“Sou
o intervalo entre o meu desejo e aquilo que os desejos dos outros fizeram de
mim.” FERNANDO PESSOA
“(...)
Pensei então em escrever uma estória ao contrário: um menino que nasce de carne
e osso e, à medida que estuda na escola, vai virando uma outra coisa... (...)”
RUBEM ALVES PINÓCHIO ÀS AVESSAS
EDITORIAL
EDITORIAL
ESTADÃO
Já
houve um tempo, não tão distante, em que as forças do Congresso Nacional se
organizavam em blocos governista e oposicionista com base em considerações
programáticas. Isso significa que o toma lá dá cá, a transformação de cada
deputado em partido de si mesmo, sem qualquer vínculo com ideias e propostas
para o País, não são uma fatalidade. O abastardamento da política, infelizmente
visto hoje quase como algo natural, é na verdade resultado da meticulosa
engenharia dos artesãoslulopetistas, cuja pretensão de permanecer para sempre
no poder jamais foi compatível com o funcionamento normal das instituições
democráticas, a começar pelo Congresso. A defenestração do PT, portanto,
deveria sinalizar a reversão desse processo de desmoralização da democracia,
restabelecendo o princípio das alianças em torno de projetos, e não de verbas,
sinecuras ou coisa pior. Mas o atual governo não parece suficientemente
disposto a romper a terrível lógica do fisiologismo - e tal hesitação cobra seu
preço na forma de incerteza permanente sobre o apoio político a medidas
essenciais para a recuperação econômica do País.
14
Agosto 2016 | 05h00
Um
exemplo disso foi dado na terça-feira passada, quando a Câmara votou o projeto
que renegocia a dívida dos Estados com a União em troca da imposição de um teto
para os gastos estaduais, primeiro grande passo do governo do presidente em
exercício Michel Temer na direção do urgente ajuste fiscal. Apesar da
aprovação, 55 deputados que supostamente integram a base de sustentação de Temer
votaram contra o projeto. Com os ausentes e os que se abstiveram de votar,
conforme mostrou o jornal O Globo, chegou a 133 o número de deputados
governistas que não deram seu apoio - cerca de um terço da bancada de 380
deputados que deveriam ser fiéis ao governo.
A
traição ficou particularmente explícita no caso do PSC, partido do líder do
governo na Câmara, deputado André Moura (SE). Dos 8 deputados da legenda, nada
menos que 5 votaram contra o projeto encaminhado por Temer.
O
próprio partido do presidente em exercício não foi um primor de fidelidade. Dos
52 parlamentares do PMDB que compareceram à votação, 5 votaram contra e outros
14 correligionários de Temer nem sequer apareceram para votar. A desculpa é a
esfarrapada de sempre: os ausentes estavam envolvidos com as eleições
municipais, e os que votaram contra assim o fizeram para não melindrar suas
bases em ano eleitoral. Considerando-se que esses políticos não fazem outra
coisa senão pensar na eleição seguinte, é o caso de perguntar se em algum momento
o governo poderá contar com eles para aprovar medidas relevantes para o País.
Esse
cenário incômodo para o governo prova que as alianças costuradas com promessas
de vantagens para partidos e políticos não são garantia de apoio. Muito pelo
contrário: o governo nada pode fazer caso seja passado para trás, e é essa
certeza que torna os oportunistas tão ousados - a ponto de votarem contra o
governo mesmo depois que este lhes fez todas as concessões exigidas, como
aconteceu na votação do projeto sobre as dívidas estaduais.
Um
exemplo escandaloso é o do Solidariedade, partido de Paulinho da Força.
Noticiou-se recentemente que Temer vai ressuscitar o Ministério do
Desenvolvimento Agrário somente para agradar àquele partido. No entanto, eis
que 4 dos 11 deputados do Solidariedade presentes à sessão de terça-feira
passada votaram contra o projeto do governo, e outros 3 correligionários de
Paulinho nem deram as caras.
Temer
e seus experientes operadores no Congresso decerto sabem que os políticos se
acomodam às circunstâncias. Se o governo deixar claro que não faz negócios, e
sim política, haverá razoável chance de que os parlamentares, uma vez
convencidos de que o Executivo deixou de ser franqueado aos parasitas, comecem
a pensar no verdadeiro interesse de seus eleitores, ou seja, no interesse
público. No entanto, se o governo seguir acreditando que as únicas alianças
possíveis são as fisiológicas, não terá direito de se queixar dos tropeços que
fatalmente sofrerá.
OPINIÃO
BRASIL
Saqueada
por um bando de ladrões e devastada por 13 anos de erros e irresponsabilidades,
a maior empresa do Brasil, a Petrobrás, apenas começa a emergir do atoleiro. O
lucro trimestral de R$ 370 milhões ficou muito abaixo dos R$ 2 bilhões
projetados por analistas financeiros. Mas pelo menos as contas ficaram
positivas depois de três períodos no vermelho. A reconstrução ainda vai ser
demorada e será impossível, já avisaram os novos administradores, completar os
investimentos de US$ 20 bilhões programados para este ano. Com prejuízo de R$
2,17 bilhões no primeiro semestre, o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) também exibe as marcas do governo petista. Em um ano
a provisão para risco de crédito passou de R$ 480 milhões para R$ 4,44 bilhões,
aumentando 824,4%. Mas os danos à Petrobrás e a outras estatais são apenas
marcas especialmente visíveis dos estragos causados por uma rara combinação de
incompetência, irresponsabilidade, arrogância e corrupção. Não cabe nessas
tabelas a parte mais importante e mais impressionante da história.
Rolf Kuntz,
O Estado de S.Paulo
O Estado de S.Paulo
14
Agosto 2016 | 06h29
Nem
tudo é explicitado nos balanços e nas demonstrações de lucros e perdas. Não
aparecem, por exemplo, as consequências econômicas – para a empresa e para o
País – do enfraquecimento da Petrobrás. Não se explicitam os efeitos do enorme
desperdício de recursos nas operações do BNDES ou de outros bancos estatais.
Não se passa diretamente dessas contas para a inflação e para a deterioração da
economia nacional, mas todos esses fatos são componentes da mesma história.
Parte
do balanço dessa longa noitada de farras e desmandos vem sendo realizada pela
Operação Lava Jato. Nenhuma investigação igualmente profunda foi iniciada em
outras áreas da administração indireta, mas um de seus desdobramentos atingiu a
Eletronuclear e já resultou em condenação. Como o aparelhamento, o loteamento e
a barganha têm dominado a alocação de altos postos no sistema estatal, ninguém
se surpreenderá se novas investigações mostrarem uma rede muito mais ampla de
escândalos.
Neste
emaranhado de bandalheiras e de irresponsabilidades, nem sempre é fácil
distinguir o crime da mera incompetência. Mas os dois conjuntos de ações
convergiram na produção do desastre maior. Só de transferências do Tesouro o
BNDES recebeu mais de R$ 400 bilhões a partir de 2009. Era dinheiro destinado
ao Programa de Sustentação do Investimento (PSI), criado para durar poucos
meses, como parte do combate à recessão, mas só extinto no ano passado.
As
aplicações do banco, destinadas preferencialmente a grandes grupos e vinculadas
à criação de campeões nacionais, consumiram enormes volumes de dinheiro, com
resultados abaixo de pífios e, em alguns casos, escandalosos.
A
crise da indústria, iniciada no meio do primeiro mandato da presidente Dilma
Rousseff, comprova há muito tempo o erro das decisões. Pelos dados oficiais, a
produção geral da indústria cresceu 0,4% em 2011, diminuiu 2,3% em 2012,
aumentou 2,1% em 2013 e depois encolheu sem parar. Houve resultados negativos
de 3% em 2014, 8,2% em 2015 e 9,1% no primeiro semestre de 2016.
Não
houve apenas um enorme recuo da produção. Houve também, mais grave que isso,
uma desastrosa perda de produtividade e de poder de competição. O governo
gastou bilhões em subsídios ao crédito, perdeu bilhões em desonerações fiscais
e criou programas vinculados a protecionismo comercial. Nada funcionou, porque
os setores favorecidos se acomodaram no esquema de favores, enquanto puderam, e
deixaram de investir.
A
maior prova disso é o recuo tanto da produção quanto da importação de bens de
capital (máquinas e equipamentos). A Petrobrás, submetida a uma política de
conteúdo nacional na compra de equipamentos e componentes, teve de suportar
custos maiores e de perder eficiência também por isso. A crise da fornecedora
de sondas Sete Brasil, levada à recuperação judicial, é parte dessa história
altamente imprópria para menores.
