PPPP’s indefectíveis
TRAGÉDIA ANUNCIADA
Edição
do dia 06/01/2017
06/01/2017
07h53 - Atualizado em 06/01/2017 08h06
Relatório sobre plano de fuga no AM
alertava sobre metralhadora com presos
Visitantes
teriam entrado no presídio com oito armas de fogo antes do Natal.
Governador do Amazonas afirmou que reforçou segurança após documento.
Governador do Amazonas afirmou que reforçou segurança após documento.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/edicoes/2017/01/06.html#!v/5559298
Um
relatório da própria Secretaria de Segurança do Amazonas alertava
sobre um plano de fuga na véspera do massacre no maior presídio do estado. O
documento também denunciava que os presos poderiam estar com armas de fogo,
incluindo uma metralhadora.
O
texto também diz que visitantes teriam entrado no presídio com oito armas de
fogo na semana que antecedeu o Natal. Os visitantes teriam recebido apoio de
agentes de socialização que já foram identificados e as armas seriam usadas
durante a fuga.
Assista à reportagem completa no
vídeo acima.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2017/01/relatorio-sobre-plano-de-fuga-no-am-alertava-sobre-metralhadora-com-presos.html
Edição
do dia 06/01/2017
06/01/2017
07h54 - Atualizado em 06/01/2017 08h12
Plano Nacional de Segurança é
antecipado após massacre no AM
Ministro
da Justiça culpou empresa que administra o presídio pela barbárie.
Presidente Michel Temer foi criticado por classificar a rebelião de 'acidente'.
Presidente Michel Temer foi criticado por classificar a rebelião de 'acidente'.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/edicoes/2017/01/06.html#!v/5559330
Pressionado
pela repercussão do massacre, o governo antecipou o Plano Nacional de
Segurança. O ministro da Justiça culpou a empresa que administra o presídio
pela barbárie e o presidente Michel Temer chamou de acidente. Essas
medidas ainda não têm prazo para sair do papel. Disseram o que, mas não
contaram quando.
Houve
muita repercussão e críticas ao anúncio, principalmente pelo fato de o
presidente ter classificado a rebelião e as mortes em Manaus de
"acidente". Michel Temer chegou, inclusive, a se explicar em uma rede
social.
Assista à reportagem completa no
vídeo acima.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2017/01/plano-nacional-de-seguranca-e-antecipado-apos-massacre-no-am.html
Edição
do dia 06/01/2017
06/01/2017
08h06 - Atualizado em 06/01/2017 08h06
Custo de preso no Amazonas é o
dobro da média nacional
Estado
gasta 3 vezes mais do que SP, que tem maior população carcerária.
São despesas com alimentação, manutenção e segurança, por exemplo.
São despesas com alimentação, manutenção e segurança, por exemplo.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/edicoes/2017/01/06.html#!v/5559290
Os
presos do Amazonas custam mais caro do que os de
outros estados do país. O custo de um detento em seis penitenciárias
privatizadas no Amazonas é em média de R$ 4.129 por mês, segundo o Ministério
Público de Contas do estado. O valor é quase o dobro da média nacional, que é
de R$ 2.400.
O
Bom Dia Brasil comparou também com valores de outros estados. Em nenhum deles o
valor é tão alto quanto o do Amazonas. Por lá, o custo por mês é quase três
vezes maior do que no estado que tem a maior população carcerária.
São
Paulo gasta em média R$ 1.450 com cada preso por mês. São
despesas com alimentação, manutenção e segurança, por exemplo. Agora, em Goiás,
o custo mensal por detento é de R$ 2.111. No Rio Grande do Sul, de R$ 2 mil.
No Paraná e
em Rondônia, o custo também é inferior. Em
Rondônia, R$ 3 mil, e no Paraná, R$ 2.393. São informações do levantamento do
grupo de estudos carcerários da USP de Ribeirão Preto.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2017/01/custo-de-preso-no-amazonas-e-o-dobro-da-media-nacional.html
“Só os profetas enxergam o óbvio."
Nelson Rodrigues
“São poucos os que enxergam antes o
que depois parecerá óbvio para todo mundo.” Max Gehringer Mundo Corporativo
15/06/2016
Data
corrente: 5/01/17
Daylight
mapa do mundo
http://datadehoje.com/
“As vantagens da sociedade devem
ser igualmente repartidas entre todos os seus
membros.
membros.
No entanto, entre os homens
reunidos, nota-se a tendência contínua de acumular no
menor número os privilégios, o poder e a felicidade, para só deixar à maioria miséria e
fraqueza.
menor número os privilégios, o poder e a felicidade, para só deixar à maioria miséria e
fraqueza.
Só com boas leis podem impedir-se
tais abusos. Mas, de ordinário, os homens
abandonam a leis provisórias e à prudência do momento o cuidado de regular os
negócios mais importantes, quando não os confiam à discrição daqueles mesmos cujo
interesse é oporem-se às melhores instituições e às leis mais sábias.
abandonam a leis provisórias e à prudência do momento o cuidado de regular os
negócios mais importantes, quando não os confiam à discrição daqueles mesmos cujo
interesse é oporem-se às melhores instituições e às leis mais sábias.
Além disso, não é senão depois de
terem vagado por muito tempo no meio dos erros
mais funestos, depois de terem exposto mil vezes a própria liberdade e a própria
existência, que, cansados de sofrer, reduzidos aos últimos extremos, os homens se determinam a remediar os males que os afligem.
mais funestos, depois de terem exposto mil vezes a própria liberdade e a própria
existência, que, cansados de sofrer, reduzidos aos últimos extremos, os homens se determinam a remediar os males que os afligem.
Então, finalmente, abrem os olhos a
essas verdades palpáveis que, por sua simplicidade
mesma, escapam aos espíritos vulgares, incapazes de analisar os objetos e acostumados a receber sem exame e sobre palavra todas as impressões que se lhes queiram dar.
mesma, escapam aos espíritos vulgares, incapazes de analisar os objetos e acostumados a receber sem exame e sobre palavra todas as impressões que se lhes queiram dar.
Abramos a história, veremos que as
leis, que deveriam ser convenções feitas livremente
entre homens livres, não foram, o mais das vezes, senão o instrumento das paixões da
minoria, ou o produto do acaso e do momento, e nunca a obra de um prudente
observador da natureza humana, que tenha sabido dirigir todas as ações da sociedade
com este único fim: todo o bem-estar possível para a maioria.”
Dos Delitos e das Penas Cesare Bonesana, marquês de Beccaria (1738 – 1794)
entre homens livres, não foram, o mais das vezes, senão o instrumento das paixões da
minoria, ou o produto do acaso e do momento, e nunca a obra de um prudente
observador da natureza humana, que tenha sabido dirigir todas as ações da sociedade
com este único fim: todo o bem-estar possível para a maioria.”
Dos Delitos e das Penas Cesare Bonesana, marquês de Beccaria (1738 – 1794)
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/eb000015.pdf
BOM DIA BRASIL
Edição
do dia 05/01/2017
05/01/2017
08h04 - Atualizado em 05/01/2017 08h08
Governo do AM sabia de risco de
rebelião e fuga, mas nada fez para evitar
Administradora
do presídio alertou sobre os riscos nas visitas de fim de ano.
Estão foragidos 121 dos 184 presos que escaparam dos dois presídios.
Estão foragidos 121 dos 184 presos que escaparam dos dois presídios.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/edicoes/2017/01/05.html#!v/5556790
A
cada dia que passa vai ficando mais claro que o massacre no sistema prisional
do Amazonas era uma tragédia anunciada e que nada foi feito para evitar o pior.
Agora, o trabalho de identificação dos corpos continua e a polícia ainda está
atrás de presos fugitivos.
De
acordo com o último levantamento oficial divulgado pela Secretaria de Segurança
Pública, 63 presos já foram recapturados; 32 do Complexo Anísio Jobim e 31 do
Instituto Penal Antonio Trindade. Continuam foragidos 121 dos 184 que
conseguiram escapar dos dois presídios da capital.
Além
disso, na quarta-feira (4), o ministro acabou falando que durante a visita dele
em Manaus, ele recebeu a informação de que
esse número pode ser ainda maior, chegar a 200 foragidos. A Secretaria de
Segurança Pública do estado rebateu essa informação dizendo que não tem motivos
para não divulgar esses dados oficiais.
No
IML, para onde foram os 60 corpos desse massacre, 42 já foram identificados e
14 já foram liberados para os familiares; dez do Compaj e os outros quatro da
Unidade do Puraquequara.
Os outros corpos que ainda não foram identificados, segundo o próprio IML, vão passar por um processo mais demorado de reconhecimento que pode levar até dez dias. Tem ainda a possibilidade de fazer DNA em alguns desses corpos para ajudar na identificação.
Os outros corpos que ainda não foram identificados, segundo o próprio IML, vão passar por um processo mais demorado de reconhecimento que pode levar até dez dias. Tem ainda a possibilidade de fazer DNA em alguns desses corpos para ajudar na identificação.
Em
relação ao número de transferências, até agora já foram transferidos 279 presos
que corriam risco de morte em três presídios da capital. Esses presos foram levados
para a cadeia pública Raimundo Vidal Pessoa que estava desativada e que foi
reaberta diante de toda essa situação.
A
partir de agora, a Secretaria de Segurança passa a divulgar diariamente dois
boletins com atualizações sobre essa situação.
Novos
documentos deixam cada vez mais claro que esse massacre poderia, sim, ter sido
evitado. Não faltaram alertas. Agora, depois das fugas e do massacre, o governo
federal, o governo do Amazonas e a empresa que administra presídios do estado
fazem um jogo de empurra.
Assista à reportagem completa no
vídeo acima.
Edição
do dia 05/01/2017
05/01/2017
08h25 - Atualizado em 05/01/2017 08h25
Mais de 1 preso foi morto por dia
nas cadeias do país em 2016, revela G1
Em
todo o ano passado, foram 392 mortes violentas nas cadeias do Brasil.
Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte lideram o ranking.
Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte lideram o ranking.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/edicoes/2017/01/05.html#!v/5556756
O
Bom Dia Brasil mostra uma estatística de mortes violentas dentro dos presídios
no ano passado. O levantamento é do site G1 com base em dados dos governos
estaduais e do Distrito Federal.
Em
todo o ano passado, foram 392 mortes violentas nas cadeias, que incluem
homicídios e suicídios. Dá mais de uma por dia, em média.
Os
estados que lideram o ranking são todos do Nordeste: Ceará,
com 50 mortes violentas, Pernambuco,
com 43, e Rio Grande do Norte, com 31.
O Amazonas ficou
na 13ª posição, com dez mortes, o equivalente a 1/6 da matança nesse início de
ano.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2017/01/mais-de-1-preso-foi-morto-por-dia-nas-cadeias-do-pais-em-2016-revela-g1.html
Edição
do dia 05/01/2017
05/01/2017
08h05 - Atualizado em 05/01/2017 08h09
Após silêncio, Temer convoca
reunião com ministros sobre massacre no AM
União
não liberou todo o dinheiro para reforma e construção de presídios.
Hoje tem mais de R$ 2 bilhões à disposição, mas ninguém usa.
Hoje tem mais de R$ 2 bilhões à disposição, mas ninguém usa.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/edicoes/2017/01/05.html#!v/5556801
Depois
de três dias de silêncio, o presidente Michel Temer convocou uma reunião para
discutir o massacre de Manaus e o Plano Nacional de
Segurança. Um levantamento mostrou que nos últimos 15 anos, o governo federal
não liberou todo o dinheiro disponível para reforma e construção de novos
presídios. O governo tenta agora afastar uma nova crise.
O
presidente se reúne, nesta quinta-feira (5), com seis ministros para discutir a
situação caótica do sistema penitenciário. Faltam 250 mil vagas e, por incrível
que pareça, o que não falta é dinheiro para reforma e construção de presídios.
Hoje tem mais de R$ 2 bilhões à disposição, mas que ninguém usa.
Assista à reportagem completa no
vídeo acima.
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2017/01/apos-silencio-temer-convoca-reuniao-com-ministros-sobre-massacre-no-am.html
http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2017/01/governo-do-am-sabia-de-risco-de-rebeliao-e-fuga-mas-nada-fez-para-evitar.html
Breves considerações sobre a
privatização dos presídios brasileiros
Christiany Pegorari Conte
Muito
se discute acerca das alternativas para solucionar os problemas enfrentados
pelo sistema penitenciário brasileiro com o fito de atingir o principal
objetivo da execução penal, qual seja: a ressocialização do condenado.
segunda-feira,
31 de agosto de 2009
Breves considerações sobre a privatização dos presídios brasileiros
Christiany
Pegorari Conte*
1. Noções
Introdutórias
Muito se discute acerca das alternativas para
solucionar os problemas enfrentados pelo sistema penitenciário brasileiro com o
fito de atingir o principal objetivo da execução penal, qual seja: a
ressocialização do condenado.
Dentre
as principais dificuldades enfrentadas pela execução penal hoje destacamos: a
superpopulação carcerária e o desrespeito aos direitos humanos em face de um
cumprimento de pena indigno e degradante.
A
superpopulação e a precariedade das instituições carcerárias acarretam em
dificuldades na efetivação da pena e, principalmente, na ressocialização do
condenado, bem como afastam a execução penal dos princípios e regras da
individualização, personalidade e proporcionalidade da pena, dentre outros.
O
crescimento acelerado do número de presos não foi acompanhado na mesma
velocidade pela quantidade de vagas criadas, fato que se verifica pelo déficit de
vagas necessárias para atender a demanda de condenados.
As
celas estão, cada vez mais, lotadas e não atendem aos requisitos mínimos de
dignidade assegurados pela Constituição Federal (art. 1º, III) e pela própria
Lei de Execução Penal (lei 7.210/84 - clique aqui), conforme
se verifica dos dispositivos citados, in verbis, abaixo:
Art.
12. A assistência material ao preso e ao internado consistirá no fornecimento
de alimentação, vestuário e instalações higiênicas.
Art.
83. O estabelecimento penal, conforme a sua natureza deverá contar em suas
dependências com áreas e serviços destinados a dar assistência, educação,
trabalho, recreação e prática esportiva.
Art.
85. O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua
estrutura e finalidade. Parágrafo único. O Conselho Nacional de Política
Criminal e Penitenciária determinará o limite máximo de capacidade do
estabelecimento, atendendo a sua natureza e peculiaridades.
Art.
88. O condenado será alojado em cela individual que conterá
dormitório, aparelho sanitário e lavatório.
Parágrafo
único. São requisitos básicos da unidade celular:
a) salubridade
do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e
condicionamento térmico adequado à existência humana;
b)
área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).
Tudo
isso, ao longo dos anos, colocou o sistema carcerário brasileiro à beira de um
colapso e, consequentemente, passou a exigir a tomada de medidas rápidas e
eficazes.
Em
2005, o sistema prisional de São Paulo registrou 27 rebeliões em todo o Estado
de São Paulo. Somente nos três primeiros meses de 2006, este número chegou a
31, ultrapassando a maior mobilização das facções criminosas que controlam as
cadeias e penitenciárias, realizada em 2001, quando 29 presídios registraram
rebeliões.
Ao
todo, são 144 unidades prisionais em São Paulo, das quais 74 penitenciárias,
três unidades de segurança máxima e 32 Centros de Detenção Provisória - CDP,
que possuem menos infraestrutura.1
Os
dados apresentados acima são de 2006, pois a Secretaria de Administração
Penitenciária não divulga dados posteriores, conforme explica Alessandra
Teixeira, presidente da comissão de sistema prisional do IBCCRIM - Instituto
Brasileiro de Ciências Criminais2:
Existe
um problema de transparência na Secretaria de Administração Penitenciária de
São Paulo. A advogada e pesquisadora acusa o órgão de não divulgar dados
completos sobre as prisões paulistas desde o final de 2006, ano em que o Estado
se viu refém de uma onda de ataques orquestrados pela organização criminosa
PCC. "A secretaria não divulga o número de presos no Estado, nem o número
de agentes que trabalham em cada penitenciária. Hoje, alega que é um motivo de
segurança." A Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo nega
as acusações. O órgão afirma que todos os dados sobre o sistema prisional
estadual são atualizados semanalmente e estão disponíveis na internet, e que
apenas o número de agentes por unidade é sigiloso, por motivos de segurança. A
reportagem do UOL Notícias encontrou o site da secretaria fora do ar na tarde
de quinta-feira (9). Alessandra também reclama que os números de rebeliões e de
mortes dentro das prisões não são divulgados. Questionada, a assessoria de
imprensa da secretaria reafirmou que os dados disponibilizados para consulta
pública são divulgados somente pelo site. A exceção é o número de mortes dentro
das prisões, que tem de ser pedido à Coordenadoria de Saúde e, por isso, deve
ser solicitado por e-mail.
De
acordo com a secretaria, atualmente há cerca de 95 mil vagas nas unidades
prisionais do Estado. O número de presos chega a cerca de 148 mil.
O
órgão também contabiliza a ocorrência de 91 rebeliões em 2006, nenhuma em 2007
e três em 2008. Porém, uma busca rápida revela que foram noticiadas pelo menos
quatro rebeliões e tumultos nas prisões do Estado em 2007 e oito em 2008.
Em
2007 foram noticiadas ocorrências no CDP (Centro de detenção Provisória) de
Guarulhos, em São José dos Campos e nas penitenciárias de Tremembé e Riolândia.
Em
2008, há notícias de tumultos e rebeliões na Penitenciária 2 de Potim, na
cadeia pública de Pitangueiras, nos CDPs de Osasco e Ribeirão Preto, e nas
penitenciárias de Martinópolis, Tremembé e Iaras.
E,
embora o governo do Estado tenha projetos de construção de novas
penitenciárias, ainda estamos aquém do necessário para a resolução dos
problemas que envolvem o sistema penitenciário tanto em âmbito estadual, quanto
nacional.
Com
a finalidade de minimizar a crise da qual padece o sistema punitivo, várias
propostas surgem, tais como: a construção de novos presídios; a realização de
políticas públicas eficazes que trabalhem com a prevenção e repressão da
prática delitiva; a utilização de instrumentos de execução penal, tais como a
progressão de regime, liberdade condicional, remição e a suspensão condicional
da pena (sursis), com o escopo de desafogar o sistema carcerário; a implantação
de um sistema eficaz de laborterapia ou oficinas de trabalho para os presos; a
aplicação de penas alternativas; a adoção de sistemas de monitoramento
eletrônico para cumprimento da pena3 e, por fim, a privatização dos
presídios, no modelo de contrato chamado PPP (parceria público-privada), que
suscita uma discussão mais aprofundada.
2.
Parcerias público-privadas
A
idéia de parceria entre os entes privados e públicos surge de um modelo
neoliberal que já vem sendo adotado pela maioria dos países, desde a década de
80, substanciado numa certa abstenção do Estado e na consequente delegação de
diversas atividades à iniciativa privada. Os EUA foram os primeiros a adotarem
as parcerias público-privadas para a melhoria na prestação dos serviços
públicos no setor prisional e redução dos gastos públicos:
No
modelo norte-americano, a privatização das prisões era o gênero do qual eram
espécies três modelos:
1)Arrendamento
das prisões;
2)Administração
privada das penitenciárias;
3)Contratação
de serviços específicos com particulares.
No
modelo de arrendamento, as empresas privadas financiavam e construíam as
prisões e depois a arrendavam-na ao governo federal, sendo que depois de um
determinado tempo sua propriedade passava ao Estado. Já no modelo de
administração privada, a iniciativa privada tanto construía como administrava
as prisões. O terceiro modelo consistia na contratação de empresas privadas
para a execução de determinados serviços. Era essencialmente uma terceirização.
O Estado fazia um contrato com o particular que abrigava, alimentava e vestia
os presos, tendo como contraprestação o seu trabalho. Em todos esses modelos o
preso era tido como terceiro beneficiário do contrato realizado entre o poder
público e a empresa particular, sendo que ele poderia compelir juridicamente o
empresário a cumprir com as obrigações estabelecidas no referido contrato.4
Alguns
países da Europa também adotam sistemas semelhantes. Na França, por exemplo, há
um sistema de cogestão, no tocante ao gerenciamento e administração do
estabelecimento prisional, entre a empresa privada e o poder público.
Na
Grã-Bretanha e na Austrália, tal como nos EUA, as atividades são inteiramente
administradas por empresas privadas, inclusive os sistemas de vigilância de
presos.
As
prisões constituem um mercado extremamente atraente para os grupos privados,
visto que a população carcerária não pára de crescer em todos os países do
globo.5
A
diretora nacional do Serviço Penitenciário Federal Argentino, Amália Rosa Toro,
defende a parceria do poder público com a iniciativa privada na América do Sul
para a realização de alguns serviços nas penitenciárias, sem que o controle
total saia das mãos do Estado. Na Argentina, a terceirização ocorreu nos
setores de limpeza, alimentação e na educação, que não demandam mais gastos
para o Estado. Há convênio para 60 mil presos na área da educação nos níveis
primário, secundário e universitário, além de cursos profissionalizantes de
informática e agropecuária. A privatização nas prisões é feita apenas em
serviços de apoio. O controle na parte de segurança é de total responsabilidade
do Estado. Na Argentina, a privatização da educação nos presídios federais e
nas províncias iniciou em 1980. O serviço de limpeza e alimentação a partir de
1990, sem nenhum custo para o Estado. O Estado terá que buscar investimentos
privados para proporcionar melhores condições de trabalho e educação aos
apenados. Os resultados são excelentes, pois houve uma reinserção social do
preso que acabou estudando, realizando cursos técnicos e houve benefício para a
família com a geração de renda.
Como
na Argentina, a privatização de alguns serviços ocorre na Bélgica, Espanha,
Itália, e México com os presos atuando na confecção de uniformes, carpintaria,
agropecuária, fabricação de produtos alimentícios como queijos, doce de leite e
frutas.6
3.
Parcerias Público-Privadas para os Presídios Brasileiros
A
Administração pode prestar serviços públicos diretamente, ou através de
delegados (concessionárias e permissionárias), sempre através de licitação
conforme o art. 175 da CF/88 (clique aqui),
regulamentado pela lei 8.987/95 (clique aqui), in
verbis:
Art.
175 - Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de
concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços
públicos.
Parágrafo
único - A lei disporá sobre:
I
- o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos,
o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições
de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;
II
- os direitos dos usuários;
III
- política tarifária;
IV
- a obrigação de manter serviço adequado.
As
PPP’s constituem contratos de colaboração entre o Estado e o particular, por
meio dos quais, nos termos estabelecidos em cada caso, o ente privado participa
da implantação e do desenvolvimento de obra, serviço ou empreendimento público,
bem como da exploração e da gestão das atividades dele decorrentes, cabendo-lhe
contribuir com recursos financeiros, materiais e humanos e sendo remunerado,
segundo o seu desempenho na execução das atividades contratadas. (lei 14.868/03
-clique aqui).
Trata-se
de regime jurídico aplicável a determinadas concessões de obras ou de serviços
públicos7, vale dizer, constitui contrato administrativo de concessão
(especial).
Nas
PPP’s, o Parceiro Privado contribui com recursos e gestão, enquanto que o
Parceiro Público promove a satisfação do interesse público, garantindo o
funcionamento da infraestrutura e serviços públicos que dependem de recursos
orçamentários indisponíveis, tendo em vista que os investimentos em
infraestrutura são cada vez mais onerosos.
Assim,
as PPP’s reduzem custos de infraestrutura, fomentam investimentos privados e
diminuem despesas públicas.
Vale
lembrar, outrossim, que duas situações não se encontravam solucionadas na
legislação das concessões e que ensejou a elaboração da lei 11.079/04 (clique aqui), quais
sejam:
1.
Serviços públicos em que os usuários poderiam pagar uma determinada tarifa, mas
não tinham condições de arcar com o pagamento do valor necessário para
assegurar a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro da concessionária,
havendo a necessidade de subsídios. Ex. transporte de massa, como metrô,
saneamento e fornecimento de água;
2.
Serviços públicos que, por sua natureza ou por força de lei, são de
responsabilidade exclusiva do Estado, neste último, se enquadra a situação dos
presídios.
A
primeira observação a ser feita, quando tratamos do tema em epígrafe, é a
utilização inadequada da expressão "privatização dos presídios", pois
a proposta, conforme explica o secretário de Defesa Social de Minas Gerais,
Maurício Campos Júnior, é de parceria entre o ente privado e o Estado:
"Não
é privatização, nem terceirização. É parceria. É uma concessão administrativa
pelo prazo de 27 anos, onde há uma coparticipação na gestão da unidade
prisional", diz Campos. "A segurança externa e a disciplina interna
são do Estado, e o Estado não abre mão delas." Para o secretário, até
mesmo funções cotidianas como limpeza e alimentação poderiam ser executadas
pela iniciativa privada. "Nada disso deveria ser exclusivo do
Estado", afirma.8
Dois
Estados brasileiros já iniciaram processos para a construção de presídios em
parceria com a iniciativa privada.
Em
Minas Gerais e Pernambuco, os contratos de PPP preveem que o consórcio vencedor
de licitação tem de fazer o projeto, construir o complexo prisional e se
responsabilizar pela gestão do presídio quando a unidade entrar em operação. O
Estado, por sua vez, fica responsável pela segurança das muralhas, o transporte
dos detentos e a diretoria da prisão.
Os
defensores da parceria argumentam que não se trata de privatizar presídios, mas
de dar mais agilidade aos investimentos na área. Afirma, mais uma vez, o
secretário de Defesa Social de Minas Gerais, Maurício Campos Júnior:
(...)
a parceria entre Estado e iniciativa privada "aumenta a capacidade do
Estado de fornecer vagas"."Ela [a parceria] permite a injeção de
recursos da ordem de R$ 200 milhões na fase de construção com a
disponibilização de vagas em curto prazo, o que não se conseguiria com o dinheiro
do Tesouro", argumenta o secretário.9
No
dia 16 de junho, o governador mineiro, Aécio Neves (PSDB), assinou contrato com
o Consórcio GPA - Gestores Prisionais Associados, formado por cinco empresas
dos ramos de construção, segurança e serviços) para a construção e gestão do
complexo prisional de Ribeirão das Neves, na região metropolitana de Minas
Gerais. O consórcio também elabora um estudo de viabilidade de uma prisão
semelhante para o governo do Rio Grande do Sul. A estimativa é de que as 3.040
vagas do complexo de Ribeirão das Neves estejam disponíveis depois de 18 meses
do início da construção.10
Em
Pernambuco, o projeto em PPP do Centro Integrado de Ressocialização - CIR de
Itaquitinga já foi licitado e homologado. O Consórcio Reintegra Brasil, ganhador
da licitação para construir e fazer a gestão das cerca de 3.000 vagas do futuro
complexo prisional, espera um empréstimo de R$ 260 milhões do Banco do Nordeste
para assinar o contrato com o governo estadual.
Segundo
Sílvio Bompastor, presidente do Comitê Gestor de Parceria Público-Privada no
Estado:
(...)
a iniciativa privada será remunerada como prestadora de serviços quando as
vagas começarem a ser preenchidas. O consórcio é composto por três empresas,
uma delas responsável pela cogestão de presídios baianos. Silvio Bompastor
também não considera que se trate de "privatização", pois os cargos
de diretor-geral, diretor de segurança e de administração serão públicos.
"Por exemplo, no caso da comida. A iniciativa privada será responsável por
fazer e servir a comida aos detentos. Mas é o diretor do presídio que vai gerir
se a comida está boa, se está sendo servida corretamente", diz.11
Os
projetos, mineiro e pernambucano, são semelhantes: os complexos terão pavilhões
para presos do regime fechado e do semi-aberto, o investimento na fase de
construção será inteiramente da iniciativa privada, e estão previstos cinco
anos para que os gastos da fase inicial sejam amortizados. A concessão de
Ribeirão das Neves será de 27 anos. A de Itaquitinga, de 30.
No
Rio Grande do Sul, onde juízes tomaram recentemente medidas controversas contra
a superlotação de presídios, como o rodízio de presos, também poderá ganhar uma
penitenciária por PPP. O consórcio mineiro GPA está autorizado, desde o dia 17
de junho, a tocar o estudo de viabilidade do projeto e tem até outubro para
entregar o estudo pronto ao governo gaúcho.
Segundo
a Secretaria de Planejamento e Gestão do governo Yeda Crusius (PSDB):
(...)
ainda que as empresas integrantes sejam as mesmas de Minas Gerais, só será possível
saber qual o modelo proposto quando o estudo estiver pronto. "Cada Estado
possui suas peculiaridades", informou, por meio de nota. Por enquanto, o
Estado ganha uma "ferramenta de mobilização para melhorar o sistema
penitenciário".
Em
São Paulo também foram realizados estudos. Um deles foi executado pela FIESP -
Federação da Indústria do Estado de São Paulo, concluído e entregue ao governo
de José Serra (PSDB) em março. O outro está por conta do Comitê Gestor de
Parceria Público-Privada estadual, ligado à Secretaria de Economia e
Planejamento.
A
Secretaria de Planejamento informou que o tema da PPP para um novo presídio
paulista continua em estudo, mas, devido a questões jurídicas, ainda não foi
decidido se um projeto do tipo é viável. No entanto, a Secretaria de
Administração Penitenciária do Estado afirma não existir projeto algum de
parceria público-privada dentro do órgão.
As
parcerias público-privadas constituem alternativa interessante para a mitigação
das deficiências existentes no sistema penitenciário nacional, no entanto, tem
sido contestada.
Em
2007, a Justiça Federal obrigou o governo do Ceará a retomar a gestão de três
unidades prisionais então administradas pela Companhia Nacional de
Administração Prisional - a Penitenciária Industrial Regional de Sobral, a
Penitenciária Industrial Regional do Cariri e o Instituto Presídio Professor
Olavo Oliveira. O juiz Marcus Vinícius Parente Rebouças entendeu que a gestão
das prisões é tarefa exclusiva da administração pública, que não ser delegada à
iniciativa privada.12
Para
a advogada e pesquisadora Alessandra Teixeira, presidente da comissão sobre
sistema prisional do IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências
Criminais, as prisões regidas pelo sistema de PPP são ilegais e
inconstitucionais: Criam-se manobras jurídicas para viabilizar essas prisões,
mas, à luz do direito, elas ferem a Constituição. O Estado tem a obrigação de
garantir as condições para que o condenado cumpra sua pena.13
No
mesmo sentido, Laurindo Dias Minhoto, professor da Escola de Direito da FGV-SP
- Fundação Getúlio Vargas e ex-conselheiro do CNPCP - Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária, ligado ao Ministério da Justiça, afirma que:
O
principal problema da presença da iniciativa privada é alimentar o interesse
econômico, em vez de estimular a eficiência da gestão. "Neste tipo de
experiência, você reforça a crença em uma política criminal equivocada -de que
quanto mais prisões, melhor para o combate ao crime", diz Minhoto, autor
de um estudo sobre as prisões administradas em regime de PPP nos Estados Unidos
e na Inglaterra. Para ele, o modelo não tem sido bem-sucedido. "[O modelo]
não significa uma redução de custos, então o contribuinte não sai ganhando.
Além disso, as distorções que afetam os estabelecimentos públicos também
aparecem nos estabelecimentos privados."
Ainda
segundo o professor, os maus-tratos aos detentos, as condições ruins de
encarceramento, o quadro de pessoal pouco qualificado, a corrupção, as fugas e
a entrada ilegal de drogas nos presídios estão presentes tanto nos
estabelecimentos públicos quanto nos privados.14
Luiz
Tarcísio Teixeira Ferreira, professor de direito constitucional da PUC/SP -
Pontifícia Universidade Católica e especialista em direito do Estado:
Não
é contra a gestão privada dos presídios, mas avalia que a utilização da lei de
PPP no sistema penitenciário desrespeita a Constituição Federal.
O
ex-secretário de Negócios Jurídicos de São Paulo diz que o modelo de PPP
estipula um período de gestão do parceiro privado semelhante ao da concessão,
que permite à iniciativa privada explorar um serviço público de forma a ser
remunerada pelas tarifas pagas pelos usuários. É o que acontece com as estradas
e os serviços de telefonia. No caso das prisões, como quem paga a conta é o
Estado, diz Ferreira, o contrato deveria ser de prestação de serviços - que tem
duração máxima de cinco anos, período muito menor do que os 30 anos que o
consórcio Reintegra Brasil terá para administrar o complexo de Itaquitinga, em
Pernambuco. "Estão usando a figura da concessão para fazer contratos de
até 35 anos, mas isso não é uma concessão. Esse modelo é inconstitucional e dá
à iniciativa privada uma série de garantias de pagamento que o credor comum do
Estado não tem", afirma. De acordo com o professor, a lei de PPP permite
que o credor seja pago pelo Estado sem entrar na fila dos precatórios junto com
quem, por exemplo, vence uma causa trabalhista. "Ele é um credor
absolutamente privilegiado."15
Na
Bahia, onde também foram feitas experiências com gestão privada no sistema
penitenciário, o modelo difere daquele adotado por Minas Gerais e Pernambuco
justamente por fixar contratos curtos, de até cinco anos.
A
Bahia mantém cinco unidades prisionais em cogestão com a iniciativa privada.
A
experiência teve início no último governo de Paulo Souto (DEM) e, segundo a
assessoria de imprensa da Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos,
não é considerado ideal pelo atual governo de Jaques Wagner (PT). De acordo com
o superintendente de Assuntos Penais da Bahia, Isidoro Orge, os conjuntos
penais de Juazeiro, Serrinha, Valença, Lauro de Freitas e Itabuna têm contratos
de concessão de até cinco anos e já existiam antes de o modelo de cogestão ser
adotado.16
O
Paraná teve uma experiência de terceirização nos presídios estaduais semelhante
à baiana. Seis unidades funcionaram neste regime entre 1999 e 2006, iniciado
durante o governo de Jaime Lerner (DEM).
Segundo
a Secretaria de Justiça, a experiência aconteceu nas casas de custódia de
Curitiba e Londrina e nas penitenciárias estaduais de Piraquara, Guarapuava,
Foz do Iguaçu e Cascavel.
Os
contratos de concessão foram cumpridos integralmente até o vencimento de cada
um, entre maio e agosto de 2006. Depois, as seis unidades voltaram ao controle
do governo paranaense.
Mas,
não há informação por parte da Secretaria de Justiça se houve algum interesse
da administração do governador Roberto Requião (PMDB) em retomar o projeto.17
O
grande entrave apontado por aqueles que se posicionam contra as parcerias
público-privadas no sistema penitenciário é o caráter jurisdicional de que se
reveste a execução no Brasil, constituindo-se, portanto, em atividade exclusiva
do Estado e indelegável por meio de contrato administrativo nos moldes retro
explanados.
Na
doutrina há duas posições sobre a natureza jurídica da execução penal, conforme
nos explica Julio Fabbrini Mirabete:
De
um lado, juristas alemães, principalmente, sustentam a jurisdicionalidade da
execução penal (...). De outro, os processualistas italianos e franceses, de
modo geral, entendem que a execução penal é uma atividade prevalentemente
administrativa, dotada, no entanto, de jurisdicionalidade episódica (como nos
incidentes de execução nos quais o juiz é obrigado a intervir, não somente para
fiscalizar, mas também para decidir os conflitos efetivos entre a pretensão do
Estado e o direito do condenado).18
O
Art. 2º da LEP adotou a primeira orientação: A jurisdição penal dos Juízes
ou Tribunais da Justiça ordinária, em todo o Território Nacional, será
exercida, no processo de execução, na conformidade desta Lei e do Código de
Processo Penal. Portanto, a parceria público-privada somente seria possível em
relação a atividades extrajudiciais da administração no curso da execução
penal, quais sejam: o fornecimento de comida, roupas, hotelaria, limpeza,
sistema de vigilância, etc. A função jurisdicional, de natureza indelegável,
permaneceria nas mãos do Estado, por meio do juízo da execução, cabendo
exclusivamente a ele determinar o período de encarceramento do preso, além de
seus direitos e seus deveres.19 E, ainda assim, as atividades exercidas
pela entidade privada devem ser fiscalizadas pelo Estado.
O
art.34 da lei 7.210/84 prevê, ainda:
Art.
34. O trabalho poderá ser gerenciado por fundação, ou empresa pública, com
autonomia administrativa, e terá por objetivo a formação profissional do
condenado.
§
1º Nessa hipótese, incumbirá à entidade gerenciadora promover e supervisionar a
produção, com critérios e métodos empresariais, encarregar-se de sua
comercialização, bem como suportar despesas, inclusive pagamento de remuneração
adequada.
§
2º Os governos federal, estadual e municipal poderão celebrar convênio com
a iniciativa privada, para implantação de oficinas de trabalho referentes a
setores de apoio dos presídios.
O
dispositivo acima, ao mesmo tempo em que indica como função de empresas ou
fundações públicas o gerenciamento do trabalho nas prisões (o que estaria
vedado para empresas privadas). Permite, por outro lado, a celebração de
convênios com a iniciativa privada, para implantação de oficinas de trabalho
(abrindo precedente para a parceria).
Outra
crítica feita às parcerias público-privadas é: a desvirtualização da finalidade
da pena, pois, mais do que ressocializar, a pena passaria somente a atender os
interesses de grupos econômicos privados (que visam à obtenção de lucro),
acarretando em uso inapropriado da execução para exploração de mão-de-obra
prisional a menor custo, tal como já ocorre em alguns países:
Vários
escândalos já vieram à tona, como o da Wackenhut Corrections Corporation - WCC,
primeira empresa mundial de gerenciamento de prisões privadas, que foi acusada,
em 2000, de maus-tratos contra presidiários de Jena, na Louisiana. Segundo o
relatório da promotoria, nesta prisão privada, com capacidade para 276
condenados, os presos eram tratados "como animais de quatro patas, andando
descalços, com roupa suja e devendo com freqüência lutar para comer". Mal
pagos, os guardas nem sempre recebiam treinamento adequado.20
Por
outro lado, para alguns, a terceirização de certas atividades pode garantir ao
preso a possibilidade de melhor reinserção social através: da ocupação de
seu tempo ocioso com educação e trabalho, o que além de qualificá-lo
profissionalmente, também se reverteria numa fonte de renda para auxílio
próprio e de sua família, e também do ressarcimento aos prejuízos ocasionados
em razão de seu crime.21
4.
Considerações Finais
Quase
todos os países têm adotado o sistema de privatização ou de parcerias entre o
poder público e empresas privadas, com o escopo de reduzir os gastos da
administração pública com a execução penal e solucionar os problemas
relacionados ao sistema carcerário.
A
adoção da parceria público-privada incita debates acerca de sua viabilidade no
sistema jurídico brasileiro, tendo em vista o caráter jurisdicional da
execução, bem como de seus efeitos em relação ao condenado, sobretudo no
tocante à sua dignidade e ressocialização.
Não
podemos negar que a parceria público-privada se apresenta como uma alternativa
bastante interessante, dentre um leque de medidas possíveis e necessárias que
devem ser tomadas para modificar o quadro lastimável em que se encontra a
execução penal no Brasil.
Por
fim, vale lembrar, mais uma vez, que o objetivo da execução é propiciar um
cumprimento de pena digno que, ao final, garanta a ressocialização do
individuo, o que não tem sido verificado nos moldes do sistema atual, daí a
necessidade de discussão acerca do tema em epígrafe.
5.
Bibliografia
ASSIS,
Rafael Damaceno de. Privatização de prisões e adoção de um modelo de gestão
privatizada.
BECCARIA,
Cesare. Dos delitos e das Penas. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
D'URSO,
Luiz Flávio Borges. Privatização de Presídios. Revista Consulex. Ano III, n.
31, p. 44-46, Jul. 1999.
MIRABETE,
Julio Fabbrini. Execução Penal. 11ªedição. São Paulo: Atlas, 2007.
MELLO,
Celso Antonio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: editora
Malheiros, 2004.
MEIRELLES,
Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: editora Malheiros,
2008.
NEVES,
Aécio. PPP’s: caminho para retomar investimentos. Jornal Folha de São Paulo.
Caderno Opinião, 27/10/05.
OLIVEIRA,
Gustavo Henrique Justino de. A arbitragem e as parcerias público-privadas.
Revista de Arbitragem e Mediação, n. 12, Ano 4, jan./mar., São Paulo: editora
Revista dos Tribunais, 2005.
Estados
investem em presídios com parceria privada; modelo desperta polêmica. UOL
Notícias – Cotidiano, 13/7/09.
Presídios
com parcerias público-privadas são ilegais, dizem críticos.
_____________
1 Dados
disponíveis em: (clique aqui). Acesso
em: 08.07.09.
2 Falta
transparência à administração penitenciária paulista, diz pesquisadora. In:
Notícias UOL – cotidiano.
3 Por
sistemas de monitoramento eletrônico entende-se o emprego de descobertas
tecnológicas voltadas a programas de novos estilos de punição e vigilância do
delinqüente. Assim, se permite que a função deletéria da prisão dê ensejo à
explicitação de soluções integradoras, que permitem a reintegração do indivíduo
à sociedade, bem como uma melhor individualização da pena. In: OLIVEIRA,
Edmundo. Direito Penal do Futuro – A Prisão Virtual. Rio de Janeiro: Forense,
2007, p. 8. A autora também pesquisa e profere palestras sobre o tema e em
breve publicará artigo a respeito dos sistemas de monitoramento eletrônico.
4 ASSIS,Rafael
Damaceno de.Privatização de prisões e adoção de um modelo de gestão
privatizada.
5 Nos
Estados Unidos, ela bate todos os recordes, com uma taxa de encarceramento de
686 para 100.000 habitantes em 2003. Na Grã-Bretanha, existem 135 detentos para
100.000 habitantes, assim como em Portugal; na Espanha, são 125 presidiários
para 100.000; na Itália, 100 para 100.000; na Holanda, 93 para 100.000; na Bélgica,
85 para 100.000. Embora, na França, esta proporção esteja entre as mais baixas
(99 para 100.000 habitantes em 2003), o número de presos aumentou em 32 % desde
1990. Em 1° de julho de 2003, ele totalizava 63.652, ou seja, 2.689 a mais que
um ano antes, sem que tenha havido alteração no número de vagas (48.600). Nunca
a taxa média de ocupação foi tão alta: 128,3 %. In: WACQUANT, Loïc.
Privatização dos Presídios. Le Monde Diplomatique. Set./04.
6 Parceria
privada é ideal para gestão de presídios. Jornal do Comércio / Geral/Página:
22. 7 Concessão de Serviços Públicos – é um contrato administrativo
pelo qual o poder público delega à outrem a prestação de um serviço público
para que este o execute em seu próprio nome, por sua conta e risco, garantida a
devida remuneração (tarifas ou, como no caso de concessões de rádio e
televisão, o concessionário se remunera pela divulgação de mensagens
publicitárias cobradas dos anunciantes) e sob normas e controle do Estado. Ex.
Eletropaulo, Embratel, a via oeste, Autoban, nova Dutra – é atribuída a pessoas
jurídica ou consórcios de empresas e pressupõe um contrato de longa duração com
altos investimentos. – se o contratado não deu causa à rescisão fará jus à
indenização (encampação/resgate – conveniência e oportunidade).
8 Estados
investem em presídios com parceria privada; modelo desperta polêmica. UOL
Notícias – Cotidiano, 13.07.09.
9 Ibidem.
10 Ibidem.
11 Ibidem.
12 Presídios
com parcerias público-privadas são ilegais, dizem críticos.
13 Ibidem.
14 Ibidem.
15 Ibidem.
16 Ibidem.
17 Ibidem.
18 MIRABETE,
Julio Fabbrini. Execução Penal. 11ªedição. São Paulo: Atlas, 2007.
19 ASSIS,
Rafael Damaceno de. Privatização de prisões e adoção de um modelo de gestão
privatizada.
20 Patrice
de Beer, A justiça americana intenta processo contra o principal operador de
prisões privadas, Le Monde, 3 de abril de 2000.
21 Ibidem.
______________
*Advogada.
Professora de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Zumbi dos Palmares.
Professora do curso de pós-graduação em Direito Eletrônico da FMU -
Faculdades Metropolitanas Unidas
http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI91850,21048-Breves+consideracoes+sobre+a+privatizacao+dos+presidios+brasileiros
PPPs: caminho para retomar
investimentos para Aécio Neves Governador de Minas em 2005
PPPs: caminho para retomar
investimentos
AÉCIO NEVES
Se
os governos, sozinhos, não têm condições de oferecer boas estradas, é preciso
agregar parceiros para essa missão
|
A
realidade não é diferente na maioria dos países, inclusive nos ricos e
desenvolvidos: os governantes assumem seus cargos e passam grande parte do
mandato reclamando da falta de recursos necessários para atender às demandas da
sociedade que os elegeu, que, via de regra, costumam ser muito justas e quase
sempre crescentes. Isso vale para todas as instâncias de governo e,
evidentemente, é mais flagrante nos países ainda em desenvolvimento.
Mesmo que inconscientemente, esses mandatários acabam por transformar o cotidiano da administração em um repetitivo e desgastante itinerário de busca por mais recursos, o que faz desse imperativo quase uma verdadeira política de governo. A escassez de alavancas para viabilizar investimentos no âmbito do Estado não é problema deste ou daquele partido ou de certa ideologia. É realidade do mundo contemporâneo, que obriga os que têm responsabilidade pública a reformar, em essência, a própria visão do Estado sobre a matéria, reinventando mecanismos institucionais e legais para vencer tal desafio.
As Parcerias Público-Privadas (PPPs) estão nesse campo.
Embora não possam e não devam ser encaradas como uma fórmula milagrosa com capacidade para resolver todas as deficiências e déficits no âmbito do poder público, se transformaram em uma alternativa importante para a reversão do quadro de dificuldades de boa parte dos Estados brasileiros.
Trata-se, na verdade, de uma nova forma de relacionamento entre o setor privado e o governo, em que o primeiro entra com sua capacidade de investir e sua competência gerencial e o segundo assegura a satisfação do interesse público. Em outras palavras, é uma solução eficiente e socialmente vantajosa para engajar o investimento privado na infra-estrutura e em áreas de grande alcance social.
Minas está apostando nessa idéia. Acabamos de lançar o primeiro modelo de PPP do país para o setor rodoviário, que é o projeto de recuperação da infra-estrutura da MG - 050, uma das rodovias estaduais de maior importância para Minas Gerais, com 350 km de extensão, que liga a região metropolitana de Belo Horizonte à divisa com São Paulo. O investimento total será de R$ 640 milhões. Nos primeiros cinco anos, serão investidos, nesse trecho, R$ 320 milhões. Seria inimaginável o Estado aplicar recursos dessa magnitude em uma só estrada, apesar de sua importância, sem o aporte do setor privado.
Essa nova modelagem, creio, pode ser uma das soluções para os graves problemas que temos nas estradas brasileiras, que estão em estado deplorável. Se os governos, sozinhos, não têm condições de oferecer boas estradas, fundamentais para a segurança dos cidadãos e para o desenvolvimento do país, é preciso que pensemos em criar condições para agregar parceiros para essa missão -é o que Minas faz neste momento.
Na Inglaterra, onde as PPPs existem há pelo menos uma década, o governo assinou projetos que superam 12 bilhões de libras, algo como R$ 60 bilhões, em diversas áreas, como construção de hospitais, escolas, presídios e rodovias. Na América Latina, o Chile é o país que tem maior experiência nessa nova modelagem, com projetos que superam US$ 2 bilhões em parcerias, as quais englobam presídios, irrigação, transportes públicos, aeroportos e rodovias.
De acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o crescimento das PPPs na América Latina vem sendo prejudicado, em grande medida, "pela ausência de um marco legal e institucional apropriado". Problema que o Brasil e Minas já superaram, pois já possuímos leis que tratam do assunto.
Aliás, a lei das PPPs de Minas, assinada em dezembro de 2003, foi o primeiro instrumento dessa natureza no país. Essa postura de vanguarda do Estado despertou o interesse do BID, que disponibilizou recursos a fundo perdido para a Unidade PPP de Minas desenvolver projetos-piloto, para criar mecanismos de garantias e difundir esse modelo de parcerias. E essa foi a primeira colaboração financeira do banco para um programa de PPP em um Estado brasileiro.
Estamos convencidos de que essa parceria pode resultar em grandes benefícios para a população. Podemos dizer que, num futuro não muito distante, teremos corredores de transporte em melhores condições de tráfego, duplicados, oferecendo mais segurança aos usuários e sendo indutores do desenvolvimento e do crescimento do Estado.
Mas não vamos ficar apenas no setor rodoviário. Já estamos projetando modelos de PPPs em saneamento básico, para oferecer água tratada e construção de redes de esgoto em áreas mais carentes do Estado, e também no sistema prisional, para a criação de vagas, um problema que é grave no Brasil inteiro.
Estou convencido de que a infra-estrutura brasileira não vai se desenvolver sem a contribuição efetiva do setor privado. Nesse modelo de parceria, há uma mudança de conceito: o Estado deixa simplesmente de ser o comprador de obras e passa a comprar serviços. Essa é a gestão moderna e é para esse caminho que aponta o êxito dos principais países do mundo.
Mesmo que inconscientemente, esses mandatários acabam por transformar o cotidiano da administração em um repetitivo e desgastante itinerário de busca por mais recursos, o que faz desse imperativo quase uma verdadeira política de governo. A escassez de alavancas para viabilizar investimentos no âmbito do Estado não é problema deste ou daquele partido ou de certa ideologia. É realidade do mundo contemporâneo, que obriga os que têm responsabilidade pública a reformar, em essência, a própria visão do Estado sobre a matéria, reinventando mecanismos institucionais e legais para vencer tal desafio.
As Parcerias Público-Privadas (PPPs) estão nesse campo.
Embora não possam e não devam ser encaradas como uma fórmula milagrosa com capacidade para resolver todas as deficiências e déficits no âmbito do poder público, se transformaram em uma alternativa importante para a reversão do quadro de dificuldades de boa parte dos Estados brasileiros.
Trata-se, na verdade, de uma nova forma de relacionamento entre o setor privado e o governo, em que o primeiro entra com sua capacidade de investir e sua competência gerencial e o segundo assegura a satisfação do interesse público. Em outras palavras, é uma solução eficiente e socialmente vantajosa para engajar o investimento privado na infra-estrutura e em áreas de grande alcance social.
Minas está apostando nessa idéia. Acabamos de lançar o primeiro modelo de PPP do país para o setor rodoviário, que é o projeto de recuperação da infra-estrutura da MG - 050, uma das rodovias estaduais de maior importância para Minas Gerais, com 350 km de extensão, que liga a região metropolitana de Belo Horizonte à divisa com São Paulo. O investimento total será de R$ 640 milhões. Nos primeiros cinco anos, serão investidos, nesse trecho, R$ 320 milhões. Seria inimaginável o Estado aplicar recursos dessa magnitude em uma só estrada, apesar de sua importância, sem o aporte do setor privado.
Essa nova modelagem, creio, pode ser uma das soluções para os graves problemas que temos nas estradas brasileiras, que estão em estado deplorável. Se os governos, sozinhos, não têm condições de oferecer boas estradas, fundamentais para a segurança dos cidadãos e para o desenvolvimento do país, é preciso que pensemos em criar condições para agregar parceiros para essa missão -é o que Minas faz neste momento.
Na Inglaterra, onde as PPPs existem há pelo menos uma década, o governo assinou projetos que superam 12 bilhões de libras, algo como R$ 60 bilhões, em diversas áreas, como construção de hospitais, escolas, presídios e rodovias. Na América Latina, o Chile é o país que tem maior experiência nessa nova modelagem, com projetos que superam US$ 2 bilhões em parcerias, as quais englobam presídios, irrigação, transportes públicos, aeroportos e rodovias.
De acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o crescimento das PPPs na América Latina vem sendo prejudicado, em grande medida, "pela ausência de um marco legal e institucional apropriado". Problema que o Brasil e Minas já superaram, pois já possuímos leis que tratam do assunto.
Aliás, a lei das PPPs de Minas, assinada em dezembro de 2003, foi o primeiro instrumento dessa natureza no país. Essa postura de vanguarda do Estado despertou o interesse do BID, que disponibilizou recursos a fundo perdido para a Unidade PPP de Minas desenvolver projetos-piloto, para criar mecanismos de garantias e difundir esse modelo de parcerias. E essa foi a primeira colaboração financeira do banco para um programa de PPP em um Estado brasileiro.
Estamos convencidos de que essa parceria pode resultar em grandes benefícios para a população. Podemos dizer que, num futuro não muito distante, teremos corredores de transporte em melhores condições de tráfego, duplicados, oferecendo mais segurança aos usuários e sendo indutores do desenvolvimento e do crescimento do Estado.
Mas não vamos ficar apenas no setor rodoviário. Já estamos projetando modelos de PPPs em saneamento básico, para oferecer água tratada e construção de redes de esgoto em áreas mais carentes do Estado, e também no sistema prisional, para a criação de vagas, um problema que é grave no Brasil inteiro.
Estou convencido de que a infra-estrutura brasileira não vai se desenvolver sem a contribuição efetiva do setor privado. Nesse modelo de parceria, há uma mudança de conceito: o Estado deixa simplesmente de ser o comprador de obras e passa a comprar serviços. Essa é a gestão moderna e é para esse caminho que aponta o êxito dos principais países do mundo.
Aécio
Neves da Cunha, 45, economista, é governador de Minas Gerais pelo PSDB. Foi
deputado federal de 1986 a 2002, líder do governo Fernando Henrique Cardoso
(1997 a 2000) e presidente da Câmara dos Deputados (2000 a 2002).
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2711200508.htm
Dilma defende simplificação de
concessões de obras
Candidata a reeleição presidencial
em 2014
Dilma defende simplificação de
concessões de obras
A
presidente da República e candidata à reeleição, Dilma Rousseff (PT), afirmou
que uma das questões fundamentais para o próximo governo é simplificar a
concessão de obras e defendeu o uso de parcerias público-privadas,
principalmente no setor de saneamento. "Em vários casos a PPP é
fundamental. Já vi várias dando certo na área de saneamento", afirmou.
Segundo Dilma, uma das principais vantagens do modelo é que as regras de
administração nesses casos são características do setor privado. "Tem
menos burocracia, menos problemas e, em alguns casos, mais agilidade",
afirmou, em entrevista gravada com jornalistas do Grupo RBS no Palácio da
Alvorada, e transmitida nesta segunda-feira pela Rádio Gaúcha.
GABRIELA LARA E CARLA ARAÚJO ,
Estadão Conteúdo
Estadão Conteúdo
11
Agosto 2014 | 16h49
Questionada
sobre a importância da parceria para a ampliação de aeroportos regionais, Dilma
afirmou que o governo está disposto a realizar concessões e parcerias, mas
ponderou que será mais fácil atrair investidores para aeroportos de cidades
médias do que de cidades pequenas. "Em cidades médias com demanda
significativa podemos fazer com que a administração seja por concessão, mas em
cidades menores não vai ter interessado", afirmou.
Segundo
Dilma, é preciso avaliar caso a caso para decidir se a expansão dos aeroportos
será feita por concessão ou por de obra pública. "Acredito na
administração quando é viável que seja feita por PPP", afirmou, citando
como bons exemplos os aeroportos de Brasília e de Guarulhos, em São Paulo.
Questionada sobre atrasos na ampliação do aeroporto de Florianópolis, Dilma
afirmou que há casos em que o problema é de responsabilidade das empresas.
"Tem alguns casos em que a empresa inclusive encerra as obras e somos
obrigadas a licitar de novo."
Questionada
sobre a construção de presídios por meio de PPPs, Dilma afirmou que o mecanismo
também pode ser usado neste caso e ponderou que essa é uma decisão que cabe aos
governos estaduais. "Pode (fazer PPP em presídio), mas isso não é uma
função do governo federal decidir", disse. A presidente voltou a dizer que
as PPPs podem ajudar a acelerar as obras necessárias no País, mas disse que
isso não significa ser menos responsável com o meio ambiente nem com as comunidades
indígenas, por exemplo. "Temos que respeitar a existência dessas
populações tradicionais", afirmou. Segundo Dilma, essas questões devem ser
resolvidas sempre "no diálogo".
http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,dilma-defende-simplificacao-de-concessoes-de-obras,1542129
Amazonas celebra PPP de complexo
prisional
Enviado
por PPP Brasil em qui,
19/03/2015 - 09:54
concessão
administrativa
Estado
O
Estado do Amazonas celebrou contrato de parceria público-privada (PPP) cujo
objeto é a implantação de unidades penitenciárias.
A
concessionária será responsável pela gestão, operação e manutenção, precedidos
de obras para implantação e/ou reforma das unidades.
O
edital foi publicado em agosto de 2014. O consórcio vencedor é formado pela
Umanizzare Gestão Prisional e Serviços e LFG Locações e Serviço Ltda. e o prazo
de vigência do contrato de concessão administrativa é de 27 (vinte e sete)
anos.
O
valor do contrato é de R$ 205.904.493,72. Trata-se da segunda PPP assinada pelo
Estado, que já celebrou uma PPP na área de saúde, referente à implantação do
Hospital da Zona Norte de Manaus.
http://www.pppbrasil.com.br/portal/content/amazonas-celebra-ppp-de-complexo-prisional
Artigo: Quem são os responsáveis
pelo fracasso de algumas PPPs?
Enviado
por Bruno Pereira em sex,
11/11/2016 - 07:46
É
natural que em momentos como os atuais, pautados pelo pessimismo e pela
ausência de perspectivas claras sobre o futuro do Brasil, sobressaiam
interpretações negativas sobre o passado recente.
No
momento em que o país, em função de fatos narrados em inquéritos, ações
judiciais e sentenças, depara-se com exemplos de radicalização da corrupção em
uma amostra relevante de contratos públicos tradicionais e descortinam-se os
atalhos que caracterizaram as trajetórias empresariais de grandes grupos
nacionais, forjadas em ambiente de incentivo à ilegalidade em comunhão com
alguns governos, os setores da infraestrutura e serviços públicos, onde tais
práticas se instalaram, prostram-se em situação de imobilismo, quer seja no
setor público, quer seja na iniciativa privada.
O
que há de mais terrível na presente situação do ambiente de negócios
público-privado nos vários mercados de infraestrutura e serviços públicos é o
efeito “terra arrasada”, não apenas em função dos casos de corrupção, mas
também por conta da percepção de enfrentamos um desarranjo global (contas
públicas, legitimidade política, financiamento de projetos, inflação, juros,
etc.).
Mesmo
que os contratos de parceria público-privada (PPP) não tenham sido o foco das
recentes investigações sobre corrupção de repercussão nacional e internacional,
não é possível negar que parte relevante das empresas investigadas no âmbito do
Caso Lava Jato atuaram fortemente no mercado brasileiro de PPPs nos últimos
anos.
Ou
seja, as PPPs estiveram imersas em um quadro cultural, político e empresarial
caracterizado pela pouca transparência, arremedos de soluções, atalhos, visão
de curto prazo, pouco sério e sem apreço pela técnica, fatores determinantes do
contexto de onde emergiram as 93 PPPs já assinadas.
Algumas
empresas, parte delas da indústria da construção, “tomaram as PPPs de assalto”,
retirando de um modelo de contratação inovador, focado no longo prazo e no
resultado, o seu potencial de transformação da qualidade do gasto e
planejamento públicos. Os danos reputacionais gerados ao modelo das PPPs transcendem
os projetos individualmente considerados, pois produzem a percepção de que o
próprio modelo é ruim, do ponto de vista conceitual e prático.
O
ambiente de ilegalidade público-privada que preponderou nos últimos anos pode
ser sintetizado nas imagens do desastre ambiental de Mariana (MG). Predomina um
mal-estar geral diante da tragédia e não existe no horizonte sinais de que, a
partir de agora, haverá uma experiência mais virtuosa.
Como
será possível ter uma experiência mais exitosa, no caso das PPPs, sem encarar
erros cometidos em licitações e contratos recentes?
Dos
93 contratos de PPP já assinados, 23 enfrentam problemas sérios, de naturezas
diversas: investimentos planejados, que ainda não foram iniciados; atrasos em
obras; processos administrativos sobre possíveis intervenções e caducidades;
governos despreparados para gerir os contratos; e performance inadequada da
concessionária.
Os
contratos que poderiam ser classificados como problemáticos são: Aterro
Sanitário de Governador Valadares; Centro Administrativo do Distrito Federal;
Centro de Gestão Integrada do Distrito Federal; Arena do Mineirão; Complexos
Hospitalares do Estado de São Paulo; Rodovia do Paraná; Esgotamento Sanitário
de Macaé; Arena Dunas; Maracanã; Hospital Metropolitano de Belo Horizonte;
Hospital Regional Metropolitano do Ceará; Instituto Couto Maia (Bahia); Linha
18 do Metrô (São Paulo); Linha 6 do Metrô (São Paulo); Polo Cinematográfico e
Cultural de Paulínia (SP); Ponte Estaiada sobre o Rio Cocó (Ceará); Rodovia
MG-050; Esgotamento Sanitário de Rio das Ostras (RJ); Resíduos Sólidos de São
Bernardo do Campo (SP); Resíduos Sólidos da Região Metropolitana de Belo
Horizonte; UBS de Manaus; Serviço de atendimento ao cidadão (Ceará); e VLT de
Goiás.
Cabe
lembrar que 4 PPPs já foram extintas antes do encerramento dos respectivos
prazos de vigência: Arena Pernambuco, Resíduos Sólidos de Belém, Iluminação
pública de Urânia (SP) e Centro de Ressocialização de Pernambuco.
Este
contexto está posto na antessala de um período em que as PPPs poderiam ser
bastante necessárias e úteis. O tema está na agenda de dezenas de Prefeitos
eleitos, a crise fiscal não será minimizada no curto prazo e há urgência por
inovações em gestão pública.
É
preciso indicar que há uma responsabilidade coletiva, raramente explicitada. Os
estudos de viabilidade, as licitações e a gestão dos contratos não “brotam do
nada”, sem intermediações de profissionais que trabalham cotidianamente com o
tema. Pelo contrário: há dezenas de gestores públicos, executivos e consultores
que se dedicam, ou deveriam se dedicar, para construir modelos de maior
qualidade. Entretanto, aparentemente houve uma falha coletiva, geradora de
diversos contratos de PPP problemáticos.
A
questão é: qual é a responsabilidade individual de todos que trabalham com o
tema diante do desafio de construir um mercado melhor? Teremos melhores PPPs
nos próximos anos ou trata-se de um modelo fadado a contentar-se com as margens
do processo decisório público e privado?
Recentemente
foi publicado no portal PPP Brasil um artigo de Philippe Enaud,
Presidente-fundador da Vivante, acionista de algumas PPPs. Por que não há mais
profissionais com posturas similares, que compartilhem suas visões sobre erros
e acertos do modelo?
É
fundamental que gestores públicos, consultores e executivos se posicionem
diante dos erros cometidos na concepção e gestão dos mais de 90 contratos de
PPP já celebrados. O PPP Brasil está aberto para repercutir tais considerações.
Há
um mal-estar silencioso sobre os resultados obtidos com as PPPs até o momento.
Apatia e senso de irresponsabilidade não produzirão melhores resultados.
http://www.pppbrasil.com.br/portal/content/artigo-quem-s%C3%A3o-os-respons%C3%A1veis-pelo-fracasso-de-algumas-ppps
O processo de privatização e desestatização
do Estado brasileiro
O processo de privatização e
desestatização do Estado brasileiro
Cláudia Maria Borges Costa Pinto
GOSTOU?
7
I
– PRIVATIZAÇÃO E DESESTATIZAÇÃO:
Não
é fácil definir "privatização". Maria Sylvia Zanella Di PIETRO afirma
que o conceito é mais conexo à Ciência da Administração, Ciência Política e às
Ciências Econômicas que ao Direito [01].
Segundo
Jorge A. Aja ESPIL: "a chamada privatização era, até pouco tempo, uma
daquelas palavras exóticas que os dicionários omitiam de incluir. Apenas
recentemente, em começos da década de 80, as novas edições dos léxicos
norte-americanos começaram a dar conta de sua definição: ‘popular e embaraçoso
jargão destinado a desembaraçar o Estado de funções próprias do setor privado’
(...)" [02].
Marcos
Jordão Teixeira do AMARAL FILHO, por seu turno, esclarece que o uso mais antigo
do termo "parece ter sido em Peter F. Drucker; ele o usou em Reason
Foundation Newsletters (Santa Mônica, Califórnia), no início de 1976", sendo
mais tarde utilizada, em 1983, nos Estados Unidos, em um dicionário que assim
conceituava o termo: "tornar privado, especialmente (como um negócio ou
indústria) mudar do controle, ou propriedade, público para o privado" [03].
No
Brasil, o dicionário Aurélio Buarque de Holanda, "em sua edição de 1985,
definiu privatizar como ‘tornar privado ou particular’. A edição de 1986
apresentou um sentido mais atual: ‘Trazer para o setor privado ou particular.
Privatizar uma empresa." [04].
Privatizar
vem do latim privus, que significa "particular".
Segundo
Leila CUÉLLAR, "privatização é um termo polissêmico [05]". Por
este motivo, portanto, encontramos, na doutrina (tanto da área jurídica quanto
econômica), inumeráveis definições para o termo, o que dificulta, à luz das
disposições da Lei 9.491 de 9-9-97, sua exata compreensão. Buscaremos, neste
trabalho, oferecer uma sistematização ao uso da expressão.
O processo de privatização e
desestatização do Estado brasileiro
Cláudia Maria Borges Costa Pinto
Publicado
em 01/2009. Elaborado em 12/2007.
GOSTOU?
7
DIREITO
ADMINISTRATIVO
SERVIÇOS
PÚBLICOS
PRIVATIZAÇÃO
Página
1 de 3»
I
– PRIVATIZAÇÃO E DESESTATIZAÇÃO:
Não
é fácil definir "privatização". Maria Sylvia Zanella Di PIETRO afirma
que o conceito é mais conexo à Ciência da Administração, Ciência Política e às
Ciências Econômicas que ao Direito [01].
Segundo
Jorge A. Aja ESPIL: "a chamada privatização era, até pouco tempo, uma
daquelas palavras exóticas que os dicionários omitiam de incluir. Apenas
recentemente, em começos da década de 80, as novas edições dos léxicos
norte-americanos começaram a dar conta de sua definição: ‘popular e embaraçoso
jargão destinado a desembaraçar o Estado de funções próprias do setor privado’
(...)" [02].
Marcos
Jordão Teixeira do AMARAL FILHO, por seu turno, esclarece que o uso mais antigo
do termo "parece ter sido em Peter F. Drucker; ele o usou em Reason
Foundation Newsletters (Santa Mônica, Califórnia), no início de 1976", sendo
mais tarde utilizada, em 1983, nos Estados Unidos, em um dicionário que assim
conceituava o termo: "tornar privado, especialmente (como um negócio ou
indústria) mudar do controle, ou propriedade, público para o privado" [03].
No
Brasil, o dicionário Aurélio Buarque de Holanda, "em sua edição de 1985,
definiu privatizar como ‘tornar privado ou particular’. A edição de 1986
apresentou um sentido mais atual: ‘Trazer para o setor privado ou particular.
Privatizar uma empresa." [04].
Privatizar
vem do latim privus, que significa "particular".
Segundo
Leila CUÉLLAR, "privatização é um termo polissêmico [05]". Por
este motivo, portanto, encontramos, na doutrina (tanto da área jurídica quanto
econômica), inumeráveis definições para o termo, o que dificulta, à luz das
disposições da Lei 9.491 de 9-9-97, sua exata compreensão. Buscaremos, neste
trabalho, oferecer uma sistematização ao uso da expressão.
1.1.1.Privatização
em sentido amplo:
Maria
Sylvia Zanella Di PIETRO afirma que, privatização, em sentido amplo, "abrange
todas de medidas com o objetivo de diminuir o tamanho do Estado e que
compreendem, fundamentalmente:
a)desregulação
(diminuição
da intervenção do Estado no domínio econômico);
b)desmonopolização de
atividades econômicas;
c)a venda
de ações de empresas estatais ao setor privado (desnacionalização ou
desestatização)
d)a concessão
de serviços públicos (com a devolução da qualidade de concessionário à
empresa privada e não mais a empresas estatais, como vinha ocorrendo);
e)os contracting
out (como forma pela qual a Administração Pública celebra acordos de
variados tipos para buscar a colaboração do setor privado, podendo-se
mencionar, como exemplos, os convênios e os contratos de obras e prestação de
serviços); é nesta última formula que entra o instituto da terceirização
" [06].
Outros
autores também adotam o conceito amplo de privatização. Entre eles, citamos:
-JAIME
RODRIGUEZ-ARANA: "conjunto de decisões que compreendem, em sentido
estrito, quatro tipos de atividades. Primeiro, a desregulação ou liberação de
determinados setores econômicos. Segundo, a transferência de propriedade de
ativos, seja através de ações, bens, etc. Terceiro, promoção da prestação e
gestão privada de serviços públicos. E, quarto, a introdução de mecanismos e
procedimentos de gestão privada no marco de empresas e demais entidades
publicas [07]".
-FRANCISCO
VILLAR ROJAS: define privatização como "a redução da atividade pública na
produção e distribuição de bens e serviços, mediante a passagem (por vezes, a
devolução) dessa função para a iniciativa privada" [08].
-CARLOS
MENEM e ROBERTO DROMI: estes autores afirmam que o termo abrange não só a
privatização em si mesma, mas também outras ferramentas para a transformação do
Estado. Segundo eles: "privatizar é também desburocratizar. Desburocratizar
é lograr que a comunidade empresarial gere os projetos de obras públicas,
analise sua rentabilidade, decida a inversão de capitais de risco" [09].
-PAULO
OTERO: "numa acepção genérica, poderá dizer-se que o termo ‘privatizar’
tem sempre o significado de tornar privado algo que antes o não era: privatizar
envolve, por conseguinte, remeter para o Direito Privado, transferir para
entidades privadas ou confiar ao sector privado zonas de matérias ou de bens
até então excluídos ou mais limitadamente sujeitos a uma influência dominante
privada. Ainda em sentido muito amplo, a privatização da Administração Pública
traduz o conteúdo de uma política ou orientação decisória que, visando reduzir
a organização e a actuação do poder administrativo ou a esfera de influência
directa do Direito Administrativo, reforça o papel das entidades integrantes do
sector privado ou do seu direito na respectiva actuação sobre certas áreas,
matérias ou bens até então objecto de intervenção pública directa ou
imediata" [10].
-CRISTIANE
DERANI: "dá-se o nome de privatização à transferência de um serviço
realizado pelo poder público para o poder privado e também à transferência de
propriedade de bens de produção públicos para o agente econômico privado. Pela
primeira modalidade, a titularidade do serviço continua sendo do poder público,
mas seu exercício é transferido para o agente privado (...). Outro modo de
transferência de poder público ao poder privado, além do poder de exercer
determinada atividade, é a transferência da propriedade pública de bens de
produção para o setor privado. O Estado vende seus ativos, retirando-se da
atividade produtiva que desempenhava – atividade que poderia ser de mercado ou
fora de mercado. Na venda de seus bens de produção, o Estado poderá vender
empresas que realizam atividade de interesse coletivo, e que agem diretamente
no mercado, como também poderá alienar bens de produção daqueles serviços que
são sua atribuição normativa e se desenvolvem fora das relações de mercado
(neste caso específico, a venda do bem será vinculada à obediência das
condições para a concessão do serviço). A propriedade é alienada ao
concessionário: o patrimônio segue aquele que é considerado no processolicitatório
apto a exercer o serviço público [11]".
1.1.2.Privatização
em sentido estrito:
Ao
lado do conceito amplo de privatização, temos o conceito restrito, que, segundo
Maria Sylvia Zanella DI PIETRO, é o adotado pela Lei 9.491 de 9-9-97 e: "abrange
apenas a transferência de ativos ou de ações de empresas estatais para o setor
privado" [12].
1.2.Estatização:
Assim
como se encontram dificuldades para definir o que seja privatização, igual
ocorre com a expressão "estatização". Alguns autores chegam a
identificar "estatização" com "privatização." [13]
Marcos
Jordão Teixeira do AMARAL FILHO propõe uma diferenciação entre as expressões
"desestatização", "privatização" e
"desregulamentação".
Para
ele "o conceito de desestatização possui um caráter ideológico, no sentido
de ter-se tornado um fim perseguido pela sociedade contemporânea. Constitui, de
outro lado, um amplo movimento da sociedade e contemporânea em direção a mais
democracia e maior autonomia para decidir seus próprios destinos, sem a tutela
onipresente do Estado. Com esse significado, possui um sentido mais amplo que
contém as noções de privatização e desregulamentação. Enquanto a
desestatização, como fim perseguido, situa-se no terreno ideológico deste final
de século, privatização e desregulamentação situam-se no campo da realidade
concreta, objetiva pelo direito, consubstanciado nos atos e leis
decorrentes." – e continua – "(...) desregulamentação
significa a eliminação total ou parcial das regras relativas ao mercado e às
atividades econômicas (...) e privatização é o termo empregado "(...)simplesmente
para designar a transferência das empresas de propriedade do Estado e as
atividades por ele exercidas para o setor privado, obedecidas às mais variadas
formas de transferência de capital aos particulares " [14].
1.2.1.Desestatização
e privatização na Lei 9.491 de 9-9-97:
A
Lei 9.491 de 1997, contrariando os conceitos doutrinários anteriormente
examinados, no art. 2º, § 1º, atribui ao vocábulo "desestatização" o
seguinte sentido:
"§
1º. Considera-se desestatização:
a)
alienação, pela União, de direitos que lhes assegurem, diretamente ou através
de outras controladas, preponderância nas deliberações sociais e o poder de
eleger a maioria dos administradores da sociedade;
b)
a transferência, para a iniciativa privada, da execução de serviços
públicos explorados pela União, diretamente ou através de
entidades controladas, bem como daqueles de sua responsabilidade.
c)
a transferência ou outorga de direitos sobre bens móveis e imóveis da União,
nos termos desta Lei."
O
artigo 2º da mesma lei diz que podem ser objeto de desestatização:
"Art.
2º. Poderão ser objeto de desestatização, nos termos desta Lei:
I
- empresas, inclusive instituições financeiras, controladas direta ou
indiretamente pela União, instituídas por lei ou ato do Poder Executivo;
II
- empresas criadas pelo setor privado e que, por qualquer motivo, passaram ao
controle direto ou indireto da União;
III
- serviços públicos objeto de concessão, permissão ou autorização;
IV
- instituições financeiras públicas estaduais que tenham tido as ações de seu
capital social desapropriadas, na forma do Decreto-Lei nº 2.321, de 25 de
fevereiro de 1987;
V
- bens móveis e imóveis da União."
Ou
seja, embora não tão abrangente, a lei utiliza o termo desestatização em um
sentido semelhante ao que alguns autores atribuem ao termo "privatização"
em sentido amplo.
Neste
sentido, Marcos Juruena Villela SOUTO é o que mais se aproxima ao conceito
legal de estatização, definindo-a como sendo "a retirada da presença do
Estado de atividades reservadas constitucionalmente à iniciativa privada
(princípio da livre iniciativa) ou de setores em que ela possa atuar com maior
eficiência (princípio da economicidade); é o gênero, do qual são espécies a
privatização, a concessão, a permissão, a terceirização e à gestão associada de
funções públicas" [15].
Outrossim,
para fins deste estudo, pode-se afirmar, à luz da Lei 9.491 de 1997
desestatização é gênero, que designa: a) a transferência de ativos ou de
ações de empresas estatais para o setor privado; b) a transferência,
para a iniciativa privada, da execução de serviços públicos (mediante
concessão, permissão e autorização); c) a transferência ou outorga de
direitos sobre bens móveis e imóveis estatais para a iniciativa privada.
II
– O PROCESSO DE DESESTATIZAÇÃO:
Um
grande número de estudiosos aponta o crescimento desmesurado do Estado como a
causa responsável pela grande onda mundial de desestatização, havida, principalmente,
a partir da década de 70 [16].
O
Estado Liberal, fundado nas idéias da proteção da liberdade e da igualdade,
mostrou-se insuficiente para debelar as distorções econômicas e sociais que ele
mesmo provocou.
Segundo
Bresser PEREIRA: "A grande crise dos anos 30 originou-se no mau
funcionamento do mercado. Conforme Keynes tão bem verificou, o mercado livre
levou as economias capitalistas à insuficiência crônica da demanda agregada. Em
conseqüência entrou também em crise o Estado Liberal, dando lugar à emergência
do Estado Social Burocrático (...)" [17].
Após
a II Guerra Mundial consolida-se um novo modelo de Estado: o Estado Social
(também denominado "welfare state", Estado do Bem-Estar, Estado
Providência, Estado do Desenvolvimento, Estado Social de Direito").
Neste
novo modelo substitui-se as idéias liberais de cunho individualista e da
igualdade meramente formal (que deu ensejo à profundas desigualdades sociais)
para a busca de uma igualdade em sentido material. Assim, atribui-se ao Estado
o dever de intervir na ordem econômica, para o fim de corrigir as distorções
provocadas pelo liberalismo até então vigente [18][19].
Em
conseqüência, com o abandono do reconhecimento do papel até então meramente
complementar do Estado, assiste-se a um crescimento desmesurado do mesmo, que,
trouxe inúmeros resultados negativos [20].
As
conseqüências negativas do Estado Social demandaram novas transformações no
papel do Estado: acrescentou-se o elemento "democrático" ao Estado
Social, que passou a ser concebido como Estado de Direito Social e Democrático
(é de Direito – protetor das liberdades individuais, sem deixar de ser Social –
protetor do bem comum). Insere-se o elemento democrático (que já se encontrava
presente, na formulação anterior, frise-se) com uma nova roupagem, a saber:
"participação popular no processo político, nas decisões do Governo, no
controle da Administração Pública" [21].
Prossegue
a autora afirmando que, no Estado Democrático de Direito, o princípio do
interesse público assume nova feição, passa da concepção utilitarista
(inspirado nas doutrinas contratualistas liberais, no qual o Direito assumia o
papel de proteger as liberdades individuais, como tutela do bem-estar geral, em
sentido puramente material) para se humanizar: preocupa-se não só com bens
materiais, mas também como valores considerados essenciais à uma existência
digna, o que exige do estado uma atuação com vistas a diminuir as desigualdades
sociais e levar à toda comunidade o bem-estar social. O princípio da legalidade
também assume novos contornos: não basta ao Estado submeter-se à lei, mas sim a
todos os princípios que se encontram na base do ordenamento jurídico, estejam
positivados ou não [22].
Todavia,
mesmo este modelo demonstrou sinais de desgaste. Bresser PEREIRA comenta que: "nos
anos 50 tornou-se lugar comum a idéia de que o Estado tinha um papel
estratégico na promoção do progresso técnico e da acumulação de capital, além
de lhe caber a responsabilidade principal pela garantia de uma razoável
distribuição de renda. Entretanto, estes êxitos levaram a um crescimento
explosivo do Estado não apenas na área de regulação, mas também no plano social
e no plano empresarial. Para isto cresceu a carga tributária (...) e como
sempre acontece, com o crescimento, com o aumento de sua capacidade de
arrecadação e de suas transferências, aos poucos as distorções começaram a
aparecer (...) Em conseqüência, seja da captura do Estado por interesses
privados, seja pela ineficiência de sua administração, seja do desequilíbrio
entre as demandas da população e sua capacidade de atendê-las, o Estado foi
entrando em crise fiscal".
E
prossegue: "em parte em conseqüência da incapacidade de reconhecer os
fatos novos que ocorriam no plano tecnológico [que provocou uma redução brutal
dos custos de transporte e de comunicação, permitindo a globalização da
economia], em parte devido à visão equivocada do Estado como demiurgo social,
e em parte, finalmente, porque as distorções de qualquer sistema de
administração estatal são inevitáveis à medida que transcorre o tempo, o fato é
que, a partir dos anos 70 e principalmente nos anos 80, a economia mundial irá
enfrentar uma nova grande crise. No primeiro mundo as taxas de crescimento
reduzem-se para a metade em relação ao que foram nos primeiros 20 anos após a
Segunda Guerra Mundial, enquanto as taxas de desemprego aumentam,
principalmente na Europa, e o milagre japonês que sobrevivera aos anos 80,
afinal soçobra nos anos 90. Na América Latina e no Leste Europeu, que se
recusam a realizar o reajustamento fiscal nos anos 70, a crise se desencadeia
nos anos 80 com muito mais violência".
Segundo
Bresser PEREIRA ao mesmo tempo em que a Grande Depressão dos anos 30 ocorreu em
virtude do mau funcionamento do mercado (retração da demanda) a Grande Crise
dos anos 80 adveio do colapso do Estado Social do século vinte. E esta crise
(crise fiscal) está associada a dois fatores: a) o caráter cíclico da
intervenção estatal; b) o processo de globalização (que reduziu a autonomia das
políticas econômicas e sociais dos estados nacionais, impondo ao Estado o novo
desafio de proteger seus cidadãos – para isto o Estado precisa ser mais forte,
mais barato e eficiente na realização de suas tarefas).
Assim,
dentro deste panorama, em respostas à crise institucional do Estado, ganharam
corpo diversas correntes políticas e ideológicas: a) a esquerda tradicional; b)
a centro-esquerda pragmática; c) a direita neoliberal; d) centro-esquerda
pragmática, social-democrática ou social-liberal [23]. Da coalizão entre a
centro-esquerda e a centro-direita surgiram iniciativas mundiais no sentido de
proceder a uma reforma do Estado, para torná-lo menor e mais voltado para as
atividades que lhes são específicas. Assim, os componentes ou processos básicos
de reforma do Estado seriam:
"a)
delimitação das funções do Estado, reduzindo seu tamanho em termos
principalmente de pessoal através de programas de privatização, terceirização e
‘publicização’ (este último processo implicando na transferência para o setor
público não-estatal das (sic) serviços sociais e científicos que hoje o Estado
presta);
b)
redução do grau de interferência do Estado ao efetivamente necessário através
de programas de desregulação que aumente o recurso aos mecanismos de controle
via mercado, transformando o Estado em um promotor da capacidade de competição
do país a nível internacional ao invés de protetor da economia nacional contra
a competição internacional.
c)
o aumento da governança do Estado, ou seja, da sua capacidade de tornar
efetivas as decisões do governo, através do ajuste fiscal, que devolve
autonomia financeira ao Estado, da reforma administrativa rumo a uma
administração pública gerencial (ao invés de burocrática) e a separação, dentro
do Estado, entre a formulação de políticas públicas e a sua execução; e
finalmente,
d)
o aumento da governabilidade, ou seja, do poder de governo, graças à existência
de instituições políticas que garantam uma melhor intermediação de interesses e
tornem mais legítimos e democráticos os governos, aperfeiçoando a democracia
representativa e abrindo espaço para o controle social ou democracia
direta" [24].
Dentro
destas balizas, privatização assume o caráter de "processo de transformar
uma empresa estatal em privada", publicização, por seu turno, é
"transformar uma organização estatal em uma organização estatal em uma
organização de direito privado, mas pública não-estatal" e
terceirização consiste "o processo de transferir para o setor privado
serviços auxiliares ou de apoio".
2.2.
Histórico da privatização:
A
privatização não é um fenômeno recente. Segundo Paulo OTERO "a
privatização da Administração Pública, entendido este fenômeno, numa primeira
aproximação, como o exercício por atividades privadas de funções de natureza
administrativa ou, segundo outra perspectiva, com a transferência para
particulares do exercício de poderes soberanos normalmente integrantes da
esfera das autoridades públicas, não se trata, ao contrário de tudo quanto se
possa pensar, de um fenômeno recente: a privatização da Administração Pública é
uma realidade muito anterior ao século XX ou mesmo ao liberalismo" [25].
Salienta
o mestre lusitano que além das "manifestações de fórmulas concessionárias
na Grécia e em Roma", há três exemplos na Idade Moderna. São eles:
a)
Século XV - sistema de colonização ensejou a criação de capitanias donatárias,
que conferiam a um particular amplos poderes de soberania de natureza
administrativa e jurisdicional sobre o território e respectiva população,
citando, como exemplo, os casos do Brasil, entre 1534 e 1549 e Angola, entre
1571 e 1592.
b)
Século XVI - ainda em termos de administração colonial, com a criação das
Companhias Coloniais (ou Majestáticas) - que eram sociedades comerciais que
captavam capitais privados para exploração, valorização e organização de
colônias e, por isto, envolviam a transferência de consideráveis poderes de
império às referidas companhias. Por exemplo, cita a Companhia da Índia,
Companhia Geral do Comércio para o Brasil, etc.
c)
Século XIX – ressurgem as Companhias Coloniais, destituídas do monopólio geral
do comércio e especialmente vocacionadas para a Administração, por exemplo,
cita o autor a Companhia de Moçambique, de Niassa, etc.
c)
Concessão de ofícios públicos, envolvendo sua venalidade e hereditariedade
(isto é, admitia-se a transferência privada da titularidade do ofício público,
mediante venda, renúncia a favor de terceiro ou sucessão mortis causa,
ou, ainda, mediante renda fixada – arrendamento ou subarrendamento de ofícios).
Prossegue
afirmando, ainda, que no Estado Liberal, ainda que existente um modelo de
Estado mínimo ou abstencionista, houve a privatização de certas áreas da
atividade administrativa, especialmente através da concessão, em três
modalidades: a) concessões de domínio público; b) concessões de obras públicas;
c) concessões de serviços públicos.
No
século XX, após a II Guerra, com a ascensão do Estado Social fortemente
intervencionista, "considerando ser sua função assumir directamente a
responsabilidade pela execução de um amplo programa de tarefas prestacionais
teleologicamente vinculadas pelos textos constitucionais à prossecução do
bem-estar" não houve qualquer sinal de movimentos de privatização,
pois se "eliminou ou desvalorizou qualquer idéia de subsidiaridade da
actuação pública, marginalizando, por consequência, os fenômenos de
privatização da Administração Pública".
"Curiosamente,
no entanto, a hipertrofia do Estado de bem-estar, por alguns mesmo qualificado
do ‘Estado de mal-estar’, levou a que se reflectisse sobre a dimensão do papel
social e econômico do Estado, incluindo a amplitude da intervenção de uma
Administração Pública verdadeiramente tentacular sobre a esfera da sociedade
civil e do indivíduo: o final dos anos setenta e o início dos anos oitenta,
primeiro pelos partidos políticos de orientação conservadora, mas, a partir de
meados dos anos oitenta, também pelos partidos de matriz-socialista,
transformou a redução do peso do Estado num objectivo programático de todos os
governos" [26].
Assim,
a exigência da redução do tamanho do Estado ganhou maior expressão,
especialmente, após a queda dos regimes comunistas europeus (no final dos anos
oitenta) e o subsequente desmantelamento das máquinas estaduais [27].
No
final dos anos 70, o governo Thatcher [28] desencadeou o fenômeno
privatizador [29], que se alastrou por toda a Europa, alicerçado
principalmente em argumentos de natureza econômica e financeira [30].
Nos
anos 90, entretanto, assistiu-se a uma verdadeira onda de privatização, que,
"apesar de ter na sua base um certo retorno a concepções econômicas
neoliberais e politicamente reducionistas do papel do Estado, pouco tem de ver
com os modelos históricos de privatização: a privatização da Administração
Pública nos finais do século XX, sem embargo de não ser um fenômeno inédito, a
verdade é que se trata de uma realidade dotada de especificidades que lhes
conferem originalidade histórica" [31].
2.2.1.
O Estado e a economia no Brasil. O processo de privatização:
Com
certo atraso, no decorrer do século XX, "o Estado brasileiro, nas ruas
relações com a economia, acompanhou o modelo dos países capitalistas adiantados
da Europa" [32].
Nos
anos 20 e após a Revolução de 1930, na era Vargas, intensifica-se um processo
de descentralização do Estado e o fortalecimento da presença do Estado no
domínio econômico, com a criação de autarquias, as quais exerciam não apenas
funções administrativas, mas também de natureza industrial ou comercial. Após a
II Guerra Mundial, tais atividades passaram a ser exercidas por pessoas
jurídicas de direito privado (sociedades de economia mista e empresas
públicas).
Durante
o governo militar realizaram-se grandes obras de infra-estrutura necessárias ao
desenvolvimento do país, ampliando-se, neste esforço, a órbita da atuação do
Estado na economia (com a criação de grande número de entidades de
administração indireta destinadas a desempenhar papéis de agentes econômicos
quanto pela edição de diversas regras jurídicas disciplinadoras da atividade
econômica) [33].
Paralelamente
a este movimento ocorre uma outra tendência de intervenção econômica, mediante
o fomento público ou crédito concedido por entidades bancárias oficiais (Banco
do Brasil e BNDES) à entidades privadas, o que teve uma consequência
interessante: as empresas devedoras dessas instituições, quando
impossibilitadas de pagarem os débitos, tomavam-nas como sócias (muitas vezes
majoritárias). Por conta disto, no decorrer de alguns anos, a União, além de
possuir no quadro da Administração indireta sociedades de economia mista e
empresas públicas, tornara-se proprietária de uma variada gama de empresas
privadas, que possuíam diversos fins, frequentemente desvinculados ao interesse
público.
Note-se
que o modelo de crescimento adotado no país, nas décadas de 60 e 70, associavam
o setor produtivo à presença do Estado: havia forte dependência da iniciativa
privada em relação ao Estado (na medida em que estaria sob sua responsabilidade
todo investimento necessário para a ampliação e manutenção da infra-estrutura
necessária ao crescimento). Este quadro resultou em um agigantamento do Estado,
que tinha por característica ser excessivamente controlador e burocrático.
A
partir dos anos 70, por diversas razões, que vão desde razões pragmáticas
(altos custos e déficits insuportáveis [34]), políticas e ideológicas,
ganhou força a idéia da redução do tamanho do Estado, não ao retrocesso ao
Estado mínimo, mas que se liberasse a sociedade da forte presença do Estado
como agente econômico e dos excessos da regulamentação exagerada.
Privatização
e desregulamentação portanto, eram as palavras de ordem e que, em diferentes
níveis, passou a ser adotada pelas principais nações ocidentais. Na América
Latina a ênfase se deu nas privatizações (sendo marcante a influência do FMI),
nos Estados Unidos, o meio escolhido, para reduzir o tamanho do Estado, foi a
desregulamentação [35].
No
Brasil, onde tradicionalmente a presença do Estado, no domínio econômico,
surgiu a percepção da necessidade de privatizar empresas controladas direta ou
indiretamente pela União, assim como aquelas de participação acionária
minoritária, bem assim permitir que serviços públicos pudessem passar para as
mãos da iniciativa privada (sendo pela venda de ativos, seja pela exploração
desses serviços [36]).
O
processo de desestatização da economia passou por etapas distintas ao longo dos
últimos governos: a) na primeira, procedeu-se à privatização de empresas que
foram incorporadas ao patrimônio da União por diversos problemas, por
intermédio do BNDES ou BNDESPAR, foram, por assim dizer, restituídas à
iniciativa privada; b) em uma etapa intermediária foram privatizadas empresas
vinculadas ao setor produtivo (que, desde a sua criação, eram consideradas
empresas estatais); c) por fim, a terceira etapa, já na égide do governo de
Fernando Henrique Cardoso, promoveu o processo de privatização stricto sensu,
dando ênfase, ainda, à concessão de serviços públicos à iniciativa privada.
Assim,
podemos apresentar as tentativas privatizantes na seguinte ordem cronológica
dos governos instituídos:
a)General
João Figueiredo (1981-1984) – Decreto 86.215 de 15-07-81.
O
governo Figueiredo, mergulhado em profunda crise, embora de forma vacilante,
encampou a idéia da privatização. Todavia, a despeito dos esforços do ministro
Hélio Beltrão, no final do mandato de Figueiredo o governo continuava com
práticas paternalistas ao setor empresarial, chegando ao ponto de, em movimento
reverso, por pressões sindicais, a estatizar a tecelagem Nova América, do Rio
de Janeiro, empresa esta totalmente antiquada e economicamente inviável [37].
O
"Programa Nacional de Desburocratização", veiculado pelo Decreto
83740/1979, reconhecia a ineficiência do serviço público em geral e pretendia a
redução da presença do estado na vida do cidadão, porquanto enunciava, o art.
3º do referido Decreto que o programa objetivava "contribuir para a
melhoria do atendimento aos usuários do serviço público (...) e reduzir
a interferência do governo na atividade do cidadão e do empresário e abreviar a
solução dos casos em que essa interferência é necessária, mediante a
descentralização das decisões, a simplificação do trabalho administrativo e
eliminação de formalidades e exigências, cujo custo econômico ou social seja
superior ao risco".
Dentro
deste programa previa-se, também o impedimento do crescimento desnecessário da
máquina administrativa federal (mediante estímulo à execução indireta).
Em
1981 sobreveio o Decreto 86.214, que instituía o "Programa de Melhoria do
Atendimento ao Público" e posteriormente o Decreto 86.215, que previa
expressamente a transferência de empresas estatais para o setor privado (sendo
clara intenção do governo em privatizar empresas que foram transferidas ao
controle pelo setor público em virtude de problemas financeiros). O espírito
deste último decreto, todavia, ainda estava impregnado pela doutrina da
segurança nacional e nacionalismo (porquanto vedavam a participação de empresas
estrangeiras) e, embora houvesse a boa "intenção do governo federal em
realizar um processo de reestruturação administrativa (...) o governo
Figueiredo encerrou sem nenhuma privatização realizada.
b)José
Sarney (1985-1898) – Decreto 95.886 de 29-03-88.
O
Governo de José Sarney apresentou uma tentativa de estruturar um processo de
privatização. O marco inicial foi o Decreto 91.991 de 28-11-95, o qual dispunha
sobre o processo de privatização de empresas sobre o controle direto ou
indireto do governo federal, guardando profundas semelhanças com a legislação
do período militar, especialmente sob o aspecto de exclusão, do processo de privatização,
de empresas exploradoras de atividades vinculadas à segurança nacional e sob o
regime de monopólio estatal, mas também teve o mérito de proibir a criação de
novas empresas sob o controle direto ou indireto da União (art. 13), entre
outras medidas com o escopo de inibir o crescimento da máquina estatal.
O
fracasso do Plano Cruzado mergulhou o país em um processo de descontrole
inflacionário e recessão econômica. Nesse contexto, sobreveio, então, o Decreto
95.886 de 29-03-1988 [38], dispondo sobre o "Programa Federal de
Desestatização".
Em
linhas gerais os objetivos do programa era transferir para a iniciativa privada
atividade econômicas exploradas pelo setor público, concorrer para a diminuição
do déficit público, propiciar a conversão de parte da dívida externa em
investimentos de risco, dinamizar o mercado de títulos e valores mobiliários,
promover a disseminação da propriedade do capital das empresas, estimular
mecanismos de competição do mercado (mediante desregulamentação da atividade
econômica), proceder a execução indireta de serviços públicos (mediante
concessões ou permissões) e promover a privatização de atividades econômicas
exploradas com exclusividade por empresas estatais, excetuados os monopólios
estatais.
Todavia,
embora se visualizasse inovações na temática das privatizações, o Governo
Sarney não obteve grandes avanços: a primeira tentativa de privatização - da
Mafersa (empresa fabricante de vagões de trens e com déficits sucessivos há
décadas) - não obteve êxito, por pressões do Sindicato dos Metalúrgicos de São
Paulo, o leilão foi cancelado.
O
saldo final é que, no governo Sarney o processo de privatização avançou
timidamente: foram vendidas 18 empresas avaliadas em US$ 533 milhões, outras 18
foram transferidas para governos estaduais, duas incorporadas por instituições
financeiras e quatro fechadas. Na sua maior parte tratava-se de empresas
pequenas e médias que empregavam 27,6 mil pessoas. Durante a década de 80, as
maiores empresas privatizadas foram a Riocell e a Aracruz Celulose, ambas na
área de celulose.
c)Fernando
Collor de Mello (1990-1992): Lei 8.031 de 12.04-90:
Fernando
Collor foi eleito sob a alcunha de celebrizado "caçador de marajás" e
com sua eleição se deu início a um ambicioso programa de reformas econômicas.
Sob
sua gestão adveio a Lei 8.018 de 11-04-90 (conversão da MP 157) que criava a
emissão de Certificados de Privatização, visando criar condições para a
realização do programa de privatizações prometido durante sua campanha. Logo
após adveio a Lei 8.031, de 12-04-90, que criou o "Programa Nacional de
Desestatização", a qual abandonando os contornos nacionalistas e de
segurança nacional (que limitavam os programas antecessores) objetivava,
fundamentalmente, resultados econômicos através da reforma do Estado, ao lado
da preocupação da integração do país nos mercados internacionais e a
democratização do acesso à propriedade de empresas (na linha do
"capitalismo popular" preconizado por Margareth Thatcher).
Surge,
pela primeira vez, a intenção de utilizar as privatizações para o saneamento do
déficit público e restringir a presença do Estado apenas em atividades
fundamentais para a consecução das prioridades nacionais, abandonando-se a
idéias de segurança nacional (note-se que o SNI foi extinto no governo Collor)
e com uma clara intenção de quebra dos monopólios constitucionais (que,
pensava-se, poderiam ser quebrados em uma revisão constitucional).
A
lei utiliza pela primeira vez o termo privatização em seu sentido estrito (ou
seja, alienação de ativos), mas dando tratamento diferenciado às participações
da Petrobrás (mantendo o disposto na Lei 2004 de 3-10-53), embora fosse clara a
intenção de quebra do monopólio estatal.
No
que toca aos serviços públicos, a lei prescreveu formas operacionais de
privatização (sendo clara a intenção de privatizar os serviços de
telecomunicações, vedada, à época, por dispositivo constitucional).
O
governo brasileiro incluiu no PND 32 empresas (dos setores siderúrgico,
petroquímico e fertilizantes), tendo iniciado o processo com a alienação da
Usiminas e a Usimec (empresas rentáveis e eficientes), o que sinalizava a
intenção do governo em demonstrar a seriedade do seu processo de privatização,
retirando sua participação de setores da economia independentemente de serem ou
não lucrativos.
Entre
as empresas privatizadas, merecem destaque a Celma S/A (reparadora de turbinas
e fabricante de motores de avião, sediada no RJ); Mafersa S/A (a qual,
historicamente, era deficitária e um ano após da privatização ostentava lucros
na ordem de 400 milhões de dólares); Cosinor (laminação de vergalhões de aço
para construção civil, suas fábricas foram vendidas e seus empregados
dispensados, gerando processo no CADE em face das empresas adquirentes – Grupo
Gerdau e Troncojacuí Administração e Participações Ltda); SNBP (transporte
fluvial de carga); Indag S/A (cujo faturamento cresceu 17% um ano após a
venda); Aços Finos Piratini S/A (produção de metais forjados, revendedores e
usuários de arame); Petroflex Indústria e Comércio S/A (produtora de elastômero
SBR, para pneus); Copesul (cujo processo de privatização foi bloqueado por
força de liminar, tendo o TRF anulado o leilão de privatização); Companhia
Nacional de Álcalis (produtora de barrilha, para indústria de vidro e
detergentes, o leilão foi suspenso por decisão judicial); CST Companhia
Siderúrgica de Tubarão (produção de placas de aço); Nitriflex (setor
petroquímico); Fosfértil (fertilizantes à base de fosfato); Polisul
Petroquímica S/A (injeção aditivada, sopro e extrusão, filmes, tubos e
rotomoldagem) e Companhia Industrial de Polipropileno (produtora de resinas de
polipropileno).
d)Governo
de Itamar Franco (1992-1994):
O impecheameant de
Collor fez reacender posições mais corporativistas e nacionalistas no processo
de privatização.
Todavia,
o Governo de Itamar Franco deu continuidade ao processo iniciado na era Collor,
pretendendo, entretanto, alterações importantes na forma de pagamento da
alienação dos ativos (exigia que parte dos pagamentos fosse efetivado em moeda
corrente), bem assim a competência do Congresso Nacional para decidir, caso a
caso, a decisão de transferir para o setor privado uma empresa estatal.
Não
obstante tais considerações, sob o governo de Itamar Franco, em 08-10-92 foi
realizado o leilão da Goiásfértil (produtora do concentrado de rocha fostática,
destinada à produção de fertilizantes fosfatados). A última das empresas
siderúrgicas a ser leiloada foi a Acesita e teve particular importância para a
continuidade do programa de desestatização (não obstante ter sido exigido, pela
primeira vez, que parte do pagamento fosse realizado em moeda corrente). Em
3-12-92 foi leiloada a Companhia Brasileira de Estireno.
Merece
destaque que, em 25-10-93, foi editada a MP 362, que tratava da discussão sobre
o uso de "moedas sociais", a quem se reputa a paralisação do processo
de privatizações (embora estivessem prontas as avaliações das empresas do setor
elétrico, como a Escelsa e a Ligth).
Esta
medida provisória trouxe importantes modificações à Lei 8.031, entre elas, que
os recursos em moeda corrente, obtidos nos leilões, fossem utilizados na
amortização da dívida pública mobiliária federal, a ampliação da participação
do capital estrangeiro e a admissão, como meio de pagamento, de "moedas
sociais" (FGTS, FCVS, empréstimos compulsórios sobre veículos, etc.).
Também
merece menção o Decreto nº 724, de 19-01-93, o qual introduziu algumas mudanças
polêmicas, entre elas, a exigência de pagamento em moeda corrente, a
possibilidade do Presidente da República avocar e decidir quaisquer matérias no
âmbito da PND e a vedação da participação dos fundos de pensão.
Sob
a égide deste decreto foram levadas à leilão a Poliolefinas (19-03-93) e a CSN
(sob intensas batalhas judiciais), a Ultrafértil, a Cosipa (também sob intensos
questionamentos judiciais), Açominas e Petroquímica União, bem como
participações acionárias na Oxiteno, tendo sido fracassadas as vendas do Lloyd
Brasileiro e da Cobra Computadores.
O
principal método de privatização utilizado pelo PND foi o sistema de leilão em
bolsa de valores, sendo criada a Comissão Diretora da Privatização que era
encarregada de supervisionar o programa e tomar as decisões sobre questões
principais como, por exemplo, aprovar a forma e as condições de venda da
empresas, em especial o preço mínimo em leilão. O resultado das privatizações
no Governo Itamar Franco foi o aporte de 5,18 bilhões de dólares.
e)Fernando
Henrique Cardoso (1994-2002):
Na
gestão de Fernando Henrique Cardoso houve a continuidade do processo de
desestatização iniciado nos governos anteriores, acentuando-se os seguintes
aspectos:
-Quebra
de monopólios (para tornar competitivas atividades antes exercidas com
exclusividade pelo setor público);
-Delegação
de serviços públicos ao particular – mediante autorização, permissão e
concessão.
-Parcerias
com entidades públicas e privadas para gestão associada de serviços públicos ou
serviços de utilidade pública, por meio de convênios, consórcios e contratos de
gestão, bem assim a intensificação da terceirização.
No
período de FHC, a gestão de diversos serviços públicos ferroviários,
portuários, de energia elétrica, de telecomunicações, antes prestados
diretamente pelo Estado ou através de sociedades de
economia mista, também tiveram transferidas a titularidade de sua prestação para
o setor privado, mediante concessão, permissão ou autorização [39]. Neste
período, também houve ampliação da privatização nos Estados e Municípios e
houve a abolição da diferenciação entre empresas nacionais de capital nacional
e estrangeiro (para abrir espaço para a privatização dos setores de siderurgia
e geração de eletricidade).
Com
a quebra de tais monopólios (EC nº 8, de 15.08.95) houve: a) um renascimento ou
"revivecência" da concessão de serviços público, bem assim dos dois
outros instrumentos de delegação (permissão e autorização) e a adoção de
controles jurídicos (regulatórios) para o fim de assegurar: i. a qualidade do
serviço; ii. a proteção do usuário e iii. a defesa da concorrência; b) ressurgimento
de autarquias, qualificadas como especiais: as agências
reguladoras [40] (cuja existência é justificada, entre
outros motivos pela "necessidade de dotar-se um órgão independente dos poderes
para exercer o controle da execução dos contratos de concessão e a fiscalização dos
serviços e das concessionárias, editando normas regulamentares, reprimindo
condutas abusivas e até resolvendo conflitos entre os agentes, envolvidos na
prestação de determinado serviço público [41]; c) com a aproximação ao
sistema jurídico americano, houve a introdução, em nosso ordenamento jurídico,
princípios extraídos do utilitarismo norte-americano, tais
como o da eficiência (inserido pela EC 19/98).
O
processo de privatização, no governo FHC, começou com a Ligth, prosseguindo, em
1997, com a venda da CVRD (que, para poder ser vendida, ensejou 127 ações
judiciais – contestadas e vencidas pela União) e terminou em 1998, com a
Eletrobrás (considerada a maior privatização do mundo, naquele ano).
No
governo de FHC adveio a Lei 9.491/97 a qual, instituindo o Programa Nacional de
Desestatização, regulamentada pelo Decreto nº 2.594, de 15.05.1998, lei esta
que objetivamos analisar em tópico separado.
‹
Página anterior
Próxima
página ›
Assuntos
relacionados
Privatização
Serviços
públicos
Direito
Administrativo
Autor
Cláudia
Maria Borges Costa Pinto
Bacharel
em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba, Especialista em Direito
Tributário pela Faculdade de Direito de Curitiba e MBA em Direito Empresarial
pela Fundação Getúlio Vargas; Mestre em Direito Econômico e Social pela
Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Advogada
https://jus.com.br/artigos/12228/o-processo-de-privatizacao-e-desestatizacao-do-estado-brasileiro
O processo de privatização e
desestatização do Estado brasileiro
Cláudia Maria Borges Costa Pinto
GOSTOU?
3. LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS E
INFRACONSTITUCIONAIS AO PROGRAMA NACIONAL DE DESESTATIZAÇÃO:
Com
o advento das Emendas Constitucionais nº 5 [42], 6 [43], 8 [44] e
9 [45], o quadro constitucional que ampara a desestatização pode ser assim
sintetizado:
a)Objeto
econômico monopolizado (ou seja, com exploração exclusiva por entidade da Administração
Pública, direta ou indireta): exploração de atividades nucleares (art. 21,
XXIII da CF/88) [46]
b)Objeto
econômico monopolizado com iniciativa atribuível à iniciativa privada (art. 20,
VIII e IX; art. 21, XI; art. 25, § 2º e 177, § 1º [47]):
-Potenciais
de energia elétrica
(art.
20, VIII - os potenciais de energia hidráulica);
-Recursos
minerais
(art.
20, IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo;).
-Telecomunicações
(art.
21, XI - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão,
os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a
organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos
institucionais);
-Serviço
local de gás canalizado e petróleo
–
Art. 25, § 2º. Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os
serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a edição de medida
provisória para a sua regulamentação.
Diante
das disposições constitucionais, vê-se que apenas os serviços descritos na
alínea "b" são suscetíveis de serem desestatizados, por meio de:
-Concessões
ou permissões
-Alienação
de controle acionário das empresas estatais federais exploradoras dos
respectivos serviços (ou simples liquidação ou extinção das mesmas, liberando a
atividade par o setor privado).
A
Lei 9.491/97 também estabelece restrições, como, por exemplo, ficando excluídos
da desestatização o Banco do Brasil S.A., a Caixa Econômica Federal, e a
empresas públicas ou sociedades de economia mista que exerçam atividades de
competência exclusiva da União, de que tratam os incisos XI e XXIII do artigo
21 e a alínea c do inciso I do artigo 159 e o artigo 177 da Constituição
Federal (não se aplicando a vedação aqui prevista às participações acionárias
detidas por essas entidades, desde que não incida restrição legal à alienação
das referidas participações – vide Lei nº 10.568, de 19.11.2002, DOU
20.11.2002, que exclui da vedação prevista no artigo 3º, as ações detidas pela
União no capital do Banco do Brasil S.A.).
3.1.
Objetivos do Programa Nacional de Desestatização:
São
definidos pelo artigo 1º da Lei 9.491/97, o qual preconiza que:
Art.
1º. O Programa Nacional de Desestatização - PND tem como objetivos
fundamentais:
I
- reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à
iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público;
II
- contribuir para a reestruturação econômica do setor público, especialmente
através da melhoria do perfil e da redução da dívida pública líquida;
III
- permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a
ser transferidas à iniciativa privada;
IV
- contribuir para a reestruturação econômica do setor privado, especialmente
para a modernização da infra-estrutura e do parque industrial do País, ampliando
sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores
da economia, inclusive através da concessão de crédito;
V
- permitir que a Administração Pública concentre seus esforços nas atividades
em que a presença do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades
nacionais;
VI
- contribuir para o fortalecimento do mercado de capitais, através do acréscimo
da oferta de valores mobiliários e da democratização da propriedade do
capital das empresas que integrarem o Programa.
3.2..
Objeto de desestatização:
Segundo
o art. 2º da Lei 9.491/97 poderão ser desestatizados:
I
- empresas, inclusive instituições financeiras, controladas direta ou
indiretamente pela União, instituídas por lei ou ato do Poder Executivo;
II
- empresas criadas pelo setor privado e que, por qualquer motivo, passaram ao
controle direto ou indireto da União;
III
- serviços públicos objeto de concessão,
permissão ou autorização;
IV
- instituições financeiras públicas estaduais que tenham tido as ações de seu
capital social desapropriadas, na forma do Decreto-Lei nº 2.321, de 25 de
fevereiro de 1987;
V
– bens móveis e imóveis da União. (Inciso acrescentado pela Medida Provisória
nº 2.161-35, de 23.08.2001, DOU 24.08.2001, em vigor conforme o art. 2º da EC
nº 32/2001)
O
parágrafo primeiro do referido artigo preconiza que:
§
1º. Considera-se desestatização:
a)
alienação, pela União, de direitos que lhes assegurem, diretamente ou através
de outras controladas, preponderância nas deliberações sociais e o poder de
eleger a maioria dos administradores da sociedade;
b)
a transferência, para a iniciativa privada, da execução de serviços públicos
explorados pela União, diretamente ou através de entidades controladas, bem
como daqueles de sua responsabilidade.
c)
a transferência ou outorga de direitos sobre bens móveis e imóveis da União,
nos termos desta Lei. (Alínea acrescentada pela Medida Provisória nº 2.161-35,
de 23.08.2001, DOU 24.08.2001, em vigor conforme o art. 2º da EC nº 32/2001)
3.4.
Modalidades operacionais:
As
modalidades operacionais possíveis para o processo de
desestatização são estabelecidas no artigo 4º da Lei 9.491/97 e são as
seguintes:
Art.
4º. As desestatizações serão executadas mediante as seguintes modalidades
operacionais:
I
- alienação de participação societária, inclusive de controle acionário,
preferencialmente mediante a pulverização de ações;
II
- abertura de capital;
III
- aumento de capital, com renúncia ou cessão, total ou parcial, de direitos de
subscrição;
IV
- alienação, arrendamento, locação, comodato ou cessão de bens e instalações;
V
- dissolução de sociedades ou desativação parcial de seus empreendimentos, com
a conseqüente alienação de seus ativos;
VI
- concessão, permissão ou autorização de serviços públicos.
VII
- aforamento, remição de foro, permuta, cessão, concessão de direito real de
uso resolúvel e alienação mediante venda de bens imóveis de domínio da União.
(Inciso acrescentado pela Medida Provisória nº 2.161-35, de 23.08.2001, DOU
24.08.2001, em vigor conforme o art. 2º da EC nº 32/2001)
§
1º. A transformação, a incorporação, a fusão ou a cisão de sociedades e a
criação de subsidiárias integrais poderão ser utilizadas a fim de viabilizar a
implementação da modalidade operacional escolhida.
§
2º Na hipótese de dissolução, caberá ao Ministro de Estado do Planejamento,
Orçamento e Gestão acompanhar e tomar as medidas cabíveis à efetivação da
liquidação da empresa. (Redação dada ao parágrafo pela Medida Provisória nº
2.161-35, de 23.08.2001, DOU 24.08.2001, em vigor conforme o art. 2º da EC nº
32/2001)
3.5.
Organização do PND:
O
PND tem por órgão máximo o Conselho Nacional de Desestatização, composto, em
caráter permanente, por quatro ministros de Estado (antes eram cinco) [48],
sob a presidência do Ministro do Planejamento e Orçamento.
As
suas reuniões, ordinariamente mensais (e extraordinariamente quando convocadas
pelo Presidente), poderão ainda participar:
Com
direito a voto: a) o titular do Ministério ao qual a empresa ou serviço se
vincule. b) quando se tratar de desestatização de instituições financeiras, o
Presidente do Banco Central do Brasil. Sem direito a voto, um representante do
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES (que funciona como
agente "gestor" operacional do PND, salvo a competência do BACEN. São
admissíveis, a convite do Presidente do Conselho, a presença de outros
Ministros de Estado, bem como representantes de entidades públicas ou privadas,
para participar das reuniões, sem direito a voto, entretanto.
O
Conselho deliberará mediante resoluções, cabendo ao Presidente, além do voto de
qualidade, a prerrogativa de deliberar, nos casos de urgência e relevante
interesse, ad referendum do colegiado (hipótese em que o Presidente submeterá a
decisão ao colegiado, na primeira reunião que se seguir àquela deliberação).
Nas
hipóteses de ausências ou impedimentos do Ministro de Estado do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, as reuniões do Conselho serão
presididas pelo Chefe da Casa Civil da Presidência da República, sendo que os
demais membros serão representados por substitutos por eles designados.
A
competência do CND é definida pelo artigo 6º da Lei 9.491/97 [49].
3.6.
Procedimento legal para a desestatização:
Analisando
o procedimento legal da desestatização, depreende-se que o mesmo compreende
duas operações distintas: os ajustes internos (rotinas administrativas e
ajustes societários) e a realização (qualificação de interessados, quando
necessária, e efetivação de desestatização).
Segundo
Rodrigo Pereira de Mello:
"Os
ajustes necessários à desestatização de uma empresa estatal federal de um
serviço público da União, naquilo que pertinentes ao âmbito interno da própria
Administração Pública (direta ou indireta), constituem-se no primeiro passo de
qualquer ação relacionada aos objetivos da Lei 9.491/97 e podem ser agrupados
sob a designação de ‘ajustes prévios’. Todos esses ajustes têm, por ato inicial
e insuperável, uma decisão do CND no sentido da inclusão da empresa ou serviço
no PND e a aprovação, pelo Presidente da República (mediante decreto
específico), dessa deliberação (art. 6º, inc. I). Publicado o ato presidencial,
iniciam-se os ‘ajustes prévios’ propriamente ditos, que se constituirão: a) ou
em saneamento financeiro e ajustes societários (inclusive fusão, incorporação
ou cisão de sociedades e criação de subsidiárias integrais, desde que
necessárias à viabilidade da desestatização), estes últimos observada sempre a
legislação comercial geral e particularmente a Lei das Sociedades Anônimas;
b) ou na designação do órgão da Administração Pública federal direta ou
indireta, responsável pela execução e acompanhamento da desestatização e na
fixação de normas regulamentares do procedimento, observada a legislação
específica aplicável: aqueles (a) são aplicáveis à desestatização de empresas
estatais federais; estes (b) dizem respeito à desestatização de serviços
públicos.
Dentre
os ajustes societários requeridos pelas empresas em processo de desestatização,
alguns exigem deliberação da assembléia geral de acionistas (cisão, fusão,
incorporação, criação de subsidiárias, aumento de capital social, abertura de
capita, alterações estatutárias, etc.) outros constituem-se por deliberação do
conselho de administração, da diretoria ou mesmo por simples atos executórios
dos órgãos empresariais.
Iniciados
ou concluídos tais ajustes, conforme o ‘desenho’ de desestatização escolhido
para cada caso, a CND delibera acerca da modalidade operacional e das condições
a ela aplicáveis (art. 6º, inc. II, alíneas a e c). Essas condições podem
incluir, dentre tantas outras, a criação na empresa de uma ‘ação de classe especial’
(golden share), a ser subscrita pela União – esta ação, diferenciada de todas
as demais representativas do capital social, seria detentora de poderes
societários especiais (art. 8º da Lei 9.491/97), tais como o poder de veto em
determinadas matérias (mudança de objeto social, mudança de sede, cessação de
determinado projeto ou investimento, alienação da composição do conselho de
administração ou regime de direção).
Com
os ‘ajustes’ e a definição da modalidade operacional e das condições
aplicáveis, encerra-se a fase dos ajustes internos. Passa-se, na sequência, à
fase da ‘realização’.
Aqui,
estando a empresa ou o serviço público prontos para sua transferência à
iniciativa privada, divulgam-se as regras aplicáveis ao processo (modalidade e
condições) e qualificam-se os eventuais interessados. A necessidade dessa
qualificação, entretanto, dependerá da modalidade aplicada pela CND à espécie:
tratando-se de desestatização de empresa e procedendo-se por meio de: a)
alienação de participação societária mediante pulverização de ações (art. 4º,
inc. I); ou de b) aumento de capital social, com renúncia ou cessão, total ou
parcial, de direitos de subscrição (art. 4º, inc. II), quando inexiste
necessidade de qualificação prévia dos interessados em face das próprias características
das operações (alienação pulverizada em bolsa a destinatários não previamente
determináveis e retirada gradativa da União com assunção do negócio pelos
demais acionistas, que, já sendo determinados, não precisam sê-lo novamente
apenas para esse fim).
Na
disponibilização das regras aplicáveis à desestatização, devem ser
disponibilizados, além do comunicado formal do CND continente da modalidade
operacional eleita e das condições a que se sujeita a operação, a justificativa
da privatização, o histórico societário da empresa, sua situação
econômico-financeira (especialmente lucratividade, pagamento de dividendos e
endividamento registrado no últimos cinco exercícios) e o sumário dos estudos
de avaliação (inclusive o critério de fixação do valor de alienação, a
modelagem de venda e o valor mínimo da participação a ser alienada). Todos
esses elementos, reunidos, constituem-se no ‘edital’ do processo de
desestatização (art. 11 da Lei 9.491).
Por
fim, na etapa final do processo, estabelecida a modalidade de desestatização,
sua modelagem e as condições em que se realizará, o Presidente da República,
por recomendação do CND e na qualidade de titular constitucional do Poder
Executivo, aprovará os meios de pagamento aplicáveis em determinada operação, dentro
dos admitidos na lei (art. 6º, inc. I c/c art. 14 da Lei 9.491/97), e fixará o
percentual admitido à participação de pessoa físicas ou jurídicas estrangeiras
naquela desestatização (art. 12 do mesmo diploma legal). Completam-se, assim,
as ‘regras do jogo’ e pode-se qualificar os interessados (pois não há operação
de mercado sem a presença desses ou fora dos interesses e possibilidades por
eles manifestados).
Com
o cumprimento de toda essa rotina legal, chega-se, e se for o caso, ao leilão a
tanto especialmente convocado (art. 4º, § 3º da Lei 9.491) e, na sequência, à
formalização de seu resultado mediante a liquidação financeira do valor
ofertado (no todo ou em parte, conforme as regras do respectivo edital) e a
assinatura, pela União e pelo vencedor do leilão, do contrato de compra
e venda das ações transacionadas (se for empresa) ou do
contrato atributivo da concessão ou permissão do serviço público atribuído.
Encerra-se, então, a desestatização: a empresa federal ou o serviço público da
União foram transferidos à iniciativa privada.
Há
duas circunstâncias posteriores ao leilão que podem ter relevância jurídica: a)
o atendimento, pelo vencedor do certame, de eventuais requisitos indispensáveis
à assinatura do respectivo contrato (tais como provar a obtenção de
financiamento ou a formalização de garantias concernentes ao pagamento de
parcelas do valor de aquisição, provar o registro do instrumento civil
constitutivo do consórcio entre os integrantes de grupo – ou ‘consórcio de
fato’ – vencedor do leilão, etc.; b) a destinação dos recursos arrecadados no
leilão ou em pagamentos subseqüentes de parcelas do valor ofertado. A primeira
das circunstâncias, como condição editalícia prévia à subscrição contratual,
pode afetar diretamente a desestatização, pois sua não-realização (ou sua
realização em termos inadequados) impede a válida assinatura do contrato e,
portanto, impede a regular conclusão do processo, importando sua alteração –
para convocação de eventual segundo classificado hábil à firmatura do contrato
– ou seu adiamento – se, não existindo outro possível "vencedor", for
necessário o reinício de todo o processo. (...)" [50].
Importa
mencionar, ainda, que a Lei 9.491/97 admite a participação de empregados
(embora sujeito à rigoroso controle, há a vantagem de poder utilizar-se do
FGTS) e empresas federais desestatizadas, no processo de oferta de ações.
‹
Página anterior
Próxima
página ›
Assuntos
relacionados
Privatização
Serviços
públicos
Direito
Administrativo
Autor
Cláudia
Maria Borges Costa Pinto
Bacharel
em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba, Especialista em Direito
Tributário pela Faculdade de Direito de Curitiba e MBA em Direito Empresarial
pela Fundação Getúlio Vargas; Mestre em Direito Econômico e Social pela
Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Advogada
https://jus.com.br/artigos/12228/o-processo-de-privatizacao-e-desestatizacao-do-estado-brasileiro/2
O processo de privatização e
desestatização do Estado brasileiro
Cláudia Maria Borges Costa Pinto
Publicado
em 01/2009. Elaborado em 12/2007.
GOSTOU?
DIREITO
ADMINISTRATIVO
SERVIÇOS
PÚBLICOS
PRIVATIZAÇÃO
«Página
3 de 3
BIBLIOGRAFIA:
Marcos
Jordão Teixeira do. Privatização no Estado Contemporâneo, 1ª edição, São Paulo:
Ícone, 1996
BLANCHET, Luiz
Alberto. Concessão e Permissão de Serviços Públicos, Curitiba: Juruá, 1995
CORDOVIL, Leonor
Augusta. A intervenção estatal nas telecomunicações: a visão do direito
econômico, Belo Horizonte: Fórum, 2005
CUÉLLAR, Leila.
As agências reguladoras e seu poder
normativo. São Paulo: Dialética, 2001
DERANI, Cristiane.
Privatização e Serviços Públicos: As Ações do Estado na Produção Econômica, 1ª
edição, São Paulo: Max Limonad, 2002
DI
PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública:
concessão, permissão, franquia, terceirização e
outras formas. 4ª edição, São Paulo: Atlas, 2003
MATOS
FILHO, José Coelho. OLIVEIRA, Wagner A., in O Processo de
Privatização das Empresas Estatais Brasileiras, extraído do site: http://www.ipea.gov.br/pub/td/1996/td_0422.pdf.
Acessado em 20/05/2007.
MELLO. Rodrigo
Pereira de. Privatização: Cenário Jurídico. Publicada na Revista CEJ, Brasília,
n. 6, p. 65 a 70, set/dez 1998.
OTERO,
Paulo. Coordenadas Jurídicas da Privatização da Administração Pública, in
"Os Caminhos da Privatização da Administração Pública", Boletim da
Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Coimbra: Coimbra Editora, 2001
PEREIRA, Bresser.
A Reforma do estado dos anos 90: lógica e mecanismos de controle. Brasília:
Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997, Caderno 1
COUTO
E SILVA, Almiro. Privatização no Brasil e o Novo Exercício de Funções Públicas
por Particulares. Serviço Público "à brasileira"? in Revista de
Direito Administrativo, 230: 45-74, Outubro/Dezembro de 2002, Rio de Janeiro
NOTAS
Maria
Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão,
franquia, terceirização e outras formas. 4ª edição, São Paulo: Atlas, 2003, p.
17.
Apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.
op. cit. p. 17.
AMARAL FILHO, Marcos Jordão Teixeira do.
Privatização no Estado Contemporâneo, 1ª edição, São Paulo: Ícone, 1996, p. 41
AMARAL FILHO, Marcos Jordão Teixeira do.
Op. cit., p. 41.
CUÉLLAR, Leila. As agências reguladoras
e seu poder normativo. São Paulo: Dialética, 2001, p. 59.
Op. cit. p. 18.
Apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.
op. cit. p. 17.
Apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.
op. cit. p. 18.
Apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.
op. cit. p. 19.
Na seqüência, referido autor afirma que o
conceito de privatização é polissêmico e que, no direito português, pode
traduzir a outros seis conceitos de privatização: a) privatização da regulação
administrativa da sociedade; b) privatização do direito regulador da
Administração; c) privatização das formas organizativas da Administração; d)
privatização da gestão ou exploração de atividades administrativas; e)
privatização do acesso a uma actividade econômica; f) privatização do capital social
de entidades empresariais públicas". OTERO, Paulo. Coordenadas
Jurídicas da Privatização da Administração Pública, in "Os Caminhos da
Privatização da Administração Pública", Boletim da Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra, Coimbra: Coimbra Editora, 2001, p. 31.
DERANI, Cristiane. Privatização e
Serviços Públicos: As Ações do Estado na Produção Econômica, 1ª edição, São
Paulo: Max Limonad, 2002, p. 110.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit. p.
19.
Neste sentido vide Rodrigo Pereira de Mello.
Aduz referido autor que: "privatização – ou como mais propriamente deve-se
nominá-la: ‘desestatização’ – é um processo político, econômico e jurídico da
ais alta significância na atualidade, in Privatização: Cenário Jurídico.
Publicada na Revista CEJ, Brasília, n. 6, p. 65 a 70, set/dez 1998.
AMARAL FILHO, Marcos Jordão Teixeira do.
Op. cit., p. 41.
SOUTO, Marcos Juruena Villela.
Desestatização, Privatização, Concessões, Terceirizações e Regulação, 4ª
edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001, p. 30, Apud CORDOVIL, Leonor
Augusta. A intervenção estatal nas telecomunicações: a visão do direito
econômico, Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 189.
Neste sentido: Maria Sylvia Zanella Di
Pietro, Marcos Jordão Teixeira do Amaral Filho, entre outros.
PEREIRA, Bresser. A Reforma do estado
dos anos 90: lógica e mecanismos de controle. Brasília: Ministério da
Administração e Reforma do Estado, 1997, Caderno 1, p. 10.
Segundo Maria Sylvia Zanella DI PIETRO
acentua que "com o crescimento dos chamados direitos sociais e econômicos
(...) o Estado (...) ampliou desmesuradamente o rol de suas atribuições,
adotando diferentes atitudes: a. algumas atribuições foram assumidas pelo
Estado como serviços públicos, entrando na categoria de serviços
públicos comerciais, industriais e sociais; para desempenhar
esses serviços, o Estado passou a criar maior número de empresas estatais e
fundações; b. outras iniciativas, também de natureza econômica, o Estado deixou
na iniciativa privada, mas passou a exercê-las a título de intervenção no
domínio econômico, por meio de sociedades de economia mista, empresas
públicas e outras empresas sob controle acionário do Estado; c. finalmente,
outras atividades, o Estado nem definiu como serviço público nem passou a
exercer a título de intervenção no domínio econômico; ele as deixou na
iniciativa privada e limitou-se a fomentá-las, por considerá-las de interesse
para a coletividade. Desenvolve-se, então, o fomento como uma atividade
administrativa de incentivo à iniciativa privada de interesse público. O Estado
fomenta a iniciativa privada por diferentes meios, como os honoríficos
(prêmios, recompensas, títulos e menções honrosas), os jurídicos (outorga de
privilégios próprios do Poder Público que outras entidades não têm) e os
econômicos (auxílios, subvenções, financiamentos, isenções fiscais,
desapropriações por interesse social, etc.) DI PIETRO, Maria Sylvia
Zanella. op. cit. p. 22.
Juan Carlos CASSAGNE identifica quatro
medidas interventivas que constituem os pilares fundamentais no estatismo:
"a. a supradimensão das estruturas administrativas e o conseqüente aumento
da burocracia; b. as abundantes e excessivas regulações que limitam e afetam as
liberdades econômicas e sociais fundamentais; c. a configuração de monopólios
legais a favor do Estado; e d. a participação estatal exclusiva ou majoritária
no capital de empresas industriais ou comerciais"Apud DI PIETRO,
Maria Sylvia Zanella. op. cit. p. 23.
20Afirma Maria Sylvia Zanella di Pietro que
as conseqüências negativas são as seguintes:
O
Estado, que até então era prestador de serviços passa a ser também um Estado
empresário, investidor (ocasionando, assim, o fortalecimento do Poder Executivo
e a atribuição de poderes normativos ao mesmo, com inevitáveis reflexos
negativos nos princípios da separação dos poderes e da
legalidade).
Com
o crescimento da máquina administrativa foram adotados métodos burocráticos de
especialização (organização em carreiras), hierarquização (atuação homogênea) e
subordinação à lei (e, assim, a impessoalidade) que, ao serem aplicados
indistintamente a todas as atividades do Estado, conduziram à ineficiência do
mesmo, na prestação dos serviços (deficiência esta agravada pelo volume de
atividades por ele assumidas e pelas crises financeiras havidas, em especial,
na América Latina).
Outro
ponto negativo refere-se ao princípio da legalidade: abandonam-se as normas de
Direito Natural, então defendidas no ideal liberal, pelo positivismo jurídico,
que passou a analisar a lei despida de qualquer conteúdo de justiça, tendência
esta perfilhada também pelo Poder Judiciário, que não acompanhou o crescimento
e não absorveu a complexidade dos inúmeros conflitos surgidos com o novo perfil
do Estado.
Outro
aspecto negativo refere-se que, diferentemente do Estado liberal (que não
desejava a ação do Estado senão em termos bem restritos e definidos), no Estado
social o indivíduo passou a exigir a ação estatal: "a sociedade quer
subvenção, financiamento, escola, saúde, moradia, transporte; quer proteção ao
meio ambiente, ao consumidor, ao patrimônio histórico e artístico nacional e
aos mais variados tipos de interesses difusos e coletivos", multiplicando
e se tornando mais complexas as relações entre a Administração e o
administrado.
Em
termos de controle, a estrutura idealizada no período liberal, embora
modificadas no decorrer do tempo, não conseguiram atender adequadamente o
processo de evolução e crescimento do Estado. Assim, ao mesmo tempo em que o
Estado foi convocado a atuar nos campos econômico e social (para assegurar
justiça social), passou a colocar em risco a liberdade individual (com restrições
que vão desde a simples limitações ao exercício de direitos até atuação direta
no setor da atividade privada, com o agravante de não alcançar o objetivo
inerente ao Estado Social – assegurar o bem comum)DI PIETRO, Maria Sylvia
Zanella. op. cit. p. 24.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit. p.
