quinta-feira, 7 de setembro de 2023

MITOS MUTANTES

"Ressalte-se que o constituinte originário consignou no texto constitucional as cláusulas pétreas, vedando expressamente propositura de Emendas tendentes a abolir os direitos elencados no artigo 60 § 4º da CF." ----------- ------------ Bat Macumba Os Mutantes Composição: Caetano Veloso / Gilberto Gil. (1969) ________________________________________________________________________________________________________ -------------
----------- Constituição do Império do Brasil (1824) - IDEG ---------- As cláusulas pétreas inseridas na Constituição do Brasil de 1988 estão dispostas em seu artigo 60, § 4º. São elas: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e garantias individuais.
------------- "Teve sua melodia oficial composta pelo imperador Dom Pedro I em 1824. Baseado em um poema de Evaristo da Veiga, o Hino da Independência passou a contar em 1824 com uma melodia composta por Dom Pedro I." ----------- --------------- Hino da Independência Oficial - com legenda e glossário Professora Vilma Ribe ---------
----------- Nas entrelinhas: O mito da Independência como ato heroico de D. Pedro I Publicado em 07/09/2023 - 07:16 Luiz Carlos Azedo Bahia, Brasília, Comunicação, Inglaterra, Merkel, Militares, Política, Política, Portugal, Rio de Janeiro A primeira Constituição brasileira foi outorgada por D. Pedro I; era liberal, com sinais trocados: o direito à propriedade privada foi assegurado para legitimar a escravidão ---------- ----------- Meu Grito Agnaldo Timóteo compositores: Roberto Carlos __________________________________________________________________________________ ------------ O "GRITO" No dia 7 de setembro de 1822, o príncipe regente Dom Pedro declarou oficialmente a separação política entre o Brasil, uma colônia, e Portugal. Logo depois, em 12 de outubro de 1822, foi aclamado imperador; em 1º de dezembro, foi coroado com o título de D. Pedro I. Por que uma monarquia, e não uma república, como quase todos os demais países das Américas? Por duas razões: havia um projeto de reunificação da Coroa portuguesa, sob a liderança de D. Pedro; segundo, um pacto entre os portugueses e os brasileiros para manter a escravidão, que os republicanos condenavam doutrinariamente. A Independência foi o desfecho da crise iniciada com a chegada da Corte portuguesa, em 1808, e concluída com a primeira Constituição brasileira, em 1824. O sistema colonial português havia entrado em crise por causa do monopólio comercial e da cobrança de altos impostos, num mundo em que o livre comércio era uma bandeira da Inglaterra e outras potências que haviam protagonizado a Revolução Industrial e as revoluções burguesas. Além disso, diversas revoltas internas colocaram na ordem do dia a separação de Portugal: a Inconfidência Mineira, a Conjuração Baiana e a Revolta Pernambucana de 1817, que sofreram forte influência da Revolução Francesa e da independência dos Estados Unidos. A crise se agravou com a Revolução Liberal do Porto, em 1820. No ano seguinte, o parlamento português obrigou D. João VI a jurar lealdade à Constituição e a voltar para Portugal. Deixou seu filho no Brasil, na condição de príncipe regente, já pensando na hipótese de que conduzisse a separação. Quando as Cortes decidiram que deveria voltar a Portugal, D. Pedro se recusou, em 9 de janeiro de 1822, conhecido como o Dia do Fico: “Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação, diga ao povo que fico”. Pressionado, D. Pedro escalou o confronto: em 3 de junho de 1822, convocou a primeira Assembleia Constituinte brasileira; em 1º de agosto, declarou inimigas as tropas portuguesas que desembarcassem no Brasil. Logo depois, lançou o Manifesto às Nações Amigas, no qual rompeu com as Cortes de Lisboa e declarou o Brasil “reino irmão” de Portugal. A resposta portuguesa foi anular essas decisões. Quando soube da exigência de que voltasse imediatamente para Portugal, Dom Pedro estava em São Paulo, nas proximidades do Rio Ipiranga. Foi ali que proclamou a nossa Independência, num gesto eternizado por Pedro Américo no quadro “Independência ou Morte”. A pintura foi concluída em 1888. No dia 7 de setembro 1822, o pintor sequer havia nascido. Construção simbólica O Grito do Ipiranga deu origem ao mito da Independência como ato heroico de D. Pedro I. Pedro Américo se inspirou nos relatos de contemporâneos do príncipe, nos padrões da arte nacionalista e romântica do final do século XIX. A obra foi feita por encomenda do governo da província de São Paulo para ocupar o salão de honra do Monumento do Ipiranga, prédio que estava em construção (Museu Paulista/USP). Foi pintado longe do Brasil, em Florença, na Itália, onde Pedro Américo residia. Com 7,60m x 4,51m, foi chumbado na parede do museu. Pedro Américo já era um pintor consagrado, por obras como A Batalha de Campo Grande (1871), Fala do Trono (1873) e Batalha do Avaí (1874). Foi injustamente acusado de plágio da tela 1807, Friedland, de Ernest Meissonier, pintada em 1875, que só veio a conhecer anos depois. O pintor estudou o local, a paisagem, suas cores e luminosidade no mês de setembro, a moda e os trajes da época. Seus rascunhos resultaram numa pintura completa, em tamanho menor, que hoje faz parte do acervo do Palácio Itamaraty, em Brasília. Para enaltecer a monarquia e seu primeiro imperador, Pedro Américo inseriu em sua obra militares e nobres montados em cavalos imponentes. Na realidade, a comitiva era bem menor e fez o percurso do litoral ao planalto paulista em mulas e jumentos. D. Pedro I e sua guarda não usavam uniformes de gala. Os Dragões da Independência ainda não existiam. O casebre retratado no quadro, a Casa do Grito, foi construído em 1884. Pedro Américo não poderia estar no quadro. Soldados perfilados, espadas erguidas, uniformes de gala, garbosos cavalos com belos arreios e selas dão imponência ao cenário. O “grito” é uma ordem militar, traduz a personalidade autoritária de Pedro I. Entretanto, houve, sim, uma guerra da Independência. Bahia, Maranhão e Pará, que tinham juntas governantes de maioria portuguesa, só reconheceram a independência em meados do ano seguinte, depois de muitos conflitos entre a população e os soldados portugueses. O povo baiano lutou muito, a Bahia comemora a Independência, ocorrida em 1823, no dia 2 de julho. No início de 1823, foi eleita uma Assembleia Constituinte. Em virtude de divergências com Dom Pedro, foi fechada. A Constituição brasileira foi elaborada pelo Conselho de Estado e outorgada pelo imperador, em 25 de março de 1824. Era uma Constituição liberal, mas com sinais trocados: o direito à propriedade privada foi assegurado para legitimar a escravidão, que somente viria a ser abolida em 1888. Compartilhe: __________________________________________________________________________________ ----------
------------ Pintura com busto de Francisco Gomes da Silva, o ChalaçaCRÉDITO,REPRODUÇÃO GOOGLE ARTS & CULTURE Legenda da foto, Pintura com busto de Francisco Gomes da Silva, o Chalaça ------------- ------------- Paulo Sérgio - Última Canção (1968) Composição: Carlos Roberto __________________________________________________________________________________ ---------------- Quem foi o Chalaça, amigo e companheiro de noitadas de D. Pedro 1º Evanildo da Silveira Desde Vera Cruz (RS) para BBC News Brasil 20 abril 2022 A palavra "chalaça", dizem os dicionários, significa espirituoso, zombeteiro, gracejador. Por isso, foi com ela que seus amigos e conhecidos - e inimigos - na corte de D. João 6º, no Rio de Janeiro, apelidaram o português Francisco Gomes da Silva, um dos 15 mil integrantes da comitiva real que desembarcou no Brasil, em 1808. Irreverente, bem-humorado, gozador, boêmio e esperto, ele se tornou amigo próximo e fiel do então príncipe e depois imperador, D. Pedro, de quem foi companheiro de farras e noitadas e alcoviteiro - arranjava belas mulheres para seu amigo real. Também galgou altos cargos no Império. Francisco Gomes da Silva, o Chalaça, nasceu em Lisboa, 22 de setembro de 1791 e morreu na mesma cidade em 30 de dezembro de 1852. Segundo muitos historiadores, era filho bastardo de Francisco José Rufino de Sousa Lobato, que mais tarde seria barão e depois Visconde de Vila Nova da Rainha, e de sua empregada doméstica Maria da Conceição Alves, uma moça pobre de 19 anos, que o registrou como sendo de "pai incógnito". Quando Lobato foi se casar, sua futura mulher exigiu que ele se livrasse de Maria e seu filho. Ele então mandou a empregada para África e, de acordo com algumas versões, pagou para um protegido seu, Antonio Gomes da Silva, ficar com Francisco e registrá-lo como filho legítimo. O certo é que, por influência do futuro visconde, ele conseguiu um emprego público como ourives oficial corte portuguesa. "Ele foi o responsável pela confecção da coroa de D. João VI no Brasil", conta o escritor Paulo Rezzutti, autor de vários livros sobre o primeiro reinado e biógrafo D. Pedro I e da imperatriz Leopoldina. Mas, apesar disso, o pai biológico não abandou o filho. "A verdade é que ele protegeu o rapaz por muito tempo", diz Rezzutti, que está escrevendo um livro específico sobre a Independência do Brasil. "Foi Lobato quem o colocou para estudar no seminário de Santarém, na província da Estremadura, onde ele aprendeu francês, inglês, italiano e espanhol." O jovem Francisco ficou lá até 1807, quando, depois de brigar com o reitor e com o padre-mestre de disciplina, veio para o Brasil, acompanhando a família real em sua fuga. "No Rio de Janeiro, em 1810, foi feito faxineiro do Palácio de São Cristóvão, sendo expulso de lá, em 1816, por ter se envolvido com uma dama do Paço", conta o escritor e historiador Rafael Cupello Peixoto. O biografado era inimigo de Chalaça na corte do imperador D. Pedro 1º. Contam algumas versões da história, que a expulsão da corte se deu, porque ele e a dama foram flagrados nus, num quarto do Palácio, pelo próprio D. João VI. "Depois disso, Chalaça se estabeleceu com uma barbearia na rua do Piolho (hoje rua da Carioca)", revela Peixoto. "Após o retorno do pai de D. Pedro para Portugal, voltou ao serviço do Paço, sendo peça importante na política da Corte imperial." ----------- Paulo Rezzutti CRÉDITO,ARQUIVO PESSOAL Legenda da foto, Paulo Rezzutti afirma que a relação entre o Chalaça e D. Pedro era bastante próxima De acordo com Rezzutti, as relações pessoais entre ele e D. Pedro eram as mais estreitas possíveis. "Eles se conheceram na juventude, no Rio de Janeiro, onde, de companheiros de aventuras pelas tavernas, acabaram estreitando laços, até que o Chalaça se torna um dos homens mais confiáveis do príncipe e depois imperador do Brasil", diz. Peixoto complementa, acrescentando que ele era um amigo sincero de D. Pedro, sempre pronto para servi-lo em todas as circunstâncias, "inclusive como pombo-correio das conquistas femininas". "Chalaça era um conselheiro pessoal, merecendo do imperador um tratamento cordial e com acesso diário a dele", explica. "Logo, ele não se restringia ao papel mero criado do Paço." Isso fica demonstrado pela atuação política do amigo do imperador. De acordo com Peixoto, Chalaça pertencia a um grupo de portugueses de nascimento, que circundavam o Imperador desde sua juventude e que após a independência foram conquistando cada vez mais espaço na Corte, e assim, participando diretamente de ações políticas do Primeiro Reinado. Conhecidos como "áulicos", esse grupo político, que apoiou o imperador D. Pedro 1º, tinha uma concepção de monarquia, na qual a soberania da nação repousava na cabeça da Coroa. "Isso era visto como forma de resguardar os interesses nacionais, com o poder de veto imperial sobre as decisões da Assembleia Geral e com o propósito de garantir a ordem e a tranquilidade pública", explica Peixoto. Segundo ele, um exemplo de que Chalaça não era apenas um criado na Corte, é que foi ele que, na qualidade de oficial maior da Secretaria de Estado, inseriu na Carta Constitucional do Império do Brasil de 1824 a sua assinatura com a rubrica: "Francisco Gomes da Silva, a fez". Por ter redigido a Carta, foi condecorado por Pedro 1º com a comenda da "Torre e Espada". Há vários exemplos de que a atuação de Chalaça não se limitava a apenas ser amigo e prestar "serviços reservados" a D. Pedro. "Sua missão como secretário pode ser vista até hoje, por exemplo, na redação final da Constituição outorgada em 1824 por D. Pedro ao Brasil", lembra Rezzutti. "Ele estava ao lado do então príncipe regente na viagem da Independência e em vários outros momentos. Sua influência sobre o amigo era bastante comentada na época, chegando a ser considerada nefasta após a morte de João 6º, em Portugal, em 1826, quando passou a advogar os interesses dos portugueses junto ao imperador." O historiador Rafael Cupello Peixoto CRÉDITO,ARQUIVO PESSOAL Legenda da foto, Segundo o historiador Rafael Cupello Peixoto, o Chalaça era uma pessoa influente na corte de D. Pedro Plano traiçoeiro Chalaça ficou no Brasil até 25 de abril de 1830, quando foi nomeado embaixador plenipotenciário do Império para o Reino das Duas Sicílias, cuja capital era Nápoles. Foi uma armação de seus adversários, entre os quais o Marquês de Barbacena, que havia participado ativamente das negociações do segundo casamento do Imperador, na Europa, e acabava de trazer de lá a segunda de D. Pedro, D. Amélia de Leuchtenberg, e queria se ver livre dele. Mas antes disso, Barbacena se aproximou de Chalaça para atingir seus objetivos políticos. Segundo Peixoto, o marquês adotou a estratégia de "conquistar" a confiança dele para assim também ganhar a de D. Pedro. Depois o traiu, no entanto. Quando Barbacena foi feito Ministro da Fazenda, em 1829, contando com a simpatia de D. Amélia, conseguiu convencer o imperador que era necessário afastar Chalaça e Rocha Pinto, componentes do criticado "gabinete secreto", do Brasil e enviá-los em comissões na Europa, em abril de 1830, explica. Naquele momento, o país vivia uma forte tensão política com a oposição ao primeiro imperador o acusando de "absolutista" e responsabilizando sua proximidade com os "áulicos" portugueses, como Chalaça e Pinto, como a principal razão pelas ações autocráticas de D. Pedro e seu pouco diálogo com a Câmara dos Deputados. Barbacena passava a imagem de quase um "primeiro-ministro" e conseguiu nos primeiros tempos à frente da pasta da Fazenda pacificar, em parte, a crise política. Mas a armação do marquês se voltou contra ela próprio. Chalaça não aceitou o cargo em Nápoles e, em vez disso, foi para Londres. "Lá, quando descobriu que a autoria do plano de sua retirada do Brasil havia sido chefiada por Barbacena, dirigiu-lhe ataques e injúrias", conta Peixoto. "O descreve como um sujeito de 'caráter dobre e atraiçoado' associando-o aos 'obscuros discípulos da Escola de Maquiavel, que, tomando mal as lições do grande mestre da dissimulação, caem vítimas de seus próprios enredos, e traições'." Não satisfeito, resolveu se vingar. "Em Londres, Chalaça realizou um levantamento dos gastos que Barbacena fez, tanto para o segundo casamento de D. Pedro quanto com a filha de D. Pedro I, D. Maria II de Portugal, que foi obrigada a se instalar por um tempo na Inglaterra, depois que o tio dela, D. Miguel, usurpou o trono de Portugal para si", acrescenta Rezzutti. Seja consequência ou não dessa devassa, o fato é que Barbacena foi demitido do Ministério naquele mesmo ano de 1830. "O curioso dessa relação dos dois é que até o momento em que a crise explodiu, com a demissão marquês, tanto ele quanto Chalaça trocavam correspondências sobre diferentes assuntos e disfarçavam entre si que ambos conspiravam um contra o outro", diz Peixoto. "O certo é que a queda de Barbacena tem o dedo de Francisco Gomes da Silva." Apesar de sua trajetória curiosa e do papel que desempenhou junto a D. Pedro e na Corte e no governo, há controvérsias sobre a real importância histórica de Chalaça. Para Rezzutti, de forma específica ele não tem nenhuma "Francisco Gomes da Silva participou de vários eventos históricos, como acompanhante do imperador ou como seu secretário, mas ele não foi responsável direto por nenhum deles", defende. "Há algumas influências suas, como na queda do gabinete do marquês de Barbacena. Então, é impossível dizer que o Chalaça não tem importância histórica, mas é aquela que é destinada aos que exercem muitas vezes o poder por detrás do poder." Peixoto pensa de maneira diferente. "Se observarmos Francisco Gomes da Silva para além da visão mais caricata, isto é, como o amigo alcoviteiro, mulherengo, boêmio e divertido de D. Pedro I, que claro ele era, vamos perceber que Chalaça também foi um personagem político", explica. "Ele atuou diretamente nos acontecimentos do Primeiro Reinado, além de ter grande influência sobre o próprio imperador." Tópicos relacionados História Brasil __________________________________________________________________________________ ------------
------------ O que é mutação constitucional? | Politize! ----------- MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL E OS LIMITES DE SUA APLICAÇÃO ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO 2. CONCEITO DE CONSTITUIÇÃO 3. RIGIDEZ CONSTITUCIONAL 4. PODER CONSTITUINTE 4.1 Poder Constituinte Originário ou de 1º grau. 4.2 Poder Constituinte Derivado ou de 2º grau. 5. MÉTODOS DE INTERPRETAÇÃO 6. MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL 7. Conceito 8. Terminologia 8.1 Espécies de Mutação Constitucional 8.2 Limites da Mutação Constitucional 8.3 MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL E O POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA RECLAMAÇÃO 4.335/AC 9. Breve relato do voto do Ministro Gilmar Mendes 10. Breve relato do voto do Ministro Eros Grau 11. Breve relato do voto do Ministro Ricardo Lewandowski 12. Breve relato do voto do Ministro Sepúlveda Pertence 13. Breve relato do voto do Ministro Joaquim Barbosa 14. MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL POR INTERPRETAÇÃO JUDICIAL 15. Mutação constitucional x Princípio de Separação de Poderes 16. SENTENÇAS MANIPULATIVAS ADITIVAS COMO MEIO DE MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL 17. CONCLUSÃO 18. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Monografias. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com. RESUMO O objetivo central deste trabalho é desenvolver uma análise crítica sobre a mutação constitucional especialmente em relação aos seus limites de aplicação, ainda não definidos doutrinariamente. Discutir sobre eventual violação ao princípio da separação de poderes ante a mudança informal da Constituição pelo Poder Judiciário. Analisar como obter o equilíbrio entre o dinamismo da sociedade e a estabilidade da Constituição sem ferir os princípios constitucionais e o próprio Estado Democrático de Direito. Palavras-chave: Mutação constitucional, Limites, Separação de poderes, Equilíbrio. 1. INTRODUÇÃO O objetivo deste trabalho é proporcionar uma reflexão sobre o polêmico fenômeno da mutação constitucional, tema este ainda não consolidado na doutrina e na jurisprudência. Inicialmente serão traçadas noções fundamentais sobre o conceito de Constituição enquanto norma fundamental do Estado com enfoque na supremacia e em seu processo rígido de alteração. Serão mencionadas também as formas de criação, alteração e revisão da Constituição, estabelecendo distinção entre o poder constituinte originário e derivado. Em seguida tem-se os métodos gerais de interpretação da norma e o conceito de mutação constitucional com a citação das diversas terminologias adotadas pela doutrina bem como suas espécies. A mutação constitucional por ser um processo informal de mudança da Constituição precisa ser analisada e aplicada ao caso concreto com muita cautela para não configurar uma legitimidade legislativa ao intérprete, sendo de extrema importância o estabelecimento de limites para a sua aplicação. Entretanto será verificado que não há definição desses limites na doutrina. Para subsidiar a reflexão acerca dos limites da mutação será feito um confronto do instituto com o princípio constitucional da separação dos poderes a fim de averiguar eventual violação. Além disso, serão analisadas a mutação constitucional via interpretação judicial e as sentenças manipulativas aditivas, observando-se os parâmetros para aplicação. Para o desenvolvimento do trabalho foram utilizados como fonte de pesquisa além da doutrina e artigos científicos, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, especialmente a Reclamação 4.335/AC que representa um dos casos mais polêmicos de mutação constitucional com opiniões totalmente divergentes entre os Ministros do STF. 2. CONCEITO DE CONSTITUIÇÃO Para que se possa iniciar uma reflexão sobre o tema mutação constitucional primeiramente se faz necessário conceituar e analisar o que vem a ser a Constituição de um Estado. A palavra Constituição tem origem no latim constitutio, de constituere (constituir, construir, formar, organizar). Em relação à conceituação jurídica, José Afonso da Silva define de forma simples e clara a Constituição do Estado, in verbis: A Constituição do Estado, considerada sua lei fundamental, seria, então, a organização dos seus elementos essenciais: um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos fundamentais do homem e as suas respectivas garantias 1 Paulo Bonavides numa conceituação material da Constituição a define como sendo: Conjunto de normas pertinentes à organização do poder, à distribuição da competência, ao exercício da autoridade, à forma de governo, aos direitos da pessoa humana, tanto individuais como sociais. Tudo quanto for, enfim, conteúdo básico referente à composição e ao funcionamento da ordem política exprime o aspecto material da Constituição.2 A Constituição é a base jurídica em que está alicerçado todo o ordenamento jurídico do Estado. Tal premissa advém da supremacia constitucional que faz com que todo o arcabouço jurídico tenha como norte e limite os ditames da Constituição, estando, portanto subordinado a ela. O plano de validade das normas jurídicas está condicionado aos preceitos constitucionais, sob pena de serem consideradas inconstitucionais caso os contrarie. A promulgação da Constituição representa o nascimento de um novo Estado, pois nela que estão disciplinados todos os seus elementos fundamentais e organizacionais. “A Constituição é Lei Fundamental ao Estado e ao seu povo, ditando ao primeiro os limites de atuação como forma de proteger ou tutelar o segundo”3 Em outras palavras a Constituição é a essência do Estado, de maneira que para conhecê-lo, basta verificar o seu texto constitucional. É a lei fundamental que estabelece a sua estrutura, forma de governo, direitos e garantias individuais, separação dos poderes e distribuição de competências, estruturação do sistema jurídico e político, limites de atuação dos poderes, entre outros. Alexandre de Moraes faz a seguinte definição: Constituição, lato sensu, é o ato de constituir, de estabelecer, de firmar; ou, ainda, o modo pelo qual se constitui uma coisa, um ser vivo, um grupo de pessoas; organização, formação. Juridicamente, porém, Constituição deve ser entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes à estruturação do Estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias e deveres dos cidadãos. Além disso, é a Constituição que individualiza os órgãos competentes para a edição de normas jurídicas, legislativas ou administrativas4 Entretanto existe divergência doutrinária quanto ao sentido da Constituição: teria ela sentido sociológico, jurídico ou político? Ferdinand Lassale defende o sentido sociológico, pois entende que a Constituição seria apenas uma “folha de papel” se não representasse a soma dos fatores reais do poder dentro de uma sociedade. Para Carl Schmitt o sentido político é a melhor concepção, pois, representa uma decisão política fundamental, decisão concreta de conjunto sobre modo e forma de existência da unidade política. Já Hans Kelsen é adepto ao sentido puramente jurídico definindo a Constituição como norma pura, puro dever-ser.5 Todavia, atribuir à Constituição apenas um sentido não seria a conceituação mais adequada, pois na verdade, ela representa a junção dos sentidos político, jurídico e sociológico. Há uma conexão entre eles senão vejamos: a Constituição é norma jurídica que vincula todo o ordenamento jurídico brasileiro (sentido jurídico), entretanto decorre de fatores e valores sociais, ou seja, ela nasce com base na realidade social daquele Estado e visa regular tal sociedade (sentido sociológico). Ademais, a Constituição não deixa de ser uma decisão política, eis que originária do poder constituinte (sentido político). É nela que será estabelecida a estrutura organizacional de uma sociedade não se limitando apenas ao campo jurídico, mas se estendendo também ao político e sociológico. Nesse sentido, José Afonso da Silva também é adepto ao sentido unitário da Constituição e sobre o tema cita Pinto Ferreira, que fala da Constituição Total “mediante a qual se processa a integração dialética dos vários conteúdos da vida coletiva na unidade de uma ordenação fundamental e suprema”.6 3. RIGIDEZ CONSTITUCIONAL A Constituição é classificada pela doutrina de diversos modos. Dentre elas tem-se a rigidez constitucional a qual deriva da própria supremacia constitucional. Uma Constituição é classificada como rígida quando sua modificação exige um processo legislativo mais solene e árduo do que para as outras legislações. Não se trata de imutabilidade, mas sim de alterabilidade dificultosa. A Constituição Federal Brasileira de 1988 é classificada como rígida, pois prevê, por exemplo, quórum de três quintos dos votos dos membros de cada casa do Congresso Nacional, em dois turnos. Além disso, não é qualquer pessoa que poderá propor Emenda, pois a iniciativa é restrita. O artigo 60 da CF elenca taxativamente quem são os legitimados para tal propositura: um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, o Presidente da República e mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. No entanto, Alexandre de Moraes em obra de Pedro Lenza entende que a CF/88 pode ser classificada como super-rígida7 uma vez que parte dela é imutável ao vedar expressamente em seu artigo 60 § 4º proposta de Emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico, a separação dos Poderes e os direitos e garantias individuais. São as chamadas cláusulas pétreas. Todavia Pedro Lenza afirma que essa não é a posição adotada pelo STF, pois a CF não veda a alteração, desde que dentro dos limites da razoabilidade e ponderação, e principalmente, desde que não venha a abolir nenhum dos direitos elencados8. Ressalte-se que a rigidez constitucional está ligada à supremacia constitucional na medida em que visa garantir uma estabilidade jurídica e política ao não permitir que o texto constitucional seja objeto de alteração constante em decorrência de maior facilidade em seu processo de modificação. Paulo Bonavides menciona o conceito formal de Constituição segundo Kelsen: “Fala-se de Constituição em sentido formal quando se faz a distinção entre as leis ordinárias e aquelas outras que exigem certos requisitos especiais para sua criação e reforma”9 Como bem define José Afonso, a Constituição é “o simples modo de ser do Estado”10. Uma conceituação sucinta, mas rica em significado, que expressa de forma simples e objetiva o que vem a ser a Constituição. Sendo a Constituição, portanto, o modo de ser do Estado, deve refletir a realidade social de seu povo. Logo, para que essa adequação do texto constitucional à situação fático social seja concretizada, a Constituição não pode ser estática, pois a sociedade está em constante evolução. Entretanto, como estabelecer os limites de tal adequação, considerando que a Constituição é a “pedra angular, em que assenta o edifício moderno do direito político”11 não podendo, portanto, ser objeto de grandes alterações em virtude da estabilidade jurídica? Para análise desse questionamento, cumpre definir as formas de criação, alteração e revisão da Constituição. 4. PODER CONSTITUINTE Para Alexandre de Moraes, poder constituinte “é a manifestação soberana da suprema vontade política de um povo, social e juridicamente organizado”.12 Pedro Lenza conceitua poder constituinte como sendo: poder de elaborar (e neste caso será originário), ou atualizar uma Constituição, através da supressão, modificação ou acréscimo de normas constitucionais (sendo nesta última situação derivado do originário)13. De acordo com a doutrina moderna, a titularidade do poder constituinte pertence ao povo. Isso pode ser verificado no artigo 1º, parágrafo único da CF/88 o qual dispõe que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Ou seja, o poder constituinte advém do povo, pois é ele que elege os representantes que terão a incumbência de legislarem, seja de forma originária ou derivada, cabendo-lhes, entretanto, o exercício do poder. Esse é o entendimento de Manoel Gonçalves Ferreira Filho, citado por Alexandre de Moraes, o qual afirma que “o povo pode ser reconhecido como o titular do poder constituinte, mas não é jamais quem o exerce. É ele um titular passivo, ao qual se imputa uma vontade constituinte sempre manifestada por uma elite”.14 O poder constituinte se subdivide em 2 espécies: poder constituinte originário ou de 1º grau e poder constituinte derivado ou de 2º grau. 4.1. PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO OU DE 1º GRAU. O poder constituinte originário, como o próprio nome diz, é o que dá origem à nova ordem jurídica do Estado. Na verdade, o seu objetivo é o nascimento de um novo Estado, o qual ditará novos parâmetros jurídicos e organizacionais, rompendo definitivamente com o estabelecido na Constituição anterior. Michel Temer, em obra de Pedro Lenza, ao discorrer sobre o tema dispõe que a cada Constituição surge um novo Estado, independente de ter se originado de movimento revolucionário ou de assembleia popular, e que embora seja geograficamente o mesmo, juridicamente não é.15 Exemplificando a definição acima exposta, é como se a cada Constituição fosse atribuída uma nova identidade àquele Estado, com as suas características peculiares. O poder constituinte é caracterizado como sendo inicial, incondicionado, ilimitado e autônomo. Isso porque não está subordinado a qualquer norma jurídica anterior, não se vinculando, portanto a uma legislação preexistente. A nova Constituição é que dará início a todo o sistema jurídico do Estado, possuindo, portanto total liberdade para estabelecimento das novas regras daquela sociedade. Ademais, a determinação da nova Constituição será exercida de forma autônoma por aqueles que exercem o poder constituinte originário. Convém ressaltar, que para a corrente jusnaturalista, o poder constituinte originário sofre limitação no direito natural, entretanto, conforme ensinamentos de Pedro Lenza16, foi adotada a corrente positivista no Brasil a qual defende que o poder constituinte originário é absoluto, não estando sujeito portanto, a qualquer limitação. 4.2. PODER CONSTITUINTE DERIVADO OU DE 2º GRAU. Ao contrário do poder constituinte originário, o poder constituinte derivado sofre limitação, estando subordinado e condicionado ao estabelecido no texto constitucional pelo próprio poder constituinte originário. Inclusive, em decorrência de tal subordinação, está sujeito ao controle de constitucionalidade, pois deve se coadunar com a Constituição. O poder constituinte derivado tem como objetivo fundamental adequar a Constituição às transformações sociais ocorridas ao longo do tempo, por meio da reforma de seu texto, sem, contudo alterar a sua essência. Classifica-se como poder derivado reformador e poder derivado decorrente. O poder de reforma pode ser exercido por meio de Emendas ou de revisão. A reforma por meio de Emendas encontra limites constitucionais, tanto formais quanto materiais. A limitação formal, como já mencionado anteriormente, decorre da rigidez constitucional, no qual é estabelecido rol restrito de legitimados para sua propositura e quórum especializado para a sua aprovação. Quanto à limitação material, esta é verificada nas chamadas cláusulas pétreas, em que é expressamente vedado Emenda tendente a abolir qualquer dos direitos relacionados no artigo 60 § 4º CF. Em relação ao poder de revisão, este se encontra disposto no artigo 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), o qual possibilitou que a Constituição fosse revista nos cinco anos seguintes a sua promulgação, desde que pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral. Em 1994 foi editada a Emenda Constitucional de Revisão (ECR) nº 6, entretanto, em virtude do decurso do tempo o referido artigo teve sua eficácia exaurida. Já o poder constituinte derivado decorrente tem por objetivo a elaboração da Constituição dos Estados-Membros, em virtude da capacidade de auto-organização atribuída a eles pela Constituição. Conforme Anna Cândida da Cunha Ferraz citada por Pedro Lenza, o poder derivado decorrente: ...intervém para exercer uma tarefa de caráter nitidamente constituinte, qual seja a de estabelecer a organização fundamental de entidades componentes do Estado Federal. Tem o Poder Constituinte Decorrente um caráter de complementaridade em relação à Constituição; destina-se a perfazer a obra do Poder Constituinte Originário nos Estados Federais para estabelecer a Constituição dos seus Estados componentes.17 Segundo Pedro Lenza, o poder constituinte derivado decorrente: é apenas o poder que os Estados-Membros, através das Assembléias Legislativas têm de elaborar as suas Constituições Estaduais, que deverão obedecer aos limites impostos pela Constituição Federal, nos exatos termos do artigo 25, caput, da CF/88.18 5. MÉTODOS DE INTERPRETAÇÃO No que concerne aos métodos de interpretação, J.J. Gomes Canotilho diz: Para se captar o sentido da lei constitucional devem utilizar-se os cânones ou regras tradicionais da hermenêutica. O sentido desvenda-se através da utilização como elementos interpretativos: (i) do elemento filológico (=literal, gramatical, textual); (ii) do elemento lógico (=elemento sistemático); (iii) do elemento histórico; (iiii) do elemento teleológico (=elemento racional); (iiiii) do elemento genético.19 Em virtude da complexidade de se interpretar uma norma e da necessidade de se estabelecer parâmetros para a sua execução, foram criados pela doutrina métodos para auxiliar nessa tarefa, os quais serão objeto de breve análise conceitual. Primeiramente, importante trazer a definição do método gramatical, pois este é o ponto de partida de qualquer interpretação. Também chamado de método literal ou textual, consiste na verificação do significado das palavras, da maneira como foi redigido, ou seja, corresponde a uma compreensão literal. Entretanto, nem sempre, a utilização somente desse método, possibilita uma interpretação adequada da norma em virtude de fatores já explicitados acima quanto à má elaboração da lei, por exemplo. Outro método de interpretação consiste no histórico. Este método possibilita uma análise mais aprofundada da norma, desde a sua origem, ou seja, será averiguado todo o processo de aprovação da norma, desde o início até a promulgação, ou veto, se houver, buscando através dos fatos a sua explicação. Será verificado, por exemplo, a justificativa do projeto, o parecer das comissões, razões de veto, se houver. Já o método teleológico tem como essência buscar a razão da norma. Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho a intenção da lei não se confunde com a vontade do legislador, pois, o motivo da norma pode ser irrelevante, como por exemplo, criar embaraços para o governo. O que se pretende é “descobrir o valor que inspira a norma”.20 Quanto à interpretação autêntica, esta possibilita ao próprio legislador emitir a sua interpretação em relação ao texto elaborado por ele mesmo, quando houver dúvida em relação ao sentido da norma. Por isso denomina-se autêntica, pois, é fidedigna à intenção do legislador ao elaborar a norma. Além dos métodos de interpretação existem princípios e regras que norteiam os intérpretes do texto constitucional. Seguem alguns deles, conforme enumeração de Canotilho na obra de Alexandre de Moraes:21 Princípio da unidade da Constituição: significa que a interpretação deve ocorrer de forma unificada, globalizante de modo a não permitir que haja contradições entre suas normas; Princípio do efeito integrador: nos conflitos jurídicos deve-se dar prioridade à integração política e social, além de reforçar a unidade política; Princípio da máxima efetividade ou da eficiência: deve-se buscar o sentido que atribua maior eficácia à norma constitucional; Princípio da justeza ou da conformidade funcional: o entendimento dos órgãos encarregados da interpretação deve se coadunar com a estrutura organizatória-funcional estabelecida na Constituição, ou seja, não pode modificar, suprimir, a repartição de competências já estabelecida no texto constitucional. Konrad Hesse citado por Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior conceitua esse princípio da seguinte forma: Se a Constituição regula de uma determinada maneira o papel respectivo dos agentes das funções estatais, o órgão de interpretação deve manter-se na marca das funções a ele encaminhadas; dito órgão não deverá modificar a distribuição das funções através do modo e do resultado de dita interpretação.22 Princípio da concordância prática ou da harmonização: significa que deve haver uma harmonização na aplicação de direitos conflitantes, de maneira a não permitir que um venha a ser suprimido em virtude da aplicação do outro. Conforme Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior “deve haver uma cedência recíproca, de parte a parte, para que se encontre um ponto de convivência entre esses direitos”.23 Princípio da força normativa da Constituição: corresponde à prevalência da interpretação que garanta maior eficácia, aplicabilidade e permanência das normas constitucionais. 6. MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL 7. CONCEITO A Constituição não é alterada apenas por processo formal. Visando alcançar um equilíbrio entre o elemento estático da Constituição rígida e o dinamismo da sociedade são admitidas mudanças informais, as quais não possuem limites ou requisitos previstos expressamente na Constituição. Pode-se falar então que a Constituição possui uma “inalteralibilidade relativa”, pois pode ser objeto de alteração sem o preenchimento de formalidades especiais. Os constitucionalistas perceberam, então que em decorrência das mudanças sociais a Constituição sofre mutação. Para Inocêncio Mártires as mutações constitucionais são alterações semânticas dos preceitos da Constituição, em decorrência de modificações no prisma histórico-social ou fático-axiológico em que se concretiza a sua aplicação.24 O fenômeno da mudança informal, ou seja, da inobservância dos critérios de reforma constitucional, foi verificado inicialmente pela doutrina alemã, quando se constatou que a Constituição de 1871 estava sofrendo mudanças em relação ao funcionamento das instituições do Reich.25 Após análise da Constituição alemã de 1871, Laband de fato apurou que o texto constitucional estava sendo objeto de mudanças para adequar à atual situação do império. Laband, então fez uma distinção entre verfassungänderung (reforma constitucional) e a verfassungswandel (mutação constitucional).26 Hsü Dau-Lin, no início da década de 30, observou que a mutação é decorrente de um processo lento de mudança e ocorre sem a intervenção do poder reformador.27 No Brasil, o tema foi introduzido pela Professora Anna Cândida da Cunha Ferraz.28 Diferentemente de uma simples interpretação, a mutação constitucional consiste em algo muito mais complexo: corresponde a um processo informal de mudança da Constituição. É informal porque não exige que tal mudança se processe de forma solene, conforme as formalidades já mencionadas para alteração da Constituição. Para Miguel Reale citado por Gilmar Ferreira Mendes: Leis há (e estamos aqui dando preferência ao estudo das leis ou normas legais, apenas pela facilidade de exposição, sendo, no entanto, as observações válidas para todas as espécies de normas jurídicas) leis há, sem dúvida que durante todo o período de sua vigência, sofrem pequenas alterações semânticas, mantendo quase intocável a sua conotação originária. Isso ocorre quando não se verifica mudança de relevo na tábua dos valores sociais, nem inovações de monta no concernente aos suportes fáticos.29 Em virtude da constante transformação e evolução da sociedade no decorrer do tempo, e consequentemente das alterações dos valores, costumes, da cultura bem como das concepções tanto ideológicas, filosóficas é que surgiu o instituto da mutação constitucional permitindo que a Constituição seja objeto de uma “renovação semântica” e adequação ao momento fático-social vivido pelo Estado, sem ,contudo, alterá-la formalmente. A mutação não consiste numa alteração do texto, mas sim numa modificação do significado, ou seja, do seu sentido. O texto permanece da mesma forma sem qualquer mudança visível, perceptível, quanto à escrita. Além disso, seria inviável ao legislador constituinte prever todas as possíveis situações que a norma poderia refletir no caso concreto. Conforme Pedro Lenza, Uadi Lammêgo Bulos conceitua mutação constitucional como sendo: Processo informal de mudança da Constituição, por meio do qual são atribuídos novos sentidos, conteúdos até então não ressaltados à letra da Constituição, quer através da interpretação, em suas diversas modalidades e métodos, quer por intermédio da construção (construction), bem como dos usos e dos costumes constitucionais.30 Trata-se de uma nova ótica sobre o mesmo texto originalmente escrito, que anteriormente, era interpretado de outra forma. Isso porque a acepção de determinados vocábulos e expressões podem sofrer uma variação de sentido com o decurso do tempo. Sobre o tema, Uadi Bulos cita Paolo Biscai di Ruffia que diz: Se se quer realmente conhecer o desenvolvimento da vida constitucional de um Estado é necessário ter presentes as múltiplas modificações não-formais das normas da Constituição, que sempre ocorrem na medida mais ou menos acentuada, segundos os diversos ordenamentos31 Traçando um paralelo com a Constituição jurídica dos Estados Unidos da América, observa-se que foi objeto de várias reinterpretações sem alteração do texto, permanecendo a mesma desde 17 de setembro de 1787, com algumas Emendas32. O que se constata é um verdadeiro controle de constitucionalidade exercido pela Suprema Corte a qual pratica atos integrativos do texto constitucional de maneira a adaptá-lo à realidade social atual, através de processo informal de mudança, desde que não sejam coibidos ou negados outros direitos inerentes ao povo. As mutações constitucionais possuem natureza informal, pois não seguem critérios expressos em lei e seu processamento ocorre, por exemplo, através dos usos e costumes, interpretações, e construções dos tribunais, de forma lenta e sem previsibilidade de quando irão ocorrer. Sobre o tema, Paulo Bonavides, entende que quanto mais rígida for uma Constituição, seus métodos de interpretação devem ser mais flexíveis de maneira a permitir a adequação ao meio político e social. Para que a ordem constitucional seja preservada é necessário o processo de interpretação como fator de atualização das normas constitucionais33 Na mesma linha de pensamento de Paulo Bonavides, José Horácio Meirelles Teixeira diz, em obra de Uadi Lammêgo Bulos: Toda Constituição é sempre uma estrutura dinâmica, como bem assinala Linares Quintana, e esse dinamismo constitucional manifesta-se através de uma espécie de ‘poder constituinte difuso’, na excelente expressão de Burdeau, fora das modalidades organizadas de exercício do poder constituinte, cumprindo ainda observar-se, como o faz Friedrich, que ‘quanto mais difíceis se apresentam esses processos de reforma, mais fortemente atuarão os processos indiretos de modificação constitucional’, como por exemplo pela interpretação dos juízes e tribunais. O ritmo, mais ou menos acelerado dessas modificações constitucionais indiretas, há de variar, portanto, em cada época e em cada lugar, de acordo com os fatores históricos atuantes, entre os quais, evidentemente, em primeiro lugar, o próprio ritmo das transformações sociais e políticas. 34 Não há na doutrina um tratamento uniforme para as mutações constitucionais, o que torna necessário estabelecer critérios didáticos para estruturação do tema. Bulos entende que seria viável estudar as mutações sobre o prisma da morfologia, fazendo uma análise didática em categorias, a qual abrange: a) as mudanças operadas em virtude da interpretação constitucional, nas suas diversas modalidades e métodos; b) as mudanças decorrentes das práticas constitucionais, isto é, dos usos e dos costumes; c) as mudanças que contrariam a Constituição, ou em outras palavras, as mutações inconstitucionais.35 Anna Cândida Cunha Ferraz descreve as possibilidades de mutação por via interpretativa, conforme mencionado por Carmen Nasaré Lopes Neves: a) quando há um alargamento do sentido do texto constitucional, aumentando-se-lhe, assim, a abrangência para que passe a alcançar novas realidades; b) quando se imprime sentido determinado e concreto ao texto constitucional; c) quando se modifica a interpretação anterior e se imprime novo sentido, atendendo a evolução da realidade constitucional; d) quando há adaptação do texto constitucional à nova realidade social, não prevista no momento da elaboração da Constituição; e) quando há adaptação do texto constitucional para atender exigências do momento da aplicação constitucional; f) quando se preenche, por via interpretativa, lacunas no texto constitucional. 36 8. TERMINOLOGIA Não há uniformidade na doutrina em relação à terminologia correta para as mudanças informais. Para Jorge Miranda o termo correto é vicissitude constitucional tácita, Gomes Canotilho prefere a expressão transições ou mutações constitucionais, Pietro Merola Chierchia é adepto da terminologia processos de fato, Georges Burdeau define como meios difusos. Já Pinto Ferreira baseado nos autores Corwin Cushman, Stier-Somlo, Jelinnek e Munro, entende que a expressão mais adequada seria mudança material Além disso, faz menção há algumas modalidades de mudança, conforme os referidos autores: a) desenvolvimento pela lei, b) transformação pelo processo de interpretação judicial, c) alteração pelos costumes políticos, d) modificação formal pela Emenda, revisão ou reforma.37 Conforme obra de Uadi Lammêgo Bulos, a Professora Anna Cândida da Cunha Ferraz, na década de oitenta, definiu como processos informais, processos-não-formais, ou processos indiretos, fazendo uma distinção do processo de reforma formal: Simplificando a questão terminológica, as expressões processo direto ou processo formal serão usadas para indicar a alteração constitucional produzida por reforma constitucional, obra do Poder Constituinte instituído em qualquer de suas modalidades ou formas de expressão, e, processos indiretos, processos-não-formais ou processo informais para designar todo e qualquer meio de mudança constitucional não produzida pelas modalidades organizadas de exercício do Poder Constituinte derivado”.38 Embora haja divergência em relação à nomenclatura, a definição conceitual permanece a mesma, ou seja, trata-se de mudança da Constituição não processada pelo poder reformador. 8.1. ESPÉCIES DE MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL Quanto às espécies de mutação constitucional a doutrina não é uníssona. O jurista chinês Dau-Lin em obra de Uadi Lammêgo Bulos faz uma subdivisão em quatro itens, dispondo que a mutação pode ser provocada: a) mediante uma prática estatal que não viola formalmente a Constituição; b) pela impossibilidade de se exercerem certos direitos estatuídos constitucionalmente; c) por uma prática estatal contraditória com a Constituição, ou ainda; d) através de interpretação, situação de anormalidade que se normaliza ou se ultrapassa no curso da própria práxis constitucional39. 8.2. LIMITES DA MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL Em decorrência da mutação constitucional consistir num processo informal de mudança da Constituição, indaga-se quais seriam os seus limites de alteração dado o grau de flexibilidade que se atribui ao intérprete na criação de um novo significado para aquele texto. Essa indagação deve ser analisada com muita cautela, pois a aplicação de tal instituto de forma equivocada pode importar numa legitimidade legislativa ao intérprete, contrariando a própria Constituição que dispõe sobre a separação dos poderes, incumbindo ao legislativo tal competência. A preocupação se torna ainda maior, pois se trata de alteração da própria Constituição, lei fundamental do Estado e parâmetro para todo o ordenamento jurídico. Logo, é indispensável a atribuição de limites, pois seria antagônico dar “carta branca” ao intérprete em se tratando de uma Constituição rígida que só permite alteração através de processo solene. Ressalte-se que o constituinte originário consignou no texto constitucional as cláusulas pétreas, vedando expressamente propositura de Emendas tendentes a abolir os direitos elencados no artigo 60 § 4º da CF. Portanto, a pretensão do constituinte era não permitir que o legislador pudesse sequer alterá-los de maneira a suprimi-los. Sendo assim, quem dirá o intérprete, modificá-los. Hesse, conforme cita Edivaldo Brito, ao invocar Lerche frisa o perigo da alteração da norma por via de mutação constitucional e ressalta o estabelecimento de limites como a exigência de maioria qualificada40. Entretanto, a própria doutrina não definiu especificamente quais seriam as limitações da mutação em virtude da complexidade em se fazer um estudo estruturado do tema. Essa dificuldade é verificada, pois as causas que dão ensejo às mutações são variadas não havendo um rol específico de possibilidades. Na verdade elas são fruto de acontecimentos decorrentes de fatos sociais que culminaram na transformação do Estado. Em decorrência da constante evolução da sociedade, da verificação cotidiana de novas situações e acontecimentos e consequentemente da transformação do Estado é que não se torna possível traçar com exatidão todas as possibilidades de limitação das mutações. Além disso, tal delineamento também encontra barreiras nas diversas formas em que se opera a mutação, como por exemplo, pelos usos e costumes, pela interpretação, pela construção judicial, dentre outros. Outro ponto importante a ser tratado consiste na imprevisibilidade de quando ela irá ocorrer. Para Laband e Jellinek, citados por Bulos, o fenômeno é “involuntário” e “intencional” e por isso se torna difícil estabelecer as limitações.41 Todavia, para Heller, também na obra de Uadi Lammêgo Bulos, a mutação constitucional encontra limites no próprio texto constitucional estando a mudança de significado adstrita à “normalidade dos fatos” não podendo esta contrapor por completo a “normatividade”. Isso porque os fatos e a norma estão coordenados entre si. E diz mais: Não se podem considerar completamente separados o dinâmico e o estático, tampouco podem sê-lo a normalidade e a normatividade, o ser e o dever ser no conceito da Constituição. Uma Constituição política só se pode conceber como um ser a que dão forma as normas. Como situação política existencial, como forma e ordenação concretas, a Constituição só é possível porque os partícipes consideram essa ordenação e essa forma já realizadas ou por realizar-se no futuro, como algo que deve ser e o atualizam.42 Conforme Gabriel Arnoult em seu livro de 1896, “De la Révision des Constitutions”, citado por Nelson de Sousa Sampaio na obra de Edivaldo Brito: Não há reforma total, no sentido absoluto da palavra, pois o direito de revisão somente permite modificar a Constituição, em seu conjunto, para aperfeiçoá-la. Mas que se possa usar deste direito consagrado pela Constituição para destruí-la, que se possa voltar assim contra a Constituição uma arma fornecida por ela, são pretensões que não podemos admitir...43 Nas palavras de Milton Campos citadas por Uadi Lammêgo Bulos, as mutações não provocam deformações maliciosas, nem subversões traumatizantes.44 Ainda conforme Bulos, Georg Jellinek: Los preceptos constitucionales a menudo son oscuros o extensos y sólo el legislador les da sentido preciso mediante leyes que los concretan de modo muy parejo a como el juez, primero, toma conciencia clara del contenido de las leyes que ha de aplicar. Así como por lo general la aplicación jurisprudencial de los textos legales vigentes está sujeta a las necesidades y opiniones variables de los hombres, lo mismo ocurre con el legislador, cuando interpreta mediante leyes ordinarias la Constitución. Lo que parece en un tiempo inconstitucional emerge más tarde conforme a la Constitución y así la Constitución sufe,mediante el cambio de su interpretación,una mutación. No sólo el legislador puede provocar semejantes mutaciones, también pueden producirse de modo efectivo mediante la práctica parlamentaria, la administrativa o gubernamental y la de los tribunales. Han de interpretar las leyes y también las normas constitucionales, pero de modo subrepticio una ley constitucional puede adquirir, poco a poco, un significado totalmente distinto al que tenía en el sistema originario.45 No entanto, para Bulos, a única limitação seria a própria consciência do intérprete dado o grau de subjetividade das mutações. Sendo assim, ele deve interpretar de forma ponderada respeitando os princípios fundamentais norteadores do Estado Democrático, bem como os parâmetros de controle de constitucionalidade, evitando, portanto as mutações inconstitucionais46. Ao falar sobre a proliferação de mutações inconstitucionais, Bulos menciona que elas ocorrem ou em virtude da falta do controle de constitucionalidade de maneira efetiva, ou porque esse controle não logra atingir o universo de atos e práticas desenvolvidas no âmbito dos poderes constituídos,ou porque pela própria natureza do processo ele se subtrai, sem possibilidade de sanção, a qualquer controle de constitucionalidade, exercido por órgão ou poder constituído. O único tipo de controle que poderá incidir sobre tais mutações é o controle não organizado, isto é, acionado por grupos de pressão, pela opinião pública, pelos partidos políticos etc.47 Vários juristas e filósofos apontam algumas diretrizes para a aplicação da mutação constitucional, seguindo os mesmos critérios orientadores da interpretação constitucional. Fazendo uma junção dessas diretrizes tem-se: Unidade do processo hermenêutico; não consiste em fazer uma análise individualizada, mas sim considerando o ordenamento jurídico como um todo, possibilitando uma unidade de compreensão; Natureza axiológica do ato interpretativo; a natureza axiológica diz respeito à valoração das preposições normativas; Natureza integrada do ato interpretativo; a interpretação da norma é integrada, de maneira a respeitar o contexto ao qual está inserida, trata-se de uma função global; Limites objetivos do processo hermenêutico; a interpretação encontra limitação no próprio sentido, ou seja, no significado de cada palavra; Natureza histórico-concreta do ato interpretativo; toda interpretação está condicionada às mudanças históricas do sistema, implicando tanto a intenção do legislador quanto as situações fáticas e axiológicas que surgirem posteriormente, fazendo uma compreensão global; Natureza nacional do ato interpretativo; a interpretação jurídica é feita conforme exigências racionais, tendo como pressuposto a recepção dos modelos jurídicos como entidades lógicas; Problematismo e razoabilidade do processo hermenêutico; a interpretação jurídica não pode se limitar a critérios de lógica formal ou a uma mera análise linguística, devendo considerar-se as exigências da razão histórica entendida como razão problemática; Natureza econômica do processo hermenêutico; conciliá-lo com as normas superiores do ordenamento jurídico, preservando-se a existência do modelo jurídico; Destinação ética do processo interpretativo; optar pela interpretação que mais compreenda aos valores éticos da pessoa e da convivência social; Globalidade de sentido no processo hermenêutico; a interpretação deve ser realizada conforme a visão global do mundo e da vida.48 8.3. MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL E O POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA RECLAMAÇÃO 4.335/AC Ante a não pacificação do tema na doutrina, bem como de sua importância e relevância no âmbito de Direito Constitucional, cumpre fazer uma análise do entendimento do instituto da mutação constitucional conforme a mais Alta Corte do país: o Supremo Tribunal Federal. Todavia, nem mesmo o Supremo possui entendimento pacificado sobre a mutação, a qual tem sido objeto de divergências entre os Ministros. Um dos casos mais polêmicos de mutação constitucional refere-se à Reclamação 4335/AC em que há opiniões divergentes entre os Ministros do STF. Trata-se de reclamação ajuizada pela Defensoria Pública da União em face da decisão do juiz da Vara de Execuções Penais de Rio Branco (AC) que indeferiu a progressão de regime da pena a dez condenados por crime hediondos, sendo que o Supremo Tribunal Federal já havia declarado a inconstitucionalidade do dispositivo da Lei de Crimes Hediondos que veda a progressão de regime, em decisão por seis votos a cinco nos autos do Habeas Corpus 82959. O juiz da Vara de Execuções Penais entendeu que a decisão proferida em controle difuso pelo STF gera efeitos apenas entre as partes, cabendo ao Senado a suspensão de lei considerada inconstitucional pelo STF, conforme artigo 52, X, CF, quando só então passará a ter efeitos erga omnes. Entretanto, para o Ministro Relator Gilmar Mendes ao Senado cabe apenas a publicidade da decisão, pois as decisões do Supremo, mesmo em controle difuso, possuem eficácia normativa, tendo ocorrido, portanto, uma mutação do artigo constitucional. Tal entendimento foi corroborado pelo Ministro Eros Grau, os quais julgaram procedente a Reclamação. Ocorre que a aplicação da mutação constitucional ao referido artigo gerou grande discussão entre os Ministros acerca dos limites da mutação bem como sobre as lições doutrinárias já consolidadas sobre o controle de constitucionalidade, motivo pelo qual a Reclamação não foi julgada até a presente data. Além dos Ministros Gilmar Mendes e Eros Grau, já votaram Joaquim Barbosa, Sepúlveda Pertence e Ricardo Lewandowski que embora tenham concedido habeas corpus de ofício para que o juiz examine os demais requisitos para deferimento da progressão, julgaram improcedente a reclamação, pois entenderam que não houve mutação constitucional do artigo 52, X, da Constituição Federal. O julgamento da reclamação foi interrompido pelo pedido de vista do Ministro Teori Zavascki.49 Apenas para observar, conforme o Ministro Gilmar Mendes, a Reclamação teria perdido seu objeto tendo em vista que no curso da análise da referida reclamação, o artigo da Lei dos Crimes Hediondos sofreu alteração através da Lei 11.464 de 28 de março 2007. 9. BREVE RELATO DO VOTO DO MINISTRO GILMAR MENDES O Ministro Relator Gilmar Mendes entendeu que o artigo 52, X, da Constituição de 1988 sofreu mutação constitucional, conforme trecho extraído de seu voto:50 É possível, sem qualquer exagero, falar-se aqui de uma autêntica mutação constitucional em razão da completa reformulação do sistema jurídico e, por conseguinte, da nova compreensão que se conferiu à regra do art. 52, X, da Constituição de 1988. Valendo-nos dos subsídios da doutrina constitucional a propósito da mutação constitucional, poder-se-ia cogitar aqui de uma autêntica reforma da Constituição sem expressa modificação do texto.51 Para Mendes, o controle de constitucionalidade difuso sofreu uma evolução no decorrer da história e agora estaria num patamar de igualdade com o controle de constitucionalidade concentrado, em relação aos seus efeitos. Para subsidiar seu entendimento, fez uma análise histórica do controle de constitucionalidade, as quais serão relacionadas brevemente. A suspensão da lei pelo Senado Federal foi prevista inicialmente na Constituição de 1934 e repetida nas Constituições de 1946, 1967/1969 e 1988, entretanto, perdeu o sentido em decorrência da criação do controle de constitucionalidade abstrato. Tal afirmativa se torna ainda mais notória após a ampliação do rol de legitimados para propositura de ação direta de constitucionalidade na Constituição de 1988, permitindo que as questões de relevância fossem objetos de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal, acabando, portanto, com a legitimidade exclusiva do Procurador Geral da República prevista nas Constituições de 1967/69. Segue trecho do voto do Relator, sobre a ênfase do controle concentrado na Constituição: A Constituição de 1988 alterou, de maneira radical, essa situação, conferindo ênfase não mais ao sistema difuso ou incidental, mas ao modelo concentrado, uma vez que as questões constitucionais passaram a ser veiculadas, fundamentalmente, mediante ação direta de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.52 O Ministro Gilmar Mendes questionou o porquê a declaração de inconstitucionalidade em controle difuso teria efeito apenas inter partes quando em ação direta de inconstitucionalidade o Supremo Tribunal Federal suspende liminarmente até mesmo a eficácia de uma Emenda Constitucional. Além disso, Mendes traçou o papel do Senado no controle de constitucionalidade e citou para tanto, Lúcio Bittencourt o qual entendia que o objetivo do constituinte, na Constituição de 1967, era “apenas tornar pública a decisão do tribunal, levando-a ao conhecimento de todos os cidadãos”. Ademais, afirmou que a não publicação de resolução pelo Senado suspendendo a norma, não impedirá que a decisão do Supremo tenha eficácia. Por fim, enfatizou que ao se permitir que o Supremo declare a inconstitucionalidade por meio de súmula vinculante, sem a intervenção do Senado, estaria corroborando, portanto, a idéia de que o artigo 52, X, da CF foi superado. 10. BREVE RELATO DO VOTO DO MINISTRO EROS GRAU Compartilhando do mesmo entendimento do Relator, o Ministro Eros Grau vislumbrou a mutação constitucional do artigo 52, X, da CF, e fez alguns apontamentos sobre a matéria.53 Para ele, é preciso haver a harmonização da rigidez do texto com a elasticidade da interpretação de maneira a se respeitar a coerência interna do texto quando da sua adequação à realidade. O intérprete deve ser prudente, e obedecer a alguns pressupostos, conforme conclusão de Aulis Aarnio: a) se insere no quadro [na moldura] do direito; b) o discurso que o justifica processa-se de maneira racional; c) atende ao código dos valores dominantes.54 Grau fez uma distinção entre texto e norma, definindo o primeiro como produto de criação legislativa e o segundo como obra do intérprete, o qual não está limitado à língua do texto normativo. Para ele, o intérprete autêntico também possui legitimidade para atualizar e substituir a norma, tendo como parâmetro a dimensão normativa. No presente caso, o Ministro ressaltou que o Relator Ministro Gilmar Mendes foi além da interpretação propondo a substituição de um texto por outro, o que no seu entender configura típica mutação constitucional. Eros Grau definiu mutação constitucional como sendo “transformação de sentido do enunciado da Constituição sem que o próprio texto seja alterado em sua redação, vale dizer, na sua dimensão constitucional textual”.55 E mais, afirmou que ela ocorre quando é afastada uma parte do texto constitucional sem que, no entanto haja a ruptura do sistema, ou seja, o próprio texto é substituído por outro. Entretanto, no presente caso, não ocorre apenas alteração de sentido, mas sim alteração do próprio texto constitucional. A proposta consiste em: [compete privativamente ao Senado Federal suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal] a outro texto [compete privativamente ao Senado Federal dar publicidade à suspensão da execução, operada pelo Supremo Tribunal Federal, de lei declarada inconstitucional, no todo ou em parte, por decisão definitiva do Supremo].56 Quanto aos critérios limitadores de aplicação da mutação, Grau afirmou que o texto objeto de alteração deve estar adequado à tradição, ou seja, ao contexto bem como à Constituição como um todo, de maneira a não contrariá-lo. É o que ocorre na alteração proposta pelo Relator, pois não encontra qualquer oposição em todo o texto constitucional e se amolda perfeitamente ao contexto. Ademais ressaltou que o Senado não poderia dar sentido contrário ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, pois o Poder Legislativo não pode reinserir uma norma declarada inconstitucional, uma vez que, neste caso “os braços do Judiciário” alcançam o céu. Em razão disso entende ser “obsoleto” tal artigo. O Ministro observou que certamente a doutrina fará críticas em relação à mudança de entendimento quanto à eficácia das decisões proferidas em controle difuso de constitucionalidade, tema esse já consolidado doutrinariamente, entretanto frisou que o Judiciário não deve se ater à doutrina, pois, inegavelmente ela seguirá o posicionamento do Tribunal e não o contrário. 11. BREVE RELATO DO VOTO DO MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI Para o Ministro Ricardo Lewandowski, não há que se falar em mutação constitucional do artigo 52, X, CF, pois para ele, tal entendimento, vulneraria o sistema de separação de poderes.57 Ressaltou que desde a Constituição de 1934, tal artigo tem se mantido, de forma reiterada nas constituições posteriores por opção do constituinte e que não seria adequado, por simples interpretação do artigo, retirar a competência do Senado, o que “colocaria em risco a própria lógica do sistema de freios e contrapesos”58. Ainda que a Constituição de 1988 tenha fortalecido o Supremo Tribunal Federal ao se atribuir eficácia erga omnes e efeito vinculante nas decisões em controle concentrado, não o fez de maneira a suprimir a competência dos demais poderes. Para Lewandowski, o fenômeno da mutação constitucional possui limitações formais e materiais na própria Constituição, a qual estabelece no seu artigo 60, as cláusulas pétreas, insuscetíveis de alteração inclusive por Emenda Constitucional. Dentre as cláusulas pétreas, destaca-se a separação dos poderes prevista no artigo 60, § 4º, III, da CF, o que no caso em tela, seria violado através da mutação constitucional proposta pelo Relator. Ele seguiu afirmando que o que se pretende é alterar a competência de um Poder para outro, por simples interpretação, sendo que tal competência foi estabelecida pelo próprio constituinte, ultrapassando, portanto os limites da mutação constitucional. Para tanto, citou a especialista no tema Anna Cândida da Cunha Ferraz a qual entende que a mutação constitucional possui limites no próprio sentido da norma constitucional. Citou também, Konrad Hesse o qual trata dos limites da mutação constitucional, nos seguintes termos: (...) uma mudança das relações fáticas pode – ou deve – provocar mudanças na interpretação da Constituição. Ao mesmo tempo, o sentido da proposição jurídica estabelece o limite da interpretação e, por conseguinte, o limite de qualquer mutação normativa. A finalidade (Telos) de uma proposição constitucional e sua nítida vontade normativa não devem ser sacrificadas em virtude de uma mudança da situação. Se o sentido de uma proposição normativa não pode mais ser realizado, a revisão constitucional afigura-se inevitável. Do contrário, ter-se-ia a supressão da tensão entre norma e realidade com a supressão do próprio direito.59 Fazendo uma reflexão sobre o conceito de Hesse, Lewandowski subdividiu a mutação constitucional em duas formas: revisão do texto atribuindo maior valor “às exigências de índole fática do que a ordem normativa vigente” e interpretação limitada à teologia da norma60. Ou seja, se não houve adequação da exigência de ordem fática com o sentido da norma, a alteração deveria ocorrer por meio de Emendas à Constituição, e não por via de interpretação. Entretanto, o Ministro ressaltou que em virtude da evolução social, a Constituição deve sim ser adequada à realidade fática de maneira a possibilitar o acompanhamento deste processo de evolução, todavia, desde que respeitados certos parâmetros rígidos. Lewandowski citou como primeiro parâmetro o próprio sentido literal do texto, ou seja, sua estrutura semântica. Ele observou que não se filia à corrente dos legalistas extremados, entretanto, o que está claramente escrito não cabe outra interpretação. No presente caso, como o artigo 52, X, da CF dispõe literalmente que compete ao Senado a suspensão da norma declarada inconstitucional pelo Supremo, não há que se cogitar outra interpretação, pois não há questionamentos em relação ao que está escrito. O texto é taxativo e claro. Em relação ao referido artigo, Ricardo Lewandowski mencionou José Afonso da Silva, o qual se manifestou sobre o tema nestas palavras: Seria mais prático e expedito que se desse à decisão definitiva do STF o efeito erga omnes a contar de sua publicação, também nos casos de recurso extraordinário (art. 102, III), que é o ponto final do controle de constitucionalidade incidenter tantum. Assim, porém, não quis o constituinte, de sorte que a interferência do Senado é de rigor. (...) A suspensão é ato político; por isso cabe ao Senado o juízo de conveniência e a oportunidade para fazê-lo61 Por fim, ressaltou que em virtude da edição da Súmula Vinculante 26 que declarou a inconstitucionalidade do artigo 2º da Lei de Crimes Hediondos, objeto desta Reclamação, não haveria razão de se dar nova interpretação ao artigo 52, X, da Constituição, uma vez que foi atingida a finalidade pretendida, ante a eficácia contra todos e efeito vinculante da referida súmula. O Ministro julgou improcedente a reclamação, mas concedeu habeas corpus de ofício para que o juiz examine os demais requisitos para deferimento da progressão. 12. BREVE RELATO DO VOTO DO MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE O Ministro Sepúlveda Pertence também se manifestou contrariamente à mutação constitucional do artigo 52, X, da CF, e afirmou que aplicá-la poderia cheirar a “golpe de Estado”62, o que deve ser resistido pelo Judiciário. Ainda que o Ministro concordasse que o artigo em análise é obsoleto, em virtude da prevalência do controle concentrado, não vislumbrou amparo legal para reduzir o Senado a uma “posição subalterna de órgão de publicidade de decisões do STF”63, pois a competência de suspensão de lei declarada inconstitucional foi opção do constituinte e tem sido mantida nas Constituições brasileiras. Ele definiu essa tentativa de mutação como “projeto de decreto de mutação constitucional”64. Ademais, afirmou ser dispensável a discussão da mutação constitucional do referido artigo uma vez que com o poder atribuído ao Supremo através da Emenda Constitucional 45 é possível alcançar a mesma finalidade pretendida, sem a intervenção do Senado, através das Súmulas Vinculantes. O Ministro julgou a reclamação improcedente, mas concedeu habeas corpus de ofício para que o juiz examine os demais requisitos para deferimento da progressão. 13. BREVE RELATO DO VOTO DO MINISTRO JOAQUIM BARBOSA O Ministro Joaquim Barbosa se manifestou contrariamente à mutação constitucional do artigo 52, X, da CF e ressaltou que a mutação por simples interpretação sugerida pelo Relator não consiste em uma modalidade idônea.65 Entretanto, o fato do Senado não ter suspendido a norma não representa obstáculo à ampla efetividade das decisões do Supremo, mas apenas complemento, sendo certo que o juiz não poderia ter entendimento contrário às decisões do Supremo. Para ele, mesmo que se aceitasse a referida tese deveriam estar presentes dois fatores: o decurso de tempo maior e a consequente e definitiva “désuetude”. Em relação à “désuetude” não há como ser reconhecida, pois conforme pesquisa realizada pelo Ministro na base de dados do Senado Federal houve a suspensão da norma declarada inconstitucional de aproximadamente 100 normas pelo Senado (dados estes até o ano de 2007). Logo, não se verificou o desuso da norma uma vez que o Senado tem desempenhado sua função ao longo dos anos. Além disso, Joaquim Barbosa também frisou a desnecessidade da mutação constitucional ante a possibilidade de edição de súmula vinculante sem a intervenção do Senado, a qual teria a mesma eficácia. O Ministro julgou a reclamação improcedente, mas concedeu habeas corpus de ofício para que o juiz examine os demais requisitos para deferimento da progressão. 14. MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL POR INTERPRETAÇÃO JUDICIAL Primeiramente, importante destacar que a doutrina considera a interpretação judicial como uma das modalidades de mutação de maior relevância, inclusive de maior utilização no direito brasileiro. Cumpre observar que a interpretação judicial não ocorre apenas pelo Supremo Tribunal Federal. Na verdade ela é exercida também pelos juízes singulares por via de controle difuso de constitucionalidade. O controle difuso de constitucionalidade pode ser realizado por qualquer juízo ou tribunal, dentro de sua esfera de competência, e consiste na análise de constitucionalidade de uma norma em relação ao caso concreto, podendo ser suscitado por qualquer interessado. O objeto da ação não é a declaração de inconstitucionalidade, mas sim a obtenção de um direito que para ser concedido necessita que determinada norma seja declarada inconstitucional. Por isso que se diz que a declaração de inconstitucionalidade dá-se de forma incidental; mesmo porque a propositura de Ação Direita de Inconstitucionalidade em face da Constituição Federal possui rol restrito de legitimados conforme artigo 103, da CF devendo ser interposta perante o Supremo Tribunal Federal. Além disso, os efeitos da decisão são apenas inter partes. O Magistrado, então, irá confrontar a norma impugnada com o texto constitucional, desenvolvendo um verdadeiro processo hermenêutico, visando a adequação da norma com a Constituição. Ele poderá declará-la inconstitucional total ou parcialmente ou até mesmo dar um novo sentido ao texto em virtude da adequação da norma ao caso concreto bem como à realidade social atual, o que configuraria, portanto, uma mutação constitucional. Entretanto, conforme já mencionado, torna-se difícil estabelecer parâmetros e até mesmo limites para a atividade hermenêutica do Magistrado em virtude da subjetividade de tal processo. Contudo em sede de controle difuso eventual “exorbitância” da decisão do Magistrado poderá ser reparada pelas instâncias superiores, pois, suscetível de reforma. Inclusive, a própria Constituição prevê quórum específico para declaração de inconstitucionalidade pelos tribunais, mostrando, portanto, a preocupação do constituinte com uma decisão mais justa e democrática, não reservando importante incumbência ao arbítrio de poucos. Nas palavras de Paulo Bonavides, sobre o tema: O controle difuso, sobre ser de índole jurídica ou judicial, com limites definidos no afastamento de aplicação da norma inconstitucional, é também grandemente democrático, visto que nasce nas bases do sistema, no seu subsolo, na sua horizontalidade, e por ele se irradia com tal amplitude que todo juiz do ordenamento é, na via de exceção, juiz constitucional.66 Todavia, o duplo grau de jurisdição não é verificado no controle concentrado de constitucionalidade exercido pelo Supremo Tribunal Federal. O controle concentrado ou abstrato de leis ou atos normativos, federais ou estaduais conforme a Constituição Federal é exercido pelo Supremo Tribunal Federal, por meio da Ação Direita de Inconstitucionalidade, Ação Declaratória de Constitucionalidade, Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva e Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, na qual também é admitido o controle de lei municipal. Como já mencionado, o artigo 103 da CF estabelece um rol específico de legitimados para a propositura das referidas ações, não podendo, portanto, qualquer do povo questionar diretamente no Supremo a inconstitucionalidade da norma. Recebe o nome de controle concentrado porque se concentra em um único órgão: Supremo Tribunal Federal. Além disso, as decisões proferidas possuem efeito erga omnes e vinculante, não estando sujeitas a qualquer reexame por outro órgão. Suas decisões são soberanas. Justamente neste ponto é que paira a preocupação acerca dos limites da interpretação e da mutação constitucional no âmbito do Supremo Tribunal Federal, haja vista que a sua decisão deverá ser cumprida por todos. Sobre o tema, Paulo Bonavides também se manifestou nos seguintes termos: Demais disso, o controle de constitucionalidade, que se faz por via de ação, a saber, o controle concentrado ou abstrato, é exercido por um só órgão do Poder Judiciário, ou seja, o Supremo Tribunal Federal, seu órgão de cúpula. Tamanha preeminência político-normativa derivada da natureza mesma desse controle dá, com frequência, a quem o executa, uma hegemonia indisputável, em se tratando, no caso, de Corte que é a cabeça do Judiciário, e se acha investida da soberania constitucional por ser a mais alta instância da fiscalização de constitucionalidade. De modo que tal primazia se pode tornar num determinado sentido eventualmente perturbadora da harmonia, equilíbrio e paridade dos três Poderes, os quais, no seu conjunto, enfeixam a titularidade da soberania. 67 Observe-se, entretanto, que ainda que as decisões proferidas em controle concentrado pelo Supremo mereçam maior cautela, as demais decisões proferidas pelo Supremo no âmbito de sua competência também merecem cuidado, pois não estão sujeitas a qualquer controle ou reexame. Germana Parente Neiva Belchior cita Gilmar Mendes o qual entende que a combinação desses dois sistemas confere ao STF tanto a atribuição de órgão revisor de última instância relativamente às matérias constitucionais, quanto ao de Tribunal Constitucional ao conferir competência de controle de constitucionalidade direta de leis estaduais e federais, em controle abstrato.68 Sobre a função exercida pelo STF Germana cita também o professor José de Albuquerque Rocha o qual afirma que: Em um sistema político-jurídico, quem tem a atribuição específica de interpretar sua lei constitucional, coloca-se em posição de proeminência em relação a todos os seus poderes. Converte-se, pois, em peça capital do sistema, em garantia das garantias dos direitos fundamentais, o que nos permitiria afirmar que no Brasil, a Constituição não é simplesmente a Constituição, mas a Constituição interpretada pelo Judiciário.69 Em virtude dessa função específica de interpretação da lei constitucional que advém da própria “essência” do Supremo Tribunal Federal de Guardião da Constituição é que se verifica maior utilização do fenômeno da mutação constitucional pelo STF, decorrente do processo hermenêutico. Sobre a interpretação judicial, Celso Ribeiro Bastos, diz que: Entender-se a aplicação do Direito como uma atividade puramente mecânica de subsunção do fato à norma jurídica correspondente, implica em admitir que os juízes não passam de meros fantoches manipulados por um ente supostamente dotado de vontade própria: a lei. Isso porque para a concepção perfilhada pela corrente cognoscitiva a interpretação se traduziria numa operação tão objetiva quanto uma operação matemática qualquer. E, para tanto, todos seriam capazes de efetuá-la, bastando o conhecimento das regras (matemáticas) aplicáveis70. No entanto, ainda que o juiz não seja “refém” da literalidade do texto, o processo hermenêutico deve obedecer a certos limites. Em decorrência da supremacia da Constituição, a interpretação deve ser realizada em consonância com o texto constitucional. Nas palavras de Canotilho, conforme Alexandre de Moraes: A interpretação conforme a Constituição só é legítima quando existe um espaço de decisão (= espaço de interpretação) aberto a várias propostas interpretativas, umas em conformidade com a Constituição e que devem ser preferidas, e outras em desconformidade com ela.71 A interpretação conforme a Constituição é possível quando da norma puder se extrair mais de uma forma de interpretação, prevalecendo aquela que melhor se compatibilize com o texto constitucional. O intérprete deve, portanto, buscar a harmonização da lei com a Constituição, sem extrapolar os limites da própria lei. Além disso, o significado da lei deve ser verificado com base na vontade do legislador. Nesse sentido, Gilmar Mendes diz que “a interpretação conforme à Constituição é, por isso, apenas admissível se não configurar violência contra a expressão literal do texto e não alterar o significado do texto normativo, com mudança radical da própria concepção original do legislador”.72 Entretanto, ressalte-se que há entendimento contrário quanto à verificação da vontade do legislador. Importante destacar, que o processo hermenêutico deve obedecer também os princípios e métodos de interpretação em geral. Ainda sobre a interpretação judicial, Paulo Bonavides vislumbra três “tipos de juízes”: Ao criar a norma do caso concreto, o juiz ordinário legisla na sentença por raciocínios hermenêuticos. Com o advento do juiz constitucional, dos tribunais da Constituição, isto é, com a jurisdição constitucional se alargando, o juiz “legislador” assume cada vez mais nas estruturas judiciais contemporâneas o lugar do antigo juiz “servo” de lei e do juiz “intérprete” de textos.73 Esse tipo de juiz que “legisla”, mencionado por Bonavides é que nos leva a refletir acerca de eventual violação do princípio da separação de poderes ante a utilização do fenômeno da mutação constitucional. Para isso é necessário discorrer sobre o tema da tripartição dos poderes. 15. MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL X PRINCÍPIO DE SEPARAÇÃO DE PODERES Inicialmente, a teoria relativa à “tripartição de Poderes” foi desenvolvida por Aristóteles, em sua obra Política, na qual ele vislumbrava o poder separado em três funções: elaboração e edição de leis (legislativa), a aplicação da lei ao caso concreto (administrativa) e julgamento de litígios (judiciária). Entretanto, naquela época as três funções eram concentradas apenas em uma única pessoa, não tendo, portanto, reflexo prático. Posteriormente, Montesquieu publicou o livro O Espírito das Leis, aperfeiçoando as idéias iniciais de Aristóteles. Para ele, as três funções deveriam ser desenvolvidas por três órgãos distintos, autônomos e independentes entre si de maneira a não concentrar o poder nas mãos de uma única pessoa. Portanto, para a gestão de um bom governo, os poderes deveriam ser divididos em: Legislativo, Judiciário e Executivo. Com isso, cada poder possui sua função típica e específica. Acerca da importância desse princípio, Gilmar Ferreira Mendes cita Montesquieu que diz: Tudo estaria perdido se o mesmo homem ou o mesmo corpo dos principais ou dos nobres, ou do povo, exercesse esses três poderes: o de fazer as leis, o de executar as resoluções públicas, e o de julgar os crimes ou as divergências dos indivíduos74 Sobre o objetivo da separação de poderes, Dimitri, na obra de Pedro Lenza dispõe que: Seu objetivo fundamental é preservar a liberdade individual, combatendo a concentração de poder, isto é, a tendência ‘absolutista’ de exercício do poder político pela mesma pessoa ou grupo de pessoas. A distribuição do poder entre órgãos estatais dotados de independência é tida pelos partidários do liberalismo político como garantia de equilíbrio político que evita ou, pelo menos, minimiza os riscos de abuso de poder. O Estado que estabelece a separação dos poderes evita o despotismo e assume feições liberais. Do ponto de vista teórico, isso significa que na base da separação dos poderes encontra-se a tese da existência de nexo causal entre a divisão do poder e a liberdade individual. A separação dos poderes persegue esse objetivo de duas maneiras. Primeiro, impondo a colaboração e o consenso de várias autoridades estatais na tomada de decisões. Segundo, estabelecendo mecanismos de fiscalização e responsabilização recíproca dos poderes estatais, conforme o desenho institucional dos freios e contrapesos75 O princípio da separação dos poderes está previsto no artigo 2º da Constituição Federal o qual dispõe: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Tal princípio é considerado como um dos “princípios fundamentais”76 além de ter sido elevado à categoria de cláusula pétrea, conforme artigo 60, § 4º, III, da CF. Isso demonstra o grau de importância do constituinte com o tema uma vez que não poderá ser abolida do ordenamento jurídico pelo poder constituinte derivado. Ressalte-se que a separação de poderes não se mostra tão rígida, pois, além das funções típicas relativas a cada poder específico, cada um deles possui funções atípicas, entretanto, tais funções estão limitadas a sua própria esfera de competência. O sistema de freios e contrapesos representa um instrumento de controle e fiscalização entre os poderes, no qual um controla o outro, de maneira a não permitir que exacerbe em suas funções em decorrência de competência atribuída só a ele. Entretanto, o controle não legitima a invasão na área de atuação do outro órgão além dos limites previstos em lei, sob pena de violação do princípio de separação de poderes. A própria Constituição define as competências de “controle” dos respectivos órgãos, como por exemplo, o artigo 52, I, CF que prevê a competência privativa do Senado Federal (Legislativo) para processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República (Executivo) nos crimes de responsabilidade, bem como a competência do STF (Judiciário) para declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual (Legislativo) prevista no artigo 102, I, CF. Diante dessa breve explanação sobre o princípio da separação dos poderes, cabe uma indagação: Como aplicar a mutação constitucional sem violar o princípio da separação dos poderes? Esse questionamento advém da premissa de que a função típica de legislar compete ao Poder Legislativo, enquanto que ao Judiciário cabe o julgamento dos litígios, não fazendo parte de sua função típica “legislar” através das sentenças. Importante destacar, como já mencionado neste trabalho, que em decorrência da constante evolução da sociedade, a Constituição não pode ser estática devendo, portanto acompanhar esses processos de evolução. Ocorre que em virtude do dificultoso processo de alteração de uma Constituição rígida, é importante ter mecanismos de “atualização” da norma que não demande tanto tempo e burocracia para tal. Um desses mecanismos consiste na mutação constitucional desempenhado pelo Poder Judiciário. Contudo, mostra-se no mínimo temerária essa legitimidade “legislativa” do Poder Judiciário a qual se verifica muitas vezes pela inoperância/ineficiência do Poder Legislativo, de seu abarrotamento e até mesmo da morosidade. No entanto, Inocêncio Mártires Coelho entende que houve uma modernização de velhos dogmas, tendo o princípio da separação de poderes sofrido alguns ajustes e flexibilização ante às novas realidades constitucionais e ao processo hermenêutico inovador. Cita como exemplo: ...a legislação judicial, fruto da inevitável criatividade de juízes e tribunais, sobretudo das cortes constitucionais, onde é frequente a criação de normas de caráter geral, como as chamadas sentenças aditivas proferidas por esses supertribunais em sede de controle de constitucionalidade.77 A respeito dessa mudança de paradigma quanto à clássica definição de separação de poderes, Rodrigo Sarmento Barata menciona Marco Aurélio Sampaio o qual entende que: A necessidade de visão multidisciplinar acima mencionada , pois, não é justificada apenas porque a Constituição seria vista como um estatuto político, ou porque condensaria ela o momento político em que fora feita, ou mesmo porque deveria ser inserida em contexto histórico específico. O que se quer ressaltar é o aparente fato de que se vive hoje um modificação do sentido de parte do texto constitucional, referente a toda sistemática de separação de Poderes, ainda que não identificável plenamente em sua extensão e profundidade (já que se trata de processo ainda em andamento), certamente, porém, visível ao estudioso do Direito, se ele não se isolar em discurso formalista e negador de qualquer vivência constitucional que não a ditada pelo texto frio. (...) a dinâmica da separação de Poderes, em termos gerais, vem- se modificando. No Brasil, especificamente, não se poderia imaginar situação diversa. Daí porque, em face das relações entre Executivo e Legislativo tomando formas novas, qual seja, a externada pela Constituição e vivenciada conforme a prática constitucional.78 A Constituição Federal de 1988 não atribuiu função normativa ao Poder Judiciário, não dispondo, portanto, de competência de criação de “leis” por meio de sentenças. Até mesmo a função de Guarda da Constituição atribuída ao STF não traz consigo, “automaticamente”, legitimidade para tal. Entretanto, essa “modernização” do princípio da separação de poderes ocorrida no decurso do tempo é verificada na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. No julgamento da medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 267, em 25/10/1990, o Relator Ministro Celso de Melo entendeu que o Judiciário só pode atuar como legislador negativo. O objeto da Adin consistia na obtenção de declaração de inconstitucionalidade por conduta omissiva do Poder Legislativo, em virtude da não edição de lei complementar para “regulamentar” a norma do artigo 45 § 1º da Constituição Federal sobre a representação proporcional de Deputados nos Estados e Distrito Federal. Nas palavras do Ministro Relator Celso de Melo: O reconhecimento dessa possibilidade, acaso admitido fosse, implicaria, transformar o Poder Judiciário, no plano do controle concentrado de constitucionalidade, em legislador positivo, condição que este próprio Tribunal tem-se recusado a exercer.79 Contudo, os entendimentos jurisprudenciais, tem sofrido mudança no decorrer do tempo, em que se tem admitido a construção judicial pela via interpretativa, caracterizando um verdadeiro ativismo judicial. Ainda que haja posicionamentos contrários, verifica-se uma mudança no cenário jurídico em que se tem constatada uma mitigação à rigidez do princípio da separação de poderes. 16. SENTENÇAS MANIPULATIVAS ADITIVAS COMO MEIO DE MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL As sentenças manipulativas têm origem na doutrina italiana e como o próprio nome diz, correspondem a uma “manipulação” do texto constitucional, via Poder Judiciário, o qual, agindo como legislador positivo, modifica ou substitui a norma, adequando-a à Constituição. Conforme definição da doutrina italiana citada por Gilmar Ferreira Mendes, sentença manipulativa consiste na decisão: Mediante a qual o órgão de jurisdição constitucional modifica ou adita normas submetidas a sua apreciação a fim de que saiam do juízo constitucional com incidência normativa ou conteúdo distinto do original, mas concordante com a Constituição.80 Essa atividade legislativa desempenhada pelo Judiciário é fruto do dinamismo social, que não se opera na mesma velocidade da atualização normativa. Com isso, tem-se verificado ao longo do tempo, o aumento de sentenças manipulativas. Para Augusto Martin de La Veja, em obra de Gilmar Ferreira Mendes essa proliferação de sentenças manipulativas decorre de três fatores: 1- a existência de uma Carta política de perfil marcadamente programático e destinada a progressivo desenvolvimento; 2- a permanência de um ordenamento jurídico-positivo com marcados resquícios autoritários; 3- ineficácia do Legislativo para responder, em tempo adequado, às exigências de atuação da Constituição e à responder, em tempo adequado, às exigências de atuação da Constituição e à conformação do ordenamento preexistente ao novo regime constitucional”.81 A utilização de sentenças manipulativas não é verificada apenas nas decisões proferidas em sede de controle concentrado de constitucionalidade, mas também nas ações diretas e através de remédios constitucionais.82. O julgamento conjunto da ADPF n. 132/RJ e da ADI 4.277/DF pelo STF no qual foi reconhecida, por unanimidade, a união homoafetiva como entidade familiar representa um caso típico de sentença manipulativa além de um marco para o direito brasileiro. Isso porque, tanto a Constituição como o Código Civil, não dispunham expressamente sobre a união homoafetiva, reconhecendo como entidade familiar apenas a união entre homem e mulher. Conforme artigo 226, § 3º, CF: Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) § 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. O artigo 1723 do CC dispõe que: Art. 1.723 - É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de Constituição de família. Contudo o STF deu novo sentido ao texto constitucional e ao Código Civil, pela via interpretativa, operando-se, portanto, uma típica mutação constitucional, por meio de uma “interpretação conforme a Constituição.” Essa mutação foi proveniente da evolução da sociedade e principalmente da evolução da concepção de entidade familiar, a qual, na atualidade, não se restringe apenas, à relação entre homem e mulher. Diante dessa nova realidade, o Judiciário resolveu se posicionar para realizar a adequação do texto constitucional e do Código Civil, assumindo, no entanto, o papel do Poder Legislativo, ante a sua inércia. A decisão foi proferida com base em princípios constitucionais, dentre os quais, a proibição da discriminação de pessoas em razão do sexo, da igualdade e o respeito à dignidade da pessoa humana como garantia da plena liberdade de escolha sexual, decorrente da autonomia de vontade. 17. CONCLUSÃO O presente trabalho teve como objetivo principal possibilitar a reflexão do fenômeno da mutação constitucional. Foram analisados os aspectos históricos, conceito, terminologias utilizadas, suas espécies e limitações, sua utilização por meio da interpretação judicial e das sentenças manipulativas. Além disso, foi feita uma análise do posicionamento do STF sobre o tema e um comparativo em relação ao princípio da separação de poderes. Quanto ao conceito, conclui-se que a mutação corresponde a um processo informal de mudança em que é dado um novo sentido à norma sem modificação do texto. Sendo a Constituição, o modo de ser do Estado, deve refletir a realidade social de seu povo. Logo, para que essa adequação do texto constitucional à situação fático social seja concretizada, a Constituição não pode ser estática, pois a sociedade está em constante evolução. Neste ponto é que se nota a importância da mutação constitucional como instrumento de interpretação da norma, pois possibilita o equilíbrio entre a estabilidade da Constituição e o dinamismo da sociedade, sem necessitar passar por processo burocrático e demorado. Quanto aos limites de sua aplicação verificou-se não haver pacificação na doutrina, nem mesmo o Supremo Tribunal Federal possui entendimento consolidado sobre o tema, o qual tem sido objeto de grandes debates e divergências entre os Ministros, como por exemplo, na Reclamação 4.335/AC. Essa divergência advém da ausência de previsão legal ou de um estudo estruturado que delimite a mutação constitucional, o que torna sua análise subjetiva. A dificuldade em se estabelecer tais limites decorre da multiplicidade de causas que poderiam dar ensejo à mutação, pois derivam da evolução da sociedade e de fatos sociais, impossíveis de serem previstos de forma objetiva e esquematizada. Sou favorável à utilização da mutação como uma renovação semântica do texto decorrente da evolução da sociedade, pois a Constituição, por ser a lei fundamental de um Estado não pode ser totalmente estática e insensível aos acontecimentos. Tampouco, em se tratando de uma Constituição rígida, uma simples adequação de significado da norma não pode ficar à mercê do dificultoso processo de reforma formal. Entretanto, a utilização desse processo informal de mudança não pode ficar apenas a critério da consciência do intérprete, pois consistiria na outorga de uma legitimidade legislativa, não prevista constitucionalmente, podendo representar uma violação à separação de poderes. É necessário que sejam respeitados parâmetros, pois qualquer entendimento contrário importaria risco ao Estado Democrático de Direito. Se até mesmo as reformas por processos formais possuem limites, tanto materiais quanto formais, como admitir que a alteração por processo informal seja realizada indiscriminadamente? A mutação constitucional encontra limites no próprio texto constitucional não podendo, de forma alguma contrariá-lo. Seu objetivo consiste em adequar o sentido da palavra ao novo significado em atendimento à nova realidade. Desta forma, um exemplo de típica mutação constitucional consiste no reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar, no julgamento conjunto da ADPF n. 132/RJ e da ADI 4.277/DF pelo STF. Tal reconhecimento não constitui afronta à Constituição, pois se encontra em total consonância com os princípios constitucionais. Ademais, é nítida a evolução do conceito de entidade familiar sofrido no decorrer dos anos, não comportando o reconhecimento da união homoafetiva inovação, mas apenas uma aceitação do que já está consolidado na vida prática da sociedade. Tanto a Constituição Federal quanto o Código Civil ao reconhecerem a relação entre homem e mulher como entidade familiar não o fazem com o intuito de proibir outros tipos de relacionamentos, pois se fosse essa a intenção do constituinte deveria fazê-lo expressamente. Logo, se a Constituição não proíbe, torna-se plenamente possível a extensão dos mesmos direitos ao relacionamento de pessoas do mesmo sexo. Entretanto, o mesmo entendimento não pode ser verificado no debate sobre a aplicação da mutação constitucional do artigo 52, X, da CF no julgamento da Reclamação 4.335/AC. O que se pretende na Reclamação é retirar a competência atribuída constitucionalmente ao Senado de suspensão da norma declarada inconstitucional pelo Supremo, prevista no artigo 52, X, da CF, transformando-o em simples órgão de publicidade das decisões proferidas em controle difuso de constitucionalidade. Com isso as decisões proferidas pelo STF em controle difuso passariam a ter efeito erga omnes e vinculante contrariando toda a doutrina já consolidada sobre o tema. Neste caso, entendo ser totalmente incabível a utilização da mutação, pois, é inadmissível a alteração do próprio texto constitucional via interpretação, o que configuraria uma manobra do Poder Judiciário para se obter o resultado pretendido exercendo de forma arbitrária a função do Poder Legislativo. Ademais, a retirada de competência do Senado por simples interpretação do Judiciário violaria o princípio da separação de poderes, o qual ressalte-se, constitui cláusula pétrea não podendo sequer ser abolida por Emenda constitucional. O artigo 52, X, da CF é claro, não cabendo qualquer análise distinta do que está escrito. Certo ou errado, obsoleto ou não foi o constituinte que optou em atribuir a referida competência ao Senado, logo, sua vontade deve ser respeitada não podendo em hipótese alguma o intérprete alterá-la. Merecem ainda maior cautela as decisões proferidas pelo STF, pois são soberanas não estando, portanto, sujeitas a qualquer controle por outro órgão. Diante disso, a mutação não deve ser utilizada de forma indiscriminada, mas com responsabilidade e ponderação, respeitando os limites de interpretação em geral e principalmente os limites da própria Constituição. 18. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADI-MC 267-8, voto do Relator, Ministro Celso de Mello. Disponível em: Acesso em 14.09.2013. ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 17ª ed. atual. São Paulo: Editora Verbatim, 2013. BARATA, Rodrigo Sarmento. A Mutação Constitucional e o STF: Sua utilização e algumas perspectivas. Monografia apresentada à Escola de Formação da Sociedade Brasileira de Direito Público – SBDP. Disponível em: Acesso em 18-09-2013. BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e Interpretação Constitucional. 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São Paulo: Malheiros, 1998. 1 José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 39 e 41. 2 Paulo Bonavides, Curso de Direito Constitucional, p. 84. 3 Ricardo Cunha Chimenti; Marisa Ferreira dos Santos; Márcio Fernando Elias Rosa; Fernando Capez, Curso de Direito Constitucional, pag. 1. 4 Direito Constitucional, p.6. 5 José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 40, 41 6 Pinto Ferreira apud José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 41 7 Alexandre de Moraes apud Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado, p. 77. 8 Direito Constitucional Esquematizado, p. 77. 9 Curso de Direito Constitucional, p. 86 10 José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 39 11 Pinto Ferreira apud José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, p.47. 12 Direito Constitucional, p. 26. 13 Constitucional Esquematizado, p. 62. 14 Manoel Gomes Ferreira Filho apud Alexandre de Moraes, Direito Constitucional, p. 27. 15 Michel Temer apud Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado, p. 185. 16 Direito Constitucional Esquematizado, p. 64 17 Anna Cândida da Cunha Ferraz apud Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado, p. 67. 18 Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado, p. 70. 19 Luiz Alberto David Araújo; Vidal Serrano Nunes Júnior, Curso de Direito Constitucional, pag 119 20 Curso de Direito Constitucional, p. 145. 21 J.J. Gomes Canotilho apud Alexandre de Moraes, Direito Constitucional, p.15. 22 Luiz Alberto David Araújo; Vidal Serrano Nunes Júnior, Curso de Direito Constitucional, pag 128 23 Ibidem, pag 127 24 G. F. Mendes, I. M. Coelho; P.G.G. Branco, Curso de Direito Constitucional, p. 187 25 Uadi Lammêgo Bulos. Da reforma à mutação constitucional. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 33, n.º129, jan./mar., 1996, p. 26 26 Ibid., mesma página 27 Hsü Dau-Lin apud Uadi Lammêgo Bulos. Da reforma à mutação constitucional. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 33, n.º129, jan./mar., 1996, p. 26 28 Uadi Lammêgo Bulos. Da reforma à mutação constitucional. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 33, n.º129, jan./mar., 1996, p. 26 29 Miguel Reale apud G. F. Mendes; I. M. Coelho; P.G.G. Branco, Curso de Direito Constitucional, p. 188 30 Uadi Lammêgo Bulos apud Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado, p. 59. 31 Paolo Biscai di Ruffia apud Uadi Lammêgo Bulos, Elementos de Direito Constitucional, p. 33. 32 Edivaldo Brito, Limites da Revisão Constitucional, p. 83, 84. 33 Curso de Direito Constitucional, p. 458, 459 34 José Horácio Meirelles Teixeira apud Uadi Lammêgo Bulos. Da reforma à mutação Constitucional. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 33, n.º129, jan./mar., 1996, p. 33 35 Elementos de Direito Constitucional, p. 38 36 Carmen Nasaré Lopes Neves. Mutação Constitucional em face da Hermenêutica Judicial no Controle por via de Exceção. In: Revista da Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Brasília, ano 12, abril, 2004. p. 32. Disponível em: www.escola.mp.org.br/arquivos/revista_2%C2%BA_concurso_de_monografia.pdf> Acesso em: 19-09-2013. 37 Uadi Lammêgo Bulos, Elementos de Direito Constitucional, p. 34, 35 38 Anna Cândida da Cunha Ferraz apud Uadi Lammêgo Bulos, Elementos de Direito Constitucional, p. 33. 39 Hsü Dau-Lin apud Uadi Lammêgo Bulos. Da reforma à mutação constitucional. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 33, n.º129, jan./mar., 1996, p. 30. 40 Hesse apud Edivaldo Brito, Limites da Revisão Constitucional, pag 88. 41 Uadi Lammêgo Bulos. Da reforma à mutação constitucional. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 33, n.º129, jan./mar., 1996, p. 42 42 Heller apud Uadi Lammêgo Bulos. Da reforma à mutação constitucional. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 33, n.º129, jan./mar., 1996, p. 42 43 Nelson de Sousa Sampaio, apud Edivaldo Brito, Limites da Revisão Constitucional, pag 88. 44 Milton Campos apud Uadi Lammêgo Bulos, Elementos de Direito Constitucional, pag 36. 45 Georg Jellinek apud Uadi Lammêgo Bulos. Da reforma à mutação constitucional. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 33, n.º129, jan./mar., 1996, p. 42, 43 46 Uadi Lammêgo Bulos. Da reforma à mutação constitucional. In: Revista de Informação Legislativa , Brasília, ano 33, n.º129, jan./mar., 1996, p. 34 47 Anna Cândida da Cunha Ferraz apud Uadi Lammêgo Bulos. Da reforma à mutação constitucional. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 33, n.º129, jan./mar., 1996, p. 43. 48 G. F. Mendes, I. M. Coelho, P.G.G. Branco, Curso de Direito Constitucional, p. 193, 194 49 Supremo Tribunal Federal, Notícias STF. Disponível em: www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalheasp?idConteudo=238713> Acesso em 05-09-2013. 50 Rcl. 4.335-5/AC, voto Min. Gilmar Mendes, passim. 51 Rcl. 4.335-5/AC, voto Min. Gilmar Mendes, p. 56. 52 Rcl. 4.335-5/AC, voto Min. Gilmar Mendes, p. 36, 37. 53 Rcl. 4.335-5/AC, voto Min. Eros Grau, passim. 54 Ibid, p. 5. 55 Ibid, p. 9. 56 Ibid, p. 10. 57 Rcl. 4.335-5/AC, voto Min. Ricardo Lewandowski, passim. 58 Rcl. 4.335-5/AC, voto Min. Ricardo Lewandowski, p. 10. 59 Konrad Hesse apud Rcl. 4.335-5/AC, voto Min. Ricardo Lewandowski, p. 12. 60 Rcl. 4.335-5/AC, voto Min. Ricardo Lewandowski, p. 12 61 José Afonso da Silva apud Rcl. 4.335-5/AC, voto Min. Ricardo Lewandowski, p. 14. 62 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo de jurisprudência n. 463. Disponível em: www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo463.htm Acesso em 12-09-2013. 63 Ibid., mesma página. 64 Ibid., mesma página. 65 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo de jurisprudência n. 463. Disponível em: www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo463.htm. Acesso em 12-09-2013. 66 Jurisdição Constitucional e Legitimidade: Algumas Observações sobre o Brasil. Revista da Smarn, v.7, n. 1, 2008. p. 13. Disponível em: www.esmarnt.jrn.jus.br/revistas/indexphp/revista_da_esmarn/article/view/50/39> Acesso em 13-09-2013. 67 Jurisdição Constitucional e Legitimidade: Algumas Observações sobre o Brasil. Revista da Smarn, p. 21. Disponível em: www.esmarnt.jrn.jus.br/revistas/indexphp/revista_da_esmarn/article/view/50/39> Acesso em 13-09-2013. 68 Gilmar Ferreira Mendes apud Germana Parente Neiva Belchior. Supremo Tribunal Federal, Legitimidade e Corte Constitucional. p. 208. Disponível em: www.esmarn.tjrn.jus.br/revistas/index.php/revista_direito_e_liberdade/article/view/25/12>Acesso em 10-09-2013. 69 José de Albuquerque apud Ibid., p. 209. 70 Hermenêutica e Interpretação Constitucional, p. 165 71 J.J. Gomes Canotilho apud Alexandre de Moraes, Direito Constitucional, p. 17. 72 Curso de Direito Constitucional, p. 1430 73 Jurisdição Constitucional e Legitimidade: Algumas Observações sobre o Brasil. Revista da Smarn, p. 9. Disponível em: www.esmarnt.jrn.jus.br/revistas/index.php/revista_da_esmarn/article/view/50/39> Acesso em 13-09-2013. 74 Montesquieu apud G. F. Mendes; I. M. Coelho; P.G.G. Branco, Curso de Direito Constitucional, p. 219 75 Dimitri apud Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado, p. 430. 76 Anna Cândida da Cunha Ferraz, Conflito Entre Poderes: O Poder Congressual de sustar atos normativos do Poder Executivo, p. 21. 77 G. F. Mendes; I. M. Coelho; P.G.G. Branco, Curso de Direito Constitucional p. 156. 78 Rodrigo Sarmento Barata, A Mutação Constitucional e o STF: Sua utilização e algumas perspectivas. Monografia apresentada à Escola de Formação da Sociedade Brasileira de Direito Público – SBDP. p. 62. Disponível em: www.sbdp.org.br/arquivos/monografia/152_Monografia%20Rodrigo.pdf> Acesso em 18-09-2013. 79 ADI-MC 267-8, voto do Relator, Ministro Celso de Mello, p. 195. Disponível em: redirstfjusbr/paginadorpub/paginadorjsp?docTP=AC&docID=346276 Acesso em 14.09.2013. 80 G. F. Mendes; I. M. Coelho; P.G.G. Branco, Curso de Direito Constitucional, p. 1432 81 Augusto Martin de La Veja apud G. F. Mendes; I. M. Coelho; P.G.G. Branco, Curso de Direito Constitucional, p. 1433 82 G. F. Mendes; I. M. Coelho; P.G.G. Branco, Curso de Direito Constitucional, p. 1434 Publicado por: MARCELA JESUS DE OLIVEIRA O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Monografias. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com. 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