O
desarranjo das contas públicas, a inflação acima dos padrões dos países
desenvolvidos e emergentes, a recessão, o desemprego de mais de 11 milhões e a
contração do comércio exterior são efeitos desses erros e desmandos. Uma
história mais completa incluiria as pedaladas e a maquiagem das contas
públicas, a gestão desastrosa do setor elétrico e a contenção de preços da
gasolina, mas nem é preciso avançar nesses detalhes.
O
superávit comercial só voltou a ocorrer porque as importações caíram mais que
as exportações. De janeiro a julho o valor dos bens importados foi 27,6% menor
que o de um ano antes, pela média dos dias úteis. A receita das vendas externas
foi apenas 5,6% inferior à de janeiro a julho de 2015. Ainda assim, o superávit
de US$ 28,23 bilhões só foi possível porque o agronegócio teve um saldo
positivo de US$ 45,58 bilhões, suficiente para compensar com sobras o déficit
conjunto dos demais setores.
Há
sinais de estabilização da economia. Se o governo provisório se converter em
efetivo, terá mais força para implantar medidas de arrumação das contas
públicas. O crescimento poderá recomeçar, facilitado pela enorme capacidade
ociosa da indústria. Mas crescimento para valer – duradouro e pelo menos na
faixa de 4% a 5% ao ano – só virá se a economia se tornar muito mais eficiente
e competitiva. Isso dependerá de contas fiscais em condições aceitáveis, de
inflação menor (com juros também menores) e de muito investimento em capital
fixo e em boa educação.
A
política educacional só irá para o rumo necessário se o populismo for
abandonado e a qualidade, revalorizada. Perdeu-se tempo alargando as portas de
ingresso em faculdades, enquanto se desprezava a boa formação fundamental e
média.
A
exigência de boa formação em linguagem, matemática e ciências foi rotulada como
preconceito elitista, como se nos países mais capazes de competir e de gerar
bons empregos a educação fosse tratada com populismo e descuido. A recriação de
um país próspero vai dar muito mais trabalho que a mera reativação da economia.
POLITICA
Defesa
do amigo do ex-presidente Lula apresenta alegações finais no processo da Lava
Jato em que é réu por corrupção, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta no
emblemático empréstimo de R$ 12 milhões que tomou junto ao Banco Schahin, em
2004, para 'irrigar'o partido
Fausto Macedo, Julia Affonso e
Mateus Coutinho
13
Agosto 2016 | 05h39
Jose
Carlos Bumlai FOTO GABRIELA BILO /
ESTADAO
O
pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Lula e preso desde 24 de
novembro de 2015 na Operação Passe Livre, desdobramento da Lava Jato, se
considera o ‘trouxa perfeito do PT’. Em alegações finais – peça decisiva na
ação penal em que Bumlai é réu por corrupção, lavagem de dinheiro e gestão
fraudulenta de instituição financeira -, apresentada ao juiz Sérgio Moro nesta
sexta-feira, 12, a defesa diz que ele ‘sabe ter cometido um grave equívoco, que
redundou na acusação, tem consciência de seus atos e de muitos deles se
arrepende’.
Bumlai
é protagonista do emblemático empréstimo de R$ 12 milhões que tomou junto ao
Banco Schahin, em outubro de 2004. O dinheiro, segundo o próprio pecuarista,
foi destinado ao PT, na ocasião em dificuldades de caixa. Segundo a Lava Jato,
em troca do empréstimo, o Grupo Schahin foi favorecido por um contrato de US$
1,6 bilhão sem licitação com a Petrobrás, em 2009, para operar o navio sonda
Vitória 10.000. Lula, que não é acusado nesta ação, teria dado a ‘bênção’ ao negócio
– o que é negado pela defesa do petista.
“A
prova dos autos explica o que de fato aconteceu: o PT precisava de dinheiro
para, entre outras providências, quitar dívidas da campanha da prefeitura de
Campinas”, alega a defesa. “Por sua vez, o Banco Schahin, representado pelo
então presidente Sandro Tordin e seus controladores Salim e MIlton Schahin,
tinha dinheiro disponível e muito interesse em se aproximar do Governo Federal
e do Partido dos Trabalhadores para se beneficiar de novas ‘oportunidades de negócios’…
Nesse contexto, como esclareceu Bumlai, ‘o empréstimo já estava totalmente
aprovado’ e ‘só precisava de um trouxa’ ‘pra assinar e ficar responsável por
ele’22. E o ‘trouxa’ escolhido foi José Carlos Bumlai que, além de ser
conhecido de todos os envolvidos, era adimplente23 e amigo do presidente
Lula24. Eis o trouxa perfeito!”
