Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
quarta-feira, 14 de setembro de 2022
Vela No Breu
***
O fogo pegou no breu
***
***
Paulinho da Viola
***
Ouça Vela No Breu
Ama e lança chamas
Assovia quando bebe
Canta quando espanta
Mal olhado, azar e febre
Sonha colorido
Adivinha em preto e branco
Anda bem vestido
De cartola e de tamanco
Dorme com cachorro
Com um gato e um cavaquinho
Dizem lá no morro
Que fala com passarinho
Desde de pequenino
Chora rindo
Olha pra nada
Diz que o céu é lindo
Na boca da madrugada
Sabe medicina
Aprendeu com sua avó
Analfabetina
Que domina como só
Plantas e outros ramos
Da flora medicinal
Com 108 anos
Nunca entrou num hospital
Joga capoeira
Nunca brigou com ninguém
Xepa lá na feira
Divide com quem não tem
Faz tudo o que sente
Nada do que tem é seu
Vive do presente
Acende a vela no breu
Ouça Vela No Breu
Composição: Paulinho da Viola / Sergio Natureza.
************************************************************************
***
quarta-feira, 14 de setembro de 2022
Roberto DaMatta - De qual Brasil falamos?
O Globo
Nossos amados ou odiados ‘políticos’ não vieram de Marte, Pasárgada, inferno ou céu, mas são nossos amigos, filhos e compadres
O da Colônia ou o do Império, o do republicanismo elitista ou o democrático, o do sertão ou o do litoral, o dos aristocratas ou o Brasil polarizado e sectário de hoje?
No meu trabalho, distingo um Brasil lido como sociedade (costumes e cultura) de um Brasil representado como nação e Estado nacional. O primeiro seria governado por hábitos do coração, conforme diriam Rousseau e Tocqueville; o segundo, administrado por uma legião de leis e procedimentos jurídicos.
Nossas sociologias e politicologias falam do Brasil como Estado nacional e pouco do Brasil como um sistema de valores. E menos ainda dos diálogos, dilemas e paradoxos dos encontros entre esses Brasis.
Um encontro responsável pela emergência de estadolatria, estadomania e estadopatia. Sem perceber que não há governo sem sociedade e que povo e governo não podem ser inimigos, numa polarização em que um “Estado forte” (ou uma “Nova República”) deveria corrigir uma sociedade velha e fraca, a solução tem sido a adoção de “estadolatrias” messiânicas. Despotismos, entretanto, destinados a se desfazer porque os hábitos relacionais do “Brasil sociedade” acabam englobando e criando uma inércia histórica promotora de retornos aterradores, das tais leis que não pegam.
Uma visão enviesada do Brasil engendra batalhas entre costumes não escritos (mas estabelecidos) e leis explícitas (destinadas a corrigir a índole de tais costumes). Ela conduz ao que estamos revivendo hoje: um momento eleitoral que seria de futuro nos leva ao passado justamente porque há um impasse entre o “Brasil nação” e o “Brasil das simpatias populistas”. O Brasil das impessoalidades legais encontra seu limite no Brasil das pessoalidades do “você sabe com quem está falando?” e das “leis que não pegam”.
O Brasil dos personalismos avessos à igualdade é mais resistente que o das normas que valem para todos. Mas como ter normas valendo para todos sem realizar uma crítica honesta do peso das obrigações familísticas? Não para liquidá-las, mas seria possível neutralizá-las escolhendo os valores democráticos da liberdade sem esquecer a igualdade.
Um primo é por mim nomeado ministro. Devo tratá-lo como primo ou como ministro? Ele se comportará como dono do meu governo ou como um funcionário? Se houver um conflito entre o ministério e o governo, ele agirá como primo ou como ministro?
Essas são questões que jamais discutimos francamente, que foram providencialmente esquecidas por nossa agenda democrática, que teria de passar a limpo o Brasil da casa pelo Brasil impessoal da rua e vice-versa.
A dificuldade com a democracia tem a ver com esse dilema entre o poder insuspeito da simpatia pessoal, que tende ao segredo e à corrupção, e a demanda da liberdade igualitária, que tende ao mundo público da impessoalidade e do anonimato — esses pilares do dinamismo democrático.
Em relação ao tamanho imenso da tarefa de implantar democracias em sociedades relacionais e patriarcais, há a dificuldade de perceber que nossos amados ou odiados “políticos” não vieram de Marte, de Pasárgada, do inferno ou do céu, mas são nossos amigos, filhos e compadres. As acusações quase sempre irascíveis com que os tratamos só podem ser compreendidas quando nos damos conta do isolamento com que situamos o “político” num campo em que o “poder” — como uma ponte desgastada entre o pessoal e o impessoal — tem a elasticidade das simpatias e conveniências. Do ganhar brutalmente muito dinheiro até o dobrar (ou driblar) legalismos para favorecer os amigos.
Com isso, entramos no terreno da impunidade, mas isso é, como diria o poeta, uma outra história...
***************************
***
Vela no Breu
Jards Macalé
***
***
quarta-feira, 14 de setembro de 2022
Paulo Delgado* - A banalização do desamparo
O Estado de S. Paulo
O impacto nocivo da tecnologia digital sobre a vida de crianças e adolescentes está destruindo, na atual geração, a aptidão para a liberdade.
Com escassos dois séculos, a história breve brasileira continua carregada de desrespeito e crueldade. Os fatos, e seus coadjuvantes, estão aí. Difícil de desassociar a linguagem violenta divulgada nas redes da violência que a ela se segue.
Sem querer condescender à amizade e à razão, a tecnologia coopera para aumentar a força do erro na educação e destrói a sociabilidade humana. O Brasil não colocou freio na soberba e nos malefícios dos dispositivos digitais, e vai tocando a eleição como videogame.
A campanha eleitoral – que passa ao largo da discussão sobre o consumo digital, antes o festeja e venera – escancara o desafio que se agrava. Não há no horizonte uma solução sábia e tranquilizadora capaz de deter o mal ostensivo e oculto da internet e das redes sociais viciadas. Que solidão, que desapontamento faz jovens e suas famílias ficarem tão perdidos assim, sem ter ninguém que se importe com eles antes de chegarem aos seus limites e baterem em hospitais, delegacias e nos tribunais?
Que paixão indomável os prende a tudo que os impressiona, em competição aberta com álcool, droga e associação criminosa, já bem conhecidas. Quantas análises são prejudicadas por quem prefere falar do óbvio que são as vantagens da tecnologia. Vamos nos concentrar nas desvantagens, no sofrimento, para não precisar nos arrepender, como Alfred Nobel se arrependeu de ter criado a dinamite.
Há, de fato, um fenômeno novo e preocupante agenciando a vida das pessoas e as encaixando em territórios alienados da realidade.
A predominância de empresas estrangeiras, cujo controle de sua responsabilidade social não é nacional, torna muitas vezes o uso de aplicativos um território sem lei ou laboratório de jurisdição extraterritorial expandida. Sem acordos de cooperação claros, quando os dados são armazenados no exterior – caso de todos eles –, fica difícil de imaginar que a autoridade brasileira possa exigir o cumprimento de parâmetros nacionais no Judiciário de terceiros países. Manejando de forma abusiva as telas, a maldade humana, que já é transnacional, compete com a diminuição da bondade.
A desproteção dos jovens diante da orgia digital está produzindo imaturidade anatômica, funcional e ignorância na geração atual. O cérebro é uma massa modelar empobrecida pelo uso da internet e danificada pela tela do celular e do computador.
A sociedade homogênea estimulada pela vida digital está em conexão direta com a vulnerabilidade de idosos, abuso infantil, pornografia, golpes financeiros, ansiedade e depressão.
Não deveria ser obrigatório que o celular se tornasse o centro da nossa vida. Pergunte à Interpol por que os crimes cibernéticos e o estelionato virtual estão se tornando a principal atividade econômica delinquencial de nosso tempo.
O “estar só”, o resolva por si mesmo, encontrou no mundo digital o parceiro para criar a comunidade dos sozinhos e se impor como moda. Todos os dias se divulga e se defende, hipocritamente, a legitimidade da vontade das pessoas por uma fé cega na liberdade de não ter liberdade. Cada vez mais se expressa emoção por emojis, ideogramas da preguiça afetiva e vocabular, sem se dar conta de que a representação de sentimentos sem a necessidade da palavra, do verbo, nega a origem da humanidade.
A gramática dos guetos seduz jovens para caminhos confusos, em realidade artificialmente criada para consumo comercial, e gerando os espaços socioafetivos fechados para que os capturados possam, em grupo, ser o que quiserem. Inclusive amorais, e justificarem todas as suas escolhas e comportamentos egoístas protegidos por afinidades tecnológicas.
O impacto nocivo da tecnologia digital sobre a vida de crianças e adolescentes está destruindo, na geração atual, a aptidão para a liberdade. A genialidade hoje não é a inteligência, mas a extravagância.
Uma infância zumbi, impregnada; aula sem professor; burrice cognitiva; família em restaurante com interação amputada por alguma tela; sono afetado; sedentarismo devastador; violência das influências subliminares; manias; jogos de morte; etc. Em quem acreditar? Quem sabe lendo Michel Desmurget (A fábrica de cretinos digitais – Os perigos das telas para nossas crianças) seja possível começar a desconfiar desta modernidade toda.
A vulnerabilidade de crianças e adolescentes não é somente socioeconômica, é, especialmente, biológica, etária, psicológica. O trabalho infantil não está mais concentrado, exclusivamente, na economia informal, na produção agrícola, nas atividades ilícitas. Crianças e adolescentes são hoje mão de obra gratuita da tecnologia digital. Não é mais, predominantemente, a pobreza na ponta e o analfabetismo na outra. Os jovens de qualquer classe, sequestrados e cativos da tecnologia, também não têm voz, infância, salubridade ou liberdade. Não são donos do seu corpo, da sua mente e das suas emoções.
O capitalismo de atenção atrai incautos para o trabalho não remunerado. E seu local de exploração são os dedos e os olhos de crianças e adolescentes, inertes em sua imaturidade física e emocional, abandonados horas e horas a fio, hipnotizados.
*Sociólogo.
****************************
***
Mangalho do Geraldo - WordPress.com
Vamos falar de Breu: outra pedra mágica? – Mangalho do Geraldo
***
1. Pegar no breu
Significado de Pegar no breu Por Luca Maribondo (MS) em 14-05-2007
Expressão que define situação irreversível; situação em que não é possível inverter o rumo, o sentido ou a direção; coisa sem possibilidade de retornar à etapa anterior;
que prossegue até o final sem ser limitada pela reação inversa. A expressão é antiga e vem dos tempos em que se soltavam muitos balões nas festas juninas: a tocha dos balões, que a garotada chamava de mecha, era feita de sacos de estopa molhados com parafina de velas derretidas; no centro da mecha havia breu, substância sólida escura, inflamável, obtido a partir de secreções resinosas de várias plantas, usada na produção de colas, tintas e vernizes, comprada em qualquer depósito de material de construção. Como não era fácil colocar o balão no ar: ele pairava durante alguns minutos até que, de repente, o fogo atingia o centro da mecha, o balão tomava força e subia rapidamente. Resumindo, ?pegar no breu? é uma alusão à expressão popular usada quando os balões das festas juninas, pegam impulso.
A expressão ganhou nova força com a frase do presidente Lula da Silva: ?A coisa pegou no breu. Ou seja, quando eu convidei o Franklin [Martins] pra ser ministro, uma das coisas que eu disse pro Franklin é o seguinte: "Nós vamos fazer a TV pública, vamos fazer sem trololó"?. A frase foi dita no dia 12 de maio de 2007, a propósito da criação da nova tv pública brasileira.
"Agora vai, o fogo pegou no breu",
https://www.dicionarioinformal.com.br/pegar%20no%20breu/
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário