais sete réus acusados de tentativa de golpe de Estado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), entre os quais três generais de exército e um almirante de esquadra, os advogados de defesa dos réus atuaram com objetivo de desconstruir, desqualificar e enfraquecer as acusações do procurador-geral da República, Paulo Gonet. E invalidar a “delação premiada” do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência e peça-chave do inquérito da Polícia Federal (PF) que investigou a tentativa de golpe. O julgamento de uma tentativa de golpe de Estado envolvendo um ex-presidente da República e oficiais de alta patente das Forças Armadas suscita muitas polêmicas; não há precedentes e, portanto, jurisprudência sobre um caso como esse. Na abertura dos trabalhos da Primeira Turma, Moraes sinalizou que o seu voto como relator será duríssimo: disse que “a impunidade não é opção para a pacificação do Brasil”. Destacou que optar pela omissão significaria permitir a corrosão da democracia, como já ocorreu em outras tentativas de golpe ocorridas no passado. Sem citar diretamente Donald Trump, que impôs sanções a ministros do STF, Moraes também afirmou que a Corte não se submeterá a pressões externas nem internas, reagiu às tentativas de intimidação. O julgamento ocorre em um ambiente internacional de tensão, por causa da adoção de sanções de Trump contra ministros, em especial Moraes, numa frustrada tentativa de interferir no funcionamento do Judiciário brasileiro. O ministro ressaltou que a “coragem institucional” e a defesa da soberania nacional são marcas do Supremo, que não será afetado por coações estrangeiras. No resumo técnico da tramitação da ação penal, desde a abertura do inquérito até as alegações finais, Moraes esclareceu que foram ouvidas 149 testemunhas, produzidas provas e analisados documentos que ultrapassam dezenas de terabytes. O relatório não antecipou o voto do ministro, previsto para a próxima semana. Já Paulo Gonet centrou sua manifestação na contestação da tese de que houve apenas “cogitação” de golpe. Chamado de “Punhal Verde e Amarelo”, para o PGR, o plano envolvia monitoramento de Moraes, reuniões com militares e movimentação de armamento. Gonet frisou que Bolsonaro pressionou comandantes militares e que o então comandante da Marinha, Almir Garnier, teria avalizado a empreitada. A acusação também incorporou episódios de violência: incêndios de veículos, ataque à sede da PF, a bomba no aeroporto em dezembro de 2022 e as convulsões de 8 de janeiro de 2023. Para Gonet, esses eventos serviram como instrumentos de convencimento dos militares, demonstrando que a execução já estava em curso. Corpo fora A tese da PGR de que os requisitos legais de “violência” e “grave ameaça”, previstos nos artigos 359-L e 359-M do Código Penal, estariam, assim, plenamente configurada. Ontem à tarde, os advogados dos réus iniciaram as sustentações orais. A defesa de Mauro Cid adotou estratégia dupla: reforçar a credibilidade da investigação e da relatoria de Moraes, para salvar os benefícios do acordo, e, ao mesmo tempo, retratá-lo como mero executor de ordens, no sentido de minimizar sua responsabilidade diante dos fatos. Os advogados exaltaram a PF e defenderam que Cid não tinha poder de decisão política, apenas acesso privilegiado. O advogado do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) tentou afastá-lo do “núcleo crucial” da trama, lembrando que ele deixou a Abin em março de 2022 para disputar mandato parlamentar. Argumentou que o acirramento golpista se deu após julho daquele ano. O ex-comandante da Marinha foi defendido por Demóstenes Torres, que criticou a denúncia da PGR por falta de individualização. Para ele, a acusação é uma “narrativa globalizante” que não discrimina de forma clara as condutas de cada réu. Garnier, único comandante formalmente acusado de apoiar o golpe, nega adesão à empreitada. Nos bastidores, os advogados reconhecem que a absolvição é improvável. Trabalham para reduzir as penas a condenações de 12 a 13 anos, contra a possibilidade máxima de 43 anos. Uma das teses é afastar a dupla imputação de “golpe de Estado” e “abolição violenta do Estado Democrático de Direito”. Argumentam que se trata do mesmo ato e não caberia punição em dobro. Outra linha de contestação é processual. Advogados alegam cerceamento de defesa pelo prazo exíguo entre denúncia e julgamento — apenas seis meses —, e pela inclusão de 80 terabytes de documentos sem tempo para análise. Também acusam Moraes de não levar recursos relevantes ao colegiado, como o agravo contra a prisão domiciliar de Bolsonaro. É um choque de estratégias. De um lado, Moraes e Gonet enquadraram os fatos como execução de um golpe, afastando qualquer relativização. Do outro, as defesas buscaram enfraquecer a denúncia, preservar benefícios de colaboração e reduzir penas. A atmosfera é de tensão máxima, com muita repercussão internacional e agitação no Congresso, onde a oposição intensifica as articulações para aprovar uma anistia antes mesmo de o julgamento ser concluído. Estamos diante de um momento histórico, que testará os limites da democracia brasileira.

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