Documento
Ao
final do documento de 70 páginas, a defesa pede a Moro que devolva a Bumlai a
liberdade.
“Na
contramão do que tem sido comum nos processos envolvendo a Força-Tarefa da
Lava-Jato, José Carlos Bumlai não é lobista, não é empreiteiro, não é político
e tampouco se beneficiou de contratos milionários com o Governo Federal. Tudo o
que tinha a esclarecer, foi esclarecido. Bumlai errou e arrepende-se
imensamente. Afinal, cometeu falsidades documentais que possibilitaram a
irrigação ilícita de recursos ao Partido dos Trabalhadores, sucedida,
posteriormente e à sua total revelia, de uma compensação de favores escusa
entre esta agremiação partidária e o Grupo Schahin em negociações com a
Petrobrás. Mas, a César o que é de César!”
Enfraquecido
por um câncer na bexiga e problemas cardíacos, Bumlai, de 71 anos, há alguns
meses foi autorizado pelo juiz Moro a fazer tratamento em casa. Mas, nesta
quinta-feira, 11, o juiz da Lava Jato mandou o amigo de Lula voltar para a
prisão em regime fechado.
Nas
alegações finais, os advogados de Bumlai argumentam. “Ainda que a acusação
insista em apontar José Carlos Bumlai como grande ‘protagonista’ dos fatos, o
que a instrução comprovou é aquilo que ele mesmo disse em seu interrogatório em
Juízo: foi apenas o ‘trouxa’, o homme de paille, de que o Partido dos
Trabalhadores e o Banco Schahin precisavam para simular o empréstimo de R$12
milhões. Nada mais do que isso!”
“Os
erros que cometeu são sim condenáveis, mas, diferentemente do que sustenta o
Ministério Público Federal, estão longe de configurar qualquer um dos crimes
apontados na denúncia”, insistem os advogados do pecuarista, um grupo de seis
criminalistas – Jacinto Miranda Coutinho, Daniella Meggiolaro, Edward Rocha de
Carvalho, Conrado de Almeida Prado, Lyzie de Sousa Andrade Perfi e Fernando
Bertolino Storto.
“Os
meses em que esteve na cadeia somados ao tempo em que permanece enfurnado e
doente em casa já foram mais que suficientes para castigá-lo pelas falsidades
que praticou para tomar e quitar um empréstimo que jamais lhe beneficiou”,
enfatizam os advogados.
“Arrepende-se,
pois sua trajetória de vida até meados de 2004 sempre fora escorreita e
ilibada. Arrepende-se, pois, sem nenhuma intenção, acabou envolvendo um grande
amigo e parceiro de negócios em uma ‘fria’1. Arrepende-se, pois seu filho
Maurício, injustamente, também responde a essa ação penal. Arrepende-se, pois
não há dificuldade em dizer não e receio de desagradar ao partido político da
situação que justifiquem a realização de um empréstimo simulado. A confissão
(de Bumlai) foi como um bálsamo em sua vida, pois com ela conseguiu tirar de
suas costas um peso que vinha carregando há mais de 10 anos, passando,
finalmente, a dormir em paz.”
A
defesa alega incompetência de Moro para o caso, aponta ‘a imprestabilidade das
provas obtidas por interceptações telefônicas ilegais’, a ‘ilegalidade da
interceptação telemática’ e diz que ‘é inepta’ a denúncia do Ministério Público
Federal.
“O
fetiche em torno de sua figura sempre foi grande, mas a imagem de articulador
do Governo Federal e de intermediário de supostos negócios escusos de interesse
do então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva finalmente
desmilinguiu-se, desmantelou-se”, segue a defesa. “O que restou dessa ação
penal foi a constatação de que as bandalheiras envolvendo a Petrobrás, seus
dirigentes e funcionários, partidos políticos e agentes públicos passam ao
largo de José Carlos Bumlai.”
“A
amizade entre Bumlai e o ex-chefe do Executivo existe e não tem como ser
negada. Mas dela nada mais se extrai, a não ser uma enorme injustiça, que está
na iminência de se desfazer.”
