quinta-feira, 18 de setembro de 2025

Síntese estruturada da pesquisa Quaest (setembro/2025)

Teatro Ato a Ato ( Roteiro híbrido: crônica-teatro político ) Prólogo ( Luzes baixas. O palco vazio. Uma cadeira no centro. O Narrador entra devagar, com voz grave e pausas longas. Um foco amarelo ilumina apenas seu rosto. ) NARRADOR (com solenidade, mas em tom irônico): Ninguém no poder quer Bolsonaro elegível. Todos sabem que não é reabilitável. Jair… sua chance está em 2027. (Curta pausa.) Ciro Nogueira já disse isso. (Levanta uma das mãos, como quem chama alguém que não aparece.) Cadê o Waldemar, gente? A gente precisa vencer — e, com a eleição, mudar o estado de coisas. (Apagam-se as luzes. Um som metálico de gotas caindo. O palco fica iluminado em vermelho-sangue.) Ato I — A Sangria (Ao fundo, projeção de veias pulsando em tela translúcida. O Narrador caminha lentamente, com voz cortada.) NARRADOR (seco, quase em sussurro) : Estamos a sangrar. (Luz branca intensa corta o vermelho.) Clipe-se as veias abertas. Descartem os clipes… nas fezes. (A plateia mergulha em escuridão total. Pausa dramática.) Ato II — A Barganha (Luz fria azulada. Dois refletores em lados opostos simbolizam prisão e liberdade. O Narrador permanece no centro, braços abertos, como se pesasse opções invisíveis.) NARRADOR (cínico, pausando cada frase) : Papuda… ou prisão domiciliar? É pegar… ou largar. (Levanta o dedo indicador, com sarcasmo.) No máximo, a “anistia light”… em homenagem à língua do laranja do norte. (Som de correntes arrastando-se. O Narrador baixa a cabeça. Silêncio prolongado.) Ato III — O Mar e a Direita (Sons de ondas. O palco é tomado por uma luz azul profunda. O Narrador caminha em círculos, como quem rema sem barco.) NARRADOR (voz firme, quase épica) : Se algo mudar… o mar virou. O barco é conduzido no, para e pelo mar. (Pausa. Ele encara o público diretamente.) A direita sem Bolsonaro… fica melhor para Ciro Nogueira. Fica melhor para Waldemar. (Dá de ombros, seco.) A fila andou. Ato IV — O Relator (A iluminação passa a verde-amarela, saturada. O Narrador segura papéis que deixa cair lentamente pelo palco.) NARRADOR (com ironia teatral) : Relator da emenda aprovada ontem, a toque de caixa, com folga: Paulinho da Força… amigão de Xandão. (O riso do Narrador ecoa, frio, metálico. As luzes piscam como flashes de fotógrafos.) Epílogo (Luzes douradas. O Narrador se despede em voz clara, mas breve. Ao fundo, uma batida lenta de tambor.) NARRADOR (em tom de despedida) : — Tchau. — Monumental o programa de hoje. (Ele dá dois passos à frente, abre os braços e fala com entusiasmo contido.) Aqui a gente mata no peito. Bota a bola no chão. Bonito. (De repente, silêncio. As cortinas começam a fechar. O Narrador abre provocativamente a camisa, soltando os botões de baixo para cima, alisando os pelos do dorso em gesto casual e desafiador. Antes de sumir, encara a plateia em silêncio.) VOZ EM OFF (grave, ecoando) : Fim do ato futuro que se passou no passado presente. (Apagam-se todas as luzes. Fim.) Como a Estrutura Narrativa dos Três Atos Pode Transformar sua História [DROPS #825]
Câmara aprova voto secreto para blindar parlamentares contra o Supremo Publicado em 18/09/2025 - 07:32 Luiz Carlos Azedo Brasília, Congresso, Eleições, Ética, Justiça, Literatura, Memória, Política, Política Deputados agem como se pudessem reinventar o passado e ressuscitar mecanismos que sempre serviram à impunidade dos poderosos, sob comando de Hugo Motta A Câmara dos Deputados decidiu restabelecer o voto secreto para analisar a abertura de processos contra parlamentares pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Cerca de 70 congressistas estão sendo investigados por desvio de recursos de emendas parlamentares. A decisão é um retrocesso político, que visa a perpetuar várias práticas de autoproteção da atual “elite” política do Congresso. Tal decisão, com tanta desfaçatez, fragiliza a democracia e desmoraliza uma de suas principais instituições. Quando havia essa prerrogativa, de 250 deputados investigados, somente um foi punido. Querem ressuscitar a regra porque os deputados dispõem de tantos recursos provenientes dessas emendas, em média R$ 50 milhões cada, que podem dar as costas à sociedade e comprar os votos necessários para sua reeleição, em evidente disparidade de armas em relação aos demais candidatos. Essa decisão não pode ser lida apenas como uma manobra regimental, mas como a recidiva de velhas e perversas estruturas sociais, herdadas do período colonial e do regime escravocrata, e da emergência de relações mafiosas na política, muitas vezes associada ao crime organizado dos grandes centros. Em Os Donos do Poder (Biblioteca Azul), Raymundo Faoro descreveu como o Estado brasileiro foi moldado pelo patrimonialismo, herdado da tradição portuguesa, em que a linha entre público e privado se dissolve. O que se vê hoje é justamente a continuidade desse modelo: deputados e senadores agindo como donos do poder, transformando a coisa pública em instrumento de defesa corporativa e formando patrimônio com recursos públicos. A PEC da Blindagem restabelece o que vigorou entre 1988 e 2001: a necessidade de aval do Congresso para processar parlamentares criminalmente. O resultado é previsível. A volta desse sistema, agora com voto secreto, é a blindagem perfeita para a impunidade. Se Faoro nos ajuda a compreender o caráter patrimonialista dessa decisão, Victor Nunes Leal ilumina outro aspecto, como descreveu em Coronelismo, Enxada e Voto (Companhia das Letras): a opressão e o clientelismo nas bases eleitorais desses parlamentares, para as quais são destinadas as emendas parlamentares. O voto aberto, sem sigilo, servia para submeter o eleitor ao coronel pela intimidação; hoje, o voto é comprado às vésperas das eleições, assim como apoio de prefeitos, vereadores e empresários, com dinheiro desviado das emendas parlamentares destinadas às prefeituras e organizações sociais. O eleitor continua sem voz, enquanto os parlamentares se escondem atrás do lusco-fusco dos processos administrativos sem transparência. É uma síntese perversa: o patrimonialismo garante a apropriação privada do Estado; o coronelismo inspira a manipulação do voto; juntos, produzem um sistema fechado, que esvazia o conteúdo democrático da representação parlamentar. De volta ao passado A Câmara age como se pudesse reinventar o passado, repetindo mecanismos que sempre serviram para garantir a impunidade dos poderosos. No centro desse processo está Hugo Motta (Republicanos-PB), presidente da Casa. Jovem, 35 anos, deputado desde 2011, filho de uma família tradicional da política paraibana, Motta parecia representar uma nova geração. Mas, ao assumir a presidência, mostrou-se herdeiro fiel do velho patriarcado associado ao pragmatismo do Centrão. Liberou votação semipresencial, conduziu negociações de bastidor, patrocinou a manobra regimental que ressuscitou o voto secreto. Não hesitou em rejeitar questionamentos da oposição, impondo a blindagem como vitória pessoal. Agora, articula a anistia para os golpistas de 8 de janeiro. Motta construiu sua carreira nos bastidores da Câmara, foi relator de CPIs e ocupou cargos estratégicos. Agora, como presidente, escolheu usar essa habilidade de bom articulador para aprofundar o fosso entre representantes e representados. Seu gesto revela mais continuidade do que renovação: é a política da autopreservação, reciclada sob nova embalagem geracional. Seu recado é claro. Não vê o Parlamento como instituição a serviço da sociedade, mas como corporação voltada para proteger a si mesma. É uma mistura de transformismo político, daí a adesão de parlamentares que não representam velhas oligarquias, e o cretinismo parlamentar, que ignora os interesses da sociedade que deveriam estar representados. Como diz o ditado popular, passarinho que come pedra sabe o fiofó que tem. Quando ameaçada pelo avanço das investigações do STF e pela exigência de transparência, a Câmara fecha as portas e apaga as luzes. O voto secreto é a escuridão que esconde a responsabilidade. Não apenas dos que já foram pegos com a boca na botija, mas também de parte daqueles que por terem adotado as mesmas práticas resolveram zerar os riscos de serem identificados, porque sabem que os recursos desviados serão rastreados se houver investigação. A sociedade, no entanto, não é a mesma da República Velha. Nem pode aceitar passivamente que seus representantes atuem como coronéis modernos ou como herdeiros de um estamento patrimonialista. O Brasil de hoje exige mais transparência, mais responsabilidade e mais democracia. A História mostra que esses mecanismos não são eternos. Desabam quando a sociedade decide que já não aceita ser tutelada. O grande desafio é transformar a indignação em resistência e mobilização, para que o voto secreto para proteger falcatruas não se converta em símbolo definitivo da desconexão entre política e cidadania. Como sempre acontece em arranjos concebidos nas madrugadas e aprovados a fórceps, a PEC da Blindagem tem, ao menos, duas inconstitucionalidades, passíveis de anulação pelo Supremo: desrespeita a regra regimental de o mesmo texto da emenda ser aprovado duas vezes; a prerrogativa de foro privilegiado não se aplica aos presidentes de partidos, porque se destina a agentes públicos, e os partidos são entes