sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

83 STAN O MATADOR


GEORGES SIMENON
(1903 - 1989 / Bélgica)

Como outros (poucos) autores policiais, Simenon tem uma legião de admiradores. É o criador de um dos mais conhecidos e bem realizados detetives do gênero: o inspetor Maigret Autor de cerca de duzentos livros, este belga que se transformou em um romancista parisiense como poucos, embora mais conhecido por seus romances, como Cais de Bruma, O Assassino, O Cão Amarelo, O Homem que Via o Trem Passar e outros tantos (vários deles lançados no Brasil nos anos 80), deixou algumas centenas de contos e novelas. Vários poderiam ser o conto escolhido, mas optamos por esta antiga investigação do senhor inspetor Maigret. 

- Eis aqui seu retrato, perfeitamente parecido! O que prova que deveríamos saber de cor os arquivos criminais de todos os países do mundo. .. Você entende agora?


TECNOLOGIA

DADOS


Moro quer banco de DNA amplo e dados de face, íris e voz de presos; entenda

 

 




Representação da estrutura do DNA; Brasil já tem banco de perfis genéticos, mas Moro quer ampliá-loImagem: iStock

Helton Simões Gomes

Do UOL, em São Paulo
05/02/2019 15h26

RESUMO DA NOTÍCIA

·         Ministro Sergio Moro quer mudar leis para obrigar todo preso condenado por crime doloso a ter seu DNA coletado
·         O projeto propõe a criação de um banco de dados biométricos, com impressão digital, face, íris e voz dos presos, inclusive dos provisórios
·         O registro do DNA de presos, criado por lei em 2012, tem sua constitucionalidade discutida no Supremo Tribunal Federal
·         Entidades criticam a legislação por ela forçar os presos a criarem provas contra si e por acabarem com a presunção de inocência
O ministro da Justiça e Segurança Pública (MJSP), Sergio Moro, apresentou seu projeto de lei anticrime, que propõe mudanças em 19 áreas. No campo da investigação de crimes, ele pretende ampliar o atual banco de DNA de presos, aumentando o tempo de manutenção dos perfis genéticos para até 20 anos após o cumprimento da pena, e criar um arquivo com informações biométricas deles, com impressão digital, face, íris e até voz.
Alguns desses dados poderão ser coletados ainda que os presos sejam provisórios e suas sentenças não sejam definitivas.

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O registro de DNA, usado de forma restrita no Brasil, tem sua constitucionalidade questionada no STF (Supremo Tribunal Federal) por obrigar que presos produzam provas contra si e por expor dados sensíveis a respeito do cidadão.

BANCO DE DNA

A identificação do DNA pode ser feita a partir do sangue, saliva ou bulbo capilar. A análise desse material biológico leva a construção um perfil genético, que é guardado em um banco que usa o Sistema de Índice de DNA Combinado (Codis, na sigla em inglês), criado pelo FBI, a polícia federal norte-americana. Essa plataforma é usada em mais de 30 países.
O Codis, segundo a AGU (Advocacia Geral da União), armazena informações genéticas de criminosos condenados pela Justiça e outras obtidas de cenas de crimes, permitindo o cruzamento de informações por meio eletrônico.
Segundo Moro, há cerca de 30 mil perfis genéticos já registrados no Brasil, administrados pela Secretaria Nacional de Segurança Pública, ligada ao MJSP, que integração os arquivos do próprio ministério, da Polícia Federal e de alguns estados. 
Atualmente, somente presos cujo crime teve violência de natureza grave contra pessoa ou foram hediondos passam por esse tipo de identificação.
Com a alteração na Lei de Execução Penal e na lei que estabeleceu o Banco Nacional de Perfil Genético, de 2012, Moro pretende ampliar o perfil dos presos que devem ter seu material genético perfilado. O projeto dele estabelece que todos os condenados por crimes dolosos, ou seja, com intenção, deverão ser submetidos à identificação do perfil genético. A amostra de DNA deverá ser extraída assim que chegarem à unidade prisional.
Na prática, amplia o banco de dados a todos que são culpados de um crime

Danilo Doneda, especialista de proteção de dados

ACESSO POR DÉCADAS

Outra mudança importante é no tempo que as informações ficarão guardadas. Hoje, os dados devem ser excluídos quando o crime pelo qual o sujeito foi condenado prescrever.
O texto de Moro propõe que o perfil genético seja excluído em dois casos: se houver absolvição do acusado ou após 20 anos do cumprimento da pena --nessa situação, o sujeito terá de solicitar a retirada de seus dados.
A Associação Nacional dos Peritos Criminais (APCF) comemorou a iniciativa:
Dar efetividade a esse instrumento [o banco de DNA] é essencial para aumentar a taxa de resolução de crimes, encontrar culpados e acabar com a impunidade

BRIGA NO STF

 

Parece uma saída eficiente, mas a coleta de perfil genética de condenados pode ser inconstitucional. O debate no STF é sobre se a coleta de DNA força ou não condenados a constituírem prova contra si em outros casos, já que suas informações genéticas podem ser usadas em outras investigações.
Entre os que defendem a medida, estão órgãos que veem como essencial o uso de DNA para solucionar crimes. Do outro lado, estão entidades que argumentam que a medida força a autoincriminação, assume que os condenados são culpados de outros crimes e não representa um avanço científico.
A Advocacia-Geral da União (AGU) é favorável ao banco de DNA e participa da ação como amicus curiae, ou seja, não é parte da ação, mas, como tem interesse nas discussões, participa da questão:
A descoberta do DNA e o mapeamento do genoma humano sempre apresentaram relação com a identificação criminal, que, aliada a outras provas, constituem ferramentas importantes para a elucidação de crimes
Para a entidade, não procede a reclamação de que o condenado estaria produzindo provas contra si. "Primeiro, porque já haveria condenação judicial a proferir juízo de certeza sobre sua culpabilidade. Segundo, porque, com a coleta do material genético, não se estará produzindo qualquer prova, mas apenas identificando criminalmente um condenado que, diante da gravidade dos delitos cometidos, o legislador entender ser insuficiente a identificação civil."
Já o Instituição Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), que reúne mais de 4.600 especialistas em investigação criminal, é contrário à medida:
As garantias constitucionais não caracterizam meros adornos normativos, cuja aplicação pode ser afastada pela conveniência jurisdicional. Ao contrário, são regras e limitações ao poder punitivo, cujas raízes históricas parecem ser constantemente ignoradas em favor de uma idealista esperança na redução da criminalidade pelo aumento da criminalização
A Defensoria Pública da União também já manifestou ao STF opinião contrário à mudança, alegando que bancos de DNA podem ser usados para rotular criminosos pelo resto da vida:
Esses perfis genéticos são armazenados em banco de dados que podem ser usados para instruir investigações criminais (...) Parece clara a pressuposição de que os condenados por esses delitos poderão vir a cometer outros crimes. Não se pode admitir que pessoa que tenha praticado outros delitos tenha presumida a sua culpabilidade a ponto de se impor a definição de seu perfil genético para alimentar banco de dados a ser utilizado em outras investigações criminais"

Taysa Schiocchet, professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), concorda. Para ela, a lei atropela prerrogativas fundamentais, como direito à privacidade, ao tentar solucionar problemas de segurança pública lançando mão de uma ferramenta questionável.

Esse apelo aos problemas da segurança pública gera quase que uma aposta romântica e ingênua no DNA como se ele tivesse essa capacidade de resolver e elucidar todos os crimes sexuais e violentos, como se fosse acabar com todos os erros judiciários

VOZ, FACE E ÍRIS

 

A outra sugestão de Moro é criar um banco com dados biométrico, como impressão digital, íris, face e voz dos presidiários. A ideia é coletar essas informações até de presos provisórios.
Pega quase até a alma da pessoa. Tudo que é representativo da imagem pode estar nesse banco

Danilo Doneda

Esse arquivo poderá operar em conjunto com outros bancos de dados administrados pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciários. O governo federal gerencia grandes bases de informação, desde os mantidos pela Receita Federal até os do Sistema Único de Saúde. O projeto de Moro prevê que os registros desse banco possam ser acessados por autoridades policiais e do Ministério Público.
Para o especialista em proteção de dados, a liberação desse acesso, ainda que feita mediante autorização da Justiça, pode não ser o meio correto. Isso poderia permitir que partes do arquivo fossem baixadas. O ideal, diz ele, é que o Ministério da Justiça administre um sistema que não mostre os dados que possui, mas, apenas, cheque se uma informação biométrica pertença a alguém. Por exemplo: um agente submete a impressão digital ou os dados de face de um suspeito, e o sistema apenas informa a chance de corresponder ou não à de alguém incluído no banco.
A partir do momento em que tem acesso, eu fico com medo que terceiros tenham acesso

O VIÉS DO DNA

 

Segundo Doneda, os dados a serem guardados, tanto o DNA quanto os biométricos, não serão resguardados pela Lei Brasileira de Proteção de Dados, que entrará em vigor em agosto deste ano. Uma modificação feita pelo ex-presidente Michel Temer desobrigou entidades públicas de informarem a Autoridade Nacional de Proteção de Dados sempre que precisarem compartilhar dados com outros órgãos públicos ou necessitarem processar informações de outras organizações.
Em outros países, o uso de DNA ou de dados biométricos para a investigação de crimes é alvo de crítica por reforçar injustiças.
Taysa Schiocchet, professora da UFPR, explica que o Reino Unido é símbolo dessa discussão. "O dobro de perfis genéticos de negros foram armazenados nos bancos britânicos. O sistema judicial acaba fortalecendo o enviesamento, e com o DNA isso ocorre ainda mais."
Se isso ocorreu no Reino Unido, o que vai acontecer no Brasil, onde a gente sabe que já há um enviesamento em relação às pessoas que estão presas

Ela diz ainda que a eficácia do uso desses bancos não é tão alta quanto o alardeado.
A questão é que o DNA não é uma prova infalível




1
Maigret, mãos nas costas, cachimbo entre os dentes, caminhava lentamente, empurrando com dificuldade seu corpo pesado pela multidão da rua Saint-Antoine, que vivia sua vida de todas as manhãs, com o sol que escoava de um céu claro sobre as pequenas charretes carregadas de frutas e legumes e sobre os tabuleiros que atulhavam quase toda a largura da calçada.
Era a hora das donas-de-casa, das alcachofras que se sopesam e das cerejas que se provam, dos escalopes e contra-filés sucedendo-se nas balanças.
- Aqui, aspargos lindos por cinco francos a caixa grande!
- Peixes frescos!... Aproveite! Acabaram de chegar!...
Caixeiros de avental branco, açougueiros sob toldos finamente quadriculados, aromas de queijo diante de uma leiteria e, mais ao longe, odores de café torrado; todo o agitado pequeno comércio da alimentação e o desfile das donas-de-casa desconfiadas, o sino das caixas registradoras e a passagem pesada dos ônibus.
Ninguém desconfiava que era o comissário Maigret quem andava por ali, nem que se tratava de um dos casos mais angustiantes que se pudesse imaginar.
Quase em frente à rua de Birague, havia um pequeno café, o Tonnelet Bourguignon, cuja pequena varanda só comportava três mesas. Foi lá que Maigret se sentou, com toda a aparência de um transeunte cansado. Ele sequer ergueu os olhos para o garçom alto e magro que se aproximava e anotava o pedido.
- Um vinho branco pequeno... - resmungou o comissário.
E quem teria adivinhado que o garçom do Tonnelet Bourguignon, com seus gestos às vezes desajeitados, não era outro senão o inspetor Janvier?
Ele voltou com o copo de vinho em equilíbrio instável sobre uma bandeja. Com um guardanapo meio duvidoso, secou a mesa, e caiu no chão um papelzinho, que Maigret apanhou pouco depois.
Era a hora das donas-de-casa, das alcachofras que se sopesam e das cerejas que se provam, dos escalopes e contra-filés sucedendo-se nas balanças.
- Aqui, aspargos lindos por cinco francos a caixa grande!
- Peixes frescos!... Aproveite! Acabaram de chegar!...
Caixeiros de avental branco, açougueiros sob toldos finamente quadriculados, aromas de queijo diante de uma leiteria e, mais ao longe, odores de café torrado; todo o agitado pequeno comércio da alimentação e o desfile das donas-de-casa desconfiadas, o sino das caixas registradoras e a passagem pesada dos ônibus.
Ninguém desconfiava que era o comissário Maigret quem andava por ali, nem que se tratava de um dos casos mais angustiantes que se pudesse imaginar.
Quase em frente à rua de Birague, havia um pequeno café, o Tonnelet Bourguignon, cuja pequena varanda só comportava três mesas. Foi lá que Maigret se sentou, com toda a aparência de um transeunte cansado. Ele sequer ergueu os olhos para o garçom alto e magro que se aproximava e anotava o pedido.
- Um vinho branco pequeno... - resmungou o comissário.
E quem teria adivinhado que o garçom do Tonnelet Bourguignon, com seus gestos às vezes desajeitados, não era outro senão o inspetor Janvier?
Ele voltou com o copo de vinho em equilíbrio instável sobre uma bandeja. Com um guardanapo meio duvidoso, secou a mesa, e caiu no chão um papelzinho, que Maigret apanhou pouco depois.
A mulher saiu para fazer compras. Não vi o Caolho. O Barbudo saiu cedo. Os três outros devem ter ficado no hotel.
O tumulto, às dez da manhã, só fazia aumentar. Ao lado do Tonnelet, uma confeitaria fazia uma promoção e os vendedores paravam os transeuntes para lhes dar para provar biscoitos de dois francos a caixa grande.
Bem na esquina da rua de Birague via-se a fachada de um hotel de quinta categoria, um desses hotéis onde as pessoas se hospedam 'por mês, por semana ou por dia", não sem "pagamento adiantado", e esse hotel, sem dúvida por ironia, tinha escolhido o nome de 'Boaestada".
Maigret saboreava seu copinho de vinho branco seco e seu olhar não parecia primaveril.  Ainda assim, aquele olhar não tardou a se deter numa janela, no primeiro andar de uma casa da rua de Birague, quase em frente ao hotel. Naquela janela, um velhinho estava sentado junto à gaiola de um canário e não parecia ter outra preocupação a não ser aquecer-se ao sol enquanto Deus ainda se dignasse deixá-lo viver.