A
defesa aponta para um capítulo do caso que envolve o então tesoureiro do PT,
João Vaccari Neto – preso na Lava Jato desde abril de 2015. “Como o próprio
Bumlai admitiu perante esse Juízo, ele cometeu um ‘grande erro’ ao consentir
com as ações arquitetadas pelos representantes das partes interessadas no
empréstimo, ou seja, o Banco Schahin e o Partido dos Trabalhadores, concordando
em realizar falsamente o mútuo em seu nome. Ao perceber que o empréstimo não
seria quitado como prometido, o peticionário, é verdade, procurou o responsável
pelas finanças do PT na época para cobrar uma solução, já que a iniciativa de
pagar a dívida com a entrega de um bem imóvel havia sido rechaçada pelos
credores. Sem entrar no mérito de como isso seria feito, afinal, esse problema
não era seu, Bumlai apenas cobrou uma posição do tesoureiro João Vaccari, tendo
este lhe dito depois que a quitação viria assim que fossem acertados negócios
entre a Petrobrás e o Banco Schahin, cujos interesses eram bem maiores do que
receber de volta os 12 milhões emprestados.”
“José
Carlos Bumlai é um senhor de 71 anos, primário e de bons antecedentes e
acometido por uma série de enfermidades recentemente descobertas”, ponderam os
defensores. “Mesmo assim, em nenhum momento criou óbice ao trâmite do processo
ou reiterou as condutas a ele atribuídas, cessadas no longínquo ano de 2009.
Ademais, conforme comprovado nos autos, não comandou ou liderou a prática de
qualquer crime, tampouco se utilizou do nome do ex-presidente Lula para fins
ilícitos.”
“Muito
embora não tenha assinado nenhum acordo de colaboração premiada, (Bumlai)
confessou voluntária e espontaneamente suas condutas, auxiliando efetivamente
para o deslinde não só das investigações que redundaram nesta ação penal.”
“Apesar
da irresignação da acusação, a prova dos autos revela que Bumlai não praticou
os delitos de corrupção passiva, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O
único crime que pode ser a ele atribuído é o de falsidade documental, já
prescrito, motivo pelo qual sua absolvição é medida de rigor.”
A
defesa contesta, ainda, o que classifica de desproporcional constrição
patrimonial imposta a Bumlai. “Para garantir futura indenização pelos prejuízos
supostamente causados pelos delitos apurados nesta ação penal, Bumlai e seus
familiares sofreram constrição patrimonial de 23 veículos e 22 imóveis. Não
obstante, há nesta ação penal outros corréus que tiveram atuação bem mais
intensa que a de José Carlos Bumlai, que lucraram com o crime, que causaram
prejuízo à Petrobrás, mas que, estranhamente, não tiveram nenhum de seus bens
bloqueados. Esses acusados – exempli gratia os afagados e protegidos donos do
Banco Schahin – inclusive, possuem liquidez o bastante para garantir e reparar
o dano de forma bem mais rápida e eficiente que Bumlai.”
Ao
pedir a Moro que mande soltar Bumlai, os advogados destacam um ponto que
reputam importante. “Ele jamais quebrou as condições estabelecidas para a
prisão domiciliar, de modo que não há nenhum indicativo de que sua manutenção
nesse regime possa colocar em risco a ordem pública ou a aplicação da Lei Penal
e, ao mesmo tempo, permitirá que ele possa cuidar dignamente de sua saúde. Por
esse motivo, o defendente dirige um apelo a esse Juízo: pede, na remota
hipótese de condenação, a possibilidade de responder o processo em liberdade
ou, ao menos, a fixação de uma medida cautelar menos gravosa, como o uso da
tornozeleira eletrônica em regime domiciliar.”
Os
advogados anotam que o Ministério Público Federal quer a condenação e a
manutenção do encarceramento do amigo de Lula, ‘mesmo já tendo passado meses na
prisão, mesmo diante de seu debilitado quadro de saúde, mesmo diante de sua
postura altamente colaborativa’.
A
defesa define Bumlai como ‘um empresário probo, um benfeitor de grandes
projetos sociais, que sempre prezou por ajudar ao próximo e que nunca se
beneficiou de um único tostão proveniente do empréstimo tomado em seu nome ou
da inescrupulosa empreitada envolvendo a maior estatal brasileira’.
