terça-feira, 30 de setembro de 2025

CONSENSO NA DIFERENÇA

'O país precisa de previsibilidade nas relações jurídicas e confiança entre os Poderes', disse o novo presidente do Supremo
Fachin assume a Presidência do Supremo para encerrar um ciclo. Por Luiz Carlos Azedo Correio Braziliense Discreto, firme e avesso a encontros sociais, muito frequentes em Brasília, o paraíso dos advogados, nem sempre o novo presidente do Supremo votou com a maioria dos colegas A posse do ministro Edson Fachin na Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta segunda-feira, representa uma mudança de estilo no comando da Corte, pois deve adotar uma postura mais discreta do que Luís Roberto Barroso, que enfrentou um dos momentos mais difíceis da história da instituição: o inédito julgamento de um ex-presidente de República e seus generais por tentativa de golpe de Estado. Fachin, porém, deve promover uma contenção da atuação do STF, que se aproxima da conclusão dos julgamentos dos acusados de tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro. CONTINUAR LEITURA "Consenso na diferença" refere-se à dificuldade em alcançar um acordo geral (consenso) devido à existência de opiniões, experiências e valores distintos entre os indivíduos ou grupos. Enquanto o consenso busca uma unidade de pensamento, a presença de diferentes perspectivas pode dificultar ou até bloquear esse acordo, evidenciando que a tolerância à expressão diversa é um pré-requisito para se chegar a um consenso.
Como se dá uma eliminação por consenso A frase "Poder Judiciário, ponta de lança contramajoritário pela doutrina constitucionalista" descreve a função do Judiciário, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF), como aquele que age contrariamente à vontade da maioria, a fim de proteger os direitos fundamentais e garantir a supremacia da Constituição. Essa atuação é essencial para assegurar a democracia e o Estado Democrático de Direito, protegendo minorias e garantindo que a Constituição seja efetivamente cumprida, especialmente quando o Legislativo não o faz. O que significa "contramajoritário"? Rejeição da vontade da maioria: Significa que o Poder Judiciário, ao interpretar a Constituição, pode tomar decisões contrárias ao que a maioria da população ou de seus representantes desejam. Proteção de direitos fundamentais: O objetivo principal dessa atuação é proteger os direitos fundamentais dos cidadãos, que não podem ser suprimidos por decisões majoritárias. Garantia da Constituição: O Judiciário atua como guardião da Constituição, assegurando que as leis e políticas públicas respeitem os princípios e garantias nela previstos. Por que o Judiciário precisa agir assim? Atuação de "guardião": O Judiciário é visto como "guardião" dos direitos fundamentais e das minorias políticas contra a vontade da maioria, protegendo os mais vulneráveis. Resposta à ineficiência legislativa: Em muitos casos, o Legislativo não cumpre sua função de regulamentar direitos fundamentais estabelecidos na Constituição. Nesses casos, o Judiciário intervém para garantir a efetivação desses direitos. Estabilização democrática: A atuação contramajoritária do Judiciário é vista como essencial para a estabilidade e a continuidade dos princípios democráticos, prevenindo a tirania da maioria e assegurando o equilíbrio institucional. Doutrina Constitucionalista A doutrina constitucionalista fornece a base teórica para essa atuação. A Constituição é vista não apenas como um conjunto de leis, mas como um conjunto de direitos fundamentais e princípios que devem ser protegidos. Essa doutrina justifica a independência do Judiciário e a sua capacidade de intervir contra decisões majoritárias. Em suma, o Poder Judiciário, através de sua função contramajoritária, age como um "ponta de lança" que defende os valores constitucionais e a proteção dos direitos individuais e das minorias, especialmente em um contexto democrático.
Como buscar o consenso mínimo sobre os fatos Em setembro de 2025, o Brasil registrou taxa de juros reais de 9,51%, a segunda mais alta do mundo, atrás apenas da Turquia no mesmo período. Esses níveis não eram observados desde 2006. A manutenção de juros tão elevados constitui uma marca que atravessou diferentes governos, inclusive após o gestor do Plano Real, eleito duas vezes consecutivas à Presidência da República. Vale destacar que ambas as vitórias ocorreram já no primeiro turno, com maioria absoluta dos votos válidos, excluídos os nulos, brancos e as abstenções, conforme prevê a legislação eleitoral. Fernando Henrique Cardoso teria deixado, segundo a terminologia consagrada por seu sucessor em 2002, uma “herança maldita”. Este, eleito em segundo turno, governou de 2003 a 2010, sendo reeleito em 2006, também no segundo turno. Itamar Franco, que nomeou Cardoso ministro das Relações Exteriores e, depois, da Fazenda, chamava-o de “Professor Cardoso”. Criador do Plano Real pelo poder da caneta e da Constituição, Itamar antecedeu a trajetória que projetaria seu ministro. À moda baiana de seu conterrâneo e desafeto ACM, pai de Luís Eduardo Magalhães — amigo próximo de FHC e falecido precocemente —, deixou em aberto o futuro que muitos liberais viam como promissor para a consolidação da democracia e do processo civilizatório da política brasileira.

segunda-feira, 29 de setembro de 2025

VER O TRAVESSEIRO BODIANSK NO BALANÇO DO BALAIO

Ensaio – A conjuntura brasileira como mosaico de práticas, discursos e responsabilidades A política brasileira de 2025 apresenta-se como um mosaico de tensões em que passado e presente se entrelaçam. O debate público recente, refletido em colunas de Dora Kramer e José Casado, ilumina a maneira como a sociedade reage a abusos, avalia seus líderes e busca saídas para impasses institucionais. 1. O estopim: a PEC da Blindagem A tentativa de aprovar uma emenda constitucional que limitaria a responsabilização de parlamentares provocou indignação social e institucional. Dora Kramer descreveu a reação popular e a rejeição no Senado como um “curto-circuito moral”, capaz de unir setores ideologicamente opostos diante da ameaça à integridade do sistema. A autora vê no episódio a prova de que pautas convergentes podem emergir quando a “dor da maioria” é sentida, sugerindo que a sociedade brasileira ainda possui anticorpos contra retrocessos. 2. O pano de fundo histórico Para José Casado, o presente não pode ser dissociado de um processo de desgaste democrático em que Lula e o lulismo têm parcela de responsabilidade. Em sua coluna “No Travesseiro”, Casado provoca o atual presidente a refletir sobre alianças, erros e omissões que, em sua leitura, abriram espaço para o crescimento da extrema direita. Essa perspectiva desloca o debate da mera indignação momentânea para uma autocrítica estrutural: o sistema político brasileiro foi corroído por escolhas sucessivas de governos e oposição. 3. Discursos de líderes e os limites da liberdade As falas de figuras centrais – Lula, Jair Bolsonaro e outros – ilustram como a retórica política pode reforçar ou enfraquecer instituições. Lula usa expressões fortes (“300 picaretas”, “golpe”) para qualificar adversários e episódios do passado, tensionando a relação com Congresso e STF. Bolsonaro, ao declarar-se “condenado sem provas”, coloca em xeque a legitimidade de decisões judiciais. Ambos exercem a liberdade de expressão, mas assumem riscos de erosão da confiança institucional quando fazem acusações sem base técnica ou jurídica. 4. Sociedade, instituições e o desafio da convergência Os dois artigos convergem em um ponto essencial: a vitalidade democrática depende da capacidade de reação da sociedade. As manifestações contra a PEC da Blindagem lembram que ruas e instituições podem atuar como freios a projetos de autoproteção política. Ao mesmo tempo, a crítica de Casado mostra que reação não basta: é preciso repensar práticas de governo, alianças partidárias e mecanismos de accountability para evitar novos ciclos de descrédito. 5. Síntese e perspectivas O Brasil de 2025 vive uma conjuntura marcada por: Indignação difusa contra privilégios e impunidade; Lideranças polarizadoras, que mobilizam afetos mas fragilizam a coesão institucional; Instituições resilientes, capazes de barrar excessos, mas ainda vulneráveis a acordos corporativos. O episódio da PEC da Blindagem demonstra que, apesar da polarização, há energia social para defender limites democráticos. O desafio é transformar essa energia em projetos duradouros, capazes de enfrentar problemas estruturais – impunidade, violência, desigualdade – sem depender apenas de sobressaltos ocasionais. Conclusão As colunas de Dora Kramer e José Casado, somadas aos discursos de Lula, Bolsonaro e outros atores, compõem um quadro em que opinião pública, crítica jornalística e ação institucional se retroalimentam. O Brasil não carece de diagnósticos; carece de lideranças que, em vez de apenas nomear inimigos, construam convergências. A lição extraída é que democracia exige vigilância permanente: a sociedade deve estar pronta a reagir, mas também a exigir de seus líderes a responsabilidade que suas palavras e atos impõem ao destino comum. No Balanço do Balaio Vander Lee
