Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
quinta-feira, 28 de setembro de 2023
ÚNICO
"(...) Rosa Weber não vulgarizou seu papel público. Deixasse esse único legado, bastaria, mas deixou mais.(...)"
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Opinião do dia – Rosa Weber*
“O Supremo Tribunal Federal permanece firme, vigilante e resiliente na defesa dos valores democráticos e pela concretização das promessas civilizatórias da Constituição. A resistência, a resiliência e a solidariedade ficaram estampadas na metáfora da travessia da Praça dos Três Poderes, todos nós de mãos dadas, desviando das pedras, dos vidros, dos cartuchos de bala. Inabalada restou a nossa democracia.”
*Ministra do STF, em discurso de despedida, 27/9/23.
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TuTuTu Tupi | ZiS
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Mercúrio ou Azougue
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Antônimos de Azougue
Azougue é o contrário de: devagar, tolo, lento, lerdo
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Conrado Hübner Mendes* - O modelo Rosa Weber
Folha de S. Paulo
Deixasse esse único legado, bastaria para ser a maior do STF pós-1988
O STF escalou, na última década, todo um Himalaia de abusividade ética e descompostura. E encontrou em Rosa Weber o seu maior contraponto de integridade. E em Edson Fachin o seu parceiro. Só restou isso para entender que nada daquilo é natural. Que o normal do STF não é aceitável em corte de Justiça nenhuma do mundo. Que interpelar e conter o alpinismo transviado de juízes é uma urgente causa democrática.
O descalabro ético afeta a capacidade de o tribunal cumprir seu papel de defesa da Constituição. Interessa a forças não republicanas e retrógradas do país. Deve ser denunciado pelo jornalismo responsável, pela crítica acadêmica e pela sociedade civil. Pois não o será pela profissão jurídica servil nem pela advocacia lobista, que brinda a magistocracia nos jardins do Lago Sul, nos teatros de Lisboa, nos terraços da Sardenha.
Uma corte que revogou a noção de conflito de interesses; em que ministro-empresário pede patrocínio a agentes econômicos, emprega magistocratas, constrói rede de influência política; em que filhos e esposas de ministros oferecem porta de acesso à corte por meio de honorários-pedágio, a taxa do parente, sem a qual se tornou difícil advogar em Brasília; em que ministros fazem negociações de constitucionalidade em público e frequentam coquetéis do poder privado.
Rosa Weber denunciou o descalabro não pela palavra, mas pelo exemplo.
Há compromissos que ministros do STF poderiam assumir para uma revolução na corte. Em 2019, imaginei um pacto por autorrespeito e rituais de imparcialidade; por discrição e compostura fora dos autos; por práticas republicanas contra o patrimonialismo judicial; por democratização do Judiciário e combate a privilégios.
Rosa Weber é o maior símbolo de compromisso com esse pacto no STF pós-1988. Estabeleceu um parâmetro ético e definiu onde deve ser colocado o sarrafo. Enquanto outros ministros aceitam convite de qualquer botequim para palestrar em Nova York, como se a audiência pagante estivesse lá para escutar as ideias da palestra, Rosa não negocia.
Sua discrição não é só traço de personalidade, mas opção pelo comportamento judicial apropriado ("judicial propriety"). Um pesadelo para repórteres que se acostumaram ao acesso fácil a ministros boquirrotos sabendo do desvio ético por trás da fofoca em off, Rosa Weber não vulgarizou seu papel público. Deixasse esse único legado, bastaria, mas deixou mais.
Suas contribuições jurisprudenciais e institucionais merecem respeito. Em seu curto mandato na presidência do STF e do CNJ, que mal completou um ano, foi autora de mudanças transformadoras.
Rosa Weber propôs e aprovou no plenário do STF resolução que limitou o uso estratégico do pedido de vista para obstrução individual. No CNJ, propôs e foi derrotada em resolução que tentava limitar as festas da Justiça, as palestras remuneradas (direta ou indiretamente) sem transparência e a promiscuidade de sempre.
Mas conseguiu, na última semana de seu mandato, aprovar resolução que cria paridade de gênero para promoção de juízes a tribunais (pesadelo do quase-desembargador paulista). Uma mudança revolucionária em tribunais que, em média, nunca tiveram mais que 20% de desembargadoras.
Na sua condução da pauta do STF, tirou das gavetas casos urgentes do PIBB (Produto Interno da Brutalidade Brasileira), como o marco temporal e o porte de drogas. Na jurisprudência do STF, esteve do lado vencedor em todos os casos que o tribunal celebra como progresso em direitos fundamentais. Na jurisprudência constitucional trabalhista, foi a mais arejada voz contra a precarização do trabalho.
Seu ímpeto pela reconstrução do plenário destruído em 8 de janeiro foi seu maior gesto de responsabilidade política. O voto no caso do aborto é seu maior legado intelectual, e passa a integrar o cânone global sobre o tema. Nesse voto, homens poderão aprender o que é a dimensão social da maternidade, justiça reprodutiva e cidadania feminina.
Que Lula cogite trocar essa mulher por membro do centrão magistocrático mostra que ele não entendeu com quem está lidando. Nem a esfinge lava-jatista. Depois de tudo.
*Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC
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John Coltrane & Johnny Hartman - Lush Life
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Das Rosas
Dorival Caymmi
Nada como ser rosa na vida
Rosa mesmo ou mesmo rosa mulher
Todos querem muito bem a rosa
Quero eu ....
Todo mundo também quer
Um amigo meu disse que em samba
Canta-se melhor flor e mulher
E eu que tenho rosas como tema
canto no compasso que quiser
Rosas...rosas ... rosas...
Rosas formosas são rosas de mim
Rosas a me confundir / Rosas a te confundir
Com as rosas, as rosas, as rosas, de abril
Rosas... rosas... rosas...
Rosas mimosas são rosas de ti
Rosas a me confundir / Rosas a te confundir
Com as rosas, as rosas, as rosas de abril
Rosas a me confundir / Rosas a te confundir
São muitas...são tantas / São todas tão rosas
Composição: Dorival Caymmi.
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"Já estou tomada de saudades antecipadas", disse Rosa Weber, em uma parafraseação de seu colega mineiro, o ministro Sepúlveda Pertence.
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STF batiza museu da Corte com nome do ministro Sepúlveda Pertence
Ex-presidente do Supremo e do TSE morreu em julho
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VÍDEO – Luís Roberto Barroso é eleito presidente do STF
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Despedida de Rosa, com aprovação de medida de isonomia na promoção da magistratura pelo CNJ, amplia a crise de quem indicou um advogado privado, eficiente em sua defesa particular. Weber foi indicada ao STF pela Presidente Dilma Rousseff. Rosa Weber segue magistrada e mulher. Esteve como ministra no Supremo. Retorna à planície dos pampas do Sul. Laica, na garantia da democracia.
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À medida que as investigações avançam, fica mais evidente a falta de um norte do governo em relação aos militares
Malu Gaspar
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Malu Gaspar - A encruzilhada militar de Lula
O Globo
Há muito a esclarecer sobre o que se passou nos bastidores do governo e da caserna nos dias anteriores à eleição de 2022 e logo depois da vitória de Lula. Embora não haja dúvida de que o Palácio do Planalto foi cenário para a armação de um golpe, nem da leniência das Forças Armadas com os acampamentos que deram guarida a hordas de golpistas, sabe-se ainda pouco sobre as circunstâncias em que tudo aconteceu e sobre o papel de cada oficial na trama.
Mas a história dos fatos que levaram ao 8 de Janeiro não é a única coisa nebulosa em Brasília. À medida que as investigações da Polícia Federal e da CPI para investigar os atos golpistas avançam, fica mais evidente a falta de um norte do governo em relação aos militares.
A ala determinada a sufocar o bolsonarismo e a enquadrar os militares foi turbinada pela delação de Mauro Cid, que botou fogo no ambiente político e colocou a Polícia Federal no encalço dos comandantes militares de Jair Bolsonaro, com o aval de Alexandre de Moraes.
No Congresso, a base lulista pressiona pela convocação de generais e comandantes para depor na CPI do 8 de janeiro, enquanto deputados do PT propõem mudar a redação do famigerado artigo 142 da Constituição e deixar claro que não, as Forças Armadas não constituem um poder moderador na República, como gostaria o bolsonarismo.
Na Esplanada dos Ministérios, as pastas dos Direitos Humanos e da Casa Civil trabalham para recriar a Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos e planejam uma cerimônia oficial no próximo 25 de outubro, quando se completam 48 anos da morte do jornalista Vladimir Herzog numa prisão da ditadura.
Em frente oposta, o ministro da Defesa, José Múcio, e o comandante do Exército, Tomás Paiva, costuraram um acordo para reduzir ao máximo o número de oficiais estrelados na CPI e, por ora, mesmo depois da delação de Mauro Cid, estão garantindo que nenhum ex-comandante — nem mesmo o da Marinha, acusado de ter dado apoio à tese do golpe — seja obrigado a encarar os holofotes.
Oficialmente, Múcio diz que “não é contra” a recriação da Comissão de Mortos e Desaparecidos, mas nos bastidores se confessa incomodado e torce para que a iniciativa fique para as calendas. Líderes lulistas no Congresso vêm convencendo seus pares a deixar o artigo 142 de lado e a aprovar só o texto que obriga todo militar que disputa eleição a ir para a reserva — com que os comandantes concordam.
Além disso, o governo deu às Forças Armadas assento VIP na fila dos investimentos. Nenhum outro setor isolado receberá tantos recursos do novo Plano de Aceleração Econômica (PAC) quanto a Defesa, para a qual estão previstos R$ 53 bilhões ao longo de quatro anos.
Na última terça-feira, ao mesmo tempo que a CPI ouvia o general Augusto Heleno em Brasília, no Rio, o BNDES de Aloizio Mercadante fazia um seminário para discutir como aplicar essa montanha de dinheiro e desenvolver a indústria de Defesa, tratada como grande promessa para o desenvolvimento nacional.
Aparentemente, Lula usa para a questão militar seu clássico método de colocar todos os atores para disputar espaço na arena e só depois definir o rumo das coisas.
Ele não fará nada para frear a investigação da PF que pode, no limite, levar à prisão de Jair Bolsonaro, nem se desgastará para conter os petistas neste momento de catarse contra os golpistas — desde, é claro, que Múcio sempre esteja lá para “pacificar” tudo. Também não se esfalfará para fardados pela ideologia — mas coloca a máquina pública para atraí-los com dinheiro e equipamentos.
No fundo, o plano é parecido com o que ele já executou em seus primeiros mandatos, conquistando os militares com rapapés e muito investimento. Naquela época, funcionou, mas os tempos são outros. Desde então já houve uma Dilma Rousseff e um Bolsonaro, e o cenário político mudou completamente.
Muitos militares não se esquecem de iniciativas como a Comissão da Verdade, até hoje vista como instrumento de revanchismo e perseguição, e encaram os movimentos dos petistas como um revival daquela “caça às bruxas”. Múcio, em seu esforço de pacificação, tem procurado afagá-los, chamando as Forças Armadas de parceiras e dizendo que “são parte do governo” — e não tropas a serviço de um comando civil.
Por ora, tudo o que o modus operandi de Lula produziu foi um frágil equilíbrio baseado em opções conhecidas, mas não necessariamente adequadas aos novos tempos. Em algum momento, o presidente terá de sair da encruzilhada e escolher um caminho. Só então se saberá se o trajeto foi bem pavimentado — ou se ficou cheio de minas terrestres que a confusão do momento não permitiu desarmar.
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Luiz Carlos Azedo - Apesar da tragédia ianomâmi, senadores querem a volta do genocídio
Correio Braziliense
A ancestralidade indígena, mesmo a assimilada pela urbanização, é um fio da vida, da sabedoria, da identidade, do pertencimento e da criatividade do nosso povo
O Senado aprovou, nesta quarta-feira, um projeto de lei que confronta o Supremo Tribunal Federal (STF) e estabelece um marco temporal para limitar a demarcação de terras indígenas à data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. É uma volta à trilha do genocídio dos ianomâmis e outras nações indígenas que vivem em áreas isoladas da Amazônia, rumo em que estávamos durante o governo Bolsonaro, além da violência contra aldeias indígenas remanescentes ainda não demarcadas em todas as regiões do país.
É bom lembrar o que acontecia até a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: estima-se que 570 crianças foram mortas pela contaminação por mercúrio, desnutrição e fome, provocada pela invasão das terras ianomâmis pelos garimpeiros. Além disso, em 2022, foram confirmados 11.530 casos de malária entre esses indígenas.
Não é preciso esforço para rever as fotos da tragédia: nelas, crianças, jovens, adultos e idosos ianomâmi parecem sair de um campo de concentração nazista. Mostram a realidade nua e crua de uma aldeia ianomâmi em Roraima, após a chegada dos garimpeiros à região. Comparar essas fotos com os registros do fotógrafo Sebastião Salgado, que realizou uma expedição à Terra Ianomâmi em 2014, mostra a dimensão da violência.
Salgado acompanhou a tradicional festa fúnebre Reahu, realizada na aldeia Demini, morada do líder Davi Kopenawa, e a subida de um grupo de xamãs ao Pico da Neblina. Suas fotos foram publicadas na edição digital do Washington Post. Em preto e branco, como sempre, são imagens fortes e fascinantes, que levam ao sentimento de um lugar perdido, num tempo diferente do nosso, no qual a natureza humana aparece em estado puro.
Já as fotos feitas no final do ano passado revelam o tempo presente: os ianomâmis aparecem como indigentes no mesmo espaço físico no qual sobreviveram por milênios. O ex-presidente Jair Bolsonaro é o grande responsável pelo que ocorreu, porque sufocou os órgãos responsáveis pela assistência aos indígenas e liberou o garimpo ilegal no país. A maioria dos senadores tem a mesma falta de empatia em relação aos indígenas.
Cosmovisão
A ancestralidade indígena, mesmo a assimilada pela urbanização, é um fio da vida, da sabedoria, da identidade, do pertencimento e da criatividade do nosso povo. Tece o passado, o presente e o futuro de nossa brasilidade, de relações que nos conectam à humanidade. Transcende o espaço e o tempo para recriar futuros possíveis e saudáveis. Pensar em todas as pessoas que vieram antes de nós é entender que há algo muito maior dentro de cada indivíduo.
Quando falamos da Amazônia e de outros biomas, estamos tratando de um tesouro cultural ainda em muito inexplorado, no qual o conhecimento indígena de sabores e propriedades medicinais é apenas uma pequena mostra do potencial alimentar e farmacológico de nossa biodiversidade.
Para os ianomâmi, que querem salvar o mundo, urihi, a terra-floresta, não é um mero espaço de exploração econômica. Trata-se de uma entidade viva, inserida na complexa dinâmica cosmológica de intercâmbios entre humanos e não humanos, que hoje está ameaçada pela ação dos garimpeiros e de outros predadores.
“A terra-floresta só pode morrer se for destruída pelos brancos. Então, os riachos sumirão, a terra ficará friável, as árvores secarão e as pedras das montanhas racharão com o calor. Os espíritos xapiripë, que moram nas serras e ficam brincando na floresta, acabarão fugindo. Seus pais, os xamãs, não poderão mais chamá-los para nos proteger. A terra-floresta se tornará seca e vazia. Os xamãs não poderão mais deter as fumaças-epidemias e os seres maléficos que nos adoecem. Assim, todos morrerão.”
A cosmovisão ianomâmi, assim traduzida pelo líder indígena Davi Kopenawa, protege a floresta e é tão importante hoje para a sobrevivência da humanidade quanto as mitologias grega e romana para a civilização ocidental. A tese do marco temporal aprovada no Senado prevê que os povos indígenas só terão direito à demarcação de terras que já eram tradicionalmente ocupadas por eles no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988. O tema foi analisado pelo Supremo Tribunal Federal na semana passada e rejeitado por 9 a 2.
A matéria aprovada no Congresso poderá ser questionada no Supremo. O senador Marcos Rogério (PL-RO), relator do projeto de lei, é um representante de predadores da floresta. O texto já foi aprovado pela Câmara dos Deputados, com apoio do presidente da Casa, deputado Arthur Lira (PP-AL). De acordo com o projeto, somente seriam consideradas terras indígenas as áreas por eles habitadas em caráter permanente e utilizadas para suas atividades produtiva. Ora, caçadores e coletores, os índios são nômades e dependem do equilíbrio ecológico e de suas terras para sobrevivem por seus próprios meios.
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