“O
acusado confia no bom senso desse Juízo, que haverá de julgar improcedente
todas as pretensões da acusação”, concluem os advogados de Bumlai. “Assim,
aguarda serenamente sua absolvição, seja em razão da atipicidade dos fatos que
lhe são imputados, seja em razão da comprovação de que não participou dos
crimes que lhe são atribuídos. Mesmo que V. Exa. assim não entenda, a acusação
não pode prosperar em razão da ilicitude originária da prova colhida nos autos
e das demais nulidades que permeiam o feito.”
O
pedido derradeiro. “Se, por absurdo, sobrevier sua condenação, aguarda-se a
fixação das penas no mínimo legal, com a aplicação das atenuantes do artigo 65,
incisos I e III, alínea d, do Código Penal e das causas de diminuição de pena
previstas no artigo 1º, §5º, da Lei n° 9.613/98 e no artigo 29, § 1°, do Código
Penal, com o cumprimento em regime inicial aberto ou semi-aberto.”
A
Schahin informou que não iria se manifestar e que segue colaborando com a
Justiça.
ESTADÃO
conteúdo De São Paulo e Curitiba
11/03/201615h14
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Rodolfo Buhrer/
Paraná Portal
José
Carlos Bumlai é levado ao complexo médico penal de São José dos Pinhais (PR)
O
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou, por escrito, nesta
quinta-feira (10), que seu amigo José Carlos Bumlai - preso desde dia 24 de
novembro na Operação Passe Livre, desdobramento da Lava Jato - é um "homem
de bem, honesto e pai de família exemplar, tendo-o na mais alta conta". A
declaração de Lula foi juntada pela defesa de Bumlai em documento que pede a
desistência do depoimento do petista como sua testemunha de defesa.
O
depoimento do petista está marcado para esta segunda-feira (14), por
videoconferência, mas poderá ser cancelado se a Justiça aceitar o pedido de
desistência. O ex-presidente foi intimado a comparecer à Justiça Federal, em
São Paulo.
A
declaração de Lula é dividida em cinco itens. Um deles entra no mérito do
motivo da prisão do amigo. O pecuarista é acusado de ter tomado empréstimo
fraudulento de R$ 12 milhões em outubro de 2004 junto ao Banco Schahin - em
troca, o Grupo Schahin foi contratado para operar sondas na Petrobras ao preço
de US$ 1,6 bilhão, em 2009, no Governo Lula.
"Jamais
tive conhecimento de eventual interesse do Sr. Bumlai em negócios relativos a
sondas de prospecção de petróleo, seja através do Grupo Schahin, seja de
outros, assim como jamais manifestei a quem quer que fosse que esse assunto
pudesse causar-lhe problemas ou pedi ajuda para "protegê-lo" de um
mal cuja existência desconheço", afirma o ex-presidente em documento
assinado de próprio punho.
Bumlai
responde ação penal por corrupção, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta.
No
ofício ao juiz federal Sérgio Moro, os advogados do amigo de Lula juntaram um
depoimento que o petista prestou à Polícia Federal, em Brasília, em dezembro de
2015.
"José
Carlos Costa Marques Bumlai, por seus advogados, nos autos da ação penal em
epígrafe, vem à presença de V. Exa. desistir da oitiva de Luiz Inácio Lula da
Silva, bem como requerer a juntada do termo de depoimento prestado por ele à
Polícia Federal (doc. nº 1) e da declaração prestada por escrito (doc. nº 2),
tendo em vista que o teor desses documentos representa o conteúdo de prova que
se pretendia produzir com tal testemunho."
Lula
na mira: Lava Jato investiga ex-presidente e deflagra protestos68 fotos
58
/ 68
4.mar.2016
- O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez discurso inflamado e
emocionado para militantes no Sindicato dos Bancários, em São Paulo (SP). Em
sua fala, Lula disse que virou o "o melhor presidente que este país já
teve" e se defendeu das acusações. O petista é investigado na 24ª fase da
Operação Lava JatoVEJA
MAIS >Imagem: Nelson Almeida/AFP
Giro
UOL
João Fellet
- @joaofelletBBC Brasil em Washington
11
agosto 2016
Juiz
federal no Estado de Maryland, nos Estados Unidos, o americano Peter Messitte
diz que o julgamento do mensalão e a Operação Lava Jato deixaram para trás os
tempos em que escândalos de corrupção política terminavam em pizza no Brasil.