25.
Ao Estado Democrático de Direito acresce-se a
idéia de Estado subsidiário (sua formulação é anterior, remontando aos fins do
século XIX e começo deste século, com a Doutrina Social da Igreja), cujas idéias
que lhes são inerentes são as seguintes: a) respeito aos direitos individuais
(a iniciativa privada tem primazia sobre a iniciativa estatal, devendo o Estado
abster-se de exercer atividades que o particular tem condições de exercer por
conta de sua iniciativa e com seus próprios recursos); b) o Estado deve
fomentar, coordenar e fiscalizar a iniciativa privada, permitindo que os
particulares, sempre que possível, tenha sucesso na condição de seus
empreendimentos; c) há parceria entre o público e privado, dentro do objetivo
de subsidiar a iniciativa privada, quando ela é deficiente. O bem comum, na
definição do Papa João XXIII, na Mater et Magistra é "o conjunto
de condições sociais por onde os homens tornam-se capazes de alcançar mais
facilmente a plenitude de seu desenvolvimento". João Paulo II, por
seu turno, na Centesimus Annus realça que o Estado deve respeitar a
autonomia dos indivíduos, das famílias, das associações de classe, grupos
econômicos, partidos políticos, na busca do bem comum. Em outras palavras, o
princípio da subsidiariedade, encontra-se na própria base da nova concepção do
Estado de Direito Social: os direitos fundamentais do homem já não são apenas
uma barreira à atuação do Estado (como no período liberal), mas sim constituem
a própria razão de ser do Estado, a quem compete promover, estimular e criar
condições para que o indivíduo se desenvolva livremente e igualmente dentro da
sociedade (em especial condições de participação do cidadão no processo
político e controle das atividades governamentais). Há uma prevalência da
centralidade da pessoa humana no âmbito do ordenamento social, donde decorre
que a idéia que o princípio da subsidiariedade apresenta duas vertentes: a)
sentido vertical (relações entre entes territoriais e o governo, ou seja,
governos centrais e locais); b) sentido horizontal (relações entre grupos
sociais e nas relações entre público e privado). Isto significa afirmar que
decisões de interesses comuns da coletividade devem ser tomadas
preferencialmente por instituições mais vizinhas do cidadão, devendo o governo
central atuar apenas quando os entes locais não possam fazê-lo sozinho). Maria
Sylvia Zanella DI PIETRO aponta as tendências que decorrem da aplicação do
princípio da subsidiariedade:
a)intenção
de diminuir o tamanho do Estado, pelo instrumento fundamental da privatização
(ocorrida principalmente na década de 80 e movida por fatores de ordem
financeira, jurídica e política).
a.1)
Financeira: diminuição de gastos públicos com empresas estatais deficitárias e
cujos riscos financeiros o Estado participa;
a.2)
jurídica: necessidade de retornar às formas de gestão privada dos serviços
públicos, sem os controles excessivos e formalismos próprios da Administração
centralizada, que tanto emperram as atividades das empresas estatais;
a.3)
política: pela presença da inspiração neoliberal, que aconselha a substituição
do Estado pela iniciativa privada, por ser ela mais apta a gerir atividades
comerciais e industriais.
Na
América Latina o processo de privatização (conexo à idéia de
reforma/reengenharia do Estado) desenvolve-se de forma semelhante em inúmeros
países, com os seguintes objetivos:
Reduzir
o tamanho do Estado
Prestigiar
a liberdade econômica, pela devolução da iniciativa ao administrado, pela
desregulamentação, eliminação de monopólios, de aplicação de regras da livre
concorrência (cabendo ao Estado incentivar e subsidiar a iniciativa privada,
quando deficiente, bem como fiscalizá-la, para proteger o usuário e o
consumidor);
Aplicação
de novas técnicas de prestação de serviços, menos formalistas e burocratizadas,
reservando o regime publicístico apenas para serviços públicos típicos do
Estado e aplicando-se os métodos de gestão privada em atividades em que a
rigidez do regime público é desnecessária, v.g. serviços sociais, comerciais e
industriais do Estado, o que se dá:
Pela
venda de ações de empresas estatais
Várias
formas de parceria com a iniciativa privada (especialmente pela concessão de
serviço público).
A
privatização é uma tendência mundial e ganha espaço como uma clara resposta ao
progressivo avanço do setor público, que, em qualquer momento, poderia
neutralizar o legítimo exercício dos direitos fundamentais e as liberdades
públicas de todos e de cada um dos membros da coletividade. Há uma necessidade
de redefinir as relações entre o Estado e a sociedade (mercado);
b)Uma
sociedade pluralista faz multiplicarem-se os interesses a serem protegidos (não
se cogita mais em interesse público de que é titular exclusivo o Estado, mas
sim de vários interesses públicos, de diversos setores da sociedade civil). E a
proteção do interesse público não é prerrogativa exclusiva do Estado, que não
mais tem condições de assumir todas as novas atividades de interesse geral.
Assim há necessidade de ampliar as atividades de fomento, ou seja, o Estado
deve ajudar, estimular, criar condições para que os vários grupos de
interesses, partam à busca de seus próprios objetivos. Em resumo, cabe:
b.1)
Ao Estado – atividades próprias como ente soberano e indelegáveis ao particular
(segurança, defesa, justiça, relações exteriores, legislação, polícia). Nestes
serviços públicos típicos prevalecem os procedimentos e princípios próprios do
regime jurídico administrativo ou de direito público.
b.2)
Sociedade (regidas pelo princípio da subsidiariedade): atividades sociais
(educação, saúde, pesquisa, cultura, assistência) e econômicas (industriais,
comerciais e financeiras), nas quais o Estado só deve agir supletivamente,
quando a iniciativa privada for deficiente. Neste serviços o Estado deve buscar
formas mais flexíveis de atuação, somente possíveis pela aplicação predominante
do direito privado, derrogando parcialmente pelo direito público apenas no que
seja essencial para assegurar o cumprimento dos fins estatais.
c)crescimento
de técnicas de fomento e instrumentos de parceria do setor público com o
privado.
d)desregulamentação
– novo equilíbrio entre liberdade e autoridade, isto é, restabelecer a
liberdade para o exercício da indústria, comércio, profissões liberais
limitadas pelo excesso de regulamentação. Segundo Maria Sylvia Zanella DI
PIETRO, na realidade, a "desregulação é uma forma de regulação que
substitui a regulação anterior (...). Pela desregulação amplia-se a liberdade
do cidadão, especialmente no domínio econômico), diminuindo-se as restrições a
sua atuação ou limitando-se os monopólios de modo a permitir que empresas
privadas atuem em regime de competição em determinados setores, antes
monopolizados. Essa desregulação atinge especialmente serviços públicos, como
os de transportes, correio, telecomunicações e energia elétrica".
e)alteração
da noção de interesse público – passa a ser entendida como interesses dos
cidadãos (interesse público primário) e não interesses da máquina
administrativa (interesse público secundário). Em consequência, os recursos
humanos, materiais e financeiros da Administração devem voltar-se
preferencialmente em benefício do cidadão, para obter-se melhor qualidade e
eficiência na prestação de serviços. Em consequência desta idéia repudia-se a
forma burocrática da organização da Administração Pública (aquela baseada em
idéias de hierarquia, especialização, impessoalidade, controle formal – que
deve ser reservada apenas para o núcleo estratégico constituído pelos três
Poderes, como órgãos de Governo, Ministério Público e órgãos de assessoramento
direto do chefe do Poder Executivo).
Em
resumo, a "reforma do Estado", com vistas a reverter os males do
Estado intervencionista passam por duas perspectivas:
a)do
cidadão: restauração da liberdade individual e livre concorrência – leva às
idéias de privatização, fomento e parceria.
b)do
Estado – que quer alcançar a eficiência na prestação de serviços públicos, que
leva à idéia desburocratização.
Sinteticamente: a) esquerda tradicional:
entrou em crise e ficou paralisada, porquanto diagnosticou erroneamente a
crise; b) centro-direita pragmática: defendiam o ajuste fiscal e liberação dos
preços e a liberalização comercial, privatização e desregulação; c) direita
neoliberal,ganhou adeptos com a temática do Estado mínimo e a necessidade de
privatizar, liberalizar, desregular e flexibilizar os mercados,de forma
radical, devendo o Estado assumir uma política macroeconômica neutra (ou seja,
o Estado deveria objetivar apenas o déficit público zero e a emissão de moeda,
abstendo-se de realizar políticas industriais e sociais); d) centro-esquerda
pragmática, diagnosticou com clareza a grande crise dos anos 80, propôs a
reconstrução do Estado, para que este possa, em um novo ciclo,voltar a
complementar e corrigir, efetivamente, as falhas de mercado, mantendo um perfil
mais modesto de intervenção (sem chegar, entretanto, ao radicalismo do Estado
mínimo). PEREIRA, Bresser. Op. Cit. pp. 16/17.
PEREIRA, Bresser. Op. Cit. pp. 18/19.
OTERO, op. cit., p. 31.
OTERO, Paulo. Op. cit. p. 35.
Almiro do Couto e Silva comenta a tendência
mundial de reexaminar algumas concepções jurídicas bem arraigadas, nos termos
seguintes: "Não será necessário dizer que tal tendência está intimamente
relacionada com a circunstância de haver os Estados Unidos, após a segunda
grande guerra mundial e, mais fortemente ainda depois da queda do muro de
Berlim, assumido posição hegemônica numa economia que hoje é globalizada. Mas
não só. Existem outras causas que são, pelo menos, igualmente importantes. Ela
resulta também da crise do Estado Social, do Estado Providência ou do Welfare
State, o qual, com seu gigantismo, suas imensas despesas e seus déficits
públicos, sua ampla intervenção no campo econômico e no campo social, deu
origem e alimentou uma forte reação no plano teórico, representada pela
corrente de pensamento chamada de neo-liberal.Ao longo das últimas décadas do
século passado o neo-liberalismo, que ganhara consistência e expressão com a
difusão das obras de Friederich von Hayeck e o crescente prestígio dos
economistas da escola de Chicago, liderados por Milton Friedmann, acabou por
influenciar poderosamente as políticas econômicas e sociais dos Estados Unidos
e da Inglaterra, respectivamente nos governos Reagan e Thatcher. É claramente
perceptível, por igual, a influência do liberalismo, pelo favorecimento da
concorrência e do mercado,em normas fundamentais, que, desde o Tratado de Roma,
presidem as relações entre os países membros da União Européia. 3. Foi dentro
desta moldura que se iniciou a discussão mundial sobre o tamanho do Estado e as
medidas que deveriam ser utilizadas para reduzi-lo. Estão ligadas a esse
contexto as privatizações, a liberalização, a desregulamentação, a quebra de
monopólios estatais de serviços públicos e a abertura à concorrência das
atividades por eles exercidas, bem como a atribuição de novos papéis aos
particulares na realização de fins públicos. COUTO E SILVA, Almiro.
Privatização no Brasil e o Novo Exercício de Funções Públicas por Particulares.
Serviço Público "à brasileira"? in Revista de Direito Administrativo,
230: 45-74, Outubro/Dezembro de 2002, Rio de Janeiro, p. 48.
Marcos Jordão Teixeira do Amaral Filho dedica
um capítulo inteiro de sua obra para analisar o processo de reformas realizadas
sob a égide do governo Thatcher, afirmando que "a Grã-Bretanha executou o
seu programa de reformas ao longo de dez anos, privatizando quase todas as
empresas estatais e transferindo ao setor privado a administração de estradas,
cadeias, entre outros serviços tradicionalmente reservados ao setor publico.
Por essa razão, o programa de privatização inglês serviu de paradigma ao mundo
e inspirou, com certeza, as mudanças do Leste Europeu após a derrocada do
sistema comunista". Op. Cit. p. 55.
Paulo OTERO salienta que não dissocia este
fenômeno da tentativa do governo conservador em reduzir o peso dos sindicatos no
setor público. Op. cit. p. 47.
Marcos Jordão Teixeira do Amaral Filho faz
extenso estudo sobre a onda de privatização mundial, explanando as experiências
dos programas de privatização no Japão, França, Espanha e América Latina,
todas, em sua opinião, com resultados positivos (à exceção das havidas na
ex-União Soviética, onde "a inexistência de capitais internos e de um
mercado levou a verdadeiro processo de pilhagem"). Op. Cit. pp.
61/94.
OTERO, Paulo. Op. cit. p. 36.
COUTO E SILVA, Almiro. Op. cit. p. 50.
Note-se que a era Vargas "introduziu no
País na siderurgia e na produção petrolífera e os militares, embora tenha vindo
ao poder para renegar o nacionalismo do grupo varguista (João Goulart à
frente), mantiveram a estratégia de desenvolvimento industrial conduzida pela
ação estatal. Criou-se, dentro desse espírito, a Telebrás, a Eletrobrás e a
Siderbrás, para impulsionarem o processo industrial, para que o País
conseguisse, no terceiro milênio, ingressar no fechado clube dos países
desenvolvidos (Brasil grande). Quando, no entanto, o fluxo de capitais em
direção ao País foi interrompido nos anos 80, o Brasil mergulhou numa crise sem
precedentes e começaram a surgir as primeiras iniciativas em direção a um
capital emancipado do Estado). AMARAL FILHO, Marcos Jordão Teixeira.
Op. Cit. p. 64.
Segundo José Coelho Matos Filho e Carlos
Wagner A. Oliveira: "alguns fatos explicam essa deterioração das finanças
públicas: o crescimento do setor produtivo estatal, a partir de 1973,
financiado por empréstimos externos; a concessão de subsídios creditícios ao
setor privado, principalmente ao setor rural, na segunda metade da década de 70
e nos anos 80; o financiamento de déficits na balança comercial por meio de
endividamento de estatais, a partir de 1979. Os reempréstimos de recursos
depositados no Banco Central, na década de 80, para pagamento da dívida no
exterior; a absorção, pelo Tesouro, das dívidas dos estados e municípios, por
ele avalizadas; a desvalorização cambial, como forma de gerar excedentes na
balança comercial, em virtude das dificuldades posteriores da entrada de
recursos externos, na década de 80, entre outros [Velloso (1993)]". Para
referidos autores, a privatização foi um meio alternativo de financiamento não
inflacionário do déficit público (tradicionalmente financiado pela emissão
de moeda, aumento de impostos, endividamento externo ou interno, ou, a
combinação de um ou mais instrumentos listas). Configura modo alternativo porque
estariam esgotadas as possibilidades da financiamento tradicional: a) emissão
de moeda aumenta o processo inflacionário; b) o aumento de impostos seria um
instrumento politicamente difícil de ser implementado; c) o financiamento
externo, embora com taxas viáveis, estaria prejudicado com problemas envolvendo
a dívida externa; d) o financiamento interno equivale a substituição de
impostos – que, reduzidos, induziriam a um aumento da demanda e um aumento de
preços, ocasionando processo inflacionário. Assim, a privatização de ativos,
além de complementar as receitas correntes, reduzem as necessidades de
financiamento do setor público. MATOS FILHO, José Coelho. OLIVEIRA,
Wagner A., in O Processo de Privatização das Empresas Estatais Brasileiras,
extraído do site: http://www.ipea.gov.br/pub/td/1996/td_0422.pdf.
Acessado em 20/05/2007.
Note-se que historicamente nos EUA a posição
do Estado é de limitar-se a ser mero regulador no jogo econômico, interferindo
somente quando as regras elaboradas pelo próprio mercado fossem falhas ou
deficientes. A solução americana para reduzir o tamanho do Estado, através das
agências reguladoras (regularoty agencies) é elogiável, pois há excelente
qualidade técnica das normas regulatórias, não só pela proximidade entre os
órgãos da entidade e os fatos a serem disciplinados ou controlados, como também
o caráter setorial ou específico da regulação e do controle. Todavia, além das
agências reguladoras, convivem, nos EUA, as agências não reguladoras,
encarregadas dos benefícios sociais. O gigantismo do Estado que foi combatido
na era Reagan, portanto, centrava-se pois, em dois aspectos: a) a
desregulamentação e diminuição da área da administração prestadora de serviços
(com a supressão de um número considerável de programas sociais; b)
desregulamentação de certos setores (v.g. o aeronáutico).
É preciso distinguir que: a ) quando a
empresa a ser privatizada opera em regime de concorrência é o mercado quem
define as regras; b) quando a empresa opera em contexto de monopólio surge a
necessidade de alguns mecanismos de regulação por parte do poder publico, que continuará
a exercer algum controle, com vistas a garantir o funcionamento apropriado da
empresa monopolista.
É o que comenta Marcos Jordão Teixeira do
Amaral Filho, op. Cit. p. 43.
O Governo de José Sarney publicou o Decreto
95.886, sob a iniciativa do ex-ministro João Sayad. O intuito seria de
privatizar empresas transferidas ao controle estatal por força de inadimplência
de obrigações (execução de garantias), empresas em que houve iniciativa privada
desenvolvida e subsidiárias de empresas públicas que não fossem indispensáveis
à consecução dos objetivos das empresas controladoras ou que ocasionassem injusta
ou desnecessária competição com as empresas nacionais. Estavam excluídas as
empresas cujas atividades envolvessem segurança nacional,estivessem em regime
legal de monopólio estatal e aquelas que explorassem em posição de
operacionalidade da infra-estrutura econômica ou produtora de insumos de
importância estratégica. Percebe-se, neste diploma legal, forte influência da
doutrina de segurança nacional dos anos 70 e do nacionalismo estatista dos anos
50.
Sem adentrarmos em maiores digressões sobre o
atual conceito de serviço público, importa esclarecer que a prestação de
serviço público pode ser: a) centralizada, ou seja, quando o Poder Público a
realiza em seu nome e sob sua exclusiva responsabilidade; b) descentralizada,
com a transferência de titularidade do serviço, que pode ser: b.1) outorgada,
por lei, às autarquias ou outras entidades paraestatais; b.2) delegação a
particulares, com a transferência da execução do serviço, seja por contrato de
concessão ou permissão ou autorização. Segundo MATOS FILHO, José Coelho.
OLIVEIRA, Wagner A, a concessão de serviços públicos, diferentemente da venda
direta de ativos, não suprime o controle do Estado, porquanto o governo passa a
determinar diretrizes e fixar regras gerais. Em linhas gerais, a Lei de
Concessões brasileira objetiva: a) fixar as bases para a delegação da prestação
de serviços públicos no Brasil; b) abrir a possibilidade de participação do
capital externo na prestação de serviços públicos, por meio da permissão para
formação de consórcio; c) por meio da renovação das concessões – mediante
licitações – permitir a rotatividade dos concessionários; d) eliminar subsídios
governamentais, impondo ao concessionário o risco empresarial. Prosseguem
referidos autores esclarecendo que: "em termos concretos, a lei
direciona-se principalmente aos setores de infra-estrutura e serviços de
saneamento. No que concerne à infra-estrutura, a proposta objetiva alcançar
três setores básicos: elétrico, transporte e telecomunicações. A intenção é
ampliar a capacidade instalada nessas áreas e oferecer, com isso, serviços de
melhor qualidade ao menor custo. Quanto ao setor de saneamento, a proposta
propõe alcançar principalmente os serviços de água e esgoto. Op. Cit. P.
19/20. Sobre conceito de serviço vide, Luiz Alberto BLANCHET: "serviço
público é a atividade como tal considerada pela Constituição da República ou
pela lei, prestada de forma permanente (ou contínua) submetida ao regime de
direito público, executada concreta ou diretamente pelo Estado, ou por aqueles
a quem tal incumbência for delegada, visando à satisfação de necessidades ou à
criação de utilidades, ambas de interesse coletivo". BLANCHET, Luiz
Alberto. Concessão e Permissão de Serviços Públicos, Curitiba: Juruá, 1995, p.
14.
Maria Sylvia Zanella Di PIETRO tece crítica
ao modelo das agências, afirmando que o grande problema é que em busca de
soluções para o agigantamento do Estado levaram aos governantes a buscar
modelos estrangeiros, o que provocou uma série de inconvenientes. No Brasil,
utilizou-se o modelo norte-americano, desprezando o fato que nosso Direito
Administrativo inspira-se no modelo europeu-continental e o norte-americano
funda-se no sistema anglo-saxão da commom law (precedente judiciário,
que supre as lacunas de normas legais e constitucionais). Assim, enquanto no
Direito Brasileiro tudo situa-se no âmbito do Direito positivo (o Direito
Administrativo encontra-se quase inteiramente preso à Constituição) no direito
norte-americano os institutos novos podem ser criados com maior facilidade
(pois sua validade jurídico constitucional vai sendo validade ou negada pelo
Poder Judiciário em face de princípios constitucionais genéricos ou standarts contidos
também em leis genéricas). Então, ao aplicar o modelo estrangeiro (muitas vezes
"na frente" da Constituição, que depois é alterada – e quando o é
-para adaptações) resulta em violação de normas constitucionais expressas. Como
exemplos disto a Autora cita: a) contrato de gestão – EC 19/98 (art. 37. § 8º),
vinha sendo utilizado desde 1991, com base no Decreto nº 137, de 27-5-91, que
institui o Programa de Gestão de Empresas Estatais. A aplicação era
inconstitucional, pois por meio de contrato, se atribuía autonomia a empresas
estatais, liberando-as do cumprimento de normas legais. b) agências reguladoras
– vêm sendo criadas por meio de leis que lhes confere poder autônomo de baixar
normas e nossa Constituição afirma que o poder regulamentar é privativo do
Chefe do Executivo. Op. cit. p. 40.