Era Lucas, o brigadeiro Lucas, que habilmente se envelhecera uns vinte anos, e que, embora tivesse percebido Maigret em sua varanda, evitava dirigir-lhe o menor sinal de reconhecimento.
Tudo aquilo constituía o que, em linguagem policial, chama-se vulgarmente de à campana. Já durava dez dias e pelo menos duas vezes por dia o comissário vinha saber das novidades, enquanto, à noite, seus homens eram revezados por um guarda que na verdade não era guarda, pois era inspetor da Polícia Judiciária, e por uma garota que fazia a vida por ali evitando ser importunada por clientes.
Maigret teria notícias de Lucas dentro de pouco tempo, quando seria chamado ao telefone no Tonnelet Bourguignon. E sem dúvida elas não seriam mais sensacionais do que as de Janvier.
A multidão passava tão perto da minúscula varanda que o comissário era toda vez obrigado a esconder os pés sob sua cadeira.
Pois, de repente, sem que ele notasse, um homem sentou-se a seu lado, em sua própria mesa, um homem magro e ruivo, de olhos tristes, cujo rosto lúgubre tinha alguma coisa do rosto de um palhaço.
- Você de novo? - rosnou o comissário.
- Peço desculpas, Sr. Maigret, mas insisto que o senhor acabará me entendendo e aceitando o que lhe proponho.
E para Janvier que se aproximava com os gestos de um perfeito garçom:
- A mesma coisa que meu amigo.
Ele tinha um sotaque polonês muito pronunciado. Devia ter a garganta irritada, pois mastigava sem parar um charuto de alcatrão que acentuava ainda mais o que havia de burlesco em sua aparência.
- Você está começando a me dar nos nervos! - disse Maigret sem simpatia. - Quer me dizer como sabia que eu viria aqui hoje de manhã?
- Eu não sabia.
- Então por que foi que veio? Ou vai querer me dizer que me viu por acaso?
- Não!
Os reflexos do homem eram lentos como os dos ginastas de musicais que se intitulam acrobatas fleumáticos. Ele olhou para frente, com seus olhos amarelos, ou melhor, ele parecia olhar para o vazio. E falava com uma voz monocórdia e triste, como se recitasse intermináveis condolências.
- O senhor é mau comigo, Sr. Maigret.
- Isto não responde à minha pergunta. Como é que pode você estar aqui esta manhã?
- Eu o segui.
- Desde a Polícia Judiciária?
- Bem antes... Desde a sua casa...
- Então você confessa que está me espionando.
- Não o estou espionando, Sr. Maigret. Tenho respeito e admiração demais pelo senhor! Eu lhe disse que seria um dia seu colaborador...
E ele suspirou nostalgicamente, contemplando seu charuto de alcatrão terminado por uma cinza artificial em madeira pintada.
Os jornais nada haviam publicado, exceto um. E esse jornal, aliás, que recebera a pista sabe Deus como, complicara bastante a tarefa do comissário.
A polícia teria todos os motivos para acreditar que os bandidos poloneses, inclusive Stan o Matador, estão neste momento em Paris.
Era verdade, mas teria sido melhor nada dizer. Em quatro anos, um bando de poloneses, a respeito dos quais quase nada se sabia, havia atacado cinco fazendas, sempre no Norte e sempre com métodos idênticos.
No princípio, eram sempre fazendas isoladas, cuidadas por velhos. Além disto, o atentado acontecia invariavelmente numa tarde de feira e em casas cujos donos, tendo vendido um bom número de animais, tinham consigo uma grande quantidade de dinheiro líquido.
Nada de científico no método. O atentado brutal, como o que acontecia no tempo dos ladrões de estrada. Um absoluto desprezo pela vida humana.
Os poloneses matavam! Matavam todos os que encontravam na fazenda, mesmo se lá houvesse crianças, sabendo que esta era a única maneira de evitar serem um dia reconhecidos.
Eles eram dois, cinco ou oito?
Em todos os casos, pessoas haviam notado uma caminhonete. Um garoto de uns doze anos pretendia ter visto um homem caolho.
Alguns afirmavam que os bandidos, para operar, serviam-se de máscaras negras.
A verdade era que sempre, todas as vezes, os fazendeiros eram mortos a golpes de faca, ou mais exatamente degolados na exata acepção da palavra.
O caso não dizia respeito a Paris. As diversas brigadas móveis da França se ocuparam dele.
Durante dois anos, o mistério permanecera total, o que não ajudava a tranqüilizar os camponeses.
Viera então uma informação dos arredores de Lille, onde as aldeias são verdadeiros enclaves poloneses em terras francesas. A informação era vaga. Era mesmo impossível encontrar a verdadeira fonte.
- Os poloneses acreditam que se trata do bando de Stan o Matador. ..
Mas, quando se interrogava um a um os homens da região, que em sua maioria não falavam francês, eles de nada sabiam, ou então gaguejavam:
- Disseram...
- Quem disse?
- Não sei... Esqueci...
Por ocasião de um crime na região de Reims, entretanto, uma empregada da fazenda, cuja existência os bandidos deviam ignorar e que dormia num socavão, havia sido poupada. Ouvira os assassinos falar numa língua que ela acreditava ser polonês. Ela tinha visto os rostos mascarados com panos pretos, mas reparara que um dos homens era caolho e que um outro, um colosso de mais de um metro e oitenta de altura, era extraordinariamente peludo.
Assim começou-se a dizer nos meios policiais:
- Stan o Matador... O Barbudo... O Caolho...
Durante meses nada mais se soube, até o dia em que um pequeno inspetor da brigada fez uma descoberta. Ele era responsável pelo bairro Saint-Antoine, onde os poloneses pululam. Tinha reparado, num hotel da rua de Birague, um grupo estranho no qual havia, simultaneamente, um caolho e um colosso com o rosto literalmente coberto de pêlos.
Na aparência, era gente pobre. O colosso peludo ocupava um quarto pago por semana, com sua mulher, mas quase todas as noites ele dava asilo a vários compatriotas, às vezes dois, às vezes cinco. Também freqüentemente outros poloneses alugavam o quarto vizinho.
- Quer se ocupar disso, Maigret? -- propusera o diretor da Polícia Judiciária.
Pois no dia seguinte, embora o caso tivesse sido mantido secreto, um jornal publicava a informação.
No outro dia, em sua correspondência, Maigret encontrou uma carta mal-escrita, com uma letra quase infantil, com inúmeros erros de ortografia, num papel de má qualidade como os que se vendem nos armazéns:
"Stan não se deixará apanhar. Tome cuidado. Antes que o senhor o tenha reduzido à impotência, ele terá tido tempo de abater meio mundo ao seu redor."
Claro, não se sabia ainda quem era Stan o Matador, mas havia boas razões para acreditar que a pista da rua de Birague estava certa, já que o assassino se dava ao trabalho de enviar uma carta de ameaças.
E aquela carta não era brincadeira, Maigret tinha certeza. Ela "cheirava" a verdade, como ele dizia. Tinha um gostinho de canalhice.
- Seja prudente, cara! - recomendara o chefe. - Nada de prisões bruscas. O homem que degolou dezesseis pessoas em quatro anos não hesitará em esvaziar o tambor do revólver quando perceber que está a ponto de ser apanhado...
Eis por que Janvier se tornara garçom do café em frente ao Hotel Boaestada, enquanto Lucas se transformara em velho impotente passando os dias farejando o sol de sua janela.
O bairro continuava sua vida barulhenta, sem desconfiar que de um minuto para outro um homem desesperado poderia abrir fogo em todos os sentidos ao seu redor...
- Senhor Maigret, eu vim dizer... E surgira Michel Ozep.
Seu primeiro encontro com Maigret datava de quatro dias. Ele se apresentara à P.J. e insistira para ser recebido pelo comissário em pessoa. Este o fizera esperar mais de duas horas, o que não havia desconcertado o homenzinho.
Uma vez no escritório, batera os calcanhares e curvara-se estendendo a mão.
- Michel Ozep, antigo oficial polonês, professor de ginástica em Paris...
- Sente-se, estou às suas ordens.
O polonês falava com um sotaque pronunciado e de maneira tão eloqüente que nem sempre se podia acompanhar o que dizia. Ele explicou que pertencia a uma família muito boa, que deixara a Polônia depois de desgostos íntimos - ele deu a entender que estava apaixonado pela mulher de seu coronel! - e que estava mais desesperado do que nunca porque não conseguia se acostumar com uma vida medíocre.
- O senhor compreende, Senhor Maigret... Ele pronunciava "Maigrette".
- ...Eu sou um cavalheiro... Aqui, eu dou aulas a gente sem cultura e sem educação... Eu sou pobre... Eu decidi me suicidar...
No começo, Maigret pensara: "Um louco!"
Pois no Quoi des Orfevres são comuns as visitas deste tipo e um bom número de malucos sente necessidade de ir lá fazer confidências.
- Tentei há três semanas... Atirei-me no Sena... ponte de Austerlitz, mas os guardas da brigada fluvial me viram e me tiraram da água...
Com um pretexto, Maigret foi para a sala ao lado, telefonou à brigada fluvial e constatou que era verdade.
- Seis dias depois, eu quis me matar com o gás dos lampiões, mas o carteiro chegou com uma carta e abriu a porta. ..
Telefonema à delegacia do bairro. Também era verdade.
- Eu quero realmente me matar, o senhor compreende? Minha existência não tem mais valor. Um cavalheiro não pode aceitar viver assim na miséria ou na mediocridade. Então, pensei que o senhor talvez precisasse de um homem como eu...
- Para quê?
- Para ajudá-lo a prender Stan o Matador. Maigret franzira as sobrancelhas.
- O senhor o conhece?
- Não... eu só ouvi falar dele... Como polonês, estou indignado que um homem de meu país viole assim as leis da hospitalidade... Desejo que Stan e seu bando sejam presos... Eu sei que ele resolveu defender-se com selvageria... Então, entre aqueles que quiserem prendê-lo, haverá certamente mortos... Não vale mais a pena que seja eu, já que quero mesmo morrer?... Diga-me onde está Stan... Eu irei e o desarmarei... Se for preciso, eu o machucarei, para que ele não ofereça mais perigo...
Maigret não teve outra saída senão empregar a fórmula tradicional.
- Deixe-me seu endereço... Eu escreverei...
Michel Ozep morava num apartamento mobiliado, na rua das Tournelles, não muito longe, exatamente, da rua de Birague. Um inspetor cuidara dele. O relatório lhe era bastante favorável. Realmente havia sido subtenente no exército polonês quando este se constituíra. Depois, perdia-se seu rastro. Era reencontrado em Paris, onde tentava dar aulas de ginástica aos filhos e filhas de pequenos comerciantes.
Suas tentativas de suicídio não eram invenção.
O que não impediu que Maigret, de acordo com o chefe da P.J., lhe enviasse uma carta oficial que terminava com
...não posso, lamentavelmente, fazer uso de sua generosa proposta, que agradeço...
Duas vezes, desde então, Ozep se apresentara no Quai des Orfévres e insistira para ver o comissário. Da segunda vez, chegara a recusar-se a ir embora, afirmando que esperaria ali o tempo que fosse preciso e ocupando quase à força, durante horas, uma das poltronas de veludo da sala de espera.
Agora, Ozep lá estava, na mesa de Maigret, na varanda do Tonnelet Bourguignon.
-Quero provar-lhe, Sr. Maigrette, que sou bom para qualquer coisa e que o senhor pode aceitar meus favores. Já são três dias que o sigo e sou capaz de lhe dizer tudo o que o senhor fez durante esse tempo. Sei também que o garçom que acaba de me servir é um de seus inspetores e que há outro numa janela em frente a nós, perto de uma gaiola de canário...
Maigret apertou furiosamente o cabo do cachimbo entre os dentes, evitando olhar para seu interlocutor, que continuava a falar com voz monocórdica.
- Eu compreendo que, quando um desconhecido vem declarar: 'Sou um antigo oficial do exército polonês e quero me suicidar" .. Compreendo que o senhor pense: 'Isto talvez não seja verdade..." Mas o senhor verificou tudo o que eu lhe disse... O senhor viu que não me rebaixo a mentir...
Era um moinho de palavras, um moinho de fluxo rápido, aos arrancos, cansativo de escutar, ainda mais que o sotaque deformava as sílabas a tal ponto que era preciso uma contínua atenção para compreender tudo.
-O senhor não é polonês, Sr. Maigrette. O senhor não compreende a mentalidade... O senhor não fala a língua... Eu quero ajudá-lo seriamente, porque não é possível que a fama de meu país continue a ser maculada por...
O comissário começava a espumar de raiva. E o outro, que, afinal de contas, devia estar percebendo, não deixava por menos:
- Se o senhor tentar prender Stan, o que ele vai fazer? Ele tem talvez dois, talvez três revólveres nos bolsos... Ele atira em todo mundo... Quem sabe se criancinhas não serão mortas, mulheres feridas?... Então, vão dizer que a polícia...
- O senhor não quer se calar?
- Eu, eu quero morrer... Ninguém chorará o pobre Ozep. O senhor me diz "Eis Stan!" E eu o sigo como segui o senhor... Espero o momento em que não haja gente... Digo a ele: 'Você é Stan o Matador!". .. Então ele atira em mim e eu atiro em suas pernas... Pelo fato dele ter atirado em mim, o senhor tem a prova de que é mesmo Stan e não faz uma bobagem... E como ele está ferido...
Nada o fazia parar! Ele teria continuado sua lengalenga apesar de todo o universo.
- E se eu o mandasse engaiolar? - interrompeu-o rudemente Maigret.
- Por quê?
- Para ter paz.
- O que o senhor diria? O que foi que o pobre Ozep fez contra as leis francesas que, pelo contrário, ele quer defender e pelas quais dá sua vida?
- Bico calado!
- O quê? O senhor aceita?
- Nada disso!
Nesse momento uma mulher passou, uma mulher de cabelos louros, pele muito clara, que todo mundo no bairro era capaz de dizer que era estrangeira. Ela levava uma sacola de compras e se dirigia a um açougue.
Maigret, que a seguia com os olhos, observou que seu companheiro sentiu a súbita necessidade de se assoar ruidosamente, cobrindo quase todo o rosto com o seu lenço.
- É a amante de Stan, não é? - disse ele quando a mulher desapareceu.
- Será que o senhor vai me deixar em paz, afinal?
- O senhor tem certeza de que ela é a amante de Stan, mas o senhor não sabe qual deles é Stan L.. O senhor acha que é o barbudo... Ora, o barbudo se chama Boris... E o caolho se chama Sacha... Não é um polonês, é um russo... Se o senhor mesmo for pesquisar, não descobrirá coisa alguma, porque no hotel só há poloneses que se recusarão a responder, ou que lhe mentirão... Enquanto eu...
Nenhuma dona-de-casa, na agitação da rua Saint-Antoine, desconfiava dos assuntos discutidos naquela minúscula varanda do Tonnelet Bourguignon. A mulher de cabelos louros e pele clara pechinchava umas costeletas no balcão de um açougue ali perto e havia em seu olhar um pouco daquele cansaço que se podia ler no de Michel Ozep.
- Talvez o senhor esteja aborrecido porque receia, se eu for morto, que lhe sejam pedidas explicações? Em primeiro lugar, não tenho família... Depois, eu escrevi uma carta na qual digo que fui eu, sozinho e por mim mesmo, que procurei a morte.
Na porta, o pobre Janvier não sabia o que fazer para explicar a Maigret que havia uma chamada telefônica para ele. Maigret havia percebido, mas continuava a observar seu polonês, tirando pequenas baforadas de seu cachimbo.
- Escute, Ozep...
- Sim, senhor Maigrette...
- Se o senhor for novamente visto nos arredores da rua Saint-Antoine, mando prendê-lo!
- Mas eu moro...
- Só precisa ir morar em outro lugar!
- O senhor recusa a oferta que... ?
- Saia daqui!
- Mas... 

- Saia ou eu o prendo!
O homem se levantou, cumprimentou batendo os calcanhares e, se dobrando em dois, afastou-se num passo digno. Maigret, que tinha avistado um de seus inspetores, fez-lhe sinal para que seguisse o estranho professor de ginástica.
Janvier podia finalmente se aproximar.
Lucas acaba de telefonar... Ele viu armas no quarto e cinco poloneses dormiram esta noite no quarto vizinho, alguns no chão, deixando a porta de comunicação entreaberta... O que queria, esse fulano?
- Nada... Eu lhe devo? ..
E Janvier, retomando seu papel, indicou o copo de Ozep.
- O senhor paga a conta daquele senhor?... Um franco e vinte e um franco e vinte, dois e quarenta...
Maigret tomou um táxi e se fez conduzir à P.J.
Na porta de sua sala, encontrou o inspetor que havia encarregado de seguir Ozep.
- Você perdeu o rastro dele? - berrou ele. - Você não tem vergonha? Eu te encarrego de uma perseguição infantil e...
- Eu não o perdi - murmurou humildemente o inspetor, que era um novato.
- Onde está ele?
- Aqui.
- Foi você quem o trouxe?
- Foi ele.
Porque, com efeito, Ozep se encaminhara diretamente para a PJ. e se instalara calmamente na sala de espera, com um sanduíche, depois de ter anunciado que tinha hora marcada com o comissário "Maigrette".

2
Trabalho menos atraente, sem dúvida, mas não menos útil: Maigret, com sua letra grande, parecendo querer esmagar a pena sobre o papel , resumia num relatório as diversas informações obtidas em quinze dias de diversas vigilâncias do bando dos poloneses.
Era alinhando-as desta forma que se podia constatar o quanto tais informações eram frágeis, pois não se podia sequer fixar ao certo o número de indivíduos fazendo parte do bando.
De acordo com as informações anteriores, ou seja, de acordo com as pessoas que, por ocasião dos atentados, haviam visto, ou acreditavam ter visto os bandidos, estes eram às vezes quatro, às vezes cinco, mas era provável que outros cúmplices descobrissem anteriormente as fazendas e freqüentassem as feiras.
Aquilo dava mais ou menos umas seis ou sete pessoas e parecia mesmo ser este o número de indivíduos que giravam em torno da rua de Birague.
Locatários fixos, só havia três, que tinham, aliás, preenchido regularmente suas fichas e apresentado passaportes em ordem.

1. Boris Saft, a quem os investigadores chamavam Barbudo e que parecia viver maritalmente com a mulher loura e chamada

2. Olga Tzérewski, 28 anos, originária de Vilna, e

3. Sacha Vorontzow, apelidado de Caolho.
Este era o trio que servia de base para a investigação, assim como servia, tudo indicava, de base para o bando.
Boris o Barbudo e Olga ocupavam um quarto.
Sacha o Caolho ocupava o quarto vizinho, e a porta de comunicação entre os dois ficava sempre aberta.
Todas as manhãs, a moça fazia suas compras e preparava a refeição sobre um fogareiro a álcool.
O Barbudo saía pouco, passava a maior parte de seus dias deitado na cama de ferro, lendo os jornais poloneses que iam comprar para ele num quiosque da praça da Bastilha.
O Caolho tinha saído algumas vezes e em todas elas fora seguido por um inspetor. Será que o homem desconfiava? A verdade é que ele ficava sempre contente de fazê-los passear por Paris e parar em diversos cafés para beber, sem dirigir a palavra a quem quer que fosse.
O resto era o que Lucas chamava de "clientela volante". Pessoas entravam e saíam, sempre as mesmas, quatro ou cinco, a quem Olga dava de comer e que, às vezes, dormiam num dos dois quartos, no chão, para partir pela manhã.
O fato nada tinha de extraordinário, pois o mesmo acontecia em quase todos os hotéis ocupados por gente pobre, exilados que se juntavam para pagar um quarto ou que hospedavam compatriotas encontrados pela rua.
A respeito da "clientela volante", Maigret possuía algumas anotações.
1. O Químico, que era chamado assim porque se apresentara duas vezes na Bolsa de Empregos para pedir uma vaga numa fábrica de produtos químicos. Suas roupas eram muito usadas, mas de bom corte. Durante horas, ele percorria as ruas de Paris com a atitude de quem procura ganhar algum dinheiro e, durante todo um dia, empregara-se como homem-sanduíche.

2. Espinafre, assim chamado porque usava um inacreditável chapéu verde-espinafre que se fazia notar ainda mais porque a camisa era de um rosa desbotado. Espinafre saía sobretudo à noite e era visto abrindo as portas de qualquer boate em Montmartre.

3. O Inchado, um baixinho gordo, ofegante, mais bem-vestido que os outros, embora seus dois pés de sapato não fossem do mesmo par.

Dois outros vinham menos regularmente à rua de Birague e era difícil dizer se faziam parte ao bando.
Maigret anotou embaixo desta lista:
Essa gente dá a impressão de estrangeiros sem dinheiro, em busca de um trabalho qualquer. No entanto, há sempre vodca nos quartos e ali se fazem, às vezes, verdadeiros banquetes.
É impossível saber se o bando se sente vigiado e só toma essa atitude para enganar a polícia.
Por outro lado, se é verdade que um desses indivíduos é Stan o Matador, seria mais provável que fosse o Caolho ou o Barbudo. Mas isto é apenas uma suposição. Foi sem o menor entusiasmo que ele levou seu relatório ao chefe.
- Nada de novo?
- Nada de concreto. Juraria que os valentões perceberam todos os nossos homens e que se divertem a multiplicar suas idas e vindas mais inocentes. Eles acham que não podemos mobilizar eternamente uma parte da P.J. para vigiá-los o tempo todo. Eles têm tempo ...
- O senhor tem um plano?
- O senhor sabe, chefe, que as idéias e eu nos embaralhamos há muito tempo. Eu vou, eu volto, eu farejo. Alguns acreditam que busco inspiração, mas dão com os burros n'água. O que espero é o fato significativo que nunca deixa de se produzir. O que importa é estar lá quando ele acontecer e se aproveitar. ..
- O senhor então espera um acontecimentozinho? - murmurou o chefe sorrindo, pois conhecia seu homem.
- Minha convicção é esta: nós realmente estamos diante do bando de poloneses. Por causa desse jornalista idiota, que está sempre rondando pelos corredores e que deve ter surpreendido alguma conversa, nossos valentões foram alertados. ..
"Agora, o que me pergunto é por que Stan escreveu. Talvez porque saiba que a polícia hesita sempre em realizar uma prisão à força? Talvez por bravata. Os matadores têm seu orgulho, eu ia dizendo orgulho profissional ...
"Qual deles é Stan?
"Por que esse diminutivo, que é mais americano do que polonês?
"O senhor sabe que levo algum tempo para formar uma opinião. .. Pois bem, ela começa a aparecer... Há dois ou três dias, parece que sinto a psicologia de meus valentões bem diferente da dos assassinos franceses...
"Eles precisam de dinheiro, não para se aposentar no campo, ou para fazer a festa nas casas noturnas, ou ainda para fugir para o exterior, mas simplesmente para viver como querem, ou seja, sem fazer coisa alguma, comer, beber e dormir, passar os dias deitados numa cama, mesmo que a cama esteja imunda, fumando e esvaziando garrafas de vodca.
"Sentem também vontade de estar juntos, de sonhar juntos, de conversar juntos e, algumas noites, de cantar juntos...
"Na minha opinião, tendo realizado seu primeiro crime, eles viveram de rendas até que o dinheiro se esgotasse, depois prepararam um novo golpe. Quando os fundos estão baixos, eles recomeçam, friamente, sem remorsos, sem a menor piedade para com os velhos que degolam e cujas economias comem em algumas semanas ou em alguns meses...
"Agora que entendi isto, espero... "
- Eu sei... o acontecimentozinho. .. - brincou o diretor da P.J.
- Ironize o quanto quiser. O que não impede que o acontecimentozinho já esteja aí...
- Onde?
- Na sala de espera ... o homenzinho que me chama de Maigrette e que quer de qualquer modo me ajudar na prisão, mesmo deixando sua pele. .. Ele afirma que é um modo como qualquer outro de se suicidar.
- Um louco?
- Talvez! Ou um cúmplice de Stan que houvesse descoberto uma maneira de conhecer nossas intenções. Todas as suposições são permitidas e é exatamente isto o que torna o fulano fascinante. O que impede, por exemplo, que ele seja Stan em pessoa?
E Maigret esvaziou seu cachimbo dando pequenos golpes no parapeito da janela, embora as cinzas caíssem em algum lugar no cais, talvez sobre o chapéu de um transeunte.
- O senhor vai usar esse homem?
- Acho que sim.
Aí o comissário andou até a porta, evitando dizer mais.
- O senhor verá, chefe! Eu ficarei espantado se a tocaia for necessária depois do fim desta semana.
Ora, era tarde de quinta-feira!
- Sente-se aí! Não é enervante ficar todo o dia chupando essa porcaria de charuto de alcatrão?
- Não, Sr. Maigrette.
- Você está começando a me irritar com seu Maigrette ... Mas enfim! Falemos seriamente. Você continua decidido a morrer?
- Estou, Sr. Maigrette.
- E continua querendo que lhe seja confiada uma missão perigosa?
- Eu quero ajudá-lo a prender Stan o Matador.
- Então, se eu dissesse para você se aproximar do Caolho e lhe dar um tiro de revólver na perna, você o faria?
- Faria, Sr. Maigrette. Mas seria preciso que o senhor me desse um revólver. Eu sou muito pobre e...
- Suponha agora que eu peça para você ir dizer ao Barbudo, ou ao Caolho, que você tem informações seguras de que a polícia irá prendê-los...
- Estou disposto, Sr. Maigrette. Eu esperaria o Caolho passar na rua e lhe daria o recado.
O olhar pesado do comissário continuava fixo no pequeno polonês e este não se mostrava incomodado, nem inquieto. Poucas vezes Maigret havia visto num homem tanta segurança junto com tanta calma.
Michel Ozep falava de se matar ou de ir até o bando de poloneses como de uma coisa muito simples, muito natural. Estava tão à vontade na varanda da rua Saint-Antoine como no ambiente da Polícia Judiciária.
- Você não conhece nem um nem outro?
- Não, Sr. Maigrette.
- Pois muito bem, vou encarregá-lo de uma missão. Azar o seu se tiver confusão. Desta vez, Maigret abaixou as pálpebras para esconder o que havia de demasiado tenso em seu olhar.
- Daqui a pouco, iremos juntos à rua Saint-Antoine. Eu esperarei do lado de fora. Você subirá até o quarto, escolhendo um momento em que a mulher estiver sozinha. Você lhe dirá que é um compatriota e que, por acaso, soube que a polícia daria esta noite uma busca no hotel ...
Silêncio de Ozep.
- Você entendeu?
- Entendi.
- Combinado?
- Vou confessar-lhe uma coisa, Sr. Maigrette.
- Vai correr da raia?
- Não vou fazer o que o senhor diz... "correrdarraia"... Não! Só gostaria de arrumar as coisas de outro jeito... O senhor talvez ache, assim, que eu seja muito ousado. .. É assim que se diz? Mas com as mulheres eu sou um homem tímido. .. E as mulheres são inteligentes, muito mais inteligentes do que os homens... Então, ela verá que estarei mentindo. .. E porque eu sei que ela verá que minto, ficarei vermelho. .. E quando eu ficar vermelho.. .
Maigret não se movia, deixando-o enrolar-se numa explicação tão detalhada quanto ruim.
- Prefiro falar com um homem. .. com o Barbudo, se o senhor quiser, ou com aquele a quem chamam o Caolho, ou a qualquer um...
Talvez porque um raio de sol penetrasse obliquamente no escritório e caísse em pleno rosto de Maigret, este parecia cochilar, como um homem a quem um almoço farto demais obriga a fazer a sesta em sua poltrona.
- É exatamente a mesma coisa, Sr. Maigrette...
Mas o Sr. Maigrette não respondia e o único sinal de vitalidade que dava era um fino filete azul que se erguia em espiral da boquilha de seu cachimbo.
- É uma pena... O senhor pode me pedir qualquer coisa, mas o senhor me pede exatamente a única coisa ...
- Bico calado!
- Como?
- Eu disse "bico calado!" Em francês, isto quer dizer que pode parar de falar... Onde você conheceu a mulher, Olga Tzérewski?


- Eu?
- Responde.
- Eu não entendo o que o senhor quer dizer. ..
- Responde.
- Eu não conheço essa mulher. .. Se eu a conhecesse, eu confessaria... Sou um antigo oficial do exército polonês e se não tivesse tido problemas. ..
- Onde a conheceu?
- Eu juro, Sr. Maigrette, pela alma de minha pobre mãe e de meu pobre pai ...
- Onde a conheceu?
- Eu me pergunto por que o senhor ficou tão mau comigo. O senhor fala com brutalidade! Eu, que vim aqui lhe fazer um favor, para evitar que franceses sejam mortos por um compatriota...
- Canta, Fifi!
- Como?
- Canta, Fifi! Entre nós isto quer dizer "continua com a lengalenga, mas ela não vai funcionar. .. "


- Peça-me qualquer coisa ...
- É o que estou fazendo.
- Peça-me outra coisa, me atirar debaixo do trem, pular pela janela. ..
- Estou pedindo para ir ver aquela mulher e dizer-lhe que vamos efetuar esta noite a prisão do bando...
- O senhor faz absoluta questão?
- Você pode aceitar ou recusar.
- E se eu recusar?
- Você vai se enforcar em outro lugar.
- Por que me enforcar?
- Maneira de falar... Enfim, você tratará de nunca mais aparecer no meu caminho. . .
- O senhor vai mesmo prender o bando esta noite?
- É provável.
- E o senhor vai permitir que eu o ajude?
- É possível ... Veremos quando você tiver completado sua primeira missão.
- A que horas?
- Sua missão?
- Não! A que horas o senhor prenderá?
- Digamos uma hora da manhã.
- Eu vou ...
- Onde? 

- Ver a mulher.
- Espere aí! Nós vamos juntos.
- É melhor que eu vá sozinho.. . Se nos virem, saberão que eu ajudo a polícia...
É claro, o polonês acabava de sair do escritório quando o comissário botou um inspetor no seu encalço.
- Devo me esconder? - perguntou esse inspetor.
- Não vale a pena... Ele é mais esperto do que você e sabe muito bem que vou mandar segui-lo. ..
E, sem perder um instante, Maigret desceu e pulou num táxi.
- A toda velocidade para a esquina da rua de Birague com Saint-Antoine. ..
A tarde estava radiosa e toldos estampados davam uma nota de cor sobre as lojas. Na sombra, cães se esticavam e a vida se escoava em câmera-lenta; tinha-se a impressão de que até mesmo os ônibus tinham alguma dificuldade para se pôr em marcha no ar espesso, suas grandes rodas deixando marcas no asfalto aquecido.
Maigret saltou do táxi para a casa que fazia ângulo entre as duas ruas e, no segundo andar, abriu uma porta, sem se dar ao trabalho de bater, e encontrou o brigadeiro Lucas sentado diante de uma janela, sempre sob o disfarce de um velhinho pacato e curioso.
O quarto era pobre, não muito limpo. Sobre a mesa viam-se os restos de uma refeição fria que Lucas pedira de uma salsicharia.
- Novidades, comissário?
- Tem gente aí na frente?
O quarto havia sido escolhido por sua posição estratégica, pois permitia a visão dos dois cômodos do Hotel Boaestada que eram ocupados pelos poloneses.
Ora, com aquela temperatura, todas as janelas estavam abertas, inclusive a de um outro quarto onde se via uma jovem adormecida, em trajes bastante leves.
- Ora vejam, parece que você não está se aborrecendo...
Sobre uma cadeira, um par de binóculos provava que Lucas cumpria seu dever com consciência e procurava obter detalhes.
- No momento - respondeu o brigadeiro - são dois no apartamento, mas logo só haverá uma pessoa. O homem, aliás, está tratando de se vestir. Ele ficou deitado a manhã inteira, como de hábito.
- É o Barbudo?
- É... Almoçaram os três: o Barbudo, a mulher e o Caolho... Então o Caolho saiu logo depois... O Barbudo se levantou e começou a se arrumar. .. Veja! Ele acabou de botar uma camisa limpa, o que não. acontece muito.
Maigret aproximara-se da janela e olhava por sua vez. O colosso hirsuto dava um laço na gravata, sobre uma camisa cuja brancura fazia no quarto cinzento uma mancha imprevista e ainda mais brilhante.
Viam-se mover seus lábios, enquanto ele se olhava no espelho. E, atrás dele, a mulher de cabelos claros arrumava, apanhava papéis engordurados que amassava em bolas, apagava finalmente um fogareiro a álcool.
- Se pelo menos eu soubesse o que eles dizem! - suspirou Lucas. - Há momentos em que fico realmente furioso! Eu os vejo falar, falar sem parar... Às vezes eles gesticulam e eu não consigo adivinhar de que se trata... Começo a me dar conta que ser surdo deve ser um suplício e entendo por que os que sofrem dessa enfermidade passam por gente má...
- Enquanto isso, não fale tanto! Você acha que a mulher vai ficar lá?
- Não é absolutamente a sua hora de sair... Se devesse fazê-lo, teria posto seu costume cinza...
Olga realmente usava o vestidinho de malha que pusera de manhã para fazer compras. Aprimorando seu disfarce de boêmia, ela fumava um cigarro sem jamais retirá-lo dos lábios, à moda dos verdadeiros fumantes que precisam do tabaco da manhã à noite.
- Ela quase não fala! - observou Maigret.
- Também não é hora disso... É principalmente à noite que ela fala, quando todos estão à sua volta... Ou ainda algumas vezes quando está sozinha com aquele que eu chamo de Espinafre, o que raramente acontece... Ou muito me engano, ou ela tem um fraco pelo Espinafre, que é o rapaz mais bonito de todos...
Era uma sensação estranha estar assim num quarto desconhecido, olhando a vida de pessoas das quais se acabava por conhecer os mínimos fatos e gestos.
- Você está se tornando um porteiro e tanto, meu pobre Lucas...
- Estou aqui para isto, não é mesmo? Veja! Posso até contar-lhe que a garota do lado, aquela que dorme tão bem, fez amor, esta noite, até três horas da manhã, com um rapazinho que usava uma gravata à Lavalliere e que saiu ao amanhecer, sem dúvida para voltar para a casa dos pais sem fazer barulho... Veja! Olhe o Barbudo indo embora!
- Ora vejam! Ele está quase elegante...
- Modo de dizer... Ele tem mais o ar de um lutador de feira do que de um homem do mundo.
- Digamos de um lutador de feira que faria bons negócios! - concedeu Maigret. Defronte, nenhum beijo de despedida. O homem saía, simplesmente, quer dizer,
desaparecia na parte do cômodo que se podia ver do observatório dos policiais. Pouco depois, ele surgia na calçada e se dirigia para a praça da Bastilha.
- Derain vai segui-lo. .. - anunciou Lucas, que parecia uma grande aranha no meio de sua teia. - Mas o outro sabe que é seguido. Vai se contentar em passear e talvez tomar alguma coisa numa varanda...
Quanto à mulher, apanhava um mapa rodoviário numa gaveta e o desdobrava sobre a mesa. Maigret calculava que Ozep não viera de táxi, e sim de metrô, e que, nessas condições, só chegaria dentro de alguns minutos.
- Se vier! - retificou. E ele veio.
Viram-no chegar, hesitante, ir e vir na calçada, enquanto o inspetor que o seguia fingia, na rua Saint-Antoine, interessar-se pelas prateleiras de uma peixaria.
Visto assim, do alto, o pequeno polonês parecia ainda mais magro e mais insignificante, e Maigret, por um instante, sentiu remorsos.
Ele imaginava ouvir a voz do pobre rapaz repetir cem vezes, em explicações difíceis, seu famoso "Sr. Maigrette".
Ele hesitava, estava claro. Poder-se-ia até mesmo jurar que ele tinha medo e olhava em torno de si mesmo com visível angústia.
- Você sabe o que ele está procurando? - disse o comissário a Lucas.
- O homenzinho pálido? Não! Talvez dinheiro para entrar no hotel?
- Ele está me procurando. .. ele se diz que com certeza estou por aqui e que, se eu por milagre tivesse mudado de idéia...
Tarde demais! Michel Ozep acabava de mergulhar no sombrio corredor do hotel. Podia-se segui-lo em pensamento. Ele subia a escada, chegava ao segundo andar.
- Ele ainda hesita ... - anunciou Maigret. Porque a porta já deveria se abrir.
- Ele está no andar. .. Vai bater. .. Bateu... Olhe!
Realmente, a moça loura estremecia, guardava, com um movimento instintivo, seu mapa rodoviário no armário e se dirigia para a porta.
Por um instante, nada se via. Os dois personagens mantinham-se na parte invisível do quarto.
Então de repente a mulher apareceu e havia algo diferente nela. Seu andar era determinado, rápido. Ela ia até a janela, fechava-a e depois puxava as cortinas escuras. Lucas virou-se para o comissário esboçando uma careta estranha.
- Vejam só! ...
Mas parou de brincar ao constatar que Maigret estava muito mais sério do que ele previa.
- Que horas são, Lucas?
- Três e dez. ..
- Na sua opinião, há alguma chance de um de nossos valentões voltar daqui a pouco?
- Acho que não. .. A não ser, como eu lhe disse, Espinafre, se souber que o Barbudo não está... O senhor não está com um ar tranqüilo. ..
- Não gosto do modo como aquela janela foi fechada...
- O senhor teme pelo seu polonês? Maigret não respondeu e Lucas continuou:
- O senhor pensou que nada prova que ele esteja no quarto? Nós o vimos entrar no hotel, é verdade. .. Mas ele pode muito bem ter ido para um outro quarto... E talvez seja alguma outra pessoa que...
Maigret deu de ombros e suspirou.
- Cale-se! Você me cansa ... 
3
- Que horas são, Lucas?
- Três e vinte...
- Você sabe o que vai acontecer?
- O senhor vai ver o que está acontecendo lá em frente?
- Ainda não. Mas muito provavelmente vou me cobrir de ridículo. De onde se pode telefonar?
- Do quarto ao lado. É um alfaiate que trabalha em casa para uma grande loja e esta o obrigou a ter telefone. ..
- Neste caso, vá ao quarto do alfaiate. Veja se ele não escuta a conversa. Telefone ao chefe, em meu nome. Diga-lhe para me mandar, com a maior urgência, uns vinte homens armados. Que eles se distribuam em torno do Hotel Boaestada e que esperem meu sinal. ..
A expressão de Lucas mostrava bastante bem a seriedade desta ordem, além do mais tão pouco dentro dos hábitos de Maigret, que adorava rir das mobilizações policiais.
- O senhor acha que a coisa vai ficar feia?
- A não ser que já esteja feito...
Ele não tirava os olhos daquela janela de vidros sujos, de cortina de veludo carmesim que datava dos tempos de Luís-Felipe.
Quando Lucas voltou do telefonema, encontrou o comissário no mesmo lugar, o rosto sempre preocupado.
- O chefe recomenda que o senhor seja prudente. Ele já teve um inspetor morto na semana passada e, se um outro acidente tiver que acontecer...
- Calado, está bem?
- O senhor acha que Stan o Matador. ..
- Não acho nada, cara! Já refleti bastante desde hoje de manhã, a ponto de estar com dor de cabeça. Agora, contento-me em captar impressões e, se você quiser saber de tudo, tenho infelizmente a impressão de que estão acontecendo ou vão acontecer coisas desagradáveis. Que horas?
- Vinte e três...
Como por ironia, no quarto vizinho, a mocinha continuava a dormir, boca entreaberta, pernas dobradas. Mais acima, lá pelo quinto ou sexto andar, alguém tentava tocar acordeão, repetindo sem parar, com notas desafinadas, o mesmo refrão.
- O senhor quer que eu vá lá? - propôs Lucas.
Maigret olhou-o duramente, como se seu subordinado houvesse censurado sua falta de bravura.
- O que é que isto quer dizer?
- Nada! Estou vendo que o senhor está inquieto com o que está acontecendo lá e propus ir ver. ..
- E você acha que eu hesitaria em ir eu mesmo? Você se esquece de uma coisa: uma vez que se está lá, é tarde demais. .. Se vamos lá e não descobrimos nada, nunca mais descobriremos coisa alguma sobre o bando. .. Eis por que eu hesito. .. Se ao menos essa infeliz não tivesse fechado a janela!...
Ele franziu de repente as sobrancelhas.
- Espere aí! Das outras vezes, nunca aconteceu de ela fechar a janela, não é?
- Nunca.
- Donde ela não desconfiava da sua presença aqui. ..
- Ela com certeza achava que eu fosse um velho babão...
- Se bem que não foi ela quem teve a idéia de fechar a janela, mas o fulano que entrou...
- Ozep?
- Ele ou algum outro... Quem entrou foi quem, antes de se mostrar, disse à mulher para fechar a janela. ..
Ele pegou seu chapéu sobre a cadeira onde o tinha deixado, esvaziou o cachimbo, encheu-o com um indicador esmagador.
- Onde o senhor vai, chefe?
- Estou ouvindo que nossos homens chegaram. . . Veja! Olha dois deles lá perto do ponto de ônibus. .. e no táxi parado, reconheço gente da casa... Se eu ficar cinco minutos lá dentro sem abrir a janela, você entra com homens...
- O senhor está levando a arma?
Alguns instantes mais tarde, Maigret atravessava a rua, enquanto o inspetor Janvier, que o tinha visto, parava de enxugar as mesinhas de sua varanda.
Lucas, febril, tinha o relógio na mão, mas como acontece quando se quer fazer as coisas bem demais, havia esquecido de anotar o momento da entrada de Maigret no hotel e seria incapaz de dizer quando se passariam os cinco minutos.
Não teve, aliás, que se morder de raiva por isto porque, depois de um tempo que lhe pareceu miraculosamente curto, a janela da frente se abriu. Um Maigret mais carrancudo do que nunca fazia a seu brigadeiro sinal para ordenar que viesse se juntar a ele.
A impressão de Lucas tinha sido que, exceto pelo comissário, o quarto estava vazio, mas, quando entrou, depois de ter ofegado numa escada sombria que cheirava a comida malfeita e a banheiro, deu um pulo ao descobrir um corpo de mulher estendido a seus pés.
Um rápido olhar a Maigret, que respondeu:
- Morta, é claro.
Dava para acreditar que queriam assinar o crime, pois a vítima fora degolada como todas as vítimas de Stan. Havia sangue por toda parte, na cama e no assoalho, e o assassino enxugara as mãos na toalha de rosto que estava manchada de vermelho escuro.
- Era ele?
Maigret deu de ombros, sempre imóvel no meio do cômodo.
- Vou dar sua descrição a nossos homens, que não o deixem sair do hotel?
- Se você quiser. ..
- Estou com vontade de botar um inspetor no telhado, para o caso...
- Tudo bem...
- Aviso o chefe?
- Daqui a pouco...
Não era fácil conversar com Maigret quando ele fazia aquela cara! Além disso, Lucas se punha no lugar do chefe, que anunciara ele mesmo que iriam rir dele.
Agora, seria pior que o ridículo. Na verdade, ele havia mobilizado importantes forças policiais, mas o fizera quando era tarde demais, enquanto um crime se cometia sob os próprios olhos de Maigret, quase com seu consentimento, já que fora ele mesmo quem enviara Ozep ao Hotel Boaestada!
- Se os do bando voltarem? Eu os prendo?
Sinal afirmativo da cabeça. Ou talvez um gesto indiferente. E Lucas finalmente saiu. Maigret ficou sozinho no meio daquele quarto no qual a janela aberta deixava penetrar uma luz crua.
Ele enxugou a testa, reacendeu maquinalmente o cachimbo que deixara se apagar.
- Que horas são...
Só aí se lembrou que estava só e tirou seu relógio do bolso. Eram três e trinta e cinco, e o acordeão, lá em cima, continuava a maltratar os ouvidos, não impedindo a jovem vizinha de dormir como um animal despreocupado.
- Onde está Maigret? - perguntou o chefe da P.J. descendo do carro e se colocando diante de Lucas.
- No quarto... É o número 19, no segundo andar. .. As pessoas do hotel ainda não sabem...
Alguns instantes depois, o diretor da Polícia Judiciária encontrava Maigret sentado numa cadeira, no meio do quarto, a dois passos do cadáver. O comissário fumava, com ar obstinado. Quase não percebeu a chegada do chefão.
- Diga lá, meu velho! Parece que estamos num belo dum abacaxi... Tudo o que ele conseguiu foi um rosnar que nada queria dizer.
- Então o famoso matador não era outro senão o homenzinho que vinha lhe oferecer seus favores!. .. Confesse, Maigret, que você poderia ter desconfiado. .. e que a atitude de Ozep era no mínimo equívoca ...
A testa de Maigret estava marcada por uma grande dobra vertical e seus maxilares se projetavam, dando a toda a fisionomia um marcante aspecto de potência.
- Acha que ele não conseguiu sair do hotel?
- Tenho certeza... - retrucou o comissário, com ar de não dar importância ao fato.
- Não o procurou?
- Ainda não.
- Acha que ele vai se deixar pegar facilmente?
O olhar de Maigret desviou-se então lentamente da janela, dirigiu-se para seu diretor, deteve-se nele pesadamente. Havia uma solenidade naquela lentidão, naquela hesitação, na ambigüidade de frases do comissário.
- Se eu estiver enganado, o homem tentará abater algumas pessoas antes de se deixar apanhar. Se eu não estiver enganado, as coisas deverão funcionar por si mesmas. ..
- Não compreendo, Maigret. Você ainda duvida que Stan e o seu Ozep sejam uma só pessoa?
- Estou convencido de que, ainda agora, havia duas pessoas neste quarto e, entre elas, Stan o Matador. ..
- Então ...?
- Eu repito, chefe: posso me enganar, como todo mundo. Neste caso, peço-lhe desculpas, pois o papel será feio. O jeito pelo qual esta história parece se desenrolar não me satisfaz. Há alguma coisa que não combina, posso sentir. Se Ozep era Stan, não há razão para...
Estou ouvindo!
- Seria longo demais. .. Que horas são, chefe?
- Quatro e quinze... Por quê?
- Por nada. ..
- Vai ficar aqui, Maigret?
- Até segunda ordem, vou...
- Enquanto isso, vou ver lá fora o que estão fazendo os nossos homens...
Eles tinham prendido Espinafre, que, como Lucas previra, vinha fazer sua visitinha à moça. Haviam dito ao polonês que sua compatriota fora morta e ele ficara lívido, mas não se abalara quando lhe falaram de Ozep.
- Não é possível que ela esteja morta! - contentara-se ele em repetir várias vezes, enquanto era levado ao posto.
Quando anunciaram esta captura a Maigret, ele se contentara em resmungar:
- Que se dane!...
E retomou sua estranha conversa particular com a morta. Meia hora mais tarde, era a vez do Caolho entrar e ser preso tão logo atravessasse a soleira. Ele também se deixou apanhar sem piscar, mas, quando lhe falaram da morte da moça, tentou se livrar das algemas e correr para o andar.
- Quem fez isso? - gritou. - Quem a matou? Foram vocês, não é?
- Foi Ozep, também chamado Stan o Matador. ..
Aí, o homem acalmou-se como que por encanto e repetiu franzindo as sobrancelhas:
- Ozep?
- Vai querer que a gente acredite que você não conhece seu patrão?
Era o chefe em pessoa quem fazia este apressado interrogatório, num corredor, e ele teve a impressão de que um leve sorriso passava pelos lábios de seu prisioneiro.
Seguiu-se um dos comparsas, aquele a quem chamavam o Químico e que se contentou em responder a todas as perguntas com um ar totalmente idiota, como se nunca tivesse ouvido falar da moça, nem de Ozep, nem de Stan...
Maigret continuava lá em cima, repassando o mesmo problema, procurando a chave que o faria, finalmente, compreender os acontecimentos.
- Tá bom!... - murmurou quando lhe falaram da prisão do Barbudo, que, depois de se debater como um doido, começara a chorar como um bezerro.
De repente, ele ergueu a cabeça para Lucas, que trazia a notícia.
- Você não reparou em nada? - disse. - Com este são quatro que prendemos, um depois do outro, e nenhum opôs qualquer resistência, enquanto um homem como Stan ...
- Mas s se Stan é Ozep ...
- Você o encontrou?
- Ainda não. Era preciso deixar entrar todos os seus cúmplices antes de virar o hotel de cima abaixo, senão eles teriam farejado de longe alguma coisa e não teriam entrado na ratoeira. Agora que estão quase todos aqui, o chefão começou a botar os lugares em estado de sítio. Os homens estão em baixo e vão revistar tudo minuciosamente, do porão ao sótão, se é que existe...
- Escute Lucas...
E este, que ia sair, ficou mais um instante, tendo em relação a Maigret um sentimento parecido com piedade.
- Estou escutando, chefe.
- O Caolho não é Stan. Espinafre não é Stan. O Barbudo não é Stan. Ora, eu estou convencido de que Stan morava neste hotel e era o centro em torno do qual os outros vinham se agrupar!
Lucas preferia nada dizer, deixando o comissário com sua mania.
- Se Ozep era Stan, não havia razão alguma para vir aqui matar uma cúmplice. Se não era Stan ...
E de repente, erguendo-se num movimento tão brusco que o brigadeiro teve um sobressalto:
- Veja o ombro desta mulher, por acaso... É, o esquerdo ...
Ele mesmo se inclinou. Lucas afastava o vestido, descobria uma carne muito branca e, nessa carne, a marca com a qual os americanos identificam as mulheres criminosas.
- Você viu , Lucas?
- Mas chefe ...
- Você não está entendendo? Stan era ela!... Eu tinha lido alguma coisa nesse sentido, mas não estava ligando as coisas, de tão convencido que estava de que nosso Stan era um homem... Há uns quatro ou cinco anos, uma moça, na América, no comando de um bando de criminosos, atacava as fazendas isoladas, exatamente como aconteceu aqui... exatamente como aqui, as vítimas eram degoladas, pela mão dessa mulher cuja crueldade os jornais americanos descreveram com vontade. ..
- É ela?
- Tenho praticamente certeza de que é ela... Mas saberei em uma hora, se encontrar os documentos em questão. .. Um dia eu arranquei as páginas numa revista... Você vem, Lucas?
Maigret empurrava seu subordinado pela escada. No térreo, chocou-se com o chefão.
- Aonde vai, Maigret?
- Ao Quai des Orfèvres, chefe... Acho que encontrei... Em todo caso, levo Lucas que virá lhe dizer. ..
E Maigret procurava um táxi, sem perceber que era olhado de um modo estranho, onde havia raiva e piedade.
- Mas Ozep...
- É exatamente ele que vou procurar. .. Quero dizer, espero achar informações sobre ele. .. Se ele matou essa mulher, é porque tinha motivo... Ouça, Lucas, quando eu quis mandá-lo falar com os outros, ele aceitou imediatamente... E ao contrário, quando lhe pedi para ir dar um recado à mulher, ele recusou e fui obrigado a exigir, quase ameaçar... Ou seja, os outros não o conheciam, mas a mulher conhecia...
Como se podia imaginar, foi preciso mais do que meia hora para botar a mão nos documentos, pois a ordem não era a qualidade dominante de Maigret, apesar de seu jeito plácido.
- Leia!... Preste atenção no exagero dos americanos que querem dar ao público o valor do seu dinheiro... "A mulher-vampiro"... "A polonesa fatal".. . "Uma chefe de bando de 23 anos"...
As aventuras da polonesa eram contadas com detalhes, e as fotografias eram muitas.
Stephanie Polintskaia, aos 18 anos, já era conhecida pela polícia de Varsóvia. Naquela época, encontrou um homem que fez dela sua mulher e se esforçou para refrear seus maus instintos. Ela teve um filho dele, mas, um dia, voltando do trabalho, esse homem encontrara o bebê degolado. Quanto à mulher, fugira com o dinheiro e alguns objetos preciosos que havia na casa...
- Você sabe quem é esse homem? - perguntou Maigret.
- Ozep? 

- Eis aqui seu retrato, perfeitamente parecido! O que prova que deveríamos saber de cor os arquivos criminais de todos os países do mundo. .. Você entende agora? Stephanie, a quem a família chamava de Stan, foi presa na América. Como ela escapou à prisão daquele país, não sei... E eis que ela se refugia na França onde retoma o curso de suas aventuras, sem mudar sua maneira de agir, depois de se cercar, como lá, de alguns brutos...
"O marido sabe pela imprensa que ela está em Paris, que a polícia está na pista .. . seu desejo seria salvá-la mais uma vez? Não acredito... Estou mais inclinado a acreditar que ele queria ter certeza de que a odiosa assassina de seu filho não escaparia ao castigo. . . É por isto que se oferece para me fazer um favor...
"Ele não tem coragem de agir sozinho... É um fraco, um faroleiro...
"Quer que a polícia aja com a sua ajuda e fui eu quem, hoje à tarde, o obrigou a, de alguma forma, fazer o gesto...
"Cara a cara com sua antiga mulher, na verdade, o que poderia ele fazer? Matar ou ser morto, pois vendo-se descoberta, essa mulher certamente não teria hesitado em suprimir o único homem capaz de denunciá-la.
"Então ele a matou! E quer que eu diga uma coisa? Aposto que vão encontrá-lo em algum canto do hotel, mais ou menos ferido. Depois de ter tentado se suicidar duas vezes e falhar nas duas vezes, eu me espantaria se não falhasse numa terceira. Agora, você pode voltar lá e dizer ao chefe ..."
- Não precisa! - disse a voz deste. - Stan o Matador enforcou-se num quarto do sexto andar cuja porta encontrou aberta... Boa solução!. ..
- Pobre coitado! - suspirou Maigret.
- Está com pena dele. ..
- Ora, pois estou ... Ainda mais porque sou um pouco responsável pela morte dele... não sei se estou ficando velho, mas levei muito tempo para achar a resposta...
- Que resposta? - perguntou o diretor da P.J. com um olhar de suspeita.
- A resposta para todo o problema! - afirmou Lucas, todo feliz por interferir. - O comissário acaba de reconstituir a história em todos os detalhes e, quando o senhor chegou, ele dizia que encontrariam Ozep em algum canto onde ele teria tentado se matar. ..
- É verdade, Maigret?
- É verdade. .. O senhor sabe, de tanto pensar num mesmo problema. .. Acho que nunca fiquei com tanta raiva na minha vida... Eu sabia que a resposta estava ali, bem perto, que só faltava uma coisinha de nada. .. Vocês todos zumbindo ao meu redor como grandes moscas e me falando de comparsas que não me interessavam ... Enfim!...
Ele respirou fundo, encheu seu cachimbo, pediu fósforos a Lucas, pois tinha gastado todos os seus durante a tarde.
- Diga lá, chefe! São sete horas. E se nós fossemos os três tomar um vinho bem gelado?. .. Com a condição de que Lucas tire sua peruca e volte a ter um aspecto apresentável ...
E eles estavam sentados na Brasserie Dauphine quando de repente o comissário bateu na testa. Acabara de olhar mecanicamente para o garçom.
- E Janvier? - perguntou.
- O quê?
- Ninguém o liberou de seu disfarce?... Coitado!. .. Quando penso que, enquanto nós tomamos vinho, ele ainda está condenado a servi-lo!
Tradução de Celina Portocarrero 
Os 100 Melhores Contos de Crime e Mistério da Literatura Universal
FLÁVIO MOREIRA DA COSTA
ORGANIZADOR
Seleção, introdução e notas



7 curiosidades sobre Georges Simenon
 setembro 4, 2014  Literatura Policial  4 Comentários alfred hitchcock, andré gide, clube do crime, companhia das letras,curiosidades, Gazette de Liège, john simenon, lausanne, lista literária, literatura policial, maigret, paris match, suíça, trussel

Georges Simenon nasceu em 13 de fevereiro de 1903 em Liège, na Bélgica, e morreu em Lausanne, aos 86 anos. Décimo sexto autor mais traduzido da história, ele escreveu mais de 450 romances e coleções de histórias impressas, foi publicado em 44 países, teve mais de 600 milhões de livros vendidos, 50 filmes e 123 episódios de TV baseados na sua obra.
Simenon era um bom observador das pessoas e dos detalhes. Era também seu melhor agente e advogado, um vendedor nato dos próprios livros, e dizem (ou ele dizia) um galanteador incorrigível. Entrou para o jornal da cidade aos 16 anos e, aos 19, já tinha se mudado para Paris buscando uma carreira como escritor. Escrevia cerca de 80 páginas por dia, e no intervalo de 10 anos publicou 200 livros sob vários pseudônimos (tudo isso antes de criar o famoso comissário Maigret).
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“Ele escrevia um capítulo inteiro muito rapidamente.
Perdia um litro de suor em uma sessão e
meia de escrita, era como um atleta!”
John Simenon, filho do autor
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Maigret surgiu em 1929, primeiro com Pietr, o Letão e depois em outros 74 romances e 28 contos. Seus romances policiais foram adaptados para o cinema e televisão, e são continuamente redescobertos por novas gerações. Reconhecido mundialmente, sua obra foi traduzida para 55 idiomas, mas vale ressaltar que na conta de Simenon também constam 136 romances psicológicos.
Descubra 7 curiosidades sobre o mundo de Simenon.



O Matador | Trailer [HD] | Um Filme Netflix

Netflix Brasil
Publicado em 28 de set de 2017
Em uma terra sem lei, Cabeleira (Diogo Morgado) investiga o paradeiro do cangaceiro Sete Orelhas (Deto Montegro). Essa busca o leva para a civilização e faz com que ele encontre na morte uma forma de viver. Sua jornada o fará descobrir que sua condição de matador pode ser um legado que não morrerá com ele. Com direção de Marcelo Galvão (Colegas, A Despedida), "O Matador" é o primeiro filme Netflix produzido no Brasil.






Por Una Cabeza (tradução)
Carlos Gardel

Por uma cabeça
De um nobre potro
Que justo na raia
Afrouxa ao chegar
E que ao regressar
Parece dizer:
Não esqueças, irmão
Você sabe, não há que jogar
Por uma cabeça
Paquera de um dia
Daquela fútil
E falsa mulher
Que, ao jurar sorrindo
O amor que está mentindo
Queime em uma fogueira
Todo o meu querer
Por uma cabeça
Todas as loucuras
Sua boca que beija
Apaga a tristeza
Acalma a amargura
Por uma cabeça
Se ela me esquece
Que me importa perder
Mil vezes a vida
Para que viver?
Quantos desenganos
Por uma cabeça
Eu joguei mil vezes
Não volto a insistir
Mas se um olhar
Me atinge ao passar
Seus lábios de fogo
Outra vez quero beijar
Chega de corridas
acabou o tesão
Um final renhido
Já não volto a ver!
Mas se algum matungo
É barbada para o domingo
Jogo tudo que tenho
Que vou fazer!

Letra original

Por una cabeza
De un noble potrillo
Que justo en la raya
Afloja al llegar
Y que al regresar
Parece decir:
No olvidéis, hermano
Vos sabés, no hay que jugar
Por una cabeza
Metejón de un día
De aquella coqueta
Y risueña mujer
Que al jurar sonriendo
El amor que está mintiendo
Quema en una hoguera
Todo mi querer
Por una cabeza
Todas las locuras
Su boca que besa
Borra la tristeza
Calma la amargura
Por una cabeza
Si ella me olvida
Qué importa perderme
Mil veces la vida
Para qué vivir
Cuantos desengaños
Por una cabeza
Yo juré mil veces
No vuelvo a insistir
Pero si un mirar
Me hiere al pasar
Su boca de fuego
Otra vez quiero besar
Basta de carreras
Se acabó la timba
¡Un final reñido
Ya no vuelvo a ver!
Pero si algún pingo
Llega a ser fija el domingo
Yo me juego entero.
¡Qué le voy a hacer!









REUNIÃO DE PAUTA: A derrota de Renan

O Antagonista
Publicado em 4 de fev de 2019



C'est de La Faute à Tes Yeux (tradução)
Edith Piaf

C'est de La Faute à Tes Yeux

Eu tinha tanto amor por um homem
Ele tinha tão pouco para mim
É pouco de vida, na verdade
eu o matei, muito ruim para mim

Tudo isso... Esta é a culpa em seus olhos
Na manhã tibieza
Um corpo perto do meu
Tudo isso... É culpa do bom tempo
Isso é culpa do amor
O céu estava muito azul

O advogado que tomou a minha defesa
Conta nosso romance
E para provar minha inocência
Suja os melhores dias

Tudo isso... Isso é culpa de seus olhos
Na manhã tibieza
Um corpo perto do meu
Tudo isso... É culpa do bom tempo
Isso é culpa do amor
Meu céu estava muito azul

O juiz severamente
Seus olhos não tinham horizonte
A voz grave e sem raiva
Me condenado à prisão

Tudo isso... Esta é a culpa nos meus olhos
Eles viram na sua
que dançava a minha dor
Tudo isso... É culpa do bom tempo
E eu vi meu amor
Chorando no meu céu azul
C'est de La Faute à Tes Yeux

J’avais tant d’amour pour un homme
Il en avait si peu pour moi
C’est peu de chose la vie, en somme
Je l’ai tué, tant pis pour moi…

Tout ça… C’est de la faute à ses yeux
Aux tiédeurs des matins
A son corps près du mien
Tout ça… C’est de la faute aux beaux jours
C’est de la faute à l’amour
Le ciel était trop bleu…

L’avocat qui prit ma défense
Conta notre roman d’amour
Et pour prouver mon innocence
Il en salit les plus beaux jours…

Tout ça… C’est de la faute à tes yeux
Aux tiédeurs des matins
A son corps près du mien
Tout ça… C’est de la faute aux beaux jours
C’est de la faute à l’amour
Mon ciel était trop bleu…

Le juge avait un air sévère
Ses yeux n’avaient pas d’horizon
D’une voix grave et sans colère
M’a condamnée à la prison

Tout ça… C’est de la faute à mes yeux
Ils ont vu dans les tiens
Que dansait mon chagrin
Tout ça… C’est de la faute aux beaux jours
Et j’ai vu mon amour
Pleurer sur mon ciel bleu…
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Referências

https://conteudo.imguol.com.br/c/entretenimento/e3/2018/12/19/dna-teste-de-dna-1545256083989_v2_900x506.jpg
https://noticias.uol.com.br/tecnologia/noticias/redacao/2019/02/05/moro-quer-banco-de-dna-amplo-e-dados-de-face-iris-e-voz-de-presos-entenda.htm
http://livred.info/os-100-melhores-contos-de-crime-e-mistrio-da-literatura-univer.html?page=75
https://almanaquedaliteraturapolicial.files.wordpress.com/2014/09/simenon_cachimbo.jpg?w=750&resize=750%2C500
https://youtu.be/hhm7glxFAcE
https://www.youtube.com/watch?v=hhm7glxFAcE
https://youtu.be/DQe9mclmvpk
REUNIÃO DE PAUTA: A derrota de Renan
https://www.youtube.com/watch?v=DQe9mclmvpk
https://youtu.be/ecY1YmK0JvE
https://www.vagalume.com.br/edith-piaf/cest-de-la-faute-a-tes-yeux-traducao.html

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