Cidadania vê
inconstitucionalidade na MP 966 e vai acionar o Supremo Tribunal Federal
Publicado em 14 de Maio de 2020
Presidente do partido, Roberto Freire
classifica texto de Jair Bolsonaro de MP da Covardia e condena tentativa do
Executivo de se eximir de responsabilidade pelos descalabros cometidos no
combate à Covid-19
O Cidadania entrará nesta quinta-feira
(14) com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) no Supremo Tribunal
Federal (STF) contra a Medida Provisória (MP) 966, que isenta os agentes
públicos de serem responsabilizados, civil e administrativamente, por erros
cometidos durante a pandemia do novo coronavírus.
Para o presidente nacional do partido,
Roberto Freire, a medida é flagrantemente inconstitucional. Entre outros
pontos, a Constituição Federal estabelece em seu artigo 37 que os “atos de
improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a
perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao
erário” do prejuízo causado.
“A MP da Covardia é inconstitucional e
não exime Bolsonaro ou ministros do descalabro no combate à Covid-19. É
confissão de culpa. Não protegeram os brasileiros, mas agem para, como se diz
vulgarmente, tirar o deles da reta. O Cidadania entrará no STF com uma ADIN”,
adiantou Freire em seu perfil no Twitter.
Pelo texto, as autoridades só poderão
responder quando “agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro”. Por erro
grosseiro, a medida define como sendo “o erro manifesto, evidente e inescusável
praticado com culpa grave, caracterizado por ação ou omissão com elevado grau
de negligência, imprudência ou imperícia”.
Excludente de
ilicitude
“Essa MP é muito estranha, e anistia
agentes públicos de possíveis crimes, cometidos em meio ao combate da pandemia
da Covid-19. Anistiar possíveis desvios de conduta de agentes públicos é criar
um excludente de ilicitude pra quem quer cometer ato ilícito”, disse a líder do
Cidadania no Senado, Eliziane Gama (MA).
Jair Bolsonaro tem forçado
constantemente o descumprimento do isolamento social, decretado por
governadores em todo o País, como medida para conter o avanço da doença, além
de estimular o uso de medicamento não comprovado pela ciência para combater o
coronavírus.
“Querer abrir a economia à força e
mandar a população pra rua quando se sabe que isolamento é única medida eficaz
contra a doença é agir com dolo. Inventar cura mágica com cloroquina na
contramão do que apontam pesquisas científicas também”, apontou Roberto Freire.
Na avaliação do Cidadania, a MP 966
afasta o pressuposto da responsabilidade civil e administrativa dos agentes
públicos pelo dano por ele próprio causado à administração pública ou a
terceiros, que é a ligação entre a conduta – comissiva ou omissiva – e o
resultado danoso.
Para o deputado federal Marcelo Calero
(Cidadania-RJ), a medida reforça o caráter autoritário do presidente Jair
Bolsonaro.
“Essa MP é uma verdadeira aberração
jurídica. É inconstitucional, típica de ditaduras e faz parte do repertório
autoritário que Bolsonaro tenta impor ao País. Deve ser devolvida ao Executivo
pelo Congresso. Não podemos sequer tomar conhecimento de uma peça tosca como
essa!”, defendeu o parlamentar.
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Medida Provisória
n° 966, de 2020
Medida Provisória n° 966, de 2020
(Responsabilização de agentes públicos
em atos relacionados com a pandemia da covid-19)
Autoria: Presidência
da República
Ementa:
Dispõe sobre a responsabilização de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da covid-19.
Dispõe sobre a responsabilização de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da covid-19.
Explicação da
Ementa:
Dispõe que os agentes públicos somente poderão ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro pela prática de atos relacionados com as medidas de: a) enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da pandemia da covid-19; e b) combate aos efeitos econômicos e sociais decorrentes da pandemia da covid-19. Estabelece que a responsabilização pela opinião técnica não se estenderá de forma automática ao decisor que a houver adotado como fundamento de decidir. Enumera os aspectos a serem considerados na aferição da ocorrência do erro grosseiro.
Dispõe que os agentes públicos somente poderão ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro pela prática de atos relacionados com as medidas de: a) enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da pandemia da covid-19; e b) combate aos efeitos econômicos e sociais decorrentes da pandemia da covid-19. Estabelece que a responsabilização pela opinião técnica não se estenderá de forma automática ao decisor que a houver adotado como fundamento de decidir. Enumera os aspectos a serem considerados na aferição da ocorrência do erro grosseiro.
Situação Atual
Último estado
AGUARDANDO
DESPACHO
Prazos abertos
14/05/2020 -
12/07/2020: Deliberação da Medida Provisória (Art. 10 da Res.
1/2002-CN combinado com o art. 62 da CF)
14/05/2020 -
18/05/2020: Apresentação de Emendas à Medida Provisória (Art. 4º, da
Res. 1/2002-CN)
Regime de
Urgência
28/06/2020 em diante (Art. 9º da
Res. 1/2002-CN combinado com o art. 62 da CF)
MEDIDA PROVISÓRIA
Nº 966, DE 13 DE MAIO DE 2020
Dispõe sobre a responsabilização de
agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da covid-19.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da
atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida
Provisória, com força de lei:
Art. 1º Os agentes públicos somente
poderão ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem ou
se omitirem com dolo ou erro grosseiro pela prática de atos relacionados,
direta ou indiretamente, com as medidas de:
I - enfrentamento da emergência de
saúde pública decorrente da pandemia da covid-19;
e
II - combate aos efeitos econômicos e
sociais decorrentes da pandemia da covid-19.
§ 1º A responsabilização pela opinião
técnica não se estenderá de forma automática ao decisor que a houver adotado
como fundamento de decidir e somente se configurará:
I - se estiverem presentes elementos
suficientes para o decisor aferir o dolo ou o erro grosseiro da opinião
técnica; ou
II - se houver conluio entre os
agentes.
§ 2º O mero nexo de causalidade entre
a conduta e o resultado danoso não implica responsabilização do agente público.
Art. 2º Para fins do disposto nesta
Medida Provisória, considera-se erro grosseiro o erro manifesto, evidente e
inescusável praticado com culpa grave, caracterizado por ação ou omissão com
elevado grau de negligência, imprudência ou imperícia.
Art. 3º Na aferição da ocorrência do
erro grosseiro serão considerados:
I - os obstáculos e as dificuldades
reais do agente público;
II - a complexidade da matéria e das
atribuições exercidas pelo agente público;
III - a circunstância de incompletude
de informações na situação de urgência ou emergência;
IV - as circunstâncias práticas que
houverem imposto, limitado ou condicionado a ação ou a omissão do agente
público; e
V - o contexto de incerteza acerca das
medidas mais adequadas para enfrentamento da pandemia da covid-19 e das suas
consequências, inclusive as econômicas.
Art. 4º Esta Medida Provisória entra
em vigor na data de sua publicação. Brasília, 13 de maio 2020; 199º da
Independência e 132º da República.
MP-RESPONSABILIZAÇÃO
DE AGENTES PÚBLICOS
EMI nº 00153/2020 ME CGU
Brasília, 12 de Maio de 2020
Senhor Presidente da República,
1. Temos a honra de submeter a sua
consideração a presente proposta de medida provisória, que tem por objetivo
dispor sobre a responsabilização de agentes públicos pelas suas ações ou
omissões em atos relacionados com a pandemia da Covid-19, de forma a
salvaguardar os atos praticados de boa fé e garantir que as sanções civis e
administrativas recaiam somente sobre aqueles praticados com dolo ou erro
grosseiro.
2. Para isso, a proposta delimita seu
alcance aos atos relacionados, direta ou indiretamente, com as medidas de: i)
enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da pandemia da
COVID-19; e ii) combate aos efeitos econômicos e sociais decorrentes da pandemia
da COVID-19 (art. 1 º).
3. O cerne da proposta é que o mero
nexo de causalidade entre a conduta e o resultado danoso não implica,
necessariamente, responsabilização do agente público. É preciso que o ato tenha
sido praticado com erro grosseiro ou dolo. Além disso, no caso de decisões
baseadas em opiniões técnicas, o decisor só pode ser responsabilizado caso
tenha elementos para aferir o dolo ou o erro grave ou caso haja conluio entre
os agentes (§§ 1º e 2º do art. 1º).
4. Para garantir a correta
interpretação da regra, a proposta define o erro grosseiro como sendo o erro
manifesto, evidente e inescusável praticado com culpa grave, caracterizado por
ação ou omissão com elevado grau de negligência, imprudência ou imperícia (art.
2º). Além disso, são fixados parâmetros que devem ser observados na aferição da
ocorrência desse erro, quais sejam: i) os obstáculos e as dificuldades reais do
agente público; ii) a complexidade da matéria e das atribuições exercidas; iii)
a circunstância de incompletude de informações na situação de urgência ou
emergência; iv) as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou
condicionado a ação ou omissão do agente público; e v) o contexto de incerteza
acerca das medidas mais adequadas para enfrentamento da pandemia e de suas
consequências, inclusive econômicas (art. 3º).
5. Note-se que, apesar das recentes
alterações, em 2018, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro
(Decreto-lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942) e da sua pronta regulamentação
(Decreto nº 9.830, de 10 de junho de 2019) representarem importantes aparatos
de proteção para uma atuação responsável e independente do agente público, o
estado de calamidade que se vive no momento e condições nas quais o processo
decisório se desenvolve demonstram que as regras referidas são insuficientes.
Em apertada síntese, as razões que justificam a urgência e a relevância da
medida são apresentadas a seguir.
6. O agente público, hoje, para
salvaguardar vidas e combater os efeitos econômicos e fiscais da população
brasileira se vê diante de medidas que terão impactos fiscais extraordinários
para as futuras gerações, de compra de equipamentos por preços que, em situação
normal, não se julgaria ideal, de flexibilizações na interpretação de regras
orçamentárias que antes pareciam indiscutíveis, dentre outras. Em suma, hoje, o
gestor se vê diante de vários choques negativos estruturais simultâneos, da
dificuldade de previsibilidade de cenários e de situações que lhe demandam
decisões contrárias a parâmetros antes conhecidos.
7. Dessa forma, não é possível que a
mesma legislação – pensada e desenvolvida para situações ordinárias de épocas
regulares – seja suficiente para atender às inúmeras peculiaridades de uma
crise com a proporção da atual.
8. Portanto, para que os gestores
possam continuar guiados apenas por dois objetivos – salvar vidas e evitar um
colapso econômico do País –, é necessário que tenham um altíssimo grau de
segurança jurídica. É preciso que suas decisões mais impactantes, tomadas de
boa-fé e voltadas para esses objetivos, sejam livres das amarras futuras de
processos de responsabilização. É preciso que o gestor saiba que, especialmente
nessa situação, não deve temer que suas ações sejam confundidas com as práticas
ilegais daqueles que eventualmente se aproveitarem do momento para corromper.
9. Essa proteção especial que se
busca, portanto, também robustece o combate às ilegalidades e improbidades, já
que ajuda a esclarecer em qual terreno cada decisão se encontra: caso eventual
conduta tomada pelo gestor, em instante de premente urgência, não atinja os
objetivos pretendidos, a eventual punição só correrá caso se tenha tomado tal
decisão de forma dolosa ou com um grau elevado de negligência, imprudência ou
imperícia.
10. Destacar essa proteção em lei
específica vai permitir que o julgamento posterior de responsabilizações seja
especialmente orientado pelo contexto atual. Não haverá margem de dúvidas, do
ponto de vista legal, sobre os limites que ora se estabelecem. Não haverá ação
do tempo que permita a supressão das particularidades da crise que se vive. A
imposição normativa será um esquadro permanente a guiar os julgadores dos atos
que se praticarem no combate aos efeitos econômicos, sociais e de saúde pública
decorrentes da pandemia da Covid-19.
11. Por fim, a urgência para edição da
anexa proposta de Medida Provisória decorre do momento pelo qual passa o País,
em que a situação de risco à saúde pública decorrente do novo Coronavírus
(Covid-19), classificado como pandemia, tem gerado medidas extremas de controle
sanitário e provocado impactos severos na economia nacional. Tal cenário exige
intervenções imediatas nos mais diversos campos de atuação estatal, cabendo,
assim, salvaguardar a necessária autonomia decisória dos agentes públicos. 12.
Portanto, Senhor Presidente, faz-se necessária a edição da anexa proposta de
Medida Provisória, que liberará os bons gestores de amarras – ainda que
simbólicas ou imaginadas – e permitirá que o País caminhe mais rápido, e com
menos vidas perdidas, para longe dessa crise. .
Respeitosamente,
Assinado eletronicamente por: Paulo
Roberto Nunes Guedes , José Marcelo Castro de Carvalho
MENSAGEM Nº 265
Senhores Membros do Congresso
Nacional,
Nos termos do art. 62 da Constituição,
submeto à elevada deliberação de Vossas Excelências o texto da Medida
Provisória nº 966, de 13 de maio de 2020 que “Dispõe sobre a responsabilização
de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da
covid-19”.
Brasília, 13 de maio de 2020
12105.100405/2020-18
OFÍCIO Nº 250/2020/SG/PR
Brasília, 13 de maio de 2020.
A Sua Excelência o Senhor
Senador Sérgio Petecão
Primeiro Secretário
Senado Federal Bloco 2 – 2º Pavimento
70165-900 Brasília/DF
Assunto: Medida Provisória.
Senhor Primeiro Secretário,
Encaminho a essa Secretaria Mensagem
na qual o Senhor Presidente da República submete à deliberação do Congresso
Nacional o texto da Medida Provisória nº 966, de 13 de maio de 2020, que
"Dispõe sobre a responsabilização de agentes públicos por ação e omissão
em atos relacionados com a pandemia da covid-19".
Atenciosamente,
JORGE ANTONIO DE OLIVEIRA FRANCISCO
Ministro de Estado Chefe da
Secretaria-Geral
da Presidência da República
Referência: Caso responda este Ofício,
indicar expressamente o Processo nº 12105.100405/2020-18 Palácio do Planalto-
4º andar - Sala:402 - Telefone: 61-3411-1447 CEP 70150-900 Brasília/DF- http://www.planalto.gov.b
Responsabilidades
dos Servidores Públicos
Publicado
por Tadeu Augusto
Segundo
Celso Ribeiro Bastos, “responsabilidade é a sanção imposta pelo direito ao
autor de um ato lesivo à ordem jurídica” [1].
O servidor
público é passível de três tipos de responsabilidade: civil, penal e
administrativa.
A
responsabilidade civil decorrerá da condenação da Administração Pública a
indenizar terceiros por danos causados pelo servidor, uma vez provado que este
tenha agido com dolo ou culpa (artigo 37, § 6º, da Constituição Federal).
A
responsabilidade penal decorrerá de atuação típica e antijurídica do servidor
relacionada ao exercício de suas atribuições, comprovada através do devido
processo legal no juízo penal.
A
responsabilidade administrativa decorrerá da violação do servidor aos deveres e
proibições inseridos nos respectivos estatutos.
Segundo
Odete Medauar, “se a conduta inadequada afeta a ordem interna dos serviços e
vem caracterizada somente como infração ou ilícito administrativo, cogita-se,
então, da responsabilidade administrativa, que poderá levar o agente a sofrer
sanção administrativa. Essa responsabilidade é apurada no âmbito da
Administração, mediante processo administrativo e a possível sanção é aplicada
também nessa esfera” [2].
Por sua vez,
“se o agente, por ação ou omissão, dolosa ou culposa, causou dano à
Administração, deverá repará-lo, sendo responsabilizado civilmente. A apuração
da responsabilidade civil poderá ter início e término no âmbito administrativo
ou ter início nesse âmbito e ser objeto, depois, de ação perante o
Judiciário” [3].
Por fim, “se
a conduta inadequada do agente afeta, de modo imediato, a sociedade e vem
caracterizada pelo ordenamento como crime funcional, o servidor será
responsabilizado criminalmente, podendo sofrer sanções penais. A
responsabilidade criminal do servidor é apurada mediante processo penal, nos
respectivos juízos” [4].
Não se deve
olvidar que, em razão da indisponibilidade do interesse público, os ocupantes
de cargos ou funções de chefia e direção têm o dever de tomar as providências
para apurar a responsabilidade de servidores, assim que tiverem ciência de
condutas que correspondam a infrações. Destaca-se que o artigo 320 do Código Penal visa coibir as condutas que
desrespeitem tais deveres.
A
indisponibilidade do interesse público também impõe aos servidores públicos o
dever de representar contra ilegalidade, omissão ou abuso de poder, praticados
por agente, de qualquer grau hierárquico, conforme os termos do artigo 116, inciso XII, da Lei nº 8.112/90.
Apesar da
imposição legal, tais deveres nem sempre são cumpridos adequadamente, em
especial, nos casos de representação contra abuso de poder ou ilegalidade de
superiores hierárquicos, visto que os subordinados temem sofrer represálias.
RESPONSABILIDADE
NA ESFERA CIVIL
A
responsabilidade civil é de ordem patrimonial e se encontra prevista nos
artigos 186 e 927, ambos do Código
Civil, os quais consagram a regra segundo a qual todo aquele que
causa dano a outrem é obrigado a repará-lo.
Se for
responsabilizado civilmente, o servidor deverá reparar o dano que, por ação ou
omissão, dolosa ou culposa, tenha causado à Administração.
Nas palavras
de Odete Medauar, “para que o servidor possa ser responsabilizado e obrigado a
pagar o prejuízo, é necessário comprovar seu dolo (teve intenção de lesar ou
assumiu esse risco) ou sua culpa (imprudência, negligência ou imperícia). Para
isso, a Administração é obrigada a tomar as medidas legais pertinentes, não
podendo, a priori, inocentar o servidor (...)” [5].
Em relação
ao dano causado por conduta do servidor público, é necessário distinguir que
tal prejuízo poderá ser causado ao Estado diretamente ou a terceiros.
Quando o
dano é causado diretamente ao Estado, a responsabilidade do servidor é apurada
pela própria Administração, por meio de processo administrativo, no qual são
asseguradas todas as garantias de defesa, conforme o art. 5º,
inciso LV da Constituição Federal.
Para as
hipóteses de danos causados diretamente ao Estado, as leis estatutárias em
geral estabelecem procedimentos autoexecutáveis (não dependem de autorização
judicial), pelos quais a Administração desconta dos vencimentos do servidor a
importância necessária ao ressarcimento dos prejuízos, respeitado limite mensal
fixado em lei, visando preservar o caráter alimentar do salário do servidor.
Por outro
lado, quando se trata de dano causado a terceiros, aplica-se a norma do
artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, em decorrência da
qual o Estado responde objetivamente, ou seja, independentemente de culpa ou
dolo, porém possui o direito de regresso contra o servidor que provocou o dano,
desde que este tenha agido com culpa ou dolo.
Ademais,
Odete Medauar salienta que “também incide em responsabilização civil todo
aquele que, exercendo, mesmo transitoriamente ou sem remuneração, mandato,
cargo, emprego ou função em qualquer órgão, ente ou poder estatal, praticar ato
de improbidade administrativa. Tais atos estão descritos na Lei 8.429,
de 02.06.1992, artigos 9º a 11; a comprovação das condutas acarreta
conseqüências administrativas, civis e penais. Sob o aspecto civil, poderá ser
decretado, pelo juiz civil, o seqüestro de bens, e também o bloqueio de bens,
contas bancárias e aplicações financeiras mantidas no exterior; a sentença que
julgar procedente a ação civil de reparação de dano, ou decretar a perda dos
bens havidos ilegalmente, determinará o pagamento do dano ou a reversão de bens
em favor da Administração prejudicada (artigos 16, § 1º, 17 e 18)” [6].
RESPONSABILIDADE
NA ESFERA PENAL
O servidor
responde penalmente quando pratica crime ou contravenção. A responsabilidade
penal diz respeito às conseqüências da prática pelo servidor público de
condutas tipificadas no ordenamento como crimes relacionados ao exercício de
cargo, função ou emprego público, daí o nome de crimes funcionais.
Para fins
criminais, o conceito de servidor público está estabelecido pelo artigo 327 do Código Penal:
“Art. 327 -
Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora
transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º -
Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em
entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço
contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração
Pública.
§ 2º - A
pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste
Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou
assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista,
empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.”
O Código Penal indica tais condutas nos artigos 312 a 326, constantes no Título XI, “Dos crimes
contra a Administração Pública”, Capítulo I, “Dos crimes praticados por
funcionário público contra a Administração em geral”; e nos artigos 359-A a
359-H, presentes no Capítulo IV, “Dos crimes contra as finanças públicas”,
acrescentado pela Lei nº 10.028/00.
Ademais, há
leis federais que preveem outras condutas de servidores qualificadas como
crime. Por exemplo, a Lei nº 4.898/65
arrola condutas qualificadas como abuso de autoridade; a Lei nº 8.666/93
menciona condutas de agentes em matéria de licitação e contratos que são
classificadas como infrações penais.
A
responsabilidade criminal do servidor é apurada pelo Poder Judiciário. A
apuração da responsabilidade criminal se efetua mediante propositura pelo
Ministério Público, de ação penal.
Em muitas
ocasiões, o conhecimento de fatos ou atos tipificados como crimes funcionais ou
de responsabilidade advém de sindicância, processo administrativo ou relatório
de Comissão Parlamentar de Inquérito, devendo ser remetidos ao Ministério
Público.
A sentença
da ação penal, transitada em julgado, poderá repercutir na esfera de
responsabilidade administrativa e civil do servidor, como por exemplo, nos
casos em que houver absolvição na esfera penal por ausência de materialidade ou
negativa de autoria.
Nas
hipóteses acima referidas, a decisão proferida na esfera penal vincula as
demais esferas, não havendo que se falar em responsabilização nos âmbitos civil
e administrativo.
RESPONSABILIDADE
NA ESFERA ADMINISTRATIVA
Segundo
Odete Medauar, “a responsabilidade administrativa expressa as conseqüências
acarretadas ao servidor pelo descumprimento dos deveres e inobservância das
proibições, de caráter funcional, estabelecidas nos estatutos ou em outras
leis” [7].
Essa
responsabilidade é apurada no âmbito da própria Administração e apenada com
sanções de natureza administrativa, denominadas sanções disciplinares, impostas
pela autoridade administrativa. Se a conduta do servidor enquadrar-se também em
tipos penais e causar dano à administração, gera responsabilização criminal e
civil.
A infração
administrativa praticada pelo servidor será apurada pela própria Administração
Pública, que deverá instaurar procedimento adequado a esse fim, assegurando ao
servidor o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes, nos termos do artigo 5º,
inciso LV, da Constituição Federal.
Os
principais meios de apuração previstos nas leis estatutárias são a sindicância
e o processo administrativo disciplinar.
As infrações
administrativas são apenadas com sanções da mesma natureza, denominadas sanções
disciplinares, impostas por autoridade administrativa. Na esfera federal, o
artigo 127 da Lei nº 8.112/90
prevê as seguintes espécies de sanções disciplinares: advertência; suspensão;
demissão; cassação de aposentadoria ou disponibilidade; destituição de cargo em
comissão; destituição de função comissionada.
Deve-se ressaltar
que, na aplicação das penalidades disciplinares, serão consideradas a natureza
e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço
público, as circunstâncias agravantes e atenuantes e os antecedentes funcionais
(artigo 128 da Lei nº 8.112/90)
Nos
artigos 129 e seguintes da Lei nº 8.112/90,
estabelecem-se as hipóteses de aplicação de cada uma das penalidades
disciplinares previstas no artigo 127 do mesmo diploma legal.
Porém,
conforme observa Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “não há, com relação ao
ilícito administrativo, a mesma tipicidade que caracteriza o ilícito penal. A
maior parte das infrações não é definida com precisão, limitando-se a lei, em
regra, a falar, em falta de cumprimento dos deveres, falta de exação no
cumprimento do dever, insubordinação grave, procedimento irregular,
incontinência pública; poucas são as infrações definidas, como o abandono de
cargo ou os ilícitos que correspondem a crimes ou contravenções” [8].
A ausência
de tipicidade da infração disciplinar confere à Administração Pública certa
discricionariedade para enquadrar a falta funcional dentre os ilícitos
previstos na lei, o que não significa a possibilidade de decisão arbitrária,
uma vez que deverão ser observados limites legais e o princípio da motivação,
segundo o qual os atos administrativos deverão ser justificados, com indicação
dos fatos e fundamentos jurídicos que lhes sustentam.
“Art. 50. Os
atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos
fundamentos jurídicos, quando: [...].”
Acerca deste
tema, destaca-se também o disposto no artigo 128, parágrafo único, da Lei nº 8.112/90:
“Art. 128.
[...] Parágrafo único. O ato de imposição da penalidade mencionará sempre o
fundamento legal e a causa da sanção disciplinar.”
Conforme as
palavras de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “é precisamente essa margem de
apreciação (ou discricionariedade limitada pelos critérios previstos em lei)
que exige a precisa motivação da penalidade imposta, para demonstrar a
adequação entre a infração e a pena escolhida e impedir o arbítrio da
Administração. Normalmente essa motivação consta do relatório da comissão ou
servidor que realizou o procedimento; outras vezes, consta de pareceres
proferidos por órgãos jurídicos preopinantes aos quais se remete a autoridade
julgadora; se esta não acatar as manifestações anteriores, deverá expressamente
motivar a sua decisão” [9].
A margem
discricionariedade conferida à Administração para realizar o enquadramento de
determinadas condutas dentre os ilícitos previstos em lei não autoriza as autoridades
competentes a decidirem de forma arbitrária, pois o exercício da
discricionariedade deve respeitar os limites previstos em lei.
Em verdade,
a aplicação das sanções disciplinares deve ser fundamentada, com a indicação
das razões fáticas e jurídicas que sustentam a decisão, devendo ser observada a
natureza e gravidade da infração e os danos que dela provierem para o serviço
público.
INDEPENDÊNCIA
E COMUNICABILIDADE DAS ESFERAS DE RESPONSABILIDADES
Uma única
conduta praticada por um servidor público poderá configurar infração
administrativa, implicar dano à Administração e ser tipificada como crime,
ensejando, nessa hipótese, responsabilidades nas esferas administrativa, civil
e criminal, pois as três têm fundamentos e naturezas diversas.
As esferas
de responsabilidades (administrativa, cível e penal) são, em regra,
independentes, de tal sorte que as penas aplicadas em cada uma das esferas
serão cumulativas, ressalvadas as exceções em que a decisão proferida no juízo
penal deve prevalecer, fazendo coisa julgada na área cível e na administrativa.
De acordo
com Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “quando o funcionário for condenado na
esfera criminal, o juízo cível e a autoridade administrativa não podem decidir
de forma contrária, uma vez que, nessa hipótese, houve decisão definitiva
quanto ao fato e à autoria, aplicando-se o artigo 935 do Código Civil de
2002” [10].
O
artigo 935 do Código
Civil dispõe:
“Art. 935. A
responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar
mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas
questões se acharem decididas no juízo criminal.”
Ainda
segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro, ”quando a sentença for pela absolvição,
há que se distinguir os seus vários fundamentos, indicados no artigo 386 do Código
de Processo Penal (com a redação alterada pela Lei nº 11.690/08)
(...)” [11].
Os
incisos I a VII do art. 386 do Código
de Processo Penal estabelecem:
“Art. 386. O
juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que
reconheça:
I
- estar provada a inexistência do fato;
II
- não haver prova da existência do fato;
III
- não constituir o fato infração penal;
IV
- estar provado que o réu não concorreu para a infração penal;
V - não
existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal;
VI
- existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de
pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1º do art. 28, todos do Código
Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência;
VII -
não existir prova suficiente para a condenação.”
As
absolvições fundadas nos incisos I, IV e VI do artigo 386 do Código
de Processo Penal influenciam as decisões a serem proferidas
nas esferas civis e administrativas.
No tocante
aos incisos I e IV do artigo 386 do Código
de Processo Penal, a repercussão nas demais esferas ocorre em razão
da regra imposta pelo artigo 935 do Código
Civil.
Nos casos
supracitados, a absolvição na esfera penal por ausência de materialidade ou
negativa de autoria vincula as demais esferas, de modo que inexiste qualquer
responsabilidade na área civil ou administrativa. Isto é, nos âmbito civil e
administrativo, não caberá qualquer discussão sobre a autoria e a materialidade
do fato tido como infração.
Por sua vez,
no caso do inciso VI do artigo 386 do Código
de Processo Penal, o reflexo nas esferas civil e administrativa se
dá com fundamento no artigo 65 do Código
de Processo Penal, que dispõe:
“Art. 65.
Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhece ter sido o ato
praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento
de dever legal ou no exercício regular de direito”.
Ressalta-se
que a absolvição fundamentada na hipótese do inciso III do art. 386 do Código
de Processo Penal não repercute nas demais esferas de
responsabilidade, pois o mesmo fato que não constitui crime pode corresponder a
uma infração disciplinar ou a um ilícito civil.
Igualmente,
nas hipóteses dos incisos II, V e VII, em que absolvição se dá por falta de
provas, não haverá repercussão nas outras esferas de responsabilidade, uma vez
que as provas que não são suficientes para demonstrar a prática de um crime
podem ser suficientes para comprovar ilícitos civis ou administrativos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BANDEIRA DE
MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 24ª edição. São
Paulo, Malheiros Editores. 2007.
BASTOS,
Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo, Celso Bastos
Editor. 2002.
DI PIETRO,
Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 24ª edição. São Paulo,
Atlas. 2011.
MEDAUAR,
Odete. Direito Administrativo moderno. 15ª edição, revista, atualizada e
ampliada. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais. 2011.
[1] BASTOS,
Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo, Celso Bastos Editor.
2002. P. 549
[2] MEDAUAR,
Odete. Direito Administrativo moderno. 15ª edição, revista, atualizada e
ampliada. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais. 2011. P. 319
31 Ibidem,
p. 319
[4] Ibidem,
p. 319
33 MEDAUAR,
Odete. Direito Administrativo moderno. 15ª edição, revista, atualizada e
ampliada. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais. 2011. P. 321
[6] MEDAUAR,
Odete. Direito Administrativo moderno. 15ª edição, revista, atualizada e
ampliada. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais. 2011. P. 321
[7] MEDAUAR,
Odete. Direito Administrativo moderno. 15ª edição, revista, atualizada e
ampliada. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais. 2011. P. 321
[8] DI
PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 24ª edição. São Paulo,
Editora Atlas. 2011. P. 612
[9] DI
PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 24ª edição. São Paulo,
Editora Atlas. 2011. P. 613
38 DI
PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 24ª edição. São Paulo,
Editora Atlas. 2011. P. 615
[11] Ibidem,
p. 615
T
Tadeu
Augusto
Referências
https://cidadania23.org.br/2020/05/14/cidadania-ve-inconstitucionalidade-na-mp-966-e-vai-acionar-o-supremo-tribunal-federal/
https://www.congressonacional.leg.br/materias/medidas-provisorias/-/mpv/141949
https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=8110754&ts=1589471320534&disposition=inline
https://tadeu1008.jusbrasil.com.br/artigos/152053855/responsabilidades-dos-servidores-publicos
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