Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
sexta-feira, 21 de julho de 2023
desintrusão?
1: O que é desintrusão? É a retirada de intrusos. Ou seja: a retirada de pessoas que estão ocupando uma área de forma ilegal. No caso de terras indígenas, é uma medida que promove a retirada de ocupantes não indígenas dessas áreas.2 de mai. de 2023Procuradoria da República no Pará - MPF
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Em cumprimento de sentença favorável ao MPF, governo inicia retirada de não indígenas de terra indígena no Pará
Presença de não indígenas viola direitos e integridade dos povos originários e ameaça meio ambiente na TI Alto Rio Guamá
https://www.mpf.mp.br/pa/sala-de-imprensa/noticias-pa/desintrusao-terra-indigena-alto-rio-guama#:~:text=1%3A%20O%20que%20%C3%A9%20desintrus%C3%A3o,ocupantes%20n%C3%A3o%20ind%C3%ADgenas%20dessas%20%C3%A1reas.
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O sociólogo José de Souza Martins discute a questão do "marco temporal" no Brasil, que envolve os direitos dos povos indígenas às suas terras ancestrais. Ele enfatiza as injustiças históricas enfrentadas pelas populações indígenas, quilombolas e sem-terra, e como sua luta por reconhecimento e direitos sobre a terra é central para a agenda política do país. Ele critica a ideia de que a concepção de "terra-mercadoria" deve prevalecer sobre os direitos imemoriais dos indígenas em relação ao seu território. Ele acredita que a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre essa questão terá amplas implicações para questões agrárias e o reconhecimento dos direitos das populações marginalizadas. O resultado determinará se a cidadania é um privilégio para alguns ou um direito para todos.
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O sociólogo José de Souza Martins discusses the issue of the "marco temporal" in Brazil, which involves the rights of indigenous people to their ancestral lands. He emphasizes the historical injustices faced by indigenous, quilombola, and landless populations, and how their struggle for recognition and land rights is central to the country's political agenda. He criticizes the idea that the concept of "terra-mercadoria" (commodity land) should supersede the indigenous people's immemorial rights to their territory. He believes that the Supreme Federal Court's decision on this matter will have far-reaching implications for agrarian issues and the recognition of the rights of marginalized populations. The outcome will determine whether citizenship is a privilege for some or a right for all.
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José de Souza Martins* - Marco temporal, o Brasil do impasse
Eu & / Valor Econômico
O julgamento do caso acabará se tornando um julgamento de brancos: os valores subjacentes às leis são majoritariamente os de um direito que reflete os interesses das categorias sociais politicamente dominantes
É esclarecedora a entrevista que a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, deu a João Valadares, do Valor. Ficam claros os impasses e indecisões, relativos à questão do chamado marco temporal para invalidação do direito dos indígenas ao seu território de ocupação imemorial.
Este é o país dos crimes conexos. Não só em relação aos territórios indígenas, mas também em relação aos problemas sociais relativos a pendências históricas quanto aos direitos das populações originárias. Ainda temos escravidão e trabalho escravo. O Brasil ainda é, portanto, o país do atraso. É no marco desse atraso que foi criado o problema do marco temporal.
A entrevista é expressão de consciência social, da unidade na diferença dos povos indígenas brasileiros. E das dificuldades políticas e partidárias a que se faça valer o seu direito de posse imemorial das terras que são parte da sua cultura territorial. Eles têm sido saqueados impunemente com base no falso pressuposto de que “índio não tem querer”, como me disse um notório grileiro de terra indígena no Mato Grosso.
No entanto, esse saque antissocial e anticapitalista encontrará pela frente as populações que foram lesadas em algum momento da história do país pelos autores dessa modalidade violenta, na acumulação primitiva de capital, de saque do patrimônio dos frágeis.
Indígenas, quilombolas e sem-terra, excluídos e lesados desenvolveram uma significativa consciência de identidade e de vítimas da privação injusta que lhes compromete a sobrevivência social e a devida participação na definição dos destinos do país. A questão fundiária, no seu amplo sentido, vem se tornando cada vez mais uma questão política e cada vez mais uma questão de confronto de direitos que compromete a possibilidade da democracia e a de um pacto viável pelo desenvolvimento econômico com desenvolvimento social.
Os historicamente beneficiários da concentração da propriedade e da distribuição desigual de poder e renda dificilmente conseguirão manter seus privilégios. Cada vez mais considerados pelas vítimas e por aqueles que se identificam com sua causa como usufrutuários da iniquidade.
O julgamento do caso acabará se tornando um julgamento de brancos: os valores subjacentes às leis são majoritariamente os de um direito que reflete os interesses das categorias sociais politicamente dominantes. A menos que os juízes encontrem nele brechas que permitam julgar com base na realidade socialmente pluralista do Brasil.
Se isso não ocorrer, se confirmará que os indígenas brasileiros não são juridicamente iguais, mas desiguais e socialmente inferiores. A propriedade capitalista da terra será socialmente superior à condição humana dos que dela carecem para sobreviver com dignidade.
Pode-se ver indícios de que a concepção de marco temporal poderá se tornar legal sem ser legítima. Quem legitima o direito do indígena é o indígena, ainda que dependa do reconhecimento de legitimidade de outras categorias sociais.
Numa sociedade cuja luta social pelo direito à diferença e, portanto, à legitimidade e legalidade da diferença, está ela no centro da tensa agenda política do país. Reduzir à concepção branca de terra-mercadoria o direito imemorial do índio ao seu território é uma violência a mais na deplorável história de violências contra as populações originárias.
Penso que a decisão do STF incidirá sobre o conjunto da questão agrária, envolvendo suas vítimas não indígenas, na medida em que pesa sobre o direito de propriedade da terra um conjunto acumulado de indefinições decorrentes de violações históricas de direitos das populações subalternas. Exatamente em relação à interpretação formal do direito à terra por parte dos que tinham poder e dominação sobre seus agregados e servos.
Quando alternativas de direito, na questão da terra, foram escamoteadas com a fragilização das vítimas de sujeição em formas degradadas de trabalho. O poder da força na sujeição dos subalternos como fator de lesão de direitos contidos nas leis é uma questão também pendente, subjacente a uma concepção de direito baseada na suposta legitimidade da privação de direito dos socialmente frágeis.
O tema do marco temporal contém a possibilidade de legalizar uma fraude contra tradições e costumes do indígena, a “lei do índio”, com base na “lei do branco”, a de apenas uma parcela da população, a dos que concebem a terra como mera mercadoria.
Agora, porém, as vítimas se tornaram novos sujeitos de vontade política e de direito. O STF se defronta, portanto, com um momento social e politicamente decisivo da história do Brasil. Terá que decidir o que deve ser cidadania: privilégio de alguns ou direito de todos.
*José de Souza Martins é sociólogo. Professor Emérito da Faculdade de Filosofia da USP. Professor da Cátedra Simón Bolivar, da Universidade de Cambridge, e fellow de Trinity Hall (1993-94). Pesquisador Emérito do CNPq. Membro da Academia Paulista de Letras. Entre outros livros, é autor de "As duas mortes de Francisca Júlia - A Semana de Arte Moderna antes da semana" (Editora Unesp, 2022).
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