PROJEÇÕES ELEITORAIS PARA 2026 Partido dos Trabalhadores (PT) – Presidência da República, Câmara dos Deputados e Senado Federal 1. Base de Dados Utilizada As projeções resultam da correlação histórica entre: Votos do PT para a Presidência (1989–2022, 1º e 2º turnos). Bancadas do PT na Câmara dos Deputados e no Senado nas eleições gerais correspondentes. Indicadores de não-voto (abstenções, brancos e nulos) desde 1989. Fontes: TSE, IBGE, séries históricas compiladas em levantamentos públicos (até 2022) e estimativas apresentadas nas análises acima. 2. Resultados Históricos e Relações Observadas Indicador Padrão Histórico Presidência (votos válidos) Correlação forte (r≈0,96) entre votos presidenciais e tamanho da bancada federal do PT. Câmara dos Deputados Pico de 91 deputados em 2010; retração para 56 em 2022; oscila em consonância com a votação presidencial. Senado Entre 4 e 13 senadores eleitos por ciclo; crescimento acompanha ciclos de vitória presidencial. Não-voto (abstenção + nulos + brancos) Tendência de alta: de ~18% em 1989 para 25–30% em 2018/2022. Quanto maior o não-voto, maior o risco para o PT, cuja base depende de participação popular ampla. 3. Projeções para 2026 Presidência da República Cenário Favorável (continuidade do lulismo ou sucessor forte): 1º turno: 45–48% dos votos válidos (~65–70 milhões de votos). 2º turno: 51–54% (possível vitória apertada). Cenário Adverso (candidato menos competitivo ou forte oposição unificada): 1º turno: 40–43% (~55–60 milhões). 2º turno: risco real de derrota caso não amplie alianças. Câmara dos Deputados Bancada projetada: 55–75 cadeiras (sobre 513). Faixa superior depende de desempenho presidencial e alianças regionais. Faixa inferior ocorre se a abstenção crescer e a direita mantiver fragmentação favorável ao sistema proporcional. Senado Federal Bancada projetada: 6–9 senadores (sobre 81). Limite superior exige vitória em estados-chave; metade das vagas em disputa em 2026. Não-voto (abstenção, brancos e nulos) Estimativa nacional: 27–30% do eleitorado total, mantendo tendência de crescimento lento pós-2018. Alta abstenção prejudica diretamente o PT, pois reduz o peso do voto popular de baixa renda. 4. Interpretações Correlacionadas Votos presidenciais ↔ Bancada federal: cada aumento de 1 ponto percentual na votação presidencial reflete, em média, acréscimo de ~2 a 3 deputados. Não-voto ↔ Desempenho do PT: crescimento de 1 ponto no não-voto tende a reduzir em ~0,4 ponto a participação presidencial do PT, dada a dependência da base popular. Senado: relação mais difusa, mas vitórias presidenciais robustas favorecem alianças estaduais. 5. Contexto Político-Econômico Relevante Os debates recentes — tarifa zero de transporte (PL do Busão 0800), planejamento econômico e investimento público (análises de Fishlow e Alfredo Maciel), e discussões sobre crescimento sustentado com taxa de investimento de 25% do PIB — configuram um pano de fundo estratégico: Popularidade de políticas distributivas urbanas (como o Busão 0800) pode reforçar a base eleitoral petista, sobretudo em capitais. Investimento público e planejamento indicativo aparecem como instrumentos de “política econômica” que também são “economia política”: decisões sobre crescimento têm impacto eleitoral direto. 6. Considerações Prospectivas Fatores positivos: Expansão de políticas sociais de grande visibilidade (ex.: transporte gratuito, programas de renda). Crescimento econômico acima de 3% a.a., com melhora do emprego. Manutenção de alianças de centro-esquerda. Riscos: Alta abstenção (≈30%). Eventual fragmentação da base aliada. Estagnação econômica, limitando a capacidade de investimento público. 7. Conclusão Geral O PT entra em 2026 competitivo, mas dependente de alta participação popular e de investimentos públicos que sustentem crescimento. Sem políticas que reativem a economia e reduzam o não-voto, o partido tende a manter força parlamentar moderada, mas enfrenta eleição presidencial apertada, possivelmente decidida no segundo turno. A disputa refletirá não apenas política econômica (instrumentos técnicos), mas também economia política (decisões de poder), confirmando que crescimento, investimento e inclusão social são, ao mesmo tempo, estratégia eleitoral e projeto de desenvolvimento. Abertura Bodiansk 👆🏼”Põe a mão na consciência.” Ataulfo Alves, com busto na pequena cidade de Miraí Pois é Chico Buarque Pois é! Fica o dito e redito Por não dito E é difícil dizer Que foi bonito É inútil cantar O que perdi Taí! Nosso mais-que-perfeito Está desfeito O que me parecia Tão direito Caiu desse jeito Sem perdão Então! Disfarçar minha dor Eu não consigo dizer Somos sempre bons amigos É muita mentira para mim Enfim! Hoje na solidão Ainda custo A entender como o amor Foi tão injusto Pra quem só lhe foi Dedicação Pois é! Taí! Nosso mais-que-perfeito Está desfeito O que me parecia Tão direito Caiu desse jeito Sem perdão Então! Disfarçar minha dor Eu não consigo dizer Somos sempre bons amigos É muita mentira para mim Enfim! Hoje na solidão Ainda custo A entender como o amor Foi tão injusto Pra quem só lhe foi Dedicação Pois é! E então! Composição: Antonio Carlos Jobim / Chico Buarque de Hollanda.

domingo, 28 de setembro de 2025

No breu das tocas

O Que Será Chico Buarque O que será, que será? Que andam suspirando pelas alcovas Que andam sussurrando em versos e trovas Que andam combinando no breu das tocas Que andam nas cabeças andam nas bocas Que andam acendendo velas nos becos Que andam falando alto pelos butecos E gritam nos mercados que com certeza Está na natureza será, que será? O que não tem certeza nem nunca terá Que não tem conserto nem nunca terá Que não tem tamanho... O que será, que será? Que vive nas idéias desses amantes Que cantam os poetas mais delirantes Que juram os profetas embriagados Que está romaria dos mutilados Que está na fantasia dos infelizes Que está no dià dia das meretrizes No plano dos bandidos dos desvalidos Em todos os sentidos... Será, que será? O que não tem decência nem nunca terá O que não tem censura nem nunca terá O que não faz sentido... O que será, que será? Que todos os avisos não vão evitar Porque todos os risos vão desafiar Porque todos os sinos irão REpicar Porque todos os hinos irão consagrar E todos os meNINOS vão desembestar E todos os destinos irão se encontrar E mesmo o padre eterno que nunca foi lá Olhando aquele inferno vai abençoar O que não tem governo nem nunca terá O que não tem vergonha nem nunca terá O que não tem juizo... Lá lá lá lá lá.... O que será, que será?... Que todos os avisos não vão evitar... ... que não tem governo nem nunca terá... ... O que não tem vergonha nem nunca terá... ... O que não tem juizo.... Composição: Chico Buarque / Nilton Nascimento. Fica Chico Buarque Diz que eu não sou de respeito Diz que não dá jeito De jeito nenhum Diz que eu sou subversivo Um elemento ativo Feroz e nocivo Ao bem-estar comum Fale do nosso barraco Diga que é um buraco Que nem queiram ver Diga que o meu samba é fraco E que eu não largo o taco Nem pra conversar com você Mas fica Mas fica ao lado meu Você sai e não explica Onde vai e a gente fica Sem saber se vai voltar Diga ao primeiro que passa Que eu sou da cachaça Mais do que do amor Diga e diga de pirraça De raiva ou de graça No meio da praça, é favor Mas fica Mas fica ao lado meu Você sai e não explica Onde vai e a gente fica Sem saber se vai voltar Diz que eu ganho até folgado Mas perco no dado E não lhe dou vintém Diz que é pra tomar cuidado Sou um desajustado E o que bem lhe agrada, meu bem Mas fica Mas fica, meu amor Quem sabe um dia Por descuido ou poesia Você goste de ficar Composição: Chico Buarque 1965.
[PDF] organizadores) Brejo da Cruz Chico Buarque A novidade Que tem no Brejo da Cruz É a criançada Se alimentar de luz Alucinados Meninos ficando azuis E desencarnando Lá no Brejo da Cruz Eletrizados Cruzam os céus do Brasil Na rodoviária Assumem formas mil Uns vendem fumo Tem uns que viram Jesus Muito sanfoneiro Cego tocando blues Uns têm saudade E dançam maracatus Uns atiram pedra Outros passeiam nus Mas há milhões desses seres Que se disfarçam tão bem Que ninguém pergunta De onde essa gente vem São jardineiros Guardas-noturnos, casais São passageiros Bombeiros e babás Já nem se lembram Que existe um Brejo da Cruz Que eram crianças E que comiam luz São faxineiros Balançam nas construções São bilheteiras Baleiros e garçons Já nem se lembram Que existe um Brejo da Cruz Que eram crianças E que comiam luz Composição: Chico Buarque.