privados. Compartilhe: Colóquio Simulado JORNALISTA (mediador): Boa noite. Este debate se insere num momento delicado da vida nacional. A discussão sobre uma possível anistia “ampla, geral e irrestrita” reacende lembranças de períodos de ruptura institucional. Permitam-me recordar: em 1987, participei da cobertura da Assembleia Nacional Constituinte. Vi de perto como o anteprojeto preparado por juristas foi rejeitado, e como, a duras penas, os constituintes eleitos teceram a Carta de 1988. Diferente de 1824, quando Dom Pedro I dissolveu a Constituinte e outorgou uma Constituição de cima para baixo, sob o peso do absolutismo de origem divina. A história nos ensina que há sempre um embate entre o poder instituído e as forças que o contestam. Vamos ao debate. ADVOGADO CONSTITUCIONALISTA: Obrigado. Do ponto de vista jurídico, a situação é clara. O art. 60 da Constituição de 1988 prevê que só se pode reformar a Carta por meio de Proposta de Emenda Constitucional aprovada por 3/5 de cada Casa, em dois turnos. Mas mais importante: existem cláusulas pétreas. Elas blindam os direitos e garantias individuais, a separação dos poderes, o voto e a federação. Nenhuma emenda pode abolir esses fundamentos. Portanto, uma anistia irrestrita, que extinga responsabilidades criminais de atentados contra a democracia, seria inconstitucional, por violar justamente o núcleo intangível da ordem constitucional. CIENTISTA POLÍTICO: Juridicamente, é incontestável. Mas a política vive de outra lógica: a correlação de forças. Em muitos países, anistias foram usadas como instrumentos de pacificação após tentativas de golpe. O problema é que nem sempre funcionam. A anistia de 1979, no Brasil, por exemplo, permitiu a volta de exilados, mas também garantiu impunidade a agentes da repressão. Hoje, propor uma anistia ampla seria lido como pacto de elites contra a democracia. Isso pode gerar duas consequências políticas: ou um alívio momentâneo nas tensões, ou um suicídio eleitoral de partidos que a patrocinem. JORNALISTA: Recordo-me que, em 1988, muitos parlamentares votaram contra a Constituição, mas depois se beneficiaram dela ao longo da redemocratização. Agora, vemos algo semelhante: alguns clamam por uma anistia à mesma Constituição que antes desprezaram. Doutor, como o Supremo reagiria? ADVOGADO CONSTITUCIONALISTA: O Supremo Tribunal Federal já enfrentou questão semelhante na ADPF 153, relativa à Lei de Anistia de 1979. Naquela ocasião, manteve a validade da lei. Mas hoje, em um contexto de ataques diretos ao Estado de Direito, dificilmente chancelaria uma anistia que abrangesse crimes contra a ordem constitucional. O STF se firmou como guardião da democracia. Qualquer PEC nesse sentido seria fulminada por inconstitucionalidade material. CIENTISTA POLÍTICO: E esse movimento não é apenas interno. O Brasil vive inserido em um ambiente internacional onde a democracia é observada de perto. Uma anistia ampla isolaria o país em fóruns multilaterais, abriria margem a sanções diplomáticas e reduziria a confiança de investidores. Internamente, criaria fraturas profundas na sociedade. Se é verdade que setores conservadores clamam por pacificação, outros veriam o gesto como traição à Constituição de 1988. Isso intensificaria a polarização. JORNALISTA: Na Constituinte, havia negociações duras, mas o espírito de compromisso prevalecia. Hoje, falta essa costura? ADVOGADO CONSTITUCIONALISTA: Sem dúvida. O Congresso atual não recebeu mandato constituinte. Ao tentar legislar como se tivesse esse poder, corre o risco de invadir terreno vedado. A ruptura seria institucional. CIENTISTA POLÍTICO: E politicamente, seria uma aposta de alto risco. A governabilidade poderia até ser garantida no curto prazo, mas o custo eleitoral em 2026 seria altíssimo. Partidos identificados com uma anistia irrestrita podem desaparecer do mapa político. Seria, como se diz, um “suicídio partidário amplo, geral e irrestrito”. JORNALISTA (encerramento): Fica claro que estamos diante de um dilema histórico: repetir a outorga autoritária de 1824 ou preservar o pacto democrático de 1988. Entre a tentação da anistia absoluta e a defesa intransigente da Constituição, caberá à sociedade, às instituições e aos partidos decidir qual caminho escolher. Mas como vimos aqui, toda escolha tem consequências — jurídicas, políticas e históricas. 👆Segunda Rodada do Debate – Bastidores de um Colóquio Publicado em 18/09/2025 – 23h17 Brasília, Congresso, Justiça, Governabilidade, História, Poder Por dentro do debate, a coreografia foi outra. O advogado constitucionalista, em público, reafirmou a supremacia das cláusulas pétreas; nos bastidores, admitiu a colegas que o Supremo já se prepara para barrar qualquer anistia ampla, se preciso com liminares em série. Confia que a Corte, acuada pelas ameaças de parlamentares, vai endurecer ainda mais. O cientista político, que nas câmeras pregou cautela, em conversas privadas foi mais incisivo: sabe que a anistia interessa a parte da elite militar e ao bloco do Centrão, mas que pode significar a morte eleitoral de quem a patrocinar. Falou em “suicídio partidário coletivo” e lembrou exemplos recentes de legendas que desapareceram depois de defender causas impopulares. O jornalista, veterano da Constituinte de 1987, fez questão de lembrar — para um público restrito — que os mesmos grupos que boicotaram a Carta de 88 agora se agarram a ela como tábua de salvação. A ironia não escapou a ninguém. A sessão foi mais que um debate acadêmico: foi uma radiografia das tensões. No Congresso, líderes testam a disposição da base governista de negociar nos subterrâneos, enquanto discursam em defesa da democracia no plenário. No Executivo, ministros já admitem que talvez seja inevitável ceder em algo — não pela convicção, mas para manter votos nas pautas econômicas. No Judiciário, ministros do Supremo trocam mensagens diretas com líderes partidários, numa espécie de “conversa de prevenção”: não avancem, ou virá reação. O clima é de corda bamba. Um passo em falso pode incendiar as ruas ou derrubar alianças frágeis. A comparação com 1824, quando Dom Pedro dissolveu a Constituinte, não é mero recurso histórico: é advertência. O gesto de então custou a legitimidade do primeiro reinado. O que se diz nos corredores: Que parte da oposição aposta na anistia não para pacificar, mas para desgastar o Supremo e forçar uma crise institucional. Que líderes do Centrão querem apenas trocar estabilidade por emendas, usando o tema como moeda de chantagem. Que o governo teme perder governabilidade se não oferecer algum gesto, mas não sabe até onde pode ir sem rachar sua própria base. O resultado provável? Um acordo mal costurado, votado de madrugada, sob o signo da ambiguidade. O risco maior é repetir velhos mecanismos de autoproteção — como o voto secreto que a Câmara ressuscitou para blindar investigados. A lógica é a mesma: obscurecer responsabilidades, adiar punições, transferir a conta para a sociedade. Conclusão amarga: enquanto o constitucionalista invoca cláusulas pétreas e o cientista político alerta para o risco eleitoral, parlamentares ensaiam mais uma coreografia de sobrevivência. A sociedade, dividida e polarizada, assiste. Mas como ensina a história, nem todo pacto de elites dura. Quando o fio se rompe, o que parecia blindagem revela-se apenas a preparação de um colapso. DO DIREITO Apresentação do Conteúdo O conjunto de textos, poemas e artigos aqui reunidos oferece um panorama de diálogo entre poesia, direito e democracia, articulando dimensões literárias, jurídicas e históricas. Geir Campos – “Tarefa” (1957) O poeta estabelece um dever ético: experimentar as dores do mundo, mas denunciá-las coletivamente, preparando a transformação em direção a uma sociedade mais justa e humana. Resumo circunstanciado: poesia como denúncia e consciência social. Geir Campos – “Da profissão do poeta” (1956) O ofício do poeta é comparado a um contrato de trabalho, com direitos, deveres e vínculos com todos os ofícios. A palavra poética aparece como função pública, capaz de comunicar e sustentar esperança. Resumo circunstanciado: poesia como trabalho social, articulada ao direito e à dignidade. Cristovam Buarque – “Onde estão os adultos?” (2025) O ensaísta critica a infantilização da política brasileira, onde parlamentares tratam recursos públicos e reformas como brincadeira. Afirma que a prisão de golpistas é insuficiente sem maturidade política para consolidar a democracia. Resumo circunstanciado: democracia exige líderes adultos, comprometidos com futuro coletivo. Wilson Gomes – “Democracia brasileira não será a mesma após o 11 de setembro” (2025) O julgamento de um ex-presidente e militares golpistas é interpretado como marco histórico. Pela primeira vez, altos responsáveis foram condenados, rompendo o padrão de impunidade e abrindo possibilidade de consolidação democrática. Resumo circunstanciado: julgamento de 2025 como divisor de águas na história da democracia nacional. Síntese geral: Os textos convergem para um fio condutor: a democracia brasileira só se sustenta pela maturidade política, pelo compromisso histórico e pela palavra crítica. A poesia de Geir Campos dá o tom ético e pedagógico; Buarque alerta para a responsabilidade política; Gomes registra o marco histórico que pode transformar intervalos frágeis em permanência democrática.
DO DIREITO Tarefa de Geir Campos Tarefa Morder o fruto amargo e não cuspir mas avisar aos outros quanto é amargo, cumprir o trato injusto e não falhar mas avisar aos outros quanto é injusto, sofrer o esquema falso e não ceder mas avisar aos outros quanto é falso; dizer também que são coisas mutáveis… E quando em muitos a noção pulsar — do amargo e injusto e falso por mudar — então confiar à gente exausta o plano de um mundo novo e muito mais humano. Geir Campos (1957)
AO DIREITO IEPfD e Roda Democrática | A DEMOCRACIA DESAFIADA - O Julgamento da Trama Golpista quarta-feira, 17 de setembro de 2025
Onde erramos – Cristovam Buarque quarta-feira, 17 de setembro de 2025 Onde estão os adultos? Por Cristovam Buarque* Correio Braziliense A prisão do ex-presidente e de militares golpistas é um passo histórico, mas insuficiente para garantir a consolidação democrática se os políticos continuarem brincando de política Depois da longa história de golpes contra a democracia, é natural que democratas comemorem a condenação de golpistas pela Justiça. Mas o Brasil precisa saber que juízes punem golpistas, mas não constroem democracia. Só políticos podem construí-la, se tiverem maturidade para fazê-la eficiente, justa e respeitada pela população. A indignação dos eleitores é mais indutora de golpes do que as armas de militares. A própria Justiça que prende golpistas, desincentiva a democracia quando, baseada nas leis da política, protege juízes corruptos com aposentadorias precoces no lugar de cadeia. A atual geração de políticos transmite impressão de que não há adultos na sala da República. Adultos consideram as consequências de seus atos para o conjunto da sociedade e para o futuro. Sob essa perspectiva, a política brasileira está carente de adultos, os políticos parecem brincar, sem responsabilidade com o país e seu futuro. Crianças não pensam no coletivo nem no longo prazo — querem seus doces e brinquedos para saciar seus desejos imediatos. Nossos representantes se comportam da mesma forma: brincam de votos, de eleições, de projetos de lei e até de reformas constitucionais. Sobretudo, brincam com o destino dos recursos públicos, sem considerar os interesses comuns da população nem o futuro da nação. As emendas parlamentares, algumas sob a forma de "Pix", é exemplo dessa brincadeira. Grande parte desses recursos tem sido destinada a projetos de caráter eleitoreiro, voltados a agradar aliados em troca de apoio político, sem coordenação com as prioridades do país, nem consequência no enfrentamento dos desafios nacionais. A ação política hoje está repleta de devaneios típicos das brincadeiras infantis, sem consequência real na condução da nação. Os parlamentares brincam com o dinheiro público e se beneficiam dele sem compromisso com o conjunto da sociedade. A própria ideia de anistiar criminosos que atentaram contra a democracia não é algo que se espere de adultos comprometidos com a democracia. Mas também não se comportam como adultos os democratas que comemoram o gesto maduro dos juízes, mas não tomam as atitudes necessárias para consolidar a democracia. A prisão do ex-presidente e de militares golpistas é um passo histórico, mas insuficiente para garantir a consolidação democrática se os políticos continuarem brincando de política, enriquecendo com a corrupção, ignorando as necessidades do povo, mantendo supersalários, mordomias, privilégios, desperdícios e sem assegurar educação de base com alta qualidade para todos. São raros, hoje, os líderes que podem ser considerados suficientemente adultos para pensar no futuro do país, respeitar o povo, articular uma base de apoio sólida para realizar os projetos necessários e formular estratégias para construir a nação que desejamos. Isso exigiria definir prioridades e pactuar sacrifícios no presente, em nome de um futuro comum para todos, o que caracterizaria adultos fazendo política, e não brincando de fazer política. Hoje, na sala da República, parece não haver adultos. Temos políticos claramente infantilizados que pedem proteção a grandalhões do bairro vizinho para bater em seus compatriotas com tarifaço e outras ameaças contra a soberania nacional. São políticos infantis e traidores da pátria. Mas aqueles que defendem a soberania não parecem entender que, na ótica adulta, essa defesa exige mais do que julgamento jurídico, requer unidade nacional que ultrapasse o núcleo restrito ao governo e seus aliados. A soberania não se sustenta em um país onde a nação é confundida com o partido no poder: ou ela pertence a todos — salvo os traidores —, ou não resiste. Para defender a soberania com o apoio de todos — excetuando os traidores —, é preciso dialogar, estender a mão, construir pactos com todos os que a desejam, mesmo que com divergências eleitorais e estratégicas. Requer a formulação e a implantação de uma agenda comum que viabilize a unidade necessária para justificar e sustentar a nação soberana. Essa, talvez, seja a mais grave infantilidade da política atual: a incapacidade de construir uma agenda comum para um destino compartilhado, com democracia consolidada, sem pobreza, sem corrupção, com distribuição justa da renda. *Professor emérito da Universidade de Brasília (UnB)
quarta-feira, 17 de setembro de 2025 Democracia brasileira não será a mesma após o 11 de setembro. Por Wilson Gomes Folha de S. Paulo Julgamento rompe lógica de ela ser apenas um intervalo entre golpes e ditaduras Levou uma vida para acontecer; a geração do meu pai não pôde ver algo assim Quase metade do país, pelo menos neste momento, não consegue perceber o alcance histórico do que ocorreu no Supremo Tribunal Federal no último 11 de setembro . Há muita raiva política no ar, há a convicção disseminada de que se tratou de mais uma batalha na guerra entre dois lados e uma enorme vontade de revanche. Triste, mas natural: nas atuais circunstâncias políticas do país, dificilmente as coisas poderiam ser vistas de outro modo. Mas a percepção pública não pode obscurecer os fatos. E o fato fundamental é que 11 de setembro de 2025, cedo ou tarde, entrará para a memória nacional como um dos dias mais decisivos da curta e intermitente história da nossa democracia. Permitam-me colocar as coisas em uma perspectiva familiar, para defender o ponto de vista que acabo de enunciar. Meu pai nasceu em 1922. Quando a ditadura do Estado Novo começou, em 1937, era um adolescente de 15 anos. Tinha 42 quando se iniciou a ditadura militar e 63 quando ela terminou. Em 73 anos de vida, atravessou duas ditaduras —foram 29 anos sob regime autoritário em sentido estrito. Se acrescentarmos o período de 1930 a 1934, após a deposição de Washington Luís, sem Congresso e com a Constituição suspensa, chegamos a 33 anos sob autoritarismo. Mais da metade da vida adulta de meu velho transcorreu sob regimes autoritários. É uma imensidão. Minha mãe nasceu em 1937. Quando oficialmente começou a ditadura deVargas, tinha cinco meses de idade. Em março de 1964, tinha 26 anos. E, por muito pouco, aos 85 anos, em 2022, não experimentou a sua terceira ditadura. Em que democracia estável tem cabimento uma pessoa viver uma "trinca de ditaduras" no decurso de uma vida? Ditaduras podem parecer abstrações distantes, sobretudo depois que passam. O mesmo acontece com muitas experiências traumáticas —tragédias, guerras, epidemias. A gente ativamente se empenha em não lembrar, para não reviver a angústia e a dor. As marcas deixadas pela pandemia de Covid, por exemplo —os mortos na família, o isolamento das pessoas queridas, a ansiedade sobre o futuro—, já parecem remotas, embora tudo tenha acontecido há tão pouco tempo. É mais suportável não remexer nisso para não sofrer de novo. Só quando encarnamos essas abstrações na vida de pessoas concretas é que podemos ter uma noção do que realmente significaram. As novas gerações, que chegaram à idade adulta em plena expansão mundial dos regimes democráticos e da ideia da democracia como valor universal, costumam se enganar ao pensar que este é um regime quase natural, parte da paisagem do mundo, o destino inevitável da civilização. A minha experiência familiar me ensinou o contrário: o normal, no Brasil, foram as ditaduras e as tentativas de golpe de Estado. A democracia é que tem sido a excepcionalidade, um intervalo sempre provisório entre um golpe e outro. Não vivemos propriamente períodos autoritários interrompendo a democracia, mas breves períodos democráticos entre longos ciclos de autocracia. Duas, três ditaduras no arco de uma vida —e a sensação de que a democracia pode ser interrompida a qualquer momento, porque boa parte do sistema político e uma multidão de brasileiros não fazem a menor questão dela— é um absurdo. Nada disso é compatível com um projeto de civilização nem com os valores que julgamos cultivar. Uma geração inteira presenciou o braço pesado do autoritarismo arrebentar a democracia várias vezes no século passado. Viu autocratas exigirem ser chamados de revolucionários. Viu o ditador de ontem voltar a ser eleito pelo voto popular sem jamais responder por seus crimes. Viu anistias e "tentativas de reconciliação nacional" para ditadores virarem incentivos para golpes futuros. O que nunca viu foram generais, almirantes e autoridades de alta patente sentados no banco dos réus, submetidos ao devido processo e condenados por golpe militar. Eu próprio nunca tinha visto um ex-presidente golpista, com enorme apoio popular, chamado a responder por seus crimes e condenado por eles. Isso levou uma vida para acontecer. A geração do meu pai sequer pôde assistir a algo assim. Então, me desculpem os que enxergam o julgamento da semana passada apenas como mais um episódio da guerra entre facções políticas: para a minha geração, e da perspectiva da nossa sempre precária democracia, o 11 de setembro foi, sim, um dia de cair no choro. Foi o renascer da expectativa de que a nossa experiência democrática deixe de ser apenas intervalo entre autocracias, para se tornar, enfim, o modo como nós, brasileiros, escolhemos viver. “Da profissão do poeta”, Geir Campos Publicado em 20/01/2017 por Sílvio Diogo “Da profissão do poeta” — poema de Geir Campos — nas vozes de José Virgínio e Sílvio Diogo; gravado em Diamantina, a 1º de maio de 2016. DA PROFISSÃO DO POETA (1956) — Geir Campos A Paulo Mendes Campos Da Consolidação das leis do trabalho: “Não haverá distinção relativa à espécie de emprego ou à condição do trabalho, seja intelectual ou manual ou técnico”. Da Identificação Profissional Operário do canto, me apresento sem marca ou cicatriz, limpas as mãos, minha alma limpa, a face descoberta, aberto o peito, e — expresso documento — a palavra conforme o pensamento. Do Contrato de Trabalho Fui chamado a cantar e para tanto há um mar de som no búzio do meu canto. Embora a dor ilhada ou coletiva me doa, antes celebro as coisas belas que movem o sol e as demais estrelas — antigos temas que parecem novos de tão gratos ao meu e aos outros povos. Da Relação com Vários Ofícios Meu verso tine como prata boa pesando na confiança dos bancários; os empregados no comércio bem sabem como atender aos que encomendo e recomendo mais do que ninguém; aos que se ligam em telefonia com ou sem fio, rádio, a esses também sei dizer à distância ou de mais perto a cifra e o texto no minuto certo; para os músicos profissionais, sem castigar o timbre das palavras modulo frases quase musicais; para os operadores de cinema meu verso é filme bom que a luz não queima; trilho também as estradas de ferro e chego ao coração dos ferroviários como um trem sempre exato nos horários; às equipagens das embarcações de mares ou de lagos ou de rios meu verso fala doce e grave como doce e grave é a taboca dos navios; nos frigoríficos derrete o gelo da apatia, se é para derretê-lo, meu canto a circular nas serpentinas; à boca da escotilha ou nas esquinas do cais, o meu recado é força viva guindando a atenção dos homens da estiva; desço cantando aos subsolos e às minas onde outros operários desenterram o minério de suas artérias finas; a outros, que dão sua têmpera aos metais, meu canto ajuda feito um sopro a mais aflando o fogo em flâmulas vermelhas; aos colegas que lidam nos jornais boas noticias dou e, mais do que isso, jeito de as repetir e divulgar quando o patrão quisera ser omisso; à gente miúda, pronta a ser maior, passo lições de um magistério puro e o que é dever escrevo a giz no muro; para os químicos sei fórmulas novas que os mártires elaboram nas covas… e a todos que trabalham vai assim meu canto sugerindo meio e fim. Do Horário do Trabalho Marcadas as minhas horas de ofício, de dia em sombras pelo chão e à noite no rútilo diagrama das estrelas, só quem ama o trabalho sabe vê-las. Dos Períodos de Descanso Seja domingo ou dia de semana, mais do que as horas neutras do repouso confortam-me os encargos rotineiros; meu descanso é confiar nos companheiros. Do Direito a Férias Nunca me participam por escrito ou verbalmente