"Por
muito tempo os brasileiros reclamaram da impunidade, e muitos achavam que era
algo com que se devia conviver", ele diz em entrevista à BBC Brasil.
"Isso mudou."
Segundo
ele, a atuação do juiz Sérgio Moro e dos procuradores e policiais federais da
Operação Lava Jato é citada em conferências globais como um exemplo do que pode
ser feito contra a corrupção.
Ele
afirma, porém, que há questionamentos legítimos sobre o uso de prisões
preventivas no processo para conseguir acordos de delação premiada, quando réus
confessam os crimes e aceitam colaborar com as investigações em troca de penas
menores. Vários réus na Lava Jato foram presos antes de serem condenados e
negociaram acordos de delação enquanto estavam na prisão.
Messitte
criou laços com o Brasil na década de 1960, quando passou dois anos fazendo
trabalho voluntário em São Paulo e aprendeu português. Desde então, visitou o
país várias vezes e se tornou um dos maiores especialistas estrangeiros no
Judiciário brasileiro.
Ele
conheceu o juiz Sérgio Moro em julho, quando ambos participaram de um evento no
Wilson Center, em Washington, e almoçaram na American University, onde Messitte
dirige o Programa de Estudos Legais e Judiciais Brasil-EUA.
Leia
abaixo os principais trechos da entrevista com o juiz americano:
BBC
Brasil - Em 2008, o senhor disse numa palestra sobre corrupção no Brasil que
"talvez tenha ficado para trás o tempo em que tudo terminava em
pizza". A previsão estava certa?
Peter
Messitte - Obviamente as coisas mudaram, e o cenário hoje é bem diferente.
A forma como os casos do mensalão e da Lava Jato emergiram representam avanços
significativos na luta contra a corrupção política. Vocês estão encontrando
malfeitores, e em muitos casos eles têm sido julgados e condenados.
É
um caminho irreversível. O público está disposto a sair às ruas. Não é mais
provável que as coisas acabem em pizza hoje ou no futuro. É uma mudança
drástica.
BBC
Brasil - Juízes e advogados nos EUA acompanham a Lava Jato?
Messitte
- A maioria dos juízes e advogados entende que houve acusações de
corrupção massiva no Brasil, que houve denúncias e confissões. Há muitas
conferências e atividades anticorrupção acontecendo pelo mundo, com
envolvimento do Banco Mundial e entidades como a Transparência International.
A
atuação do juiz Moro, do Ministério Público e da Polícia Federal na Lava Jato
sempre aparece como um exemplo do que pode ser feito.
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copyrightAG. BRASILImage caption
O
juiz Sérgio Moro é o responsável por uma das maiores investigações da história
brasileira
BBC
Brasil - Como compara o caso do mensalão e a Lava Jato?
Messitte
- Eles são um pouco diferentes pela natureza da corrupção. O mensalão eram
pagamentos por um partido a políticos no Congresso. Na Lava Jato, há mais
atores envolvidos.
Nos
dois casos, vemos o começo do uso da delação premiada contra o crime organizado
no Brasil. Houve algumas delações no mensalão e muitas na Lava Jato. É um
desenvolvimento importante.
E
a Lava Jato está sendo muito mais rápida. No mensalão, passaram-se muitos anos
até o caso chegar ao Supremo. Na Lava Jato, muitas sentenças já saíram em dois
anos.
A
principal mudança foi a prisão preventiva. Muitos acusados na Lava Jato foram
postos na prisão antes do julgamento. Isso realmente aumentou a pressão sobre
eles para que fechassem acordos, cooperassem e depusessem contra outros para
sair da prisão mais cedo. Isso não aconteceu tanto no mensalão.
Há
críticas a serem feitas, se a prisão preventiva pode ser uma ferramenta para
estimular pessoas a fazer delação premiada. Muitos questionam isso do ponto de
vista constitucional.
BBC
Brasil - Tem havido abuso no uso das prisões preventivas?
Messitte
- Se a pessoa pode fugir, contribuir para a continuação das atividades
criminosas ou destruir provas, há uma boa razão para prendê-la antes do
julgamento. Esse deve ser o critério. Não tenho razões para acreditar que o
juiz Moro esteja usando as prisões preventivas por outras razões além dessas.
Houve
casos em que ele ordenou a prisão preventiva e o Supremo reverteu a decisão.
Ainda terá de ser resolvido até onde a prisão preventiva pode ser usada sem que
haja exagero. Esse é um debate legítimo e que eventualmente chegará ao Supremo.
Se
as pessoas vão fazer delações premiadas, poderiam fazê-las sem a pressão da
prisão. A ideia é que as delações premiadas sejam voluntárias. Se há presunção
de inocência, por que alguém pode ser preso antes da determinação final sobre
sua culpa?
BBC
Brasil - Nos EUA, é comum que réus sejam presos para estimulá-los a fazer uma
delação?
Messitte
- Não, não seria próprio pôr alguém na prisão com o único propósito de
arrancar uma delação premiada. Nenhum juiz concordaria com isso. No sistema
federal, onde sirvo, os critérios para a prisão preventiva são risco de fuga ou
risco à comunidade.
BBC
Brasil - Alguns no Brasil questionam a confiabilidade das delações premiadas,
dizendo que réus podem mentir só para sair da prisão.
Messitte
- Teoricamente, isso é possível em alguns casos. Mas para aprovar o acordo
de delação - que é negociado pelo Ministério Público -, o juiz tem de verificar
se ele é legal, regular e voluntário. Se determinar que a pessoa está mentindo
ou que há algo irregular na forma como depôs, não deve aprová-lo. E não é
suficiente admitir a culpa para entrar num acordo, é preciso colaborar.
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copyrightAG. BRASILImage caption
O
juiz americano conheceu Sérgio Moro em julho, quando ambos participaram de um
evento no Wilson Center
BBC
Brasil - Na última década o combate à corrupção no Brasil esteve muito enfocado
em iniciativas legais, como a aprovação da Lei da Ficha Limpa. Em que medida a
corrupção pode ser combatida por leis, e em que medida é uma questão cultural
mais complexa e difícil de ser sanada?
Messitte
- Por muito tempo os brasileiros reclamaram da impunidade, e muitos
achavam que era algo com que se devia conviver. Isso mudou.
A
ideia agora é: "não precisamos aceitar isso, não é a forma como deve
ser". O Brasil virou a página. Houve uma mudança cultural, e foram as leis
que fizeram isso, leis que definiram o que é a corrupção política.
As
delações premiadas começaram no Brasil nos anos 1990 com os crimes hediondos.
De repente, passaram a ser usadas contra o crime organizado, porque leis
ampliaram a possibilidade de que fossem aplicadas nesses casos.
BBC
Brasil - O juiz Sérgio Moro é uma figura controversa no Brasil, tratado como herói
por uns e acusado por outros de abusar de seus poderes e agir politicamente.
Que impressão teve dele ao encontrá-lo?
Messitte
- Achei que ele é um cara muito direto e decente. Não detectei nele
qualquer inclinação política. Há leis no Brasil contra corrupção, lavagem de
dinheiro e extorsão. Alguém tem de aplicá-las. Não esqueçamos o papel do
Ministério Público e da Polícia Federal: eles podem não ter a mesma publicidade
que o juiz Moro, mas merecem o mesmo crédito.
Às
vezes, quando você aplica a lei e isso fere alguém, essa pessoa se diz vítima,
afirma que sua decisão é política. Algumas pessoas te amam pelo que faz, e
outros te odeiam.
Eu
aprecio as posições dele. Imagine se, diante de depoimentos de informantes
internos de que havia corrupção massiva [na Petrobras], um juiz dissesse que
ninguém é culpado e não aceitasse nenhum acordo de delação?
Haverá
erros no processo? Não tenho dúvida. Espero que eles sejam corrigidos na
apelação. Mas menos de 5% das decisões de Moro foram revertidas até agora.
BBC
Brasil - Não é arriscado e indesejável que um juiz se torne uma figura tão
pública e atraia tanta atenção?
Messitte
- É inevitável. Às vezes, acontece o inverso. Veja o que ocorreu com
Giovanni Falcone e Paolo Borsellino na Itália. Estavam indo atrás do que
consideravam a verdade e terminaram na situação mais infeliz [os dois juízes
foram mortos após julgarem grandes casos contra a máfia italiana].
Deve-se
dar crédito a Moro pela coragem. Esse cara inspirou um grande número de
brasileiros, [mostrando] que há possibilidade de Justiça, de tratamento
igualitário perante a lei. Qual a última vez que isso aconteceu no Brasil? Você
não vê figuras assim com frequência.
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