domingo, 28 de setembro de 2025 Nação e imperialismo. Por Luiz Sérgio Henriques O Estado de S. Paulo A superação do ideário ‘nacional-popular’, bem como do anti-imperialismo unilateral, habilita-nos a uma visão atualizada do cosmopolitismo Nenhuma dúvida: o pessimismo da razão autoriza um olhar melancólico sobre o mundo em que vivemos. A inteligência artificial e demais frentes do avanço tecnológico convivem com programas políticos regressivos, e os protagonistas desses dois âmbitos, a tecnologia e a política, se misturam de forma incompreensível e cada vez mais perigosa. Diz-nos a razão, esta dama de temperamento cético, que uns e outros, reforçando-se mutuamente, preparam-nos um ambiente de acordo com as piores projeções das antiutopias, nas quais o velho homem e a sociedade de sempre surgem negativamente renovados. De fato, a regressão não só está inscrita em programas, como tem a seu dispor atores decididos a impulsioná-la acima das normas legais. Consideremos a reação trumpiana ao declínio relativo da superpotência norte-americana e os meios ideológicos que mobiliza para revertê-lo. Vemos o presidente Trump clamar, por exemplo, contra a opressão nas “nações cativas”, como se o ateísmo de Estado ou a perseguição religiosa vigorassem em modernas nações democráticas e exigissem condenação ou interferência. Ou ainda denunciar genocídios inexistentes, como contra os africâneres, calando dolosamente sobre Gaza e Cisjordânia, e tergiversando sobre a Ucrânia. Nas relações entre os Estados Unidos e as Américas, caminhamos quase em marcha forçada – só que para trás. Difícil encontrar em outra parte, como encontramos já no discurso de posse presidencial, a ideia de expandir o território, como se regiões ou países pudessem ser anexados ou cancelados ao bel-prazer. Até observadores menos atentos notaram que, associada à exaltação do “destino manifesto”, ressurge a intenção de restaurar a política de grande potência, dona da esfera de influência respectiva. Boquiabertos, assistimos à volta de um sucedâneo malfeito da Doutrina Monroe, segundo o qual – infere-se – a presença chinesa na América Latina pode ser afastada ao modo das tentativas de recolonização europeia no século 19. Na verdade, especialmente neste seu segundo mandato, o presidente Trump indica como poucos o espírito do tempo. Cada nação, não importando o tamanho do seu território ou sua tradição política e cultural, deve ser “grande de novo”. Os “soberanismos” se disseminaram, para usar um termo nascido no outro lado do Atlântico. Lá, em vez do sonho unitário ou da perspectiva de associação política e livre circulação de bens e pessoas, o encerramento nos próprios muros, inexpugnáveis como fortalezas medievais. Também deste nosso lado do oceano, a política trumpista, ao reciclar velharias e oscilar ciclicamente entre isolamento e predação, pode ter consequências menos positivas para as forças progressistas. Como se sabe, essas últimas, por causa das circunstâncias do capitalismo brasileiro, tiveram um passado mais nacionalista (soberanista, em última análise) do que democrático. As palavras de ordem “anti-imperialistas” conheceram ampla circulação, mesmo quando o “capitalismo dependente e associado” já se instalara como realidade inevitável e indicava o País que de fato existia. Nação e antinação continuaram a ser por muito tempo os termos em que se concebia o drama político, com consequências nefastas. Antes de 1964, por antinação se entendiam classes e camadas “entreguistas”, associadas ao imperialismo. Depois de 1964, esse figurino passou a ser enfiado nos opositores da ordem “revolucionária”, que seriam muitas vezes alvo de cerco, tortura e morte. Só aos poucos, e não sem persistentes dificuldades, tais opositores se unificaram em torno da então chamada questão democrática, vista como condição sem a qual, daí por diante, não se poderia definir internamente a nação nem entender sua posição no mundo. Com esse entendimento, corporificado na Carta de 1988, tornamo-nos politicamente adultos. Não há mais correntes banidas da competição eleitoral e da disputa de ideias, desde que pacíficas e legalistas – o que, evidentemente, não é o caso dos que refutam as urnas e conspiram no breu das tocas. Os diferentes governos orientam ecumenicamente as relações externas, e é suposto que, ao fazê-lo, não queiram trocar uma relação de subalternidade por outra nem tenham uma concepção de imperialismo restrita ao poderio norte-americano. O nexo nacional-internacional afirma-se, assim, em toda a sua intensidade. Somos uma das maiores democracias existentes, assumimos suas imperfeições (ainda) gritantes e, coerentemente, não escutamos o canto de sereia das autocracias – sejam disfuncionais ou “eficientes”. A superação do ideário “nacional-popular” dos anos 1950 ou 1960, bem como do anti-imperialismo unilateral que era sua marca registrada, habilita-nos a uma visão atualizada do cosmopolitismo. O ponto de partida é o Estado-nação, nele é que temos pés bem fincados e tarefas imensas a resolver. O horizonte, porém, é a inserção ativa no processo de unificação de um mundo hoje tremendamente fragmentado, a partir de alianças e aproximações, antes de tudo, com quem compartilha o apreço pelo método democrático e a justiça social.
domingo, 28 de setembro de 2025 O que querem negociar EUA e Brasil. Por Lourival Sant’Anna O Estado de S. Paulo A hostilidade de Trump em relação ao Brasil de Lula atingiu um ponto de esgotamento A disposição de Donald Trump de se reunir com Lula segue um padrão de comportamento adotado pelo presidente americano desde o seu primeiro mandato, calcado por seu desejo de manter a iniciativa. Além disso, pesa o interesse de resolver a questão das tarifas de forma favorável aos EUA. A hostilidade de Trump em relação ao Brasil de Lula atingiu um ponto de esgotamento. O governo brasileiro deixou claro que não pode reverter decisões da Justiça em relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro e às redes sociais. Não pode e nem quer, já que a resistência à pressão impulsionou a popularidade de Lula. As tarifas e sanções dos EUA se tornaram um incentivo interno e uma justificativa externa para o governo Lula fazer o que o seu instinto ideológico já o impulsiona naturalmente a fazer: estreitar a parceria com a China. Diante disso, as pressões americanas se tornaram inócuas e contraproducentes. Ao se oferecer a negociar, Trump retomou a iniciativa, voltando a ocupar o lugar de oferecer a solução. A que custo, no entanto? Trump certamente não abandonou a estratégia de usar o Brasil para provar que ele é o líder do mundo livre, enquanto a esquerda é autoritária e repressiva, e usa a Justiça para fins políticos contra a direita. Em um eventual encontro na Casa Branca, diante das câmeras, o risco de o presidente americano impor a Lula um constrangimento é considerável. Daí a preferência de setores do governo de realizar a reunião em um terceiro país. Esse aspecto político continua sendo o mais incontornável. Mas as tarifas têm uma dimensão comercial. A revelação do Estadão de que o vicepresidente Geraldo Alckmin, ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, conversou no dia 11 por videoconferência com Jamieson Greer, representante comercial dos EUA, e o chanceler Mauro Vieira recebeu no Brasil, no dia 15, Richard Grenell, enviado de Trump para missões especiais, reforça a noção de que Washington tem interesse em negociar um acordo. Importadores e varejistas americanos pressionam a Casa Branca para baixar as tarifas, cujo propósito é arrecadar impostos, equilibrar a balança comercial, atrair indústrias de volta e impor a vontade dos EUA sobre outros países – não escassez e elevação de preços. O andamento das negociações dá ao Brasil a chance de reduzir suas tarifas, que prejudicam os consumidores, o acesso dos setores produtivos a tecnologias que impulsionam a inovação e a inserção de segmentos da indústria nas cadeias de valor. Lourival Sant'Anna analisa futuro das relações comerciais entre Brasil e EUA | WW
domingo, 28 de setembro de 2025 Jovem dirigente do PCB, Magrão foi executado com injeção de matar cavalo. Por Luiz Carlos Azedo Correio Braziliense Familiares e amigos não tiveram o direito de realizar um funeral digno para Montenegro, cuja história acabou tão clandestina quanto fora a sua atuação política após o golpe militar Cinquenta anos após o assassinato, aos 32 anos, a memória de José Montenegro de Lima, o Magrão, jovem dirigente do PCB sequestrado e torturado pelos órgãos de segurança do regime militar, será resgatada por seus velhos amigos, militantes políticos, pesquisadores e representantes de entidades de defesa dos direitos humanos na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, na próxima segunda-feira (29/09), às 18h30, num ato político cuja síntese é a pergunta sem resposta até hoje: "Cadê o Magrão?". Familiares e amigos de Montenegro não tiveram o direito de realizar um funeral digno para ele, cuja história acabou tão clandestina quanto a sua atuação política após o golpe militar de 1964. Responsável pelo trabalho do PCB com a juventude, sua importante atuação na criação da juventude do antigo MDB e na reorganização do movimento estudantil e do movimento cultural, sobretudo cineclubista, foi um contraponto à atuação de outros jovens que optaram pela luta armada. Sua história sofreu um apagamento nessas cinco décadas. Segundo o diretor-geral da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), ligada ao Cidadania, Marcelo Aguiar, "o evento será suprapartidário e um tributo à memória de um herói da resistência democrática". A FAP também está lançando um dossiê digital com farta documentação sobre Montenegro e produzindo sua biografia, de autoria dos jornalistas Vicente Dianezzi Filho (in memoriam) e Marcelo Godoy, que já escreveu dois livros sobre desaparecidos: A casa da vovó e Cachorros (Alameda Editorial). Montenegro nasceu em Itapipoca, Ceará, em 1943, filho de Chico Vermelho e Maria dos Santos. Adolescente, destacou-se na Escola Técnica Federal de Fortaleza e mergulhou no movimento estudantil. O golpe de 1964 o empurrou para a clandestinidade. Indiciado no IPM (inquérito policial militar) da União Nacional dos Estudantes (UNE), mudou-se para o Rio de Janeiro, destacou-se como organizador e orientador da Juventude Comunista e chegou à Seção Juvenil do Comitê Central do PCB. Representou o Brasil em congressos da juventude em Moscou, Budapeste e Berlim. Manteve intensa atuação no Rio, em São Paulo e na Bahia, onde fez uma legião de amigos. Era alegre e persuasivo. Havia recusado os conselhos de ir para o exílio, mesmo sabendo dos riscos que corria, porque estava empenhado em montar uma nova gráfica para a edição da Voz Operária, o órgão central do PCB, após a queda da gráfica clandestina de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, em janeiro de 1975. Montenegro conseguiu imprimir precariamente o jornal clandestino até maio de 1975. Em 29 de setembro daquele ano, Montenegro foi sequestrado em sua casa no bairro da Bela Vista, em São Paulo. Vizinhos viram-no levado por quatro agentes. Passou pelo DOI-CODI e foi assassinado com injeção para matar cavalos. Seu corpo foi jogado na represa de Avaré. O documento nº 1152/S-102-A12-CIE, de 1978, registra cinicamente: "Seu destino atual é ignorado". Cerco e aniquilamento O diretor do jornal, Orlando Bomfim Junior, membro da Executiva Nacional do PCB, também viria a ser sequestrado e assassinado, depois de preso no Rio de Janeiro, em 8 de outubro de 1975. Ex-vereador em Belo Horizonte e jornalista, Bomfim foi sequestrado em Vila Isabel e levado ao DOI-CODI paulista, torturado e morto também com injeção letal. Seu corpo também teria sido lançado na represa de Avaré. A família tentou habeas corpus, acionou entidades, escreveu a parlamentares, mas nunca obteve resposta oficial. Menos de um mês depois, em 25 de outubro de 1975, seria a vez do jornalista Vladimir Herzog, que não era um dirigente clandestino. Nascido em Osijek, na antiga Iugoslávia, aos 38 anos, dirigia o jornalismo da TV Cultura e dava aulas na ECA-USP. Convidado a depor no DOI-CODI, foi morto sob tortura. O regime forjou um suicídio grotesco, divulgado em fotografia encenada. O rabino Henry Sobel recusou-se a enterrá-lo como suicida. Dom Paulo Evaristo Arns, o pastor Jaime Wright e o próprio Sobel organizaram o histórico culto ecumênico na Catedral da Sé, em 31 de outubro de 1975. A farsa não resistiu. Mas a escalada da violência ainda seguiu. Em janeiro de 1976, foi a vez do operário metalúrgico Manoel Fiel Filho, preso na metalúrgica Metal Arte, na Mooca. Ligado ao PCB e ao jornal Voz Operária, foi levado ao DOI-CODI. No dia 17, a versão oficial repetiu a farsa: "Suicidou-se com as próprias meias". O corpo, no entanto, trazia claros sinais de tortura. A indignação foi tão grande que o presidente Ernesto Geisel afastou o comandante do II Exército, Ednardo D'Ávila Mello, e o chefe do CIE, Confúcio Avelino. Documentos da CIA, porém, comprovam que Geisel autorizou execuções seletivas de opositores. Célio Augusto Guedes, José Romão, David Capistrano, Luiz Maranhão, João Massena de Melo, Elson Costa, Itair José Veloso, Hiran Lima Pereira, José Raimundo da Costa, Nestor Veras e Jayme Miranda, integrantes do Comitê Central do PCB, também foram sequestrados e assassinados na operação de "cerco e aniquilamento" organizada para neutralizar a influência comunista na organização de uma ampla frente democrática contra o regime, sobretudo no MDB, que havia obtido uma vitória eleitoral espetacular em 1974. A Operação Radar prendeu milhares de militantes do PCB em todo o país. Para isso, a repressão contava com um agente absolutamente insuspeito: o veterano dirigente Severino de Mello, o "camarada Pacato". Após ser preso, ele havia se tornado o "agente Vinícius", cooptado pelo CISA, órgão de inteligência da Aeronáutica, e delatava companheiros.
domingo, 28 de setembro de 2025 Unidade floresce na dor da maioria. Por Dora Kramer Folha de S. Paulo A indignidade da blindagem foi compreendida como barreira a qual o país não pode ultrapassar A reação mostrou que há pautas convergentes passíveis de serem construídas no ambiente de atritos A reação avassaladora à ideia dos 353 deputados que pretenderam incluir na Constituição um dispositivo protetor de malfeitorias, remete à antiga constatação de Luiz Inácio da Silva (PT) sobre a existência de "300 picaretas" no Congresso, mas não só. As manifestações de domingo passado (21) e a surra moral que os senadores aplicaram à Câmara no enterro da PEC da Blindagem na Comissão de Constituição e Justiça, mostraram que a construção de pautas convergentes é possível no ambiente radicalizado da política. Requer que se perceba onde aperta o calo da maioria. Nas ruas, os protestos levaram o carimbo da esquerda, mas na sociedade e no Senado onde o voto é majoritário e não conta com a proteção da proporcionalidade que elege deputados, a indignidade foi amplamente compreendida. A repulsa ultrapassou barreiras da estima ideológica ou, como se diz, furou as bolhas. Parlamentares de direita, e até bolsonaristas, se engajaram no rechaço à quebra de limites. Donde é lícito supor que exista energia onde parecia vicejar a apatia. Involuntariamente, os artífices da malandragem provocaram um curto-circuito daqueles capazes de despertar a coletividade para a necessidade dar um basta quando se chega à fronteira do inadmissível. Na história recente vivemos alguns momentos de tomada de consciência que impulsionaram a unidade nacional. Resultaram, por exemplo, no fim da ditadura e no êxito do combate à inflação. Houve desperdícios, como ocorreu com os atos de 2013 contra a ineficiência do Estado que afundaram nos equívocos de condução e na indiferença do poder público. Será que não temos causas em comum a defender sem prejuízo da preservação das opiniões divergentes no campo do pensamento político? Uma delas diz respeito à impunidade. De parlamentares, de golpistas e do avanço do crime organizado frente ao Estado desorganizado para enfrentá-lo. Segurança é questão de soberania nacional. Aperta o calo da maioria e tende a apertar ainda mais.
Charge do JCaesar: 26 de setembro Humor Por JCaesar 26 set 2025, 08h55 Leia mais em: https://veja.abril.com.br/coluna/jose-casado/charge-do-jcaesar-26-de-setembro/ ✅ Conclusão Embora esteja protegido pelo direito à livre crítica, fazer uma afirmação taxativa e numérica, sem apresentar provas ou critérios verificáveis, não é uma conduta responsável para quem exerce ou pretende exercer funções públicas de alta relevância. A frase “300 picaretas” teve valor retórico e mobilizador, mas, sob a ótica da responsabilidade institucional, foi imprudente, pois generalizou acusações graves, dificultando a verificação e comprometendo o debate político qualificado. ✅ Conclusão Assim como no caso de qualquer liderança política, afirmar publicamente “fui condenado sem provas” sem apresentar demonstração objetiva é uma atitude de baixa responsabilidade institucional. É legítimo recorrer ou criticar decisões, mas a crítica deve ser feita com base em argumentos jurídicos e provas, não apenas em declarações categóricas. Ao lançar dúvida genérica sobre o sistema de Justiça, Bolsonaro exerce seu direito de expressão, mas o faz de maneira que pode fragilizar a credibilidade das instituições, o que não se alinha a uma conduta responsável para quem tem ou teve alta representação pública.
No travesseiro José CasadoPor José Casado As culpas e os conflitos de Lula no ‘fracasso democrata’ que abriu espaço à extrema direita
Charge do JCaesar: 25 de setembro Humor Por JCaesar 25 set 2025, 08h49 Leia mais em: https://veja.abril.com.br/coluna/jose-casado/charge-do-jcaesar-25-de-setembro/

sábado, 27 de setembro de 2025

GANDULA LARANJA

O chamado “Carrossel Laranja Sueco” pode ser visto como um verdadeiro aggiornamento da tática empregada por Feola, técnico da seleção masculina de futebol do Brasil, na campanha vitoriosa de 1958, na Suécia. Nela, destacava-se a alternância dinâmica entre o lateral-esquerdo Nilton Santos, que avançava com liberdade ao ataque, e o ponta-esquerda Zagallo, que recuava para cobrir o companheiro na defesa, garantindo equilíbrio e surpreendente fluidez ao sistema tático. A palavra "gandula" também pode se referir a alguém que devolve a bola no campo de futebol, e se essa pessoa estiver a usar um equipamento laranja, poderia ser chamada de "Gandula Laranja"
'Cãesdulas' Cães disponíveis para adoção viram gandulas no Rio Open Em ação para chamar atenção sobre adoção de animais, cães treinados exercem função de gandula e roubam a cena na disputa do Rio Open de tênis
Você sabia que o termo “gandula” usado até hoje no futebol nasceu no Vasco da Gama? ⚽ Na década de 1930, o argentino Bernardo Gandulla atuou em São Januário e, quando não estava escalado, ajudava os companheiros devolvendo bolas que saíam do campo. A cena ficou tão marcante que a torcida começou a brincar: “Olha lá, o Gandula!”. O apelido pegou. Em pouco tempo, o nome dele virou sinônimo dos garotos que repõem a bola nos jogos. Da beira do gramado em São Januário para o vocabulário oficial do futebol brasileiro — e depois para o mundo inteiro. 🌍 Essa é mais uma daquelas curiosidades históricas do Vasco que mostram como o Gigante da Colina deixou marca até nos detalhes do esporte. #vasco #vascodagama #futebol
Os muros que nos dividem - Fazer política é construir democracia, ou seja, é saber ultrapassar os muros e ir além da indignação sábado, 27 de setembro de 2025 Os muros que nos dividem. Por Marco Aurélio Nogueira O Estado de S. Paulo Fazer política é construir democracia, ou seja, é saber ultrapassar os muros e ir além da indignação Sociedades estão repletas de muros. Alguns são altos, ameaçadores e difíceis de escalar; outros são tão naturais que quase não os percebemos. Muros separam, desde logo, classes e grupos. Os mais ricos não se misturam com os mais pobres. As classes médias flutuam entre um muro e outro. Migrantes e imigrantes distinguem-se dos locais, permanecendo, em regra, distantes deles, que não os acolhem. Muros segregam. Há inúmeros deles no mundo: Estados, fronteiras, potências, nações, territórios. A desigualdade de renda e de inclusão estampa o muro mais brutal da nossa época. Muros variam conforme os tempos e as gerações. Em sociedades tradicionais, eles são baixos e compactos: deixam as pessoas com pouca liberdade. Os indivíduos demoram para se soltar de famílias, igrejas, hierarquias, costumes. Sociedades modernas têm muros mais fluidos, as pessoas escapam deles com facilidade, nem por isso deixam de senti-los. Muros controlam. Os poderosos fazem uso deles para impedir que pessoas se encontrem, elaborem ideias comuns e ajam de acordo com elas. Muros protegem e disciplinam: dificultam que pessoas do interior se exponham aos “perigos” do exterior desconhecido e aprendam a se comportar de uma dada maneira. Geram obediência. Muros são simbólicos. Separam igrejas e religiões, raças e etnias, opiniões e ideologias. São institucionais e territoriais: fronteiras federativas beneficiam os respectivos entes, distritos fixam direitos e deveres. A burocracia é feita de casinhas trancadas à chave. Os partidos convivem com pequenos muros dentro deles, as direções e as bases, as alas e correntes. Sociedades complexas são diferenciadas. Hoje, foram abalroadas pela hipermodernidade: globalização, mercados insaciáveis, aceleração, revolução tecnológica. Comportamentos, ideias, ritos, linguagem e valores saíram do lugar. Perdeu-se coesão e solidariedade. Há muros por todos os lados, embora a aparência seja de uma pista sem obstáculos. A política decaiu em qualidade, senso de proporção e responsabilidade. Virou uma corporação e, com isso, se divorciou da sociedade. As sociedades carecem de instituições que as organizem. A polarização se aprofundou. Na política, o centro ficou opaco, sem sedução. Populistas polarizadores se encarregam de inviabilizá-lo, porque o temem. O discurso de ódio, raiva, desconfiança e indignação tomou conta do cenário. O conflito é a regra, o consenso é a exceção. Há que haver muito empenho e boa cultura política para que os que pensam diferente se unam em torno de algo comum. Quando a política chega ao extremo de ter dois polos inimigos entre si, a moderação e a conciliação perdem espaço. Pulverizada em redes, a população se intoxica com as narrativas e os vetos recíprocos entre os polos. Fecham-se as frestas para soluções alternativas e projetos de futuro. Tanto faz se a polarização é entre esquerda e extrema direita, democratas e autoritários, conservadores e progressistas. Ela sempre inviabilizará uma união que faça a força. Com a política sendo feita com os mais chegados, os outros sendo tratados como inimigos, não como adversários e eventuais companheiros de viagem. Hoje, os democratas mais velhos não conseguem dialogar com os democratas mais jovens. O muro geracional atravanca os espaços democráticos. Fazer de um novo jeito predomina entre os jovens, como sempre aconteceu na passagem das gerações. Ocorre, porém, que os jovens falam outra língua, esposam outros valores e comportamentos. Voltaramse para dentro de si, colocamse questões “públicas” condizentes com suas expectativas. Não aceitam e não entendem o que falam os mais velhos. Há uma discrepância no plano da linguagem. De um lado, sobra impaciência, de outro falta atualização. As novas gerações, por exemplo, não compreendem a ideia da democracia como valor universal; querem uma democracia imediata, que esteja a seu serviço, que absorva suas pulsões particulares. Os mais velhos, ao contrário, pensam que a democracia tem tempos longos e deve ser universalista: direitos iguais para todos, eleições regulares, imprensa livre, negociações exaustivas, consensos mínimos e pactos sempre que possível. Os democratas estão separados por narrativas distintas, credos diferentes, ideologias e fidelidades cristalizadas. Não entendem a política democrática do mesmo modo. Alguns se empenham para encontrar caminhos que atenuem a polarização, valorizem o equilíbrio fiscal e a boa gestão pública. Outros querem ser revolucionários e se vangloriam dos muros que construíram para si mesmos, atuam em nome de uma “verdade” histórica sustentada por teorias e ideologias envelhecidas, que não conversam com a realidade atual. Mesmo assim, a sociedade se mexe, como ocorreu em 21 de setembro. Movidas pela indignação cívica, as pessoas não aceitam o que se passa no Congresso. As ruas deram um alerta e um recado. Acenderam uma chama de esperança em favor da ideia de que fazer política é construir democracia, ou seja, é saber ultrapassar os muros e ir além da indignação. O Muro de Berlim The Bells Até o céu se rebelou Quando viu minha história de amor Feliz eu era um dia Tinha tudo o que queria De repente fiquei sozinho Sem carinho, sem ninguém O muro de Berlim Entre eu e meu bem Cortaram a alegria do meu coração Como se corta uma fatia de pão Deus tenha pena E traga meu amor pra mim Em Berlim, em Berlim Em Berlim, em Berlim Composição: Erasmo Carlos / Roberto Carlos. The Bells - Tema Clipe 2.254 visualizações 13 de jun. de 2021 Provided to YouTube by The Orchard Enterprises O Muro de Berlim · The Bells · Erasmo Carlos · Roberto Carlos The Bells ℗ 1966 Young [dist. Tratore] Renato e seus Blue Caps tocavam na piscina The Clevers no terraço, Jet Black's no salão Os Bells de cabeleira não podiam tocar Enquanto a Rosemary não parasse de dançar Festa de Arromba Erasmo Carlos Vejam só que festa de arromba Noutro dia eu fui parar Presentes no local, o rádio e a televisão Cinema, mil jornais, muita gente, confusão Quase não consigo na entrada chegar Pois a multidão estava de amargar Hey, hey (hey, hey), que onda Que festa de arromba Logo que eu cheguei, notei Ronnie Cord com um copo na mão Enquanto Prini Lorez bancava o anfitrião Apresentando a todo mundo Meire Pavão Wanderléa ria e Cleide desistia De agarrar um doce que do prato não saía Hey, hey (hey, hey), que onda Que festa de arromba Renato e seus Blue Caps tocavam na piscina The Clevers no terraço, Jet Black's no salão Os Bells de cabeleira não podiam tocar Enquanto a Rosemary não parasse de dançar Mas vejam quem chegou de repente Roberto Carlos com seu novo carrão Enquanto Tony e Demétrius fumavam no jardim Sérgio e Zé Ricardo esbarravam em mim Lá fora um corre-corre dos brotos do lugar Era o Ed Wilson que acabava de chegar Hey, hey (hey, hey), que onda Que festa de arromba Hey, hey (hey, hey) Renato e seus Blue Caps tocavam na piscina The Clevers no terraço, Jet Black's no salão Os Bells de cabeleira não podiam tocar Enquanto a Rosemary não parasse de dançar Mas vejam quem chegou de repente Roberto Carlos com seu novo carrão Enquanto Tony e Demétrius fumavam no jardim Sérgio e Zé Ricardo esbarravam em mim Lá fora um corre-corre dos brotos do lugar Era o Ed Wilson que acabava de chegar Hey, hey (hey, hey), que onda Que festa de arromba De madrugada quando eu já ia embora Ainda estava chegando gente The Jordans, Golden Boys, Trio Esperança Rossini Pinto, ha! Caramba! Até o Simonal, o Jorge Ben e o meu amigo Jair Rodrigues! Composição: Erasmo Carlos / Roberto Carlos.
Vicente Feola em 1958 Vicente Ítalo Feola (São Paulo, 1 de novembro de 1909 — São Paulo, 6 de novembro de 1975)[carece de fontes] foi um futebolista e treinador brasileiro.[1][2] Feola é o recordista em partidas no comando do São Paulo, com 532 jogos à frente do clube[3], e o primeiro brasileiro a levar o Brasil ao título da Copa do Mundo, em 1958[4].[5] A anedota sobre Feola adormecer durante o jogo e a exclamação "Segura, segura, que já está bom demais!" é fato, mas a causa do cochilo é uma mistura de lenda e fato. Embora seja verdade que Feola cochilava e que sua saúde era debilitada pela obesidade e medicamentos, a cena descrita ocorreu no banco de reserva, e não em um jogo do Brasil. Djalma Santos, por exemplo, atesta o fato da lenda, que foi divulgada como história.
Feola: ítalo-brasileiro dirigiu Seleção na Copa de 58 Vicente Feola, primeiro técnico campeão mundial era filho de imigrantes italianos Publicado7 de agosto de 2022 Feola, técnico da seleção brasileira em 1958, idealizou a alternância entre Nilton Santos e Zagallo, antecipando o que viria a ser chamado de “Carrossel Laranja Sueco”.
Com morte de Zagallo, todos os titulares do título mundial de 1958 já morreram Pelé e o "Velho Lobo" foram os últimos presentes na decisão a morrerem Itatiaia Esporte 06/01/24 às 08:57 | Atualizado 06/01/24 às 08:58 Com a morte de Zagallo na noite desta sexta-feira (5), no Rio de Janeiro, aos 92 anos, os 11 titulares da Seleção Brasileira que foi campeã do mundo em 1958, na Suécia, estão mortos.
Com a morte de Zagallo, apenas um jogador que participou da final da Copa de 1958 está vivo Primeiro brasileiro a morrer foi Garrincha, em 20 de janeiro de 1983 Alexandre Simões, da Itatiaia 08/01/24 às 05:21 | Atualizado 08/01/24 às 05:24 Atacante sueco Kurt Hamrin (direita) durante jogo contra a União Soviética na Copa do Mundo de 1958 Atacante sueco Kurt Hamrin (direita) durante jogo contra a União Soviética na Copa do Mundo de 1958 • SCANPIX SWEDEN / AFP ouvir notícia Com a morte de Zagallo na noite da última sexta-feira (5), no Rio de Janeiro, último titular da Seleção Brasileira na decisão da Copa de 1958 a morrer, apenas um jogador que participou da partida em que o Brasil conquistou o primeiro título mundial ainda está vivo. É o atacante sueco Kurt Hamrin, de 89 anos.
Último sobrevivente da final da Copa de 1958 morre aos 89 anos O sueco Kurt Hamrin é até hoje o maior artilheiro da história da Fiorentina Trevor Stynes, da Reuters 05/02/24 às 09:24 | Atualizado 05/02/24 às 09:24 Kurt Hamrin é o maior artilheiro da história da Fiorentina Kurt Hamrin é o maior artilheiro da história da Fiorentina • Divulgação/Fiorentina ouvir notícia O atacante Kurt Hamrin, vice-campeão com a Suécia na Copa do Mundo de 1958 e maior artilheiro da história da Fiorentina, morreu aos 89 anos, informou a Federação Sueca de Futebol neste domingo (4). Sim, a ação defensiva e ofensiva conjunta do lateral Nilton Santos e do ponta Zagallo, que permitia a Nilton subir para o ataque e Zagallo cobrir a sua posição, pode ser vista como uma precursora tática do "Carrossel Laranja", a formação do futebol holandês que se destacou pela movimentação e troca de posições dos jogadores. Ambas as formações demonstram a utilização de movimentação e versatilidade dos jogadores para desorganizar o adversário e criar espaços. Semelhanças: Movimentação e Troca de Posições: A ideia central em ambas as táticas é a movimentação constante dos jogadores e a troca de posições para criar surpresa e ocupar espaços, seja no ataque ou na defesa. Versatilidade dos Jogadores: A capacidade dos jogadores de ocupar diferentes funções em campo é crucial para o sucesso dessas estratégias. Desorganização do Adversário: A mobilidade e as mudanças de posições dificultam a marcação do adversário, que tem dificuldade em encontrar os seus marcadores e organizar a defesa. Diferenças: Contexto: A tática de 1958 era mais pontual e focava a atuação de dois jogadores específicos, Nilton Santos e Zagallo, para um determinado setor do campo. Escala da Movimentação: O "Carrossel Laranja" se caracteriza por uma movimentação mais generalizada e coordenada por todo o time, com praticamente todos os jogadores trocando de posição com frequência, não se limitando apenas a um setor. Objetivo: Embora ambas usassem a movimentação, a tática brasileira era um recurso específico para criar sobrecarga no ataque e garantir o equilíbrio defensivo, enquanto o "Carrossel Laranja" visava uma fluidez e imprevisibilidade constante da equipe. Em resumo, a utilização inteligente dos espaços e a movimentação dos jogadores por parte da Seleção Brasileira em 1958, com destaque para Nilton Santos e Zagallo, foram um importante passo para a evolução tática, influenciando conceitos que seriam aprimorados e desenvolvidos posteriormente pelo "Carrossel Laranja". Com morte de Zagallo, todos os titulares do título mundial de 1958 ... Jan 6, 2024 — Gylmar; Djalma Santos, Bellini, Orlando e Nilton Santos; Zito e Didi; Garrincha, Vavá, Pelé e Zagallo. O primeiro esquadrão a fazer do Brasil um campeão mundial... favicon CNN Brasil Aprofunde seus conhecimentos com o Modo IA
sábado, 27 de setembro de 2025 O que a mídia pensa | Editorial / Opiniões Congresso não pode se eximir do combate ao crime organizado Por O Globo A cada dia fica mais urgente agenda legislativa que dê musculatura ao Estado na luta contra facções criminosas A cada dia fica mais claro que o papel do Congresso é fundamental no combate ao crime organizado. Deputados e senadores devem imprimir agilidade à tramitação da agenda de segurança pública necessária para aumentar a força institucional do Estado nesse enfrentamento. À medida que o poder público começa a obter êxitos pontuais, fica mais urgente que a legislação seja atualizada para dar respaldo legal ao avanço de operações integradas por organismos federais, estaduais e municipais. É impossível enfrentar as organizações criminosas com eficácia sem planejamento baseado em informações fidedignas, obtidas em investigações que usam inteligência e tecnologia. O poder público precisa estar preparado para reprimir grupos especializados em lavar dinheiro usando empresas que participam da economia formal. O nível assustador de infiltração do crime na sociedade ficou claro nas mais recentes operações da Polícia Federal (PF), do Ministério Público de São Paulo e da Receita Federal contra o Primeiro Comando da Capital (PCC), maior facção criminosa do país. No final do mês passado, a força-tarefa desbaratou um esquema gigantesco de lavagem que operava no mercado de combustíveis. As investigações revelaram que o PCC está presente em todo o ciclo do etanol: da produção em usinas de açúcar e álcool à venda de combustível adulterado em centenas de postos de abastecimento. Além disso, tinha ramificações no centro financeiro do país, a paulistana Avenida Faria Lima. Nesta semana, um desdobramento da operação desmascarou esquema de lavagem semelhante, desta vez com uso de empreendimentos imobiliários, motéis e até franquias de uma rede de perfumaria e cosméticos. Foram cumpridos 25 mandados de busca e apreensão em Santo André, Barueri e Osasco, na Grande São Paulo; Bertioga, no litoral; além de Campos do Jordão, na Serra da Mantiqueira. Ao todo, as operações bloquearam R$ 7,6 bilhões em bens de 55 investigados. A principal fonte de receitas de facções criminosas como PCC e Comando Vermelho (CV) já não é mais o tráfico de drogas. Ambas comandam um emaranhado de negócios escusos, imbricados na economia formal, gerando enorme volume de recursos de fachada legal. Empresários de boa-fé precisam aperfeiçoar seus controles internos para não ajudar as lavanderias de dinheiro sujo camufladas de negócios lícitos. Empresas donas de franquias, em especial, devem redobrar a atenção na escolha dos franqueados para não manchar a imagem de suas marcas. Nada substitui, porém, o dever do Estado nesse enfrentamento. Por isso o papel do Congresso é tão importante. Não há razão para adiar ainda mais a tramitação no Legislativo da PEC da Segurança, que promove a integração de União e estados no combate ao crime, assim como do Projeto de Lei contra devedores contumazes — a criação de dívidas impagáveis é hoje um dos principais artifícios nas operações ilícitas de lavagem. Por fim, é preciso acelerar o envio ao Congresso da legislação antimáfia que permitirá coesão e maior eficácia no enfrentamento às facções criminosas. O crime organizado já foi longe demais. Há algum tempo deixou de ser apenas caso de polícia. Os Poderes da República estão sob ameaças de toda ordem, quando já não foram infiltrados. O Congresso não pode se eximir de sua responsabilidade.
‘Gratificação faroeste’ restabelecida pela Alerj não pode prosperar Por O Globo Bônus a policial que mata suspeitos está associado a piora na violência, além de ser moralmente inaceitável Na última terça-feira, a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) aprovou, por 45 votos a 17, a volta de um bônus para policiais sintomaticamente apelidado “gratificação faroeste”. O texto aprovado estipula que um agente da Polícia Civil receba de 10% a 150% além do salário em caso de “neutralização de criminosos” — eufemismo para matar. Deputados já cogitam estender o mesmo benefício a policiais militares. Trata-se de um incentivo absurdo à letalidade policial, que não pode prosperar sob nenhuma circunstância. Tal incentivo já foi tentado no passado e se revelou um equívoco. O aumento das mortes por policiais tirou a vida de muitos inocentes descritos falsamente como delinquentes. Também encorajou a execução sumária de criminosos, sem direito a processo nem defesa. Para piorar, não funcionou como estratégia de conter o crime. Os estados com forças policiais mais letais são os mais inseguros. A taxa de assassinatos no Brasil, medida por 100 mil habitantes, está em 20,8, de acordo com o Anuário Brasileiro da Segurança Pública. Amapá (45) e Bahia (40,6) apresentam mais que o dobro da média nacional. São, não por coincidência, os dois estados com as maiores taxas de mortes decorrentes de intervenção policial. Ainda que fosse eficaz para conter o crime, a “gratificação faroeste” seria moralmente inaceitável. Num Estado de Direito, o Estado detém o monopólio do uso legítimo da força. Policiais arriscam a vida para preservar a segurança pública e precisam de instrumentos como armas de fogo para garantir a própria vida e a dos cidadãos. Mas seu uso precisa ser defensivo e seguir regras. Na terra sem lei, a polícia se torna também bandida. A máxima popular segundo a qual “bandido bom é bandido morto” viola princípios básicos de civilização. Por fim, a “gratificação faroeste” foi restaurada pela Alerj num momento em que o Rio vem registrando queda nas mortes violentas. Nesse contexto, a letalidade policial no estado caiu de 8,3 por 100 mil habitantes em 2022 para 4,1 dois anos depois. A redução, porém, não tirou o Rio dos primeiros lugares no ranking nacional. São Paulo exibe índices inferiores à metade. Nenhuma polícia do Sudeste ou do Sul chega perto da fluminense em letalidade. Para enfrentar os desafios de segurança pública, Executivo e Legislativo estadual deveriam fortalecer políticas que já provaram ser eficientes, com uso de tecnologia e análises estatísticas para alocar a força policial, maior profissionalização, treinamento e equipamentos como câmeras corporais. Na quarta-feira, o Ministério Público Federal (MPF) notificou o governador Cláudio Castro (PL) afirmando que a “gratificação faroeste” é inconstitucional. No ofício, argumenta que ela não poderia ter sido estabelecida por iniciativa do Legislativo, descumpre decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF das Favelas e viola o direito fundamental à segurança pública. Antes de uma decisão da Justiça que na certa a derrubará, Castro deveria vetá-la.
TCU expõe faz de conta das metas orçamentárias Por Folha de S. Paulo Tribunal alerta que Executivo deve buscar centro do objetivo, não mínimo permitido como faz governo Lula Enquanto a meta é de déficit zero, a gestão petista projeta rombo de R$ 30,2 bilhões neste ano; equilibrar a conta exige controle de despesas O Tribunal de Contas da União acendeu um sinal amarelo —que pode virar vermelho— para o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em decisão unânime de seu plenário, o TCU alertou que o Executivo federal deve mirar o centro da meta orçamentária, de déficit zero neste 2025, não o limite inferior de tolerância da norma fiscal, que permite um saldo negativo de até R$ 31 bilhões, sob pena de violar o artigo constitucional que exige a sustentabilidade da dívida pública. Esse entendimento não tem efeito imediato, mas pode forçar novos congelamentos orçamentários e expõe uma controvérsia jurídica. De um lado, o governo argumenta que o regramento legal obriga a execução de despesas aprovadas pelo Congresso Nacional, mas exigindo contingenciamentos para atingir o piso da banda. Do outro, o TCU rebate com a emenda constitucional 109, de 2021, e a Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, que priorizam a estabilidade da dívida, interpretando a meta como um compromisso central, não uma margem flexível para manobras. Quaisquer que sejam as interpretações, e a administração petista indica que recorrerá ao Supremo Tribunal Federal (STF), é impossível mascarar o problema essencial: a fragilidade fiscal que ameaça a economia do país. Atualmente, de acordo com as projeções orçamentárias, o governo espera rombo de R$ 30,2 bilhões neste ano —e isso sem contabilizar grande parte do pagamento de precatórios. Para equilibrar a conta seriam necessários cortes de despesas, preferencialmente, e mais receita. O problema é grave porque nem o centro da meta garante a estabilidade da dívida pública, como manda a lei. Estimativas do Tesouro Nacional indicam que o passivo chegará a 80,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2025 e 81,3% no próximo ano. Economistas apontam o risco de que a cifra atinja 90% em poucos anos sem ações para conter gastos obrigatórios, tornando o Brasil vulnerável a choques externos e juros elevados. A raiz do mal está na política perdulária da administração petista. O Palácio do Planalto rechaça ou despreza reformas estruturais, como a previdenciária e a administrativa, entre outras providências para cortar excessos, melhorar a focalização de programas sociais e elevar eficiência. A banda em torno da meta existe para absorver eventos imprevistos, não para justificar ineficiência cotidiana ou acomodar gastança populista. Na prática, tenta-se excluir dos limites não apenas imprevistos, como a cheia de 2024 no Rio Grande do Sul e o pacote de ajuda a empresas atingidas pelo tarifaço americano, mas também novos programas. O custo imediato para o país são os juros altos, que elevam o serviço da dívida a R$ 1 trilhão anual. Aceitar esse círculo vicioso é hipotecar o futuro pela conveniência do presente —que é ilusória ante o arrocho que onera famílias e contribuintes.
Expansão da educação a distância é ponta do iceberg Por Folha de S. Paulo EAD supera presencial em número de matriculados; há muito a ser feito para melhorar o ensino superior Em 2014, foram 1,3 milhões de matriculas em EAD, ante 6,5 milhões no presencial. No ano passado, 5,2 milhões e 5 milhões, respectivamente Segundo o Censo do Ensino Superior 2024, divulgado pelo Ministério da Educação na segunda (22), no ano passado o número de matriculados na graduação por educação a distância (EAD) pela primeira vez superou o do modelo presencial, com 5,2 milhões —50,75% do total de 10,2 milhões de universitários. Para uma noção da inversão do cenário, dez anos antes 1,3 milhão de matrículas foram registradas em EAD no país, ante 6,5 milhões no ensino presencial. Também chama a atenção que mais de 95% dos matriculados em cursos a distância estudem em faculdades particulares. A educação a distância é uma ferramenta válida para expandir o acesso a universidades utilizada em diversos países desenvolvidos. Mesmo assim, critérios precisam ser estabelecidos. Mesmo descontando problemas metodológicos do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), ele aponta que graduandos de faculdades particulares e da EAD tendem a tirar notas baixas. O Ranking Universitário da Folha também aponta precariedade em boa parte das instituições privadas. A regulamentação da EAD instituída pelo MEC em maio foi sensata. Entre várias medidas, proibiu-se a modalidade em direito, medicina, odontologia, enfermagem e psicologia e criou-se o modelo semipresencial. A regulação e a própria saturação do mercado tendem a conter o avanço da EAD —a entrada de novos alunos já vem caindo nos últimos anos. Mesmo assim, ainda há muito a ser feito para melhorar o ensino superior e transformar diplomas em bons empregos e ascensão social. A baixa oferta de educação técnica e profissionalizante no ensino médio promove inchaço de matrículas em faculdades e cursos de qualidade duvidosa. Nesse quesito, o Brasil está muito atrás do mundo desenvolvido e de vizinhos como Chile e Colômbia. Já passa da hora, também, de abandonar ranços ideológicos e rever o modelo de financiamento das universidades públicas, que se mostra insustentável, com parcerias e aportes dos beneficiários de renda mais elevada. Por fim, uma economia com crescimento pífio na última década tem dificuldades em absorver mão de obra qualificada. Impressiona que 256 mil pessoas entre 18 e 65 anos que receberam auxílio do Bolsa Família em 2022 concluíram uma faculdade. Sem um esforço integrado dos governos em várias frentes, o número de diplomados continuará aumentando, mas sem que isso gere produção de conhecimento, inovação tecnológica e renda.
Vitória da discrição diplomática Por O Estado de S. Paulo ‘Química’ entre Lula e Trump foi fruto do trabalho profissional de diplomatas e empresários do Brasil e dos EUA que quebraram o monopólio informacional do bolsonarismo em Washington A recente aproximação entre os presidentes Lula da Silva e Donald Trump durante a Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, nada teve de fortuita. Como mostrou o Estadão, a “química” entre os chefes de Estado e de governo do Brasil e dos EUA foi fruto do trabalho discreto e profissional levado a cabo por diplomatas, autoridades políticas e empresários de ambos os países que compreendem o valor da paciência, da técnica e da boa-fé para as relações bicentenárias entre duas nações amigas com múltiplos interesses em comum. O encontro entre Lula e Trump, ainda que breve e informal, foi construído sob absoluto sigilo a fim de evitar sabotagens, em especial aquelas orquestradas pelo blogueiro Paulo Figueiredo e seu títere, o ainda deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), ambos homiziados nos EUA. Nesse sentido, foi decisiva a participação do vice-presidente Geraldo Alckmin e do chanceler Mauro Vieira, pelo lado brasileiro, e dos enviados especiais Jamieson Greer e Richard Grenell, pelo lado norte-americano. A escolha da discrição como método provou-se um sucesso. Ao blindar as negociações contra a ação sub-reptícia daqueles dois traidores interessados no fracasso da aproximação de alto nível, a diplomacia permitiu que as conversas evoluíssem com objetividade e pragmatismo, livres, portanto, da poluição ideológica. Isso traz à luz dois aspectos relevantes. O primeiro é a reafirmação do papel da diplomacia oficial e da interlocução empresarial como instrumentos fundamentais de política externa. No momento mais tenso nas relações bilaterais entre Brasil e EUA, foram os adultos na sala que viabilizaram a abertura de um canal direto entre os dois governos. Empresários fortemente impactados pelas tarifas impostas por Washington às exportações brasileiras desempenharam papel determinante nesse processo. Longe de ser mero lobby, a articulação representa a legítima defesa de interesses econômicos. Companhias brasileiras com forte presença nos EUA sofrem diretamente com as barreiras comerciais erguidas pela Casa Branca. A seus controladores, mas não só, interessa levar a Trump uma visão da realidade brasileira que se contrapõe às mentiras da dupla Figueiredo-Bolsonaro, que até então vinha monopolizando o fluxo de informações. Eis, então, a segunda dimensão desse episódio, de natureza política: a quebra do monopólio informacional que o bolsonarismo exercia sobre o governo Trump. Até recentemente, a imagem do Brasil que chegava à Casa Branca era em grande parte mediada por vozes desonestas interessadas em difundir a versão conspiratória de que o Supremo Tribunal Federal, em conluio com o governo Lula da Silva, perseguia Jair Bolsonaro e seus comparsas golpistas. Esse retrato falacioso criou um ambiente de desconfiança e hostilidade mútuas. A bem da verdade, mesmo antes de Trump assumir o cargo, Lula já havia declarado apoio à sua então adversária na eleição de 2024, Kamala Harris, o que atrapalhou, por óbvio, a construção de uma relação amistosa entre ambos. Mas, com a abertura de um canal diplomático regular, o fato é que o petista mostrou-se disposto a estreitar os laços com sua contraparte e a Casa Branca passou a ter acesso a informações mais fidedignas e plurais sobre a conjuntura brasileira, reduzindo o espaço de influência das víboras bolsonaristas. É cedo, naturalmente, para prever quais resultados concretos advirão do encontro entre Lula e Trump – supondo que, de fato, haverá essa reunião. Contudo, é inegável que a retomada de um diálogo institucional representa uma vitória para ambos os países. O simples fato de os presidentes estarem dispostos a ouvir-se reciprocamente, colocando sobre a mesa as prioridades de cada lado, já constitui um avanço expressivo em comparação ao clima beligerante que vinha prevalecendo até agora. Seja qual for o desfecho, o saldo imediato desse movimento já é positivo: a diplomacia e o empresariado conseguiram romper o isolamento criado pelo discurso sectário e interesseiro do bolsonarismo e recolocaram Brasil e EUA em rota de aproximação e interlocução madura.
Alguém tem vergonha na cara Por O Estado de S. Paulo Um promotor de Justiça aposentado recusou penduricalho de R$ 1,3 milhão e ainda foi ao STF para pedir que os atos que criam o benefício sejam declarados nulos, porque são ilegais e imorais Se Diógenes estivesse por aqui com sua lanterna, em sua busca vã por um homem com vergonha na cara, talvez o tivesse finalmente encontrado. Neste país em que levar vantagem ganhou até uma lei, a de Gérson, eis que alguém resolveu recusar um indecente privilégio a que tinha direito, porque, ora vejam, atenta escandalosamente contra princípios elementares da boa moral. Como não é todo dia que isso acontece, como bem sabe o velho Diógenes, o caso tornou-se digno desta nota. Como noticiou o Estadão, o promotor de Justiça aposentado Jairo de Luca, inconformado com a decisão do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) de engordar seu contracheque em R$ 1,3 milhão em razão de um penduricalho chamado de “compensação por assunção de acervo”, não só recusou o benefício, como ainda ajuizou uma ação popular no Supremo Tribunal Federal (STF) para acabar com essa farra. A tal “compensação por assunção de acervo” significa um dia de folga a cada três dias trabalhados sob a alegação de um suposto excesso de serviço, limitando o período de descanso a dez dias por mês, que pode ser convertido em dinheiro. Pela via administrativa, dá-se um aumento de até um terço do salário, estourando, não raro, o maltratado teto constitucional de R$ 46,3 mil. No caso do MP-SP, o pagamento retroativo foi autorizado em fevereiro deste ano. De Luca soube que receberia essa verba, mas não tinha nem ideia do valor que lhe era devido. Ele então questionou o MP-SP, descobriu que a bolada retroativa era referente ao período de 2015 a 2023 e optou por declinar. Na ação popular sob relatoria do ministro Edson Fachin, o promotor aposentado ataca uma resolução e uma recomendação do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que, editadas pelo então procurador-geral da República, Augusto Aras, abriram brechas para os pagamentos milionários. Ele pede que o STF as declare nulas. Primeiramente porque esses pagamentos se dão ao arrepio da lei – ou seja, trata-se de uma flagrante ilegalidade, haja vista que não foram criados pela via legislativa. Não caberia a um órgão administrativo instituir benefícios. De Luca mostrou que o CNMP afirmou ter se baseado nas Leis 13.093 e 13.095 para criar o penduricalho ao mesmo tempo em que as afrontou. Essas legislações foram aprovadas em 2015, o ano ao qual o MP-SP retrocedeu a benesse, para beneficiar juízes federais e do Trabalho com uma gratificação de natureza remuneratória. Portanto, sujeita ao abate-teto e ao Imposto de Renda. Mas os normativos do CNMP criaram indenizações que furam o teto e não pagam tributos. Para piorar, esse penduricalho pode ser pago até mesmo para o promotor que acumula (ou atrasa) serviço em seu próprio gabinete, e não apenas no caso de ter recebido temporariamente o acervo de um colega ou ter executado uma outra função. Como esses penduricalhos se espalham em efeito cascata em razão de uma tal simetria entre as carreiras do MP e da magistratura, De Luca escreveu, com razão, que “não se consegue vislumbrar embasamento legal” para que promotores, procuradores e juízes recebam a mais para realizarem “tarefas intrínsecas aos próprios e respectivos cargos”. A recente profusão de verbas indenizatórias a essa elite do funcionalismo público causa espanto. Há casos de contracheques que chegam a R$ 700 mil por mês na folha de pagamentos desses órgãos. Especializada em pesquisas sobre o sistema de Justiça, a plataforma Justa mostrou, em estudo recente, que houve um crescimento de 48% em média nos contracheques do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) neste ano em relação a 2023. Com 87% dos magistrados com salários acima do teto, a Corte já consumiu 84% dos R$ 11,9 bilhões previstos para despesas com pessoal em apenas oito meses. Não surpreenderá ninguém se o Judiciário ou o MP-SP passarem o pires pedindo mais dinheiro ao Executivo. Diante desse cenário, oxalá o STF tome uma decisão moralizadora. Se nada mudar, talvez esteja na hora de mudar o orçamento do Judiciário e do MP, a começar por lhes cortar verbas, pois, com tanto pagamento sem merecimento e acima do teto, é evidente que tem sobrado dinheiro. Quem sabe assim todos tomem vergonha na cara.
