Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém que não entenda.
Cecília
Meireles
Liberdade
Carlos Drummond de Andrade
O pássaro é livre
na prisão do ar.
O espírito é livre
na prisão do corpo.
Mas livre, bem livre,
é mesmo estar morto.
Composição: Carlos Drummond de Andrade
O
que é que Ouro Preto Tem?
Tem montanhas e luar; Tem burrinhos, pombos brancos
Nuvens vermelhas pelo ar; Tem procissões nas ladeiras Com dois sinos a tocar;
Opas de todas as cores Anjinhos a caminhar... Tem Rosário, São Francisco Santa
Efigênia, Pilar... Tem altares e oratórios Cadeirinhas de arruar. Tem casas de
doze janelas, Estudantes a cantar... Tem saudades e fantasmas Ouro por todo
lugar. Tem santos de pedra- sabão Calçadas de escorregar, E ali, na Rua das
Flores, Na varandinha do bar, Tem a figura risonha Do grande pintor Guignard
Que Deus botou neste mundo Para Ouro Preto pintar. Cecília Meireles
A
GUIGNARD
Caro pintor Guignard, que está enfermo: daqui desta
cidade, onde perdura o eco fantasista de teus passos pelos caminhos claros da
pintura: do Rio, onde teus quadros mais festivos, evadindo-se às lindes da
matéria, à prisão dos museus, ao pobre tempo, voam livres no céu, em luz
etérea; onde Stendhal, turista mais sensível, correria os cafés, sem que jamais
sua procura atenta e minuciosa neles recuperasse teus murais, pois o São
Sebastião, as caravelas, em Barata Ribeiro, e os verdes ramos ofertados aos
pobres, já sumiram, só florescendo em nós, que os recordamos; e da grande
madona que confiaste, a um sorveteiro humilde, nada resta, em porta material se
convertendo, o que é porta do céu para a alma em festa; daqui, porém, onde
outros testemunhos falam de ti às gentes distraídas, como no hotel essa parede
súbita que multiplica, ao sol, as nossas vidas, cantando em passarinhos e
folhagens, em cores mais sutis que a própria cor, de vez, Guignard, que pintas
o teu sonho, e na raiz do sonho vela o amor; daqui, onde retratos de meninas
continuam meninas, murmurando um segredo infantil de seiva e bruma, desvendado
por ti, anjo pintando: desse Rio amoroso e cristalino, onde algum banco de
azulejo e casas de ilusão abrem cenários para as moças que pintas, e que eu
vejo, sem registro civil, incorporadas ao puro mito poético da Jovem, que a
todo mal resiste, e resplandece quando, em torno de nós, os males chovem; daqui
te mando, amigo, esta mensagem à casa de saúde onde repousas do teu muito
pensar em nuvens e anjos, que entre todos os bens, são tuas cousas. Aníbal e
Rodrigo – dois apenas citarei, mas não muitos, e o flamante fuzileiro naval e
sua noiva, comigo fraternizam neste instante. Amigos e modelos, em conjunto
afetuoso, por sobre a Mantiqueira, fazem-te esta visita sem palavras, fruto de
simpatia verdadeira. Volta, Guignard, de corpo restaurado, ao mundo material,
de onde extraías o delicado mundo guignardiano, entre balões, nas altas
serranias. voam livres no céu, em luz etérea; onde Stendhal, turista mais
sensível, correria os cafés, sem que jamais sua procura atenta e minuciosa
neles recuperasse teus murais, pois o São Sebastião, as caravelas, em Barata
Ribeiro, e os verdes ramos ofertados aos pobres, já sumiram, só florescendo em
nós, que os recordamos; e da grande madona que confiaste, a um sorveteiro
humilde, nada resta, em porta material se convertendo, o que é porta do céu para
a alma em festa; daqui, porém, onde outros testemunhos falam de ti às gentes
distraídas, como no hotel essa parede súbita que multiplica, ao sol, as nossas
vidas, cantando em passarinhos e folhagens. Carlos Drummond de Andrade (Correio
de Minas, Belo Horizonte, 26 de junho de 1962. p. 3. Caderno 2. “Viola de
Bolso”)
Paisagem
de Ouro Preto - Igreja Antonio Dias, 1962
óleo s/ compensado de madeira
67,5 x 87 cm
óleo s/ compensado de madeira
67,5 x 87 cm
Referências
https://www.pensador.com/frase/MTU2MjQ/
https://youtu.be/iwljoDLXJMY
http://www1.cultura.mg.gov.br/fronteira/template/textos/guignard_prosa_verso.pdf
http://www.dangaleria.com.br/modern/obras/guignard_2.jpg
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh7Ubt2arLavvTsmo-tkmI2xdcIXLN3nv-Ay-daIg5wePjAwk4v4HMZt5TY6GCX1854O4NKiJpCgAy9Q7SFVYqlhvaxcf3XmrEaaOy3rKeJNMgL5hxcHfhoTN34WIDrc23A8HyYTQD57PU/s1600/Paisagem+Ouro+Preto,+1959.jpg
http://www.elfikurten.com.br/2014/03/alberto-da-veiga-guignard-modernidade-e.html
http://www.dangaleria.com.br/modern/guignard_2.html
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