WALD, Arnoldo; MORAES, Luíza
Rangel de. Agências Reguladoras. Revista de Informação Legislativa. Brasília:
Senado Federal, 1999, nª 141, p.144. Apud CUÉLLAR, Leila, op.
cit.p. 64.
Alterou a redação do art. 25, § 2º,
permitindo aos Estados-membros explorar diretamente ou mediante concessão a
empresas privadas, os serviços locais de gás canalizado, concessões essas, que
na redação original, somente poderiam ser outorgadas a empresas estatais.
A Emenda Constitucional n.º 6, de
15.8.1995,suprimiu da Carta constitucional o seu art. 171, que fixava o
conceito de empresa brasileira de capital nacional (inc. II: "aquela
cujo controle efetivo esteja em caráter permanente sob a titularidade direta ou
indireta de pessoas físicas domiciliadas e residentes no País ou de entidades
de direito público interno, entendendo-se por controle efetivo da empresa a
titularidade da maioria do capital votante e o exercício, de fato ou de
direito, do poder decisório para gerir suas atividades"), assegurando-lhe "proteção
e benefícios especiais temporários para desenvolver atividades consideradas
estratégicas para a defesa nacional ou imprescindíveis ao desenvolvimento do
País" (idem, § 1º, inc. I), bem como tutela especial visando sua
atuação em "setor imprescindível ao desenvolvimento tecnológico
nacional" (idem, § 2º). Esta Emenda também modificou a redação do
art. 176, § 1º, da Constituição de 1988, alterando o regime da pesquisa e a
lavra de recursos minerais e o aproveitamento de potenciais de energia
hidráulica, possibilitando que os mesmos possam ser realizados, mediante
autorização ou concessão.
A EC nº 8 confirma a competência da União
para a exploração direta dos serviços de telecomunicações, autorizando
entretanto a outorga de concessões a empresas privadas, e não apenas a empresas
sob controle estatal, como constava da redação original do art. 21, inc. XI.
A Emenda Constitucional n.º 9, de 9.11.1995,
alterou a redação dos §§ 1º e 2º do art. 177, flexibilizando o
monopólio da União sobre a pesquisa e lavra de petróleo, gás natural e outros
hidrocarbonetos fluídos, permitindo que tais atividades sejam contratadas com
empresas estatais ou privadas.
Note-se que com a EC 49/2006 houve alterações
no inciso, autorizando: "b) sob regime de permissão, são autorizadas a
comercialização e a utilização de radioisótopos para a pesquisa e usos médicos,
agrícolas e industriais; c) sob regime de permissão, são autorizadas a
produção, comercialização e utilização de radioisótopos de meia-vida igual ou
inferior a duas horas".
Art. 177. Constituem monopólio da União: I -
a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros
hidrocarburetos fluidos; II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro;
III - a importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes
das atividades previstas nos incisos anteriores; IV - o transporte marítimo do
petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo
produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo
bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem; V - a pesquisa, a
lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de
minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos radioisótopos
cuja produção, comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob regime
de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII do caput do art. 21
desta Constituição Federal. § 1º. A União poderá contratar com empresas
estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a IV
deste artigo, observadas as condições estabelecidas em lei.
São eles: I - Ministro de Estado do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, na qualidade de Presidente; II
- Chefe da Casa Civil da Presidência da República; III - Ministro de Estado da
Fazenda; IV - Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão. O inciso
V, que incluía o Ministro de Estado da Indústria, do Comércio e do Turismo foi
revogado pela Medida Provisória nº 2.161-35, de 23.08.2001, DOU 24.08.2001, em
vigor conforme o art. 2º da EC nº 32/2001).
Art. 6º. Compete ao Conselho Nacional de
Desestatização:
I
- recomendar, para aprovação do Presidente da República, meios de pagamento e
inclusão ou exclusão de empresas, inclusive instituições financeiras, serviços
públicos e participações minoritárias, bem como a inclusão de bens móveis e
imóveis da União no Programa Nacional de Desestatização;
§
1º. Na desestatização dos serviços públicos, o Conselho Nacional de
Desestatização deverá recomendar, para aprovação do Presidente da República, o
órgão da Administração direta ou indireta que deverá ser o responsável pela
execução e acompanhamento do correspondente processo de desestatização, ficando
esse órgão, no que couber, com as atribuições previstas no artigo 18 desta Lei.
§
2º. O Conselho Nacional de Desestatização poderá baixar normas regulamentadoras
da desestatização de serviços públicos, objeto de concessão, permissão ou
autorização, bem como determinar sejam adotados procedimentos previstos em
legislação específica, conforme a natureza dos serviços a serem desestatizados.
§
3º A desestatização de empresas de pequeno e médio portes, conforme definidas
pelo Conselho Nacional de Desestatização, poderá ser coordenada pelo
Departamento de Coordenação e Controle das Empresas Estatais, da
Secretaria-Executiva do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão,
competindo-lhe, no que couber, as atribuições previstas no art. 18 desta Lei.
(NR) (Redação dada ao parágrafo pela Medida Provisória nº 2.161-35, de
23.08.2001, DOU 24.08.2001, em vigor conforme o art. 2º da EC nº 32/2001)
MELLO, Rodrigo Pereira. Op. Cit. pp. 67/68.
‹
Página anterior
Próxima
página ›
Assuntos
relacionados
Privatização
Serviços
públicos
Direito
Administrativo
Autor
Cláudia Maria Borges Costa Pinto
Bacharel
em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba, Especialista em Direito
Tributário pela Faculdade de Direito de Curitiba e MBA em Direito Empresarial
pela Fundação Getúlio Vargas; Mestre em Direito Econômico e Social pela
Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Advogada
https://jus.com.br/artigos/12228/o-processo-de-privatizacao-e-desestatizacao-do-estado-brasileiro/3
https://jus.com.br/artigos/12228/o-processo-de-privatizacao-e-desestatizacao-do-estado-brasileiro
RUY CASTRO
Profetas do óbvio
RIO
DE JANEIRO - "Contam -Ruy Castro poderá dizer se é verdade- que, ao
caminhar pelo aterro do Flamengo, Nelson Rodrigues percebeu que o amigo [o
escritor Guimarães Rosa], que sempre morou no Rio, levou um grande susto.
[Rosa] Não acreditava no que via. Acabara de descobrir o bondinho do Pão de
Açúcar. Aí teria nascido a expressão 'óbvio ululante', criada por Nelson
Rodrigues."
Nosso
eterno craque Tostão contou essa história em sua coluna na Folha de
domingo e pediu meu testemunho. Esclareço a dúvida com prazer. Não foi Guimarães
Rosa quem levou um susto ao, de repente, ver o bondinho do Pão de Açúcar. Foi
outro mineiro -Otto Lara Resende-, e o susto de Otto foi ainda maior porque,
embora passasse diariamente pelo aterro em seu carro, a caminho do trabalho,
ele nunca se dera conta da existência, não do bondinho, mas do próprio Pão de
Açúcar!
Segundo
Nelson, ao se ver subitamente diante da pedra, Otto meteu o pé no freio,
rodopiou e parou atravessado na pista. Os carros que vinham atrás também
pararam e, por milagre, ninguém bateu. Otto saiu do carro. Atônito, apontava
para o Pão de Açúcar e só conseguia balbuciar: "Não é possível! Não estava
aqui ontem!". A asma, sempre ela, o atacou. As pessoas começaram a apear
para acudi-lo. Uma delas dedicou-se a abaná-lo com a "Revista do
Rádio", dizendo: "Calma, meu senhor!".
E
Nelson concluiu: "Durante anos, o Pão de Açúcar, de tão óbvio, passou
despercebido por Otto. Era como se não existisse. Mas, um dia, enfim, Otto o
enxergou. Era o óbvio ululante. Só os profetas enxergam o óbvio".
Nada
disso arranha o raciocínio de Tostão, para quem o futebol do Barcelona já era,
há anos, um óbvio que muitos se recusavam a enxergar. Aliás, só reforça o seu
argumento: o futebol do Barcelona é tão óbvio que só podia ser enxergado pelos
profetas.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/17156-profetas-do-obvio.shtml
Gramatigalhas
por José Maria da Costa
Todo ou Todo o?
quarta-feira,
3 de dezembro de 2014
dúvida
do leitor
A
leitora Cristiane Andrade envia a seguinte mensagem ao Gramatigalhas:
"Estimado
professor, existe alguma diferença nas frases: a) 'Todo o dia ele está no
fórum.', b) 'Todo dia ele está no fórum.'? Obrigada."
envie
sua dúvida
1) Vejam-se
os seguintes exemplos e o significado respectivo da expressão todo ou todo
o: a) "Todo o dia, o réu está no balcão do cartório, à espera da
sentença" (o dia inteiro); b) "Todo dia, o réu está no balcão do
cartório, à espera da sentença" (todos os dias).
2) Laudelino
Freire é muito preciso em sua observação a respeito: "O todo quando
se lhe pospõe o artigo (todo o) significa a inteireza de uma coisa,
reservando-se a todo, sem o artigo, a significação de cada, qualquer, ou o
total de muitas. No primeiro caso indica-se o todo físico, o todo lógico, por
inteiro; no segundo, a coleção ou totalidade".
3) Fundando-se
em lição de Damião de Góis, continua tal gramático na observação de que: a) na
frase "Laranjeira que todo ano tem fruto", deve entender-se
que essa árvore dá frutos todos os anos; b) se, porém, se disser "Laranjeira
que todo o ano tem fruto", deve-se entender que ela frutifica
durante o ano inteiro.
4) E
finaliza ele com propriedade: "O fato, portanto, ficará regularizado, se
se tomar por norma usar sempre de todo seguido de o, menos
quando todo tenha a significação de qualquer, ou de totalidade. As
expressões toda a parte, toda a vez, todo o momento, todo
o caso, etc., melhor exprimirão o que se quer dizer uma vez escritas sem o
artigo.
5) De
igual modo, em exemplo significativo, Silveira Bueno desfaz possíveis dúvidas:
a) "Toda vida é uma dádiva de Deus" quer dizer que qualquer vida
é uma dádiva de Deus; b) já "Toda a vida é uma dádiva de Deus"
vem a significar que a vida inteira é uma dádiva de Deus.
6) Vale
também transcrever a preciosa síntese e acréscimo de Júlio Nogueira: "Na
linguagem do Brasil, faz-se judiciosa distinção. Todo o diz-se quando
equivale a inteiro, na totalidade, completamente... Na acepção de qualquer não
se usa o artigo". E continua tal gramático com sua observação: "No
plural, porém, o artigo aparece em qualquer acepção".
7) E
se reitere, quanto a última lição, com a observação de Édison de Oliveira, para
quem, "no plural, as palavras todos, todas sempre se farão
acompanhar pelos artigos os, as, independentemente do significado em
que tenham sido empregadas".
8) Buscando
esquematizar o emprego exato de tais vocábulos, leciona Laudelino Freire que se
deve "usar sempre de todo seguido de o (todo o) menos
quando todo tenha a significação de qualquer. Todo o significa
a inteireza de uma coisa; todo, sem o artigo, significa cada, qualquer, ou
o total de muitos. A distinção é inconfundível. 'Toda a casa foi queimada',
isto é, a casa, toda ela, foi queimada. 'Toda casa deve
pagar impostos', isto é, todas as casas são sujeitas ao imposto. 'Todo
o dia' = dia inteiro; 'Todo dia' = todos os dias".
9) Na
lição de José de Nicola e Ernani Terra, "os pronomes indefinidos todo e toda (no
singular), quando desacompanhados de artigo, significam qualquer"; porém,
"quando acompanhados de artigo, passam a dar a ideia de inteiro,
totalidade".
10) Para
Antonio Henriques e Maria Margarida de Andrade, todo "tem a
ideia de totalidade numérica, de generalização" (toda responsabilidade
= qualquer tipo de responsabilidade), enquanto todo o "tem ideia
de totalidade das partes, especificação" (toda a responsabilidade =
responsabilidade total, inteira, completa).
11) Sousa
e Silva (1958, p. 295), por um lado, lembra que há gramáticos, como Eduardo
Carlos Pereira, para os quais "é facultativo o uso do artigo nas frases em
que muitos o omitem presentemente"; por outro lado, observa ele que essa
moderna distinção entre toda a casa ("a casa inteira")
e toda casa ("todas as casas" ou "qualquer
casa"), por exemplo, "tende a fixar-se em nossa língua, por
influência do francês".
12) Para
Luciano Correia da Silva, os arcaicos e os clássicos usavam indiferentemente
uma forma pela outra, e "somente a partir do Romantismo é que se passou a
ensinar esta diferença: todo é sinônimo de cada qualquer, e todo
o quer dizer inteiro, na totalidade".
13) Vale
a pena teorizar com a lição de Alfredo Gomes: "a palavra todo tem
duas acepções: a de inteiro e a de qualquer. Apesar de
confundidas essas duas ideias no emprego..., convém fazê-lo seguir de artigo – todo
o, toda a – no sentido de inteiro, e usá-lo sem artigo quando
significar qualquer: a) 'Todo homem é mortal'; b) 'Nem toda a casa
está estragada'".
14) Em
caso muito particular, anote-se que, Silveira Bueno, por um lado, observa que
"a expressão todo mundo é galicismo que desde os tempos de
Gil Vicente entrou no uso português, mais velho, portanto que o próprio
Brasil".
15) Por
outro lado, mostra esse autor uma visão permissiva no emprego dela: "Esta
antiguidade da expressão já lhe deu foros de idioma e pode ser empregada,
sabendo-se, contudo, que é empréstimo".
16) Antonio
Henriques refere lição de Said Ali e de Rui Barbosa de que a equivalência de todo
o (inteiro) e todo (qualquer) "engenhosa e clara, mas
falsa", acrescentando que o primeiro dos autores que cita "aduz
inúmeros exemplos em que falha tal correlação".
17) O
Código Civil de 1916 nem sempre observa a distinção: a) "Todo o ato
lícito que tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar
ou extinguir direitos, se denomina ato jurídico" (art. 81 – todo o ato
lícito está por qualquer ato lícito; a redação conferida ao CC/2002,
art. 185, fez desaparecer o problema); b) "A mulher pode, em todo o caso,
reter os objetos de seu uso..." (art. 303 – todo o caso está
por qualquer caso; como se tratava do regime dotal, o dispositivo não se
repete no CC/2002); c) "Estão sujeitos à curatela: I – os loucos de todo
o gênero" (art. 446, I – todo o gênero está pela totalidade
completa; a redação conferida ao CC/2002, art. 1.767, I, fez desaparecer a
dificuldade); d) "A certidão negativa exonera o imóvel e isenta o
adquirente de toda responsabilidade" (art. 1.137, parágrafo
único – toda responsabilidade está por qualquer responsabilidade; o
dispositivo não se repete no CC/2002).
18) O
Código Comercial, de igual modo, nem sempre faz a referida distinção: a) "Todo documento
de contrato comercial não ressalvada pelos contraentes com assinatura da
ressalva não produzirá efeito algum em juízo..." (art. 134 – a distinção
foi observada); b) "Todo o corretor é obrigado a matricular-se no
Tribunal de Comércio do seu domicílio" (art. 38 – a distinção não foi
observada).
19) A
legislação portuguesa, de igual modo, não prima pela observância rigorosa da
distinção aqui noticiada: "Toda a pessoa que tiver notícia de
qualquer infração penal poderá participá-la ao juiz da comarca em que foi
cometida..." (CPPp, art. 160°). Corrija-se: "Toda pessoa que
tiver notícia de qualquer infração penal poderá participá-la ao juiz da comarca
em que foi cometida...".
http://www.migalhas.com.br/Gramatigalhas/10,MI212188,61044-Todo+ou+Todo+o
STARTUP 2017
‘Citei todos eles e todos eles
estão aí’
O
pivô do maior escândalo parlamentar dos anos 90 fala pela primeira vez após dez
anos e diz: os corruptos e os corruptores de ontem são os mesmos de hoje.
LARYSSA RODRIGUES E MARCELA MATTOS
4
de janeiro de 2017
Imagem: Cristiano Mariz / Veja
O
economista José Carlos Alves dos Santos foi protagonista do maior
escândalo de corrupção no Congresso na década de 90. Em 1993, ele revelou
que as grandes empreiteiras mantinham uma sociedade criminosa com deputados e
senadores. No Congresso, uma CPI foi instalada para apurar o caso. Alves dos
Santos confirmou as acusações e apontou Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS e
Queiroz Galvão como integrantes do grupo que agia à margem das instituições,
manipulando e desviando dinheiro público — algo, se não idêntico, muito
semelhante ao que seria descoberto pela Operação Lava Jato 21 anos depois.
Leia
também:
O
responsável por revelar ao país o esquema de corrupção conhecido como Anões do
Orçamento contou à revista Veja que os escândalos da década de 90 e o atual são
realmente muito parecidos. Leia:
O
senhor denunciou o esquema dos Anões do Orçamento. O que mudou passadas mais de
duas décadas?
Os
lobistas e as empreiteiras estão aí. Eu citei todos eles, e todos eles
continuam aí até hoje do mesmo jeito. Evidentemente tudo se aperfeiçoa, mas, em
princípio, o esquema da Lava-Jato é basicamente igual: uma empreiteira dá
dinheiro ao parlamentar. O parlamentar, então, vota a emenda, depois vai lutar
pela liberação dos recursos junto ao ministério e ganha mais uma comissão.
Por
que as denúncias daquela época ficaram por isso mesmo?
A
sociedade nunca tomou nenhuma atitude em relação à corrupção. O que está
havendo agora é que o pessoal de Curitiba e o juiz Sergio Moro estão começando
a agir. O próprio STF não agia contra a corrupção. Quantas denúncias foram
apresentadas no escândalo dos Anões do Orçamento? Quantos foram processados?
Cinco ou seis perderam o mandato por decisão do Congresso, que precisava
entregar a cabeça de alguém para poder acalmar a sociedade. Há, inclusive,
gente que foi denunciada por mim, que estava envolvida já naquela época e que
agora aparece neste novo escândalo da Lava-Jato.
Não
vou falar porque não quero botar lenha na fogueira, mas são pessoas deste
governo e do governo anterior. Na época, eu falei de cerca de quarenta
parlamentares. Alguns estão aí até hoje e em altos cargos da República. Tudo o
que fiz, passei e sofri não serviu para nada. Não é muito estimulante,
principalmente quando a gente vê os políticos que estão por aí controlando este
país.
O
senhor diria que ainda é um arquivo vivo?
Já
me pediram muito que escrevesse um livro. Recebi propostas também para filmes,
mas não quero trazer mais polêmicas. Tenho anotações de quando fui preso pela
primeira vez. Deixei algumas coisas anotadas porque tinha medo de que me
matassem. São denúncias, dossiês de políticos do Congresso. Estão guardados com
algumas pessoas — mas não vou dizer quem são. Isso foi o meu seguro, mas como o
seguro morreu de velho…
Depois
dos Anões do Orçamento, o país conheceu o mensalão e o petrolão, mas o
Congresso parece inerte diante de denúncias. O Congresso é uma escola de
corrupção?
Com
certeza é. Um deputado neófito, de primeiro mandato, do interior e que não sabe
de nada, começa a ver um colega fazendo aquilo. Não acontece nada com o
corrupto, e o novato aprende. Muita gente se corrompe por viver naquele
ambiente. Eu digo inclusive por mim. Eu via isso dentro do Congresso e aprendi
lá. Era como mariposa em torno da luz. Você está naquele ambiente e acaba
convivendo com tudo. Como não há demissões, prisões nem condenações, as pessoas
vão pensando que podem ir cada vez mais longe e que não vai acontecer nada com
elas.
O
senhor se considera o primeiro grande delator do país?
Não.
Na época foi um negócio espontâneo meu. Hoje a pessoa delata para poder levar
vantagem. É combinado com advogado, todo o negócio é armado para diminuir uma
pena. Na minha época não tinha nada disso. Mas considero que a delação é
válida. É uma maneira de investigar: sacrifica-se a pena de um para poder pegar
o resto e desmontar um esquema.
O
senhor denunciou corruptos mas também admitiu ser um deles. Que fim levou a
propina que recebeu de deputados?
Eu
tinha 1 milhão de dólares em casa e entreguei aos policiais.
Além
de integrar o esquema de corrupção, o senhor ficou marcado também pela acusação
de ter mandado matar sua mulher.
Eu
não matei a minha mulher. Fui para o júri achando que ia sair livre. Quando
acabei condenado, fiquei arrasado, mas depois me levantei de novo. Não tinha
nenhuma prova material contra mim, só os depoimentos dos dois homens que a
mataram. Esses depoimentos estavam cheios de contradições. Hoje vou levando a
minha vidinha. Nunca mais soube (dos assassinos). Hoje eu não tenho raiva de
ninguém. Raiva não adianta nada, ódio não adianta nada.
O
que o levou a virar evangélico e a pregar em cultos ao redor de Brasília?
Eu
me converti quando estava preso. Estava desesperado. O ambiente psicológico era
pesado, tinha perdido a minha mulher e estava sem entender nada. Eu recebia
Bíblias, livros de espiritismo e budismo e lia tudo o que me caía nas mãos.
Antes, até ridicularizava quem andava com a Bíblia, mas, quando caí na
necessidade e na angústia, vi que tudo isso ajuda muito. Quando estava preso e
fui julgado, tive uma crise forte e pensei: “Eu me converti, eu estou bem, li a
Bíblia, sou outro cara, mudei. Então não vou ser condenado”. Quando veio a
condenação, foi uma paulada: “Meu Deus, por que isso?”.
Condenado
por corrupção, o senhor dividiu uma ala da prisão com presos como Henrique
Pizzolato e o ex-senador Luiz Estevão. Como era a rotina?
Normalmente
as pessoas, quando vão presas, ficam muito angustiadas. O início é muito duro,
mas a gente procura dar força, conversar, mostrar que é um período da vida.
Montamos uma igreja lá dentro. Tinha um pastor, e fazíamos um culto. Fui para a
ala da cadeia onde estