“Porque aquele que operou eficazmente em Pedro para o
apostolado da circuncisão, esse operou também em mim com eficácia para os gentios.”
Paulo (Gálatas,
2:8)
A vaidade humana sempre guardou a pretensão de
manter o Cristo nos círculos do sectarismo religioso, mas Jesus prossegue
operando em toda parte onde medre o princípio do bem.
Dentro de todas as linhas de evolução terrestre, entre
santuários e academias, movimentam-se os adventícios inquietos, os falsos
crentes e os fanáticos infelizes que acendem a fogueira da opinião e sustentam-na.
Entre eles, todavia, surgem os homens da fé viva, que se convertem nos sagrados
veículos do Cristo operante.
Simão Pedro centralizou todos os trabalhos do
Evangelho nascente, reajustando aspirações do povo escolhido.
Paulo de Tarso foi poderoso ímã para a renovação da
gentilidade.
Através de ambos expressava-se o mesmo Mestre, com um
só objetivo – o aperfeiçoamento do homem para o Reino
Divino.
É tempo de reconhecer-se a luz dessas eternas
verdades.
Jesus permanece trabalhando e sua bondade infinita se
revela em todos os setores em que o amor esteja erguido à conta de supremo
ideal.
Ninguém se prenda ao domínio das queixas injustas,
encarando os discípulos sinceros e devotados por detentores de
privilégios divinos. Cada aprendiz se esforce por criar no coração a atmosfera
propícia às manifestações do Senhor e de seus emissários.
Trabalha, estuda, serve e ajuda sempre, em busca das
esferas superiores, e sentirás o Cristo operante ao teu lado, nas relações
de cada dia.
35 O
Cristo operante Pão Nosso FEB COLEÇÃO FONTE VIVA 1950 30ª edição -
4ª impressão - 8/2017
O duelo
11. Só é verdadeiramente
grande aquele que, considerando a vida uma viagem que o há de conduzir a
determinado ponto, pouco caso faz das asperezas da jornada e não deixa que seus
passos se desviem do caminho reto. Com o olhar constantemente dirigido para o
termo a alcançar, nada lhe importa que as urzes e os espinhos ameacem
produzir-lhe arranhaduras; umas e outros lhe roçam a epiderme, sem o ferirem,
nem impedirem de prosseguir na caminhada. Expor seus dias para se vingar de uma
injúria é recuar diante das provações da vida, é sempre um crime aos olhos de
Deus; e, se não fôsseis, como sois, iludidos pelos vossos prejuízos, tal coisa
seria ridícula e uma suprema loucura aos olhos dos homens.
Há crime no homicídio em duelo; a vossa própria
legislação o reconhece. Ninguém tem o direito, em caso algum, de atentar contra
a vida de seu semelhante: é um crime aos olhos de Deus, que vos traçou a linha
de conduta que tendes de seguir. Nisso, mais do que em qualquer outra
circunstância, sois juízes em causa própria. Lembrai-vos de que somente vos
será perdoado, conforme perdoardes; pelo perdão vos acercais da Divindade, pois
a clemência é irmã do poder. Enquanto na Terra correr uma gota de sangue
humano, vertida pela mão dos homens, o verdadeiro Reino de Deus ainda se não
terá implantado aí, reino de paz e de amor, que há de banir para sempre do
vosso planeta a animosidade, a discórdia, a guerra. Então, a palavra duelo somente
existirá na vossa linguagem como longínqua e vaga recordação de um passado que
se foi. Nenhum outro antagonismo existirá entre os homens, afora a nobre
rivalidade do bem. – Adolfo, bispo de Argel. (Marmande, 1861.)
12. Em certos casos, sem
dúvida, pode o duelo constituir uma prova de coragem física, de desprezo pela
vida, mas também é, incontestavelmente, uma prova de covardia moral, como o
suicídio. O suicida não tem coragem de enfrentar as vicissitudes da vida; o
duelista não tem a de suportar as ofensas. Não vos disse o Cristo que há mais
honra e valor em apresentar a face esquerda àquele que bateu na direita, do que
em vingar uma injúria? Não disse Ele a Pedro, no Jardim das Oliveiras: “Mete a
tua espada na bainha, porquanto aquele que matar com a espada perecerá pela
espada?” Assim falando, não condenou, para sempre, o duelo? Efetivamente, meus
filhos, que é essa coragem oriunda de um gênio violento, de um temperamento
sanguíneo e colérico, que ruge à primeira ofensa? Onde a grandeza da alma daquele
que, à menor injúria, entende que só com sangue a poderá lavar? Ah! que ele
trema! No fundo da sua consciência, uma voz lhe bradará sempre: Caim! Caim! que
fizeste de teu irmão? Foi-me necessário derramar sangue para salvar a minha
honra, responderá ele a essa voz. Ela, porém, retrucará: Procuraste salvá-la
perante os homens, por alguns instantes que te restavam de vida na Terra, e não
pensaste em salvá-la perante Deus! Pobre louco! Quanto sangue exigiria de vós o
Cristo, por todos os ultrajes que recebeu! Não só o feristes com os espinhos e
a lança, não só o pregastes num madeiro infamante, como também o fizestes
ouvir, em meio de sua agonia atroz, as zombarias que lhe prodigalizastes. Que
reparação a tantos insultos vos pediu Ele? O último brado do cordeiro foi uma
súplica em favor dos seus algozes! Oh! como Ele, perdoai e orai pelos que vos
ofendem.
Amigos, lembrai-vos deste preceito: “Amai-vos uns aos
outros” e, então, a um golpe desferido pelo ódio respondereis com um sorriso, e
ao ultraje com o perdão. O mundo, sem dúvida, se levantará furioso e vos
tratará de covardes; erguei bem alto a fronte e mostrai que também ela se não
temeria de cingir-se de espinhos, a exemplo do Cristo, mas, que a vossa mão não
quer ser cúmplice de um assassínio autorizado por falsos ares de honra, que,
entretanto, não passa de orgulho e amor-próprio. Dar-se-á que, ao criar-vos,
Deus vos outorgou o direito de vida e de morte, uns sobre os outros? Não, só à
Natureza conferiu Ele esse direito, para se reformar e reconstruir; quanto a
vós, não permite, sequer, que disponhais de vós mesmos. Como o suicida, o
duelista se achará marcado com sangue, quando comparecer perante Deus, e a um e
outro o Soberano Juiz reserva rudes e longos castigos. Se Ele ameaçou com a sua
justiça aquele que disser raca a seu irmão, quão mais severa não será a pena
que comine ao que chegar à sua presença com as mãos tintas do sangue de seu
irmão! – Santo Agostinho. (Paris, 1862.)
13. O duelo, como o que
outrora se denominava o juízo de Deus, é uma das instituições bárbaras que
ainda regem a sociedade. Que diríeis, no entanto, se vísseis dois adversários
mergulhados em água fervente ou submetidos ao contato de um ferro em brasa,
para ser dirimida a contenda entre eles, reconhecendo-se estar a razão com aquele
que melhor sofresse a prova? Qualificaríeis de insensatos esses costumes, não é
exato? Pois o duelo é coisa pior do que tudo isso. Para o duelista destro, é um
assassínio praticado a sangue-frio, com toda a premeditação que possa haver,
uma vez que ele está certo da eficácia do golpe que desfechará. Para o
adversário, quase certo de sucumbir em virtude de sua fraqueza e inabilidade, é
um suicídio cometido com a mais fria reflexão. Sei que muitas vezes se procura
evitar essa alternativa igualmente criminosa, confiando ao acaso a questão: mas
não é isso voltar, sob outra forma, ao juízo de Deus, da Idade Média? E nessa
época infinitamente menor era a culpa. A própria denominação de juízo de
Deus indica a fé, ingênua, é verdade, porém, afinal, fé na Justiça de Deus,
que não podia consentir sucumbisse um inocente, ao passo que, no duelo, tudo se
confia à força bruta, de tal sorte que não raro é o ofendido que sucumbe.
Ó estúpido amor-próprio, tola vaidade e louco orgulho,
quando sereis substituídos pela caridade cristã, pelo amor do próximo e pela
humildade que o Cristo exemplificou e preceituou? Só quando isso se der
desaparecerão esses preceitos monstruosos que ainda governam os homens, e que
as leis são impotentes para reprimir, porque não basta interditar o mal e
prescrever o bem; é preciso que o princípio do bem e o horror ao mal morem no
coração do homem. – Um Espírito protetor. (Bordeaux, 1861.)
14. Que juízo farão de mim,
costumais dizer, se eu recusar a reparação que se me exige, ou se não a
reclamar de quem me ofendeu? Os loucos, como vós, os homens atrasados vos
censurarão; mas os que se acham esclarecidos pelo facho do progresso
intelectual e moral dirão que procedeis de acordo com a verdadeira sabedoria.
Refleti um pouco. Por motivo de uma palavra dita às vezes impensadamente, ou
inofensiva, vinda de um dos vossos irmãos, o vosso orgulho se sente ferido,
respondeis de modo acre e daí uma provocação. Antes que chegue o momento
decisivo, inquiris de vós mesmos se procedeis como cristãos? Que contas ficareis
devendo à sociedade, por a privardes de um de seus membros? Pensastes no
remorso que vos assaltará, por haverdes roubado a uma mulher o marido, a uma
mãe o filho, ao filho o pai que lhe servia de amparo? Certamente, o autor da
ofensa deve uma reparação; porém, não lhe será mais honroso dá-la
espontaneamente, reconhecendo suas faltas, do que expor a vida daquele que tem
o direito de se queixar? Quanto ao ofendido, convenho em que, algumas vezes,
por ele achar-se gravemente ferido, ou em sua pessoa, ou nas dos que lhe são
mais caros, não está em jogo somente o amor-próprio: o coração se acha magoado,
sofre. Mas, além de ser estúpido arriscar a vida, lançando-se contra um
miserável capaz de praticar infâmias, dar-se-á que, morto este, a afronta,
qualquer que seja, deixa de existir? Não é exato que o sangue derramado imprime
retumbância maior a um fato que, se falso, cairia por si mesmo, e que, se
verdadeiro, deve ficar sepultado no silêncio? Nada mais restará, pois, senão a
satisfação da sede de vingança. Ah! triste satisfação que quase sempre dá
lugar, já nesta vida, a causticantes remorsos. Se é o ofendido que sucumbe,
onde a reparação?
Quando a caridade regular a conduta dos homens, eles
conformarão seus atos e palavras a esta máxima: “Não façais aos outros o que
não quiserdes que vos façam.” Verificando-se isso, desaparecerão todas as
causas de dissensões e, com elas, as dos duelos e das guerras, que são os
duelos de povo a povo. – Francisco Xavier. 13 (Bordeaux, 1861.)
15. O homem do mundo, o
homem venturoso, que por uma palavra chocante, uma coisa ligeira, joga a vida
que lhe veio de Deus, joga a vida do seu semelhante, que só a Deus pertence,
esse é cem vezes mais culpado do que o miserável que, impelido pela cupidez,
algumas vezes pela necessidade, se introduz numa habitação para roubar e matar
os que se lhe opõem aos desígnios. Trata-se quase sempre de uma criatura sem
educação, com imperfeitas noções do bem e do mal, ao passo que o duelista
pertence, em regra, à classe mais culta. Um mata brutalmente, enquanto o outro
o faz com método e polidez, pelo que a sociedade o desculpa. Acrescentarei
mesmo que o duelista é infinitamente mais culpado do que o desgraçado que,
cedendo a um sentimento de vingança, mata num momento de exasperação. O
duelista não tem por escusa o arrebatamento da paixão, pois que, entre o
insulto e a reparação, dispõe ele sempre de tempo para refletir. Age, portanto,
friamente e com premeditado desígnio; estuda e calcula tudo, para com mais
segurança matar o seu adversário. É certo que também expõe a vida e é isso o
que reabilita o duelo aos olhos do mundo, que nele então só vê um ato de
coragem e pouco caso da vida. Mas haverá coragem da parte daquele que está
seguro de si? O duelo, remanescente dos tempos de barbárie, em os quais o
direito do mais forte constituía a lei, desaparecerá por efeito de uma melhor
apreciação do verdadeiro ponto de honra e à medida que o homem for depositando
fé mais viva na vida futura. – Agostinho. (Bordeaux, 1861.)
13 N.E.: Francisco
Xavier (Francisco de Jessu, dito), 1506–1552: cognominado apóstolo das Índias,
jesuíta espanhol, pioneiro e cofundador da Companhia de Jesus, cujos membros
são conhecidos como jesuítas. Exerceu sua atividade missionária no Oriente,
evangelizou o sudeste da Ásia (Índia, Malásia e Japão).
16. Nota. Os duelos se vão
tornando cada vez mais raros e, se de tempos a tempos alguns de tão dolorosos
exemplos se dão, o número deles não se pode comparar com o dos que ocorriam
outrora. Antigamente, um homem não saía de casa sem prever um encontro, pelo
que tomava sempre as necessárias precauções. Um sinal característico dos
costumes do tempo e dos povos se nos depara no porte habitual, ostensivo ou
oculto, de armas ofensivas ou defensivas. A abolição de semelhante uso
demonstra o abrandamento dos costumes e é curioso acompanhar-lhes a gradação,
desde a época em que os cavaleiros só cavalgavam bardados de ferro e armados de
lança, até a em que uma simples espada à cinta constituía mais um adorno e um
acessório do brasão do que uma arma de agressão. Outro indício da modificação
dos costumes está em que, outrora, os combates singulares se empenhavam em
plena rua, diante da turba, que se afastava para deixar livre o campo aos
combatentes, ao passo que estes hoje se ocultam. Presentemente, a morte de um
homem é acontecimento que causa emoção, enquanto noutros tempos ninguém dava
atenção a isso.
O Espiritismo apagará esses últimos vestígios da
barbárie, incutindo nos homens o espírito de caridade e de fraternidade.
Amai os vossos inimigos O Evangelho
Segundo o Espiritismo ALLAN KARDEC FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA Rio - Brasil
1944 Tradução de Guillon Ribeiro da 3ª edição francesa revista, corrigida
e modificada pelo autor em 1866
Lute.
A boa luta faz de você um ponto de
referência para os outros.
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