Um ultrajante prêmio à barbárie Por O Estado de S. Paulo Assembleia do Rio de Janeiro aprova infame gratificação a policiais por morte de suspeitos A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) aprovou, por 47 votos a favor e 15 contra, um projeto de lei que restabelece uma bonificação a policiais civis que “neutralizarem” supostos criminosos em alegados confrontos, isto é, que matarem suspeitos durante ações policiais. A própria denominação com a qual o bônus ficou conhecido quando esteve em vigor, nos anos 1990, “gratificação faroeste”, traduz o sentido de terra sem lei que passa a ser tolerado, e até incentivado, no combate à criminalidade no Estado – o que torna mais abominável a decisão dos deputados fluminenses. Por uma emenda incluída no tal projeto, que se presta à reestruturação da Secretaria de Polícia Civil, cada policial pode receber adicionais que variam de 10% a 150% do salário, a depender da quantidade de suspeitos mortos em supostos confrontos. Trata-se da institucionalização da barbárie, proposta pelos deputados Alan Lopes (PL), Marcelo Dino (União) e Alexandre Knoploch (PL), e aprovada por ampla maioria dos parlamentares. O prêmio, que também vale para apreensão de armamentos, vigorou no Estado por apenas três anos, de 1995 a 1998, e foi extinto justamente pelo acentuado aumento de execuções durante aquele período. Nos chamados “autos de resistência”, como eram registradas as mortes em confronto, tiros na nuca e no ouvido eram frequentes. Não é necessário perícia técnica para atestar que isso não ocorre quando se está num confronto. Pesquisa feita na época por técnicos da própria Alerj e pelo Instituto de Estudos da Religião (Iser) confirmou que a taxa de letalidade nas operações policiais dobrou no período de vigência da gratificação. Mas, ainda que não houvesse a amostra nefasta de uma prática adotada em passado não tão distante, é inconcebível que a solução encontrada pelos deputados para reprimir o crime seja estabelecer recompensa pela cabeça dos supostos bandidos. Além de, na prática, significar uma licença para matar, trata-se da volta ao tempo da condescendência com atrocidades cometidas por esquadrões da morte formados por policiais civis e militares que promoviam execuções sumárias, sequestros, torturas e extorsões nas décadas de 1960 e 1970 no Rio e em São Paulo. Os grupos de milicianos que se espalham pelo Rio de Janeiro, disputando território e poder com o narcotráfico, guardam muita semelhança com esses esquadrões. A proposta original de reestruturação da Polícia Civil foi enviada à Alerj pelo governo do Estado e não previa a bonificação, inserida como emenda durante a avaliação na Comissão de Constituição e Justiça. Em entrevista ao jornal O Globo, Marcelo Dino, um dos autores da emenda, disse que o próximo passo é estender os bônus aos policiais militares, dizendo que os bandidos “precisam ser abatidos”. Caberá ao governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), sancionar ou vetar a medida. Como se trata de um político alinhado ao bolsonarismo, um movimento que louva a barbárie, esperar que ele impeça esse absurdo é provavelmente debalde. De todo modo, é nosso dever rogar que o sr. Castro vete.
Isenção do IR é pauta de interesse social Por Correio Braziliense A Câmara dos Deputados tem diante de si uma oportunidade de reconquistar credibilidade: aprovar a mudança no Imposto de Renda (IR) que isenta trabalhadores que ganham até R$ 5 mil mensais Pressionado pela opinião pública, o Congresso foi obrigado a recuar diante da PEC da Blindagem e a esfriar o PL da Dosimetria. O recado das ruas foi claro: não há mais espaço para manobras legislativas destinadas a blindar políticos e a anistiar golpistas. Agora, a Câmara dos Deputados tem diante de si uma oportunidade de reconquistar credibilidade: aprovar a mudança no Imposto de Renda (IR) que isenta trabalhadores que ganham até R$ 5 mil mensais. É uma medida concreta, de impacto imediato, que dialoga com as necessidades reais da sociedade. Não basta aprovar a lei — é preciso garantir que os brasileiros entendam que não pagarão mais imposto sobre salários de até R$ 5 mil. Cerca de 10 milhões de pessoas serão beneficiadas, para aliviar orçamentos familiares e reforçar o poder de compra da classe média e dos trabalhadores assalariados. Entretanto, o levantamento Pulso Brasil, do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe), mostra que apenas 1% dos entrevistados sabe do que se trata. É a tal história: está-se diante de um assunto que precisa ser comunicado ao público, como aquela galinha que cacareja ao pôr o ovo. O tema é de interesse social, deveria ser amplamente debatido pela sociedade. Porém, a Câmara dos Deputados ocultou da opinião pública para utilizar a proposta como moeda de troca com o governo, com objetivo de evitar que o Palácio do Planalto jogasse pesado contra a proposta de blindagem dos políticos contra investigações do Supremo Tribunal Federal (STF) e de mudança de dosimetria das penas dos condenados por tentativa de golpe de Estado, caso do ex-presidente Jair Bolsonaro, condenado a 27 anos e três meses de prisão. O governo fala em "justiça tributária" — conceito correto, mas abstrato para muitos. Sua mensagem deveria ser mais clara. Só assim, será possível transformar a isenção do Imposto de Renda em bandeira popular, capaz de reverter a paralisia e recolocar a agenda de interesse da sociedade no centro do debate público. Também é preciso ficar atento a duas manobras típicas da armação de "pauta bomba": uma é não aprovar a elevação proporcional do imposto pago por quem ganha acima de R$ 10 mil reais; outra é ampliar a faixa de isenção até esse valor. Seria mais ou menos como dar um pouco com uma das mãos e retirar muito com a outra. Uma decisão como essa seria desastrosa para o deficit público, provocando mais inflação, o que anularia os benefícios da isenção. O arquivamento da PEC da Blindagem foi uma vitória da cidadania e da democracia. Mas é apenas o começo. O Congresso deve provar que sabe legislar em favor do povo. Se falhar novamente, reafirmará sua imagem de reduto corporativo, alheio ao interesse público. Se acertar, pode dar um passo no caminho da reconciliação com a sociedade. O momento exige clareza de propósito e coragem política: aprovar o IR zero para quem ganha até R$ 5 mil é mais que uma promessa — é um imperativo.
Uma tragédia que se repete Por O Povo (CE) Nada alivia a dor de uma mãe e de um pai que perdem um filho, de maneira tão estúpida, em um ambiente que deveria protegê-lo O que se pode dizer quando dois adolescentes são brutalmente assassinados a tiros e outros três são feridos dentro de uma instituição de ensino? Foi o que aconteceu na quinta-feira em uma escola pública, em Sobral (233 km de Fortaleza). Era hora do intervalo, cerca de 600 alunos estavam no pátio. Vizinhos ouviram uma "rajada de tiros", disparados por dois homens, que fugiram em uma moto. Os jovens mortos tinham 16 e 17 anos. Camilo Santana, ministro da Educação, anotou em uma rede social, dizendo ter recebido "com tristeza e indignação" a notícia, e fez uma convocação genérica dizendo ser hora de "unir forças", apelando para um trabalho conjunto para preservar a escola como "espaço sagrado, lugar de paz e de acolhimento". Elmano de Freitas, governador do Ceará, também escreveu, afirmando ter recebido a notícia com "indignação e profundo pesar", classificando o crime como "fato gravíssimo e intolerável". Infelizmente, essas palavras, ou parecidas, são repetidas a cada vez que a barbárie mostra a sua face de horror. E o pior, serão ditas novamente se nada de concreto for feito para se chegar às causas dessa brutalidade, de modo a extingui-la. Não se trata de culpar um ou outro governante, a eles também devem faltar palavras diante do horror, ao mesmo tempo em que erram sobre a forma de como enfrentar o problema. O fato é que a violência espalha-se por todo o país, independentemente do partido ou ideologia do governante de plantão, atingindo a todos, indistintamente. Portanto, politizar o acontecimento ou descontextualizar o ataque é um meio macabro de obter dividendos políticos. De qualquer forma, é inafastável a responsabilidade de cada governador pelo que acontece em seu estado, neste caso, principalmente porque já havia alerta de que um estudante estava ameaçado por facções, ainda que não tenha sido nenhum dos atingidos no atentado. Assiste-se, no Ceará, a uma política de segurança pública que já se revelou equivocada onde quer que tenha sido aplicada. Apela-se para o aumento do número de policiais, estimula-se o confronto, anuncia-se a captura de "chefes" de facções, comemora-se o número de prisões, porém a situação agrava-se cada vez mais. O fato é que encontrar um meio para "unir forças" e fazer o trabalho conjunto, como propõe o Camilo Santana, não parece tão simples ou já teria sido feito. Apesar de a violência, de um modo ou de outro, atingir a todos, infelizmente ainda não se chegou a um consenso mínimo de como combatê-la de modo eficaz. Enquanto isso, resta a tentativa de amenizar os efeitos da tragédia: acolher as famílias, prender os responsáveis pelo crime e levá-los a julgamento. Nada disso corrige o mal causado, nem alivia a dor de uma mãe e de pai que perdem um filho, de maneira tão estúpida, em um ambiente que deveria protegê-lo.