Requisição administrativa em tempos de pandemia
Em que consiste o fenômeno da requisição
administrativa?
Requisição é o instrumento de intervenção
estatal mediante o qual, em situação de perigo público iminente, o Estado
utiliza bens móveis, imóveis ou serviços particulares com indenização ulterior,
se houver dano.
Conforme o Prof. Hely Lopes, requisição é a utilização
coativa de bens ou serviços particulares pelo Poder Público por ato de execução
imediata e direta da autoridade requisitante e indenização ulterior, para
atendimento de necessidades coletivas urgentes e transitórias.
Há, na vigente Constituição, previsão expressa para o
instituto (CF, art. 5º, XXV):
No caso de iminente perigo público, a autoridade competente
poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização
ulterior, se houver dano.
A requisição administrativa pode ser civil ou militar. A
requisição militar objetiva o resguardo da segurança interna e a manutenção da
soberania nacional, diante de conflito armado, à saúde e aos bens da
coletividade, diante de inundação, incêndio, sonegação de gêneros de primeira
necessidade, epidemias, catástrofes etc.
Referência :
Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo. Direito
Administrativo. 3ª edição. Impetus. 2002.
- Marcelo Alonso
Fonte: Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes
https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/2143678/em-que-consiste-o-fenomeno-da-requisicao-administrativa-marcelo-alonso
- CF
·
...
·
CAPÍTULO I DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
·
Vide
Art. 5º
Todos são
iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
[...]
XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá
usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização
ulterior, se houver dano;
https://brasil.mylex.net/legislacao/constituicao-federal-cf-art5_8488.html
XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente
poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização
ulterior, se houver dano;
|
[MS 25.295,
rel. min. Joaquim Barbosa, j. 20-4-2005, P, DJ de
5-10-2007.]
|
http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp
DECRETO Nº 5.392 DE 10 DE MARÇO
DE 2005.
Declara estado de calamidade
pública no setor hospitalar do Sistema Único de Saúde no Município do Rio de
Janeiro, e dá outras providências.
|
O PRESIDENTE
DA REPÚBLICA , no uso
da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VI, alínea "a", da
Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 196 da Constituição, e
Considerando a deficiência das ações e serviços de
saúde no município do Rio de Janeiro e a situação dramática a que se chegou,
com notório prejuízo do atendimento na rede hospitalar e das unidades do
serviço de saúde, com grave risco para a própria preservação da vida humana,
Considerando que o Estado do Rio de Janeiro está
habilitado na gestão plena do sistema de saúde, de acordo com a Norma
Operacional de Assistência nº 01/2002,
Considerando a necessidade de ações para
atendimento emergencial na área de saúde daquela localidade,
Considerando, finalmente, que tal conjuntura impõe
ao Governo Federal a adoção de medidas urgentes e especiais;
DECRETA:
Art. 1º É declarado estado de calamidade
pública no setor hospitalar do Sistema Único de Saúde no Município do Rio de
Janeiro.
Art. 2º Enquanto perdurar o estado de
calamidade referido no art 1º , ficam requisitados, nos termos do art. 15, inciso XIII, da Lei nº 8.080, de 19 de
setembro de 1990, pelo Ministro de Estado da Saúde, os bens,
serviços e servidores afetos aos seguintes hospitais:
I - Hospital da Lagoa - CNPJ nº 03875022000193;
II - Hospital Municipal do Andaraí - CNPJ nº
03875072000170;
III - Hospital Geral de Jacarepaguá (Hospital
Cardoso Fontes) - CNPJ nº 03389886000103;
IV - Hospital Geral de Ipanema - CNPJ nº
03875087000139;
V - Hospital Municipal Souza Aguiar - CNPJ nº
29468055000293;
VI - Hospital Municipal Miguel Couto - CNPJ nº
29468055000374.
§ 1º Se necessário, o Ministério da Saúde
poderá também requisitar outros serviços de saúde públicos e privados
disponíveis, com vistas ao restabelecimento da normalidade dos atendimentos.
§ 2º O Ministro de Estado da Saúde poderá
requisitar, ainda, todos os recursos financeiros afetos à gestão de serviços e
ações que se fizerem necessárias aos hospitais a que se refere este artigo.
Art. 3º Para fins do disposto no art. 2º ,
fica o Ministério da Saúde autorizado a promover compras emergenciais de
equipamentos, medicamentos, insumos e suprimentos, observado o disposto
na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.
Art. 5º No período em que perdurar o estado de
calamidade, fica autorizado o Ministério da Saúde, nos termos do art. 2º , inciso I, da Lei nº 8.745, de 9 de dezembro
de 1993, a promover a contratação temporária de pessoal, em
caráter excepcional, com vistas a suprir as necessidades dos hospitais a que se
refere o art. 2º , observadas as disposições legais pertinentes.
Art. 6º Este Decreto entra em vigor na data de
sua publicação.
Brasília, 10 de março de 2005; 184º da
Independência e 117º da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Humberto Sérgio Costa Lima
Humberto Sérgio Costa Lima
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de
11.3.2005
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/D5392.htm
20/04/2005 TRIBUNAL PLENO MANDADO DE SEGURANÇA 25.295-2
DISTRITO FEDERAL V O T O O
SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Ninguém ignora, Senhor Presidente,
que a requisição de bens e/ou serviços, nos termos em que prevista pela
Constituição da República (art. 5º, inciso XXV), somente pode incidir sobre a
“propriedade particular”, conforme adverte autorizado magistério doutrinário
(CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, “Curso de Direito Administrativo”, p. 797/98,
item n. 67, 17ª ed., 2004, Malheiros; JOSÉ CARLOS DE MORAES SALLES, “A
Desapropriação à Luz da Doutrina e da Jurisprudência”, p. 815/820, itens ns.
1/6, 4ª ed., 2000, RT; DIOGO DE FIGUEIREDO MOREIRA NETO, “Curso de Direito
Administrativo”, p. 375/376, item n. 114.2, 14ª ed., 2005, Forense; CARLOS ARI
SUNDFELD, “Direito Administrativo Ordenador”, p. 111/112, itens ns. 25/26, 1ª
ed./3ª tir., 2003, Malheiros; HELY LOPES MEIRELLES, “Direito Administrativo
Brasileiro”, p. 601/603, 28ª ed., obra atualizada por EURICO DE ANDRADE
AZEVEDO, DÉLCIO BALESTERO ALEIXO e JOSÉ EMMANUEL BURLE FILHO, 2003, Malheiros;
EDIMUR FERREIRA DE FARIA, “Curso de Direito Administrativo Positivo”, p.
388/390, itens ns. 1.2/1.3, 1997, Del Rey; JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO,
“Manual de Direito Administrativo”, p. 702/709, itens ns. VII e VIII, 12ª ed.,
2005, Lumen Juris; JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, “Direito Administrativo Brasileiro”,
p. 570/572, item n. 443, 1999, Forense; DIÓGENES GASPARINI, “Direito
Administrativo”, p. 299/300, item n. 3.5, 1989, Saraiva; LÚCIA VALLE
FIGUEIREDO, “Curso de Direito Administrativo”, p. 310/311, item n. 8, 7ª ed.,
2004, Malheiros; JOSÉ AFONSO DA SILVA, “Curso de Direito Constitucional
Positivo”, p. 281, item n. 12, 24ª ed., 2005, Malheiros; ALEXANDRE DE MORAES,
“Constituição do Brasil Interpretada”, p. 271/272, item n. 5.47, 2ª ed., 2003,
Atlas, v.g.). Isso significa, portanto, que, em contexto de normalidade
institucional, os bens integrantes do patrimônio público estadual e municipal
acham-se excluídos, porque a ele imunes, do alcance desse extraordinário poder
que a Lei Fundamental, tratando-se, unicamente, “de propriedade particular”,
outorgou à União Federal (art. 5º, XXV), ressalvadas as situações excepcionais,
que, fundadas no estado de defesa (CF, art. 136, § 1º, II), outorgam, ao
Presidente da República, os denominados “poderes de crise”, cujo exercício está
sujeito à rígida observância, pelo Chefe do Executivo, dos limites formais e
materiais definidos pelo modelo jurídico que regula, em nosso ordenamento
positivo, o sistema constitucional de crises ou de legalidade extraordinária,
conforme ressaltam eminentes doutrinadores (UADI LAMMÊGO BULOS, “Constituição
Federal Anotada”, p. 1.118/1.129, 5ª ed., 2003, Saraiva; ALEXANDRE DE MORAES,
“Constituição do Brasil Interpretada”, p. 1.629/1.640, 2ª ed., 2003, Atlas;
JOSÉ AFONSO DA SILVA, “Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 736/746,
22ª ed., 2003, Malheiros; WALTER CENEVIVA, “Direito Constitucional Brasileiro”,
p. 317/323, 3ª ed., 2003, Saraiva, v.g.). É por essa razão que MANOEL GONÇALVES
FERREIRA FILHO (“Comentários à Constituição Brasileira de 1988”, vol. 3/60-61,
1994, Saraiva), ao versar o tema pertinente às medidas extraordinárias
autorizadas pelo estado de defesa, observa, quanto ao alcance do poder de requisição
federal, que tal instituto incide sobre “bens e serviços, inclusive públicos”,
podendo estender-se, em conseqüência, vigente esse mecanismo constitucional de
defesa do Estado, até mesmo, a “bens ou serviços municipais ou estaduais”
(grifei). Vê-se, desse modo, que não se revela lícito, à União Federal, em
período de normalidade institucional, e analisada a questão sob uma perspectiva
de ordem estritamente constitucional, promover a requisição de bens, serviços e
recursos financeiros pertencentes ao Município do Rio de Janeiro, que se
insurge, por isso mesmo, com absoluta razão, contra o decreto emanado do Senhor
Presidente da República.
O exame da controvérsia instaurada nesta sede mandamental -
que envolve matéria de alta indagação constitucional – impõe que a análise da
questão se realize, não com apoio em meros dispositivos legais, mas seja feita,
essencialmente, à luz dos postulados fundamentais que dão suporte à
organização, em nosso sistema institucional, do Estado Federal. O
relacionamento entre as instâncias de poder – União, Estados, Distrito Federal
e Municípios – encontra necessário fundamento na Constituição, que traduz,
nesse contexto, a expressão formal do pacto federal, cujas prescrições não
podem ser transgredidas, sob pena de a autonomia institucional das entidades
federadas, que representa pedra fundamental na estruturação da Federação,
nulificar-se, com evidente ofensa a um dos princípios essenciais que conformam
a organização do Estado Federal em nosso sistema jurídico. Entendo, por isso
mesmo, Senhor Presidente, que a controvérsia ora em exame há de ser resolvida
em face do princípio da autonomia municipal, que representa, no contexto de
nossa organização político-jurídica, uma das pedras angulares sobre as quais se
estrutura o edifício i nstitucional da Federação brasileira. A nova
Constituição da República, promulgada em 1988, prestigiou os Municípios,
reconhecendo-lhes irrecusável capacidade política como pessoas integrantes da
própria estrutura do Estado Federal brasileiro, atribuindo-lhes esferas mais
abrangentes reservadas ao exercício de sua liberdade decisória, notadamente no
que concerne à disciplinação de temas associados ao exercício do seu poder de
auto-organização, de autogoverno e de auto-administração. O artigo 29 da
Constituição da República representa, na realidade, o substrato
consubstanciador, o núcleo expressivo de outorga dessa autonomia institucional
às entidades municipais. A Constituição da República, no preceito mencionado,
dispõe que o Município reger-se-á por lei orgânica, que se qualifica como
verdadeiro estatuto constitucional das pessoas municipais. Cabe assinalar,
neste ponto, que a autonomia municipal erige-se à condição de princípio
estruturante da organização institucional do Estado brasileiro, qualificando-se
como prerrogativa política, que, outorgada ao Município pela própria
Constituição da República, somente por esta pode ser validamente limitada,
consoante observa HELY LOPES MEIRELLES, em obra clássica de nossa literatura
jurídica (“Direito Municipal Brasileiro”, p. 80/82, 6ª ed./3ª tir., 1993,
Malheiros): “A Autonomia não é poder originário. É prerrogativa política
concedida e limitada pela Constituição Federal. Tanto os Estados-membros como
os Municípios têm a sua autonomia garantida constitucionalmente, não como um
poder de autogoverno decorrente da Soberania Nacional, mas como um direito
público subjetivo de organizar o seu governo e prover a sua Administração, nos
limites que a Lei Maior lhes traça. No regime constitucional vigente, não nos
parece que a autonomia municipal seja delegação do Estado-membro ao Município
para prover a sua Administração. É mais que delegação; é faculdade política,
reconhecida na própria Constituição da República. Há, pois, um minimum de
autonomia constitucional assegurado ao Município, e para cuja utilização não
depende a Comuna de qualquer delegação do Estado-membro.” (grifei) Essa mesma
orientação já era perfilhada por SAMPAIO DORIA (“Autonomia dos Municípios”, in
Revista da Faculdade de Direito de São Paulo, vol. XXIV/419-432, 1928), cujo
magistério – exposto sob a égide de nossa primeira Constituição republicana
(1891) – bem ressaltava a extração constitucional dessa insuprimível
prerrogativa político-jurídica que a Carta Federal, ela própria, atribuiu aos
Municípios. Sob tal perspectiva, e como projeção concretizadora desse
expressivo postulado constitucional, ganha relevo, a meu juízo, no exame da
presente controvérsia, a garantia institucional da autonomia política, fundada
no próprio texto da Constituição da República. Tenho para mim, desse modo – ao
reconhecer que existe, em favor da autonomia municipal, uma “garantia
institucional do mínimo intangível” (PAULO BONAVIDES, “Curso de Direito
Constitucional”, p. 320/322, item n. 7, 12ª ed., 2002, Malheiros) – que o art.
29 da Carta Política não autoriza a utilização de recursos hermenêuticos cujo
emprego possa importar em grave vulneração à autonomia constitucional dos
Municípios, especialmente se se considerar que a Constituição da República
criou, em benefício das pessoas municipais, um espaço mínimo de liberdade
decisória que não pode ser afetado, nem comprometido, em seu concreto
exercício, por ingerências normativas ou político-administrativas de outras
entidades estatais ou, como decorreria da tese sustentada pelo Senhor
Presidente da República, por interpretações que culminassem por lesar o mínimo
essencial inerente ao conjunto (irredutível) das atribuições constitucionalmente
deferidas aos Municípios. O exame do decreto presidencial, considerado o seu
próprio conteúdo, permite que nele se reconheça um indisfarçável (e
inaceitável) caráter interventivo, claramente transgressor da ordem
constitucional vigente no Estado brasileiro. O fato é que a adoção de
mecanismos excepcionais não poderá traduzir, como sucede na espécie, meio
dissimulado da prática de atos de nítido caráter interventivo, cuja utilização
- tratando-se da União em suas relações com os Municípios - é expressamente
vedada pela Constituição, pois, não custa advertir, os Municípios, exceto
aqueles situados em territórios federais (CF, art. 35, “caput”), não podem
sofrer intervenção decretada pela União Federal. Essa particular circunstância
qualifica-se, no caso ora em exame, como dado juridicamente relevante, pois, no
sistema constitucional brasileiro, não há possibilidade de a União intervir em
quaisquer Municípios, ressalvados, unicamente, os Municípios “localizados em
Território Federal...” (CF, art. 35, “caput”). Desse modo, os Municípios
situados no âmbito dos Estados-membros, como sucede com o Município do Rio de
Janeiro, não se expõem à possibilidade constitucional de sofrerem intervenção
decretada pela União Federal, eis que, relativamente a esses entes municipais,
a única pessoa política ativamente legitimada a neles intervir é o
Estado-membro, consoante adverte o magistério da doutrina (ALEXANDRE DE MORAES,
“Direito Constitucional”, p. 280, item n. 3.3, 4ª ed., 1998, Atlas; MANOEL
GONÇALVES FERREIRA FILHO, “Comentários à Constituição Brasileira de 1988”, vol.
1/236, 1990, Saraiva; CELSO RIBEIRO BASTOS e IVES GANDRA MARTINS, “Comentários
à Constituição do Brasil”, vol. 3, tomo II/353, 1993, Saraiva; PINTO FERREIRA,
“Comentários à Constituição Brasileira”, vol. 2/352, 1990, Saraiva; JOSÉ
CRETELLA JÚNIOR, “Comentários à Constituição Brasileira de 1988”, vol. IV/2091,
item n. 184, 1991, Forense Universitária; JOSÉ AFONSO DA SILVA, “Curso de
Direito Constitucional Positivo”, p. 483 e 488, 15ª ed., 1998, Malheiros, Cumpre
enfatizar, no ponto, por relevante, que esse entendimento encontra pleno
suporte no magistério jurisprudencial que esta Suprema Corte firmou na matéria
em causa: “IMPOSSIBILIDADE DE DECRETAÇÃO DE INTERVENÇÃO FEDERAL EM MUNICÍPIO
LOCALIZADO EM ESTADO-MEMBRO. - Os Municípios situados no âmbito dos
Estados-membros não se expõem à possibilidade constitucional de sofrerem
intervenção decretada pela União Federal, eis que, relativamente a esses entes
municipais, a única pessoa política ativamente legitimada a neles intervir é o
Estado-membro. Magistério da doutrina. Por isso mesmo, no sistema
constitucional brasileiro, falece legitimidade ativa à União Federal para
intervir em quaisquer Municípios, ressalvados, unicamente, os Municípios
‘localizados em Território Federal...’ (CF, art. 35, caput).” (RTJ 167/6-7,
Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno) No caso, e como já destacado nos votos
precedentes, registrou-se hipótese expressamente vedada pela Constituição, o
que não pode ser tolerado por esta Suprema Corte. Concluo o meu voto, Senhor
Presidente. E, ao fazê-lo, ressalto que o ato do Senhor Presidente da
República, objeto de impugnação nesta sede mandamental, não obstante veiculado
com a finalidade de promover a requisição de bens e serviços do Município do
Rio de Janeiro/RJ, qualifica-se – considerado o seu próprio conteúdo – como
medida de nítido caráter interventivo, incidindo, por isso mesmo, em clara
transgressão ao que dispõe a Constituição da República.
O vício de inconstitucionalidade que afeta e compromete o
decreto presidencial em questão é suscetível de reconhecimento, no caso ora em
exame, por dois motivos: primeiro, porque a União Federal não dispõe de
legitimidade para requisitar bens, serviços e recursos financeiros pertencentes
a qualquer Município, eis que a prerrogativa a que se refere o art. 5º, XXV, da
Constituição, em contexto de normalidade institucional, somente pode incidir
sobre a “propriedade particular”; e segundo, porque qualquer requisição
dirigida a um Município, como ocorreu na espécie, traduzirá, na realidade,
indisfarçável ato de intervenção federal, absolutamente incabível, em face do
que prescreve a Carta Política, que não admite a possibilidade de intervenção
federal em municípios situados em território dos Estados-membros (CF, art. 35,
“caput”), conforme já advertiu o Plenário desta Suprema Corte (RTJ 167/6-7,
Rel. Min. CELSO DE MELLO). Sendo assim, e consideradas as razões expostas,
defiro, integralmente, nos termos em que impetrado, o presente mandado de
segurança, em ordem a invalidar, por absolutamente inconstitucional, o decreto
do Senhor Presidente da República. É o meu voto.
http://www.stf.jus.br/imprensa/pdf/MS-25295.pdf
Art. 35. O
Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios
localizados em Território Federal, exceto quando:
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[Súmula 637.]
|
[ADI 336, voto do rel. min. Eros Grau,
j. 10-2-2010, P, DJE de 17-9-2010.]
|
[ADI 2.631, rel. min. Carlos Velloso, j.
29-8-2002, P, DJ de 8-8-2003.]
|
[ADI 614 MC,
rel. min. Ilmar Galvão, j. 14-10-1992, P, DJ de 18-5-2001.]
|
[AI 597.466
AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, j. 27-11-2007, 2ª
T, DJE de 1º-2-2008.]
|
[IF 590 QO,
rel. min. Celso de Mello, j. 17-9-1998, P, DJ de 9-10-1998.]
|
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[ADI 558 MC, rel. min. Sepúlveda Pertence,
j. 16-8-1991, P, DJ de 26-3-1993.]
|
|
IV - o Tribunal de Justiça der provimento a
representação para assegurar a observância de princípios indicados na
Constituição Estadual, ou para prover a execução de lei, de ordem ou de
decisão judicial.
|
[Rcl 2.143 AgR, rel. min. Celso de Mello,
j. 12-3-2003, P, DJ de 6-6-2003.]
|
[AI 343.461 AgR, rel. min. Celso de Mello,
j. 18-6-2002, 2ª T, DJ de 29-11-2002.]
|
[Pet 1.256,
rel. min. Sepúlveda Pertence, j. 4-11-1998, P, DJ de
4-5-2001.]
|
http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp#473
REGULAÇÃO
Requisição
administrativa em tempos de pandemia
Determinação
deve sempre ser acompanhada de avaliação criteriosa por parte do Poder Público
quanto às alternativas existentes
WELLINGTON MÁRCIO KUBLISCKAS
EDUARDO XAVIER
CLARA COUTINHO
BETO VASCONCELOS
09/04/2020
13:48
Foto: Marco
Santos / Ag.Pará
PARCERIA
DE CONTEÚDO
Espaço
voltado à análise e proposição de soluções para os sistemas de regulação do
país e seu respectivo impacto para o desenvolvimento socioeconômico do Brasil.
Profissionais de diversas áreas –órgãos públicos reguladores, agentes privados
regulados e do meio acadêmico– produzirão conteúdo para a página.
No último
dia 30 de janeiro, a Organização Mundial da Saúde – OMS decretou “estado
de emergência em saúde pública de importância internacional” em função
do novo coronavírus. No dia 11 de março, a OMS declarou que a contaminação
havia atingido o estado de pandemia, em função do alto índice de contágio e de
seu alcance mundial.
Em
decorrência disso, diversos países do mundo passaram a adotar providências
excepcionais e temporárias voltadas ao enfrentamento da COVID-19.
No
Brasil, em âmbito federal, entre outras providências, foram editados a Portaria
MS/GM nº 188/2020, que dispõe sobre a Declaração de Emergência em Saúde Pública
de Importância Nacional; a Lei n.º 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas
para enfrentamento ao novo coronavírus; a Portaria MS/GM n.º 356/2020, que
regulamenta a Lei nº 13.979/2020; e o Decreto Legislativo nº 06/2020, que
reconheceu Estado de Calamidade Pública em todo o território nacional.
No mesmo
caminho, nos Estados, no Distrito Federal e nos Municípios, seguem sendo
impostas normas determinando o isolamento social, o fechamento do comércio, a
suspensão de serviços não essenciais, entre inúmeras outras.
Das
normas recentemente editadas, destaca-se a regra contida no art. 3º, inciso
VII, da Lei Federal n.º 13.979/2020, ao estabelecer que “para enfrentamento
da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do
coronavírus, poderão ser adotadas, entre outras, as seguintes medidas:
(…) requisição de bens e serviços de pessoas naturais e jurídicas,
hipótese em que será garantido o pagamento posterior de indenização justa”.
O art.
3º, inciso VII, da Lei n.º 13.979/2020, em linhas gerais, repete o disposto no
art. 15, inciso XIII, da Lei nº 8.080/1990 – conhecida como a Lei do Sistema
Único de Saúde – SUS -, que estabelece a possibilidade da União, Estados,
Distrito Federal e Municípios requisitarem bens e serviços para atendimento de
necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de
perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias, tanto de pessoas
naturais como de jurídicas, sendo-lhes assegurada justa indenização.
As regras
veiculadas no art. 15, inciso XIII, da Lei n.º 8.080/1990, e no art. 3º, inciso
VII, da Lei n.º 13.979/2020, assim como outros dispositivos presentes em nosso
ordenamento1,
são desdobramentos do instituto da requisição administrativa,
previsto no art. 5º, inciso XXV, da Constituição.
De modo
bastante simplificado, a requisição administrativa pode ser definida como “(…)
o ato [administrativo] pelo qual o Estado, em proveito de um
interesse público [perigo público iminente], constitui alguém, de
modo unilateral e auto executório, na obrigação de prestar-lhe um serviço ou
ceder-lhe transitoriamente o uso de uma coisa in natura,
obrigando-se a indenizar os prejuízos que tal medida efetivamente acarretar ao
obrigado”.2
A requisição
administrativa é uma forma extrema de intervenção do Estado na
propriedade privada, pois possibilita ao Poder Executivo, unilateralmente e sem
a necessidade de mediação por parte do Poder Judiciário, fazer uso de bens e
serviços particulares, de modo imediato e compulsório, com indenização
posterior ao privado afetado.
Trata-se,
pois, de ato excepcional, e, por isso, deve ser determinado somente quando
comprovadamente estiver presente um “perigo público iminente”. Caso contrário,
a medida poderá ser considerada abusiva e nula de pleno direito.3
No setor
da saúde, o instituto da requisição administrativa vinha sendo utilizado em
situações pontuais – e até certo ponto raras – de intervenção por parte do
Poder Público em instituições privadas, sem fins lucrativos, atuantes no setor
médico-hospitalar e que apresentassem comprovadas falhas na prestação dos
serviços, colocando, assim, em risco o atendimento à população.
Com o
aprofundamento da crise gerada pelo novo coronavírus, a requisição
administrativa passou a ser aventada – e, em alguns casos, já efetivamente
implementada – pela União, Estados e Municípios como forma de obter insumos e
equipamentos hospitalares (como máscaras, luvas e respiradores), leitos
hospitalares, serviços de profissionais da saúde e até imóveis para a
instalação de hospitais de campanha.
Ocorre
que têm sido recorrentes notícias de intervenções capitaneadas por órgãos e
entidades da Administração Pública, sem que houvesse atenção a tais requisitos,
o que fez com que o Judiciário decidisse pela ilegalidade e
inconstitucionalidade de sua aplicação4.
Nesse
contexto, tornam-se relevantes algumas linhas sobre o assunto.
A
determinação da requisição administrativa deve sempre ser acompanhada de
avaliação criteriosa por parte do Poder Público quanto às alternativas
existentes – tais como a aquisição dos bens e serviços por dispensa de
licitação (art. 4º da Lei n.º 13.979/2020), a importação de equipamentos e o
estímulo a políticas de reversão industrial.
Além
disso, a requisição administrativa – como todo e qualquer ato administrativo –
deve observar os princípios constitucionais da motivação, da razoabilidade e da
proporcionalidade, podendo ser adotada apenas e tão somente quando restar
comprovada sua necessidade e adequação para a consecução do interesse público.
Ainda, deve ser implementada com pleno respeito aos direitos fundamentais das
pessoas que têm os seus bens e serviços requisitados.
Outro
ponto a ser destacado é que as requisições administrativas devem ser feitas de
forma organizada e coordenada entre os diferentes órgãos e entidades da União,
Estados, Distrito Federal e Municípios, sob pena de restar frustrada a
finalidade do instituto nessa conjuntura, que é o de garantir o atendimento
pleno à população.
Os
primeiros dias de mobilização para o combate à COVID-19 têm sido marcados pela
crescente e preocupante tensão entre os entes federativos na busca de
equipamentos e utensílios demandados pelos respectivos sistemas de saúde, como
pode ser observado em disputas judiciais instauradas nos Estados de Pernambuco5 e
São Paulo.6
De fato,
de acordo com a legislação vigente, União, Estados, Distrito Federal e
Municípios têm competência concorrente para promover ações voltadas ao
atendimento à saúde (art. 23, inciso II, da Constituição), bem como para editar
atos de requisição administrativa7.
Todavia, o relacionamento dos entes federativos, em matéria de requisição
administrativa, deve ser balizado pelos princípios constitucionais da lealdade
federativa e da eficiência.
De acordo
com o princípio da lealdade federativa (“bundestreue”), as unidades
federadas devem sempre atuar (a) de forma leal no
exercício das suas competências próprias, evitando prejudicar os demais entes
federativos e pautando a sua conduta pelo princípio da boa-fé; (b) de forma
solidária, ajudando-se mutuamente sempre que necessário para a manutenção
da coesão federal; e (c) de forma harmônica e
complementar no planejamento e execução de políticas públicas, na
consecução dos objetivos fundamentais e na concretização das determinações
constitucionais de interesse comum.
A postura
de entes federativos, ao disputar a primazia do direito de concretizar a
requisição administrativa de equipamentos de empresas privadas para atender às
demandas locais, pode sim significar a violação do princípio da lealdade
federativa, em especial se a conduta impossibilitar o acesso dos demais entes
federativos aos equipamentos necessários ao atendimento da população localizada
em seus territórios.
Ainda, a
aplicação do instituto de forma pouco criteriosa pode violar o princípio da
eficiência, caso resulte na subutilização dos equipamentos e insumos essenciais
ou, ainda, atrasos no efetivo emprego desses nas ações de enfrentamento ao novo
coronavírus, em vista de provável judicialização ocasionada por alegados
abusos.
Neste
contexto, é imprescindível que os entes federativos busquem alternativas para o
fortalecimento da coordenação e cooperação, como observado pelo Min. Dias
Toffoli em decisão proferida na SL n.º 1.309/SP, nos seguintes termos:
“Na
presente situação de enfrentamento de uma pandemia, todos os esforços encetados
pelos órgãos públicos devem ocorrer de forma coordenada, capitaneados pelo
Ministério da Saúde, órgão federal máximo a cuidar do tema, sendo certo que
decisões isoladas, como essa ora em análise, que atendem apenas a uma parcela
da população, e de uma única localidade, parecem mais dotadas do potencial de
ocasionar desorganização na administração pública como um todo, atuando até
mesmo de forma contrária à pretendida”.8
Não há
dúvidas de que a requisição administrativa é um instituto previsto na
legislação vigente que pode ser útil nos esforços voltados ao combate às
COVID-19. Contudo, a prerrogativa de tamanho poder é diretamente proporcional à
responsabilidade por utilizá-la com a total e irrestrita observância aos
requisitos legais e princípios constitucionais, sob pena de trazer mais
prejuízos do que benefícios à coletividade em tempos de crise profunda de
pandemia.
—————————
1 Como o art. 1.228,
§3º, do Código Civil, o recente Decreto no 10.308 de 2020,
Decreto no 9382 de 2018 e Decreto no 5.392 de
2005.
2 Bandeira de
Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 15ª
ed., São Paulo: Malheiros, 2002, p. 750.
4Notícia disponível em https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/03/justica-manda-prefeitura-de-cotia-devolver-respiradores-confiscados-de-empresa-da-cidade.shtml
WELLINGTON MÁRCIO KUBLISCKAS – Consultor de XVV
Advogados, mestre e doutor em Direito Constitucional pela USP.
EDUARDO XAVIER – sócio de XVV Advogados. Foi secretário-executivo da Secretaria de Portos e subchefe-adjunto para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência.
CLARA COUTINHO – Advogada no XVV Advogados. Atua na área de Direito Administrativo, Regulatório e da Infraestrutura. Graduada em Direito pela UFMG.
BETO VASCONCELOS – Sócio de XVV Advogados. Professor no INSPER. Foi Secretário Nacional de Justiça. Exerceu também os cargos de Secretário Executivo e Subchefe para Assuntos Jurídicos da Presidência da República.
EDUARDO XAVIER – sócio de XVV Advogados. Foi secretário-executivo da Secretaria de Portos e subchefe-adjunto para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência.
CLARA COUTINHO – Advogada no XVV Advogados. Atua na área de Direito Administrativo, Regulatório e da Infraestrutura. Graduada em Direito pela UFMG.
BETO VASCONCELOS – Sócio de XVV Advogados. Professor no INSPER. Foi Secretário Nacional de Justiça. Exerceu também os cargos de Secretário Executivo e Subchefe para Assuntos Jurídicos da Presidência da República.
Fonte: JOTA
https://www.jota.info/tributos-e-empresas/regulacao/requisicao-administrativa-em-tempos-de-pandemia-09042020
OAB 2ª FASE
| PRÁTICA + MENTORIA | EXAME XXXI - Direito Constitucional
Professor
Erival da Silva Oliveira
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https://www.youtube.com/watch?v=ron2ntOD3KI
Direito Constitucional: Direitos e Garantias
Fundamentais - Estratégia Presencial
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Constitucional, com a Prof. Adriane Fauth.
https://www.youtube.com/watch?v=2FaLPLlorow
Referências
https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/2143678/em-que-consiste-o-fenomeno-da-requisicao-administrativa-marcelo-alonso
https://brasil.mylex.net/legislacao/constituicao-federal-cf-art5_8488.html
http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/D5392.htm
http://www.stf.jus.br/imprensa/pdf/MS-25295.pdf
http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp#473
https://www.jota.info/wp-content/uploads/2020/03/6087-a4836921-a5b2-7ee4-305a-ccee30161208-1024x683.jpg
https://www.jota.info/tributos-e-empresas/regulacao/requisicao-administrativa-em-tempos-de-pandemia-09042020
https://youtu.be/ron2ntOD3KI
https://www.youtube.com/watch?v=ron2ntOD3KI
https://youtu.be/ron2ntOD3KI
https://www.youtube.com/watch?v=ron2ntOD3KI
https://youtu.be/2FaLPLlorow
https://www.youtube.com/watch?v=2FaLPLlorow
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