os ócios que mereço, mas sempre gozo bem o merecido: pois o ócio não é ofício pelo avesso? É quando fio o verso; depois teço. Da Remuneração das Férias Em férias tenho a paga de saber lembrado o verso meu por quem o inspira; é como se outra mão tangesse a lira. Do Salário Mínimo Laborando entre os pontos cardinais, de norte a sul, de leste a oeste, vou cobrando aqui e ali quanto me basta: o privilégio de seguir cantando. (Imposto é cuidar onde e como e quando.) Do Expediente Noturno Trabalho à noite e sem revezamentos. Se há mais quem cante, cantaremos juntos; sem se tornar com isso menos pura a voz sobe uma oitava na mistura. Da Segurança do Trabalho Mesmo no escuro, canto. Ao vento e à chuva, canto. Perigo à vista, canto sempre; e é clara luz e um ar nunca viciado e sol no inverno e fresca no verão, meu canto, e sabe a flores se é de flores e a frutos se é de frutos a estação. Só não me esforço à luz artificial com que a má fé de alguns aos mais deslumbra servindo-lhes por luz o que é penumbra; também quando o ar parece rarefeito a lira engasga, o verso perde o jeito. Da Higiene do Trabalho Não canto onde não seja o sonho livre, onde não haja ouvidos limpos e almas afeitas a escutar sem preconceito; para enganar o tempo ou distrair criaturas já de si tão mal atentas, não canto… Canto apenas quando dança, nos olhos dos que me ouvem, a esperança. Da Alteração de Contrato Etc. Meu ofício é cantando revelar a palavra que serve aos companheiros; mas se preciso for calar o canto e em fainas diferentes me aplicar unindo a outros meu braço prevenido, mais serviço que houver será servido. * Do livro Da profissão do poeta. 1ª ed. Rio de Janeiro: Philobiblion e Civilização Brasileira, 1956. Xilogravuras de Manuel Segalá. Votos válidos x votos totais: entenda a diferença e quando um candidato vence a eleição no 1º turno Cargos de presidente e governador podem ser definidos no primeiro ou segundo turno. Diretor do Datafolha por mais de 20 anos e colunista da GloboNews, Mauro Paulino detalha como o TSE contabiliza os votos do eleitorado. Por Arthur Stabile, g1 30/09/2022 10h47 Atualizado há 2 anos
Quaest: 40% dizem que Lula deveria disputar reeleição; 9% dizem que Alckmin deveria substituí-lo; Tebet tem 6%; e Haddad, 5% Pesquisa mostra que presidente venceria em todos os cenários de 1º e 2º turno. Margem de erro é de 2 pontos para mais ou menos. Por Arthur Stabile, Felipe Turioni, Gustavo Petró, g1 — São Paulo 18/09/2025 07h00 Atualizado há 4 horas Resumo técnico sobre possibilidade de vitória em 1º turno 1. Fundamento estatístico O sistema eleitoral brasileiro considera apenas votos válidos (excluídos brancos e nulos). Para vencer no 1º turno, um candidato precisa obter >50% dos votos válidos. Assim, a viabilidade depende não só da intenção de voto no candidato, mas também do nível de brancos/nulos/abstenções. 2. Resultados observados (Quaest, set/2025) Lula aparece em 32–34% do total de votos nos cenários de 1º turno. Brancos/nulos oscilam entre 10–13% nesses mesmos cenários. Convertendo para votos válidos, Lula fica em torno de 37%, muito abaixo do limiar de 50%. Condição matemática para vitória em 1º turno: com Lula em 34% do total, seria necessário que os brancos/nulos superassem 32% — patamar bem mais alto que o registrado. 3. Justificativa técnica A relação é: \text{% votos válidos do candidato} = \frac{\text{Intenção de voto bruta}}{1 - \text{% branco/nulo}} Como a soma atual de branco+nulo é relativamente baixa (10–13%), o redimensionamento não é suficiente para elevar Lula a >50% entre válidos. Mesmo considerando a margem de erro de ±2 p.p., os intervalos de confiança continuam muito abaixo de 50%. 4. Conclusão objetiva Com os dados atuais, não há possibilidade estatística de vitória em 1º turno para Lula nem para qualquer outro candidato. Apenas em cenários de 2º turno, onde a taxa de branco/nulo chega a ~25%, Lula atinge acima de 60% dos votos válidos — mas isso não se aplica ao 1º turno. Portanto, do ponto de vista estritamente técnico e probabilístico, a eleição presidencial de 2026 está desenhada para ir ao 2º turno, salvo uma mudança muito expressiva na taxa de brancos/nulos ou no crescimento substancial de algum candidato. Hope and Glory | The New York Times THANK YOU ADOLF!

Nenhum comentário:

Postar um comentário