quarta-feira, 24 de julho de 2019

Procuradora-Geral da República requer o provimento destes embargos de declaração...


...para sanar as obscuridades acima apontadas e propiciar, se for o caso, o recurso posterior dela cabível.



Conclusão

Pelo exposto, para aclarar o teor e o alcance da decisão embargada, sua aderência à Constituição, às leis vigentes, aos tratados internacionais assinados pelo Brasil e ao precedente vinculante do STF, é que a Procuradora-Geral da República requer o provimento destes embargos de declaração, para sanar as obscuridades acima apontadas e propiciar, se for o caso, o recurso posterior dela cabível.

Brasília, 23 de julho de 2019.

Raquel Elias Ferreira Dodge
Procuradora-Geral da República

http://www.mpf.mp.br/pgr/documentos/9552019LJPGREmbargosRE1055941N21523220192cRD.pdf

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA

N.º 955/2019 – LJ/PGR
Sistema Único n.º 215232/2019

RECURSO EXTRAORDINÁRIO nº 1.055.941
RELATOR: Ministro Dias Toffoli



Excelentíssimo Senhor Ministro Dias Toffoli,







A PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA, no uso de suas atribuições constitucionais, com fundamento no art. 619 do Código de Processo Penal, vem interpor

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

em relação à decisão monocrática que, com fundamento no art. 1035-§5º do Código de Processo Civil (CPC), suspendeu todos os processos judiciais e, com base no poder geral de cautela do juiz, todos os inquéritos e procedimentos de investigação criminal com dados bancários ou fiscais repassados ao Ministério Público pelos órgãos de fiscalização e controle  (COAF, Receita Federal e BACEN), que vão além da identificação dos titulares das operações bancárias e dos montantes globais, sem prévia autorização judicial.

I – Breve resumo da ação penal e do recurso extraordinário

Nesta ação penal, o Ministério Público Federal obteve êxito na condenação dos réus pelos crimes tributários de sonegação fiscal tipificados no artigo 1º, inciso I e II da Lei 8.137/901 , a penas de reclusão superiores a 2 anos e 7 meses e a reparação dos danos causados à União (fls. 291-verso). Todavia, os réus recorreram ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que anulou a condenação "em razão do indevido compartilhamento de dados sigilosos obtidos pela Receita Federal junto às instituições financeiras sem prévia autorização judicial e anulou o feito, desde o recebimento da denúncia." (fl. 292-verso).

(...)

O julgamento deste recurso extraordinário pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) foi pautado para o dia 21 de novembro de 2019.

II - Do novo pedido

Em 15.07.2019, o requerente protocolou petição avulsa em que sustentou:

(...)

Assinalou, a propósito:

(...)

III – Da decisão embargada

Segundo o Código de Processo Civil, os embargos de declaração destinam-se a sanar obscuridade, contradição, omissão ou a corrigir erro material na decisão judicial, nos termos dos arts. 1.022 a 1.026 do CPC c/c art. 619 do CPP.
A decisão judicial ampliou o pedido que foi feito pelo requerente da petição avulsa apenas em relação ao seu PIC e em face do Ministério Público do Rio de Janeiro. Deste modo, esta decisão acabou por abranger expressamente todos os processos judiciais, investigações e PIC's que tramitam no território nacional, atingindo milhares de investigações e ações penais em curso, que tratam de matérias as mais diversas, inclusive de réus presos. Precisa ser aclarada nos seguintes aspectos:

(i)         primeira obscuridade: decisão ultra ou extra petita. A decisão embargada implicou em expansão indevida do objeto deste Recurso Extraordinário.
(ii)      segunda obscuridade: contrariedade a precedente vinculante do STF. A decisão embargada determinou a suspensão de inquéritos e PICs apesar de precedente vinculante do STF estabelecer a inaplicabilidade do art. 1035-§5º do CPC a inquéritos e PICs;
(iii)    terceira obscuridade: ampliação do pedido para abranger situações diferentes em curso no território nacional, incluídas sem pedido expresso. A decisão embargada aplicou dispositivos legais e precedente do STF que se dirigem a temática completamente diversa;

III.A PRIMEIRA OBSCURIDADE: DECISÃO ULTRA OU EXTRA PETITA. A DECISÃO EMBARGADA IMPLICOU EM EXPANSÃO INDEVIDA DO OBJETO DESTE RECURSO EXTRAORDINÁRIO, COM OFENSA À LEI.

(...)

Nestes limites, argui-se ofensa aos artigos 322, 324 e 492 do Código de Processo Civil, e pede-se nestes embargos de declaração, com fundamento no referido artigo 494-II, que a decisão não abranja qualquer outra situação de fato, exceto as que se enquadrem estritamente nesta situação, cujo mérito será resolvido no momento processual próprio pelo Pleno da Corte.

III.B SEGUNDA OBSCURIDADE: AMPLIAÇÃO DO PEDIDO PARA ABRANGER SITUAÇÕES DIFERENTES EM CURSO NO TERRITÓRIO NACIONAL, INCLUÍDAS SEM PEDIDO EXPRESSO. A DECISÃO EMBARGADA APLICOU DISPOSITIVOS LEGAIS E PRECEDENTE DO STF QUE SE DIRIGEM A TEMÁTICA COMPLETAMENTE DIVERSA.

(...)

A obscuridade que estes embargos de declaração visam a elucidar reside também em que sequer por analogia as balizas objetivas previstas no art. 5º-§2º da LC 105 poderiam ser aplicadas à transferência de dados fiscais e ou bancários pelo COAF ao Ministério Público, já que a disciplina legal desta transferência está em outra lei, a Lei9613/98, e é diversa da transferência de dados regulada pelo art. 5º da LC 105, conforme dito acima. Aplicar uma a outra mistura normas distintas.
Pede-se que esta obscuridade seja sanada no julgamento destes embargos de declaração.

III c. Terceira obscuridade: contrariedade a precedente vinculante do STF. Decisão embargada determinou a suspensão de inquéritos e PICs apesar de precedente vinculante do STF estabelecer a inaplicabilidade do art. 1035-§5º do CPC a inquéritos e PICs.

(...)

Por tais motivos, a decisão embargada encerra obscuridade ao suspender todos os inquéritos e PICs que tratem do tema 990 da sistemática de repercussão geral, apesar de o Pleno do STF já ter sedimentado o entendimento, em precedente vinculante oriundo do julgamento de QO no RE 966177, de que “o sobrestamento de processos penais determinado em razão da adoção da sistemática da repercussão geral não abrange: a) inquéritos policiais ou procedimentos investigatórios conduzidos pelo Ministério Público; b) ações penais em que haja réu preso provisoriamente”, o qual foi utilizado como razão de decidir pela decisão embargada.
Pede-se que esta obscuridade seja aclarada no julgamento destes embargos de declaração, notadamente em relação a investigações extrajudiciais e judiciais em que há réus presos.

III.D OBSCURIDADE: A DECISÃO EMBARGADA IMPLICOU EXPANSÃO INDEVIDA DO OBJETO DESTE RECURSO EXTRAORDINÁRIO E DA PETIÇÃO AVULSA

(...)

Desse modo, não é possível afirmar que a ampliação do objeto deste Recurso Extraordinário não teria impactos sobre o julgamento de mérito, na medida em que implica a necessidade de se analisar um arcabouço normativo significantemente maior, em alguns casos, inclusive, composto por regramentos supralegais. No caso em exame, o réu responde por crime de sonegação fiscal apenas. A harmonização de todas essas normas é tarefa complexa; mesmo que fosse o caso de se proceder assim, não se afigura possível subtrair o juízo de conveniência e oportunidade dessa extensão do órgão competente para tanto, o Plenário do STF.
Assim, peço que esta obscuridade seja sanada por meio destes embargos, para sendo adequado novo pronunciamento que elucide as aparentes incoerências expostas, com redução do alcance da decisão.

IV – Breves considerações pragmáticas sobre o impacto da decisão e sobre o tema de fundo do Recurso Extraordinário.

IV.a Razões práticas.

(...)

Semelhante dificuldade, aliás, enfrentarão autoridades de Unidades de Inteligência Financeira (UIFs) estrangeiras, as quais deverão formalizar procedimentos de cooperação internacional (naturalmente mais morosos) a fim de obter informações cujo acesso, no âmbito da comunidade internacional, não está submetido à reserva de jurisdição. Em razão do princípio da reciprocidade, já se pode antever que mesmo entrave será imposto para os requerimentos de informação formalizados pelas autoridades brasileiras, atravancando ainda mais investigações que apurem delitos transnacionais, como tráfico internacional de drogas, de armas e pornografia infantil.

IV.B IMPACTO NAS INVESTIGAÇÕES POSSIVELMENTE CAUSADO PELA DECISÃO EMBARGADA

(...)

Como se pode notar, a suspensão imposta pela decisão embargada atinge inúmeras investigações e ações penais em todo país, conforme têm informado os membros de diferentes Ministérios Públicos estaduais e Federal e colegiados nacionais, afetando sobretudo aquelas com a macrocriminalidade organizada, que se vale de sofisticadas engrenagens a fim de ocultar e garantir o usufruto das riquezas obtidas ilegalmente.

V – CONSIDERAÇÕES A RESPEITO

V.A – CONSIDERAÇÕES INICIAIS: A COGÊNCIA DAS RECOMENDAÇÕES DO GAFI

(...)

Assim, em linha com as determinações do Conselho de Segurança da ONU e na condição de membro pleno GAFI, o Brasil assumiu o compromisso de seguir e implementar as Quarenta Recomendações. Deve ser observado, aliás, que as recomendações do GAFI (26 a 28) eram consideradas como largamente cumpridas pelo Brasil, conforme avaliação realizada em 201016 , o que poderá ser alterado. Está agendada nova avaliação do país para o início de 2020.

V.B DAS RECOMENDAÇÕES DO GAFI INOBSERVADAS PELA DECISÃO ORA EMBARGADA

(...)

Percebe-se, portanto, que os efeitos de eventual descumprimento de diretrizes emanadas do GAFI podem comprometer tanto a reputação internacional do Brasil quanto sua atuação nos principais mercados financeiros internacionais. E as consequências daí decorrentes seriam desastrosas, a exemplo da dificuldade de acesso a créditos internacionais para financiamentos de projetos de desenvolvimento, restrição a instituições financeiras brasileiras em transações internacionais, restrições a produtos brasileiros em transações comerciais internacionais pela dificuldade e risco inerentes aos fluxos financeiros e pagamentos a exportadores brasileiros.

VI – Conclusão

Pelo exposto, para aclarar o teor e o alcance da decisão embargada, sua aderência à Constituição, às leis vigentes, aos tratados internacionais assinados pelo Brasil e ao precedente vinculante do STF, é que a Procuradora-Geral da República requer o provimento destes embargos de declaração, para sanar as obscuridades acima apontadas e propiciar, se for o caso, o recurso posterior dela cabível.

Brasília, 23 de julho de 2019.

Raquel Elias Ferreira Dodge
Procuradora-Geral da República

Fonte: http://www.mpf.mp.br/pgr/documentos/9552019LJPGREmbargosRE1055941N21523220192cRD.pdf
Acessado em: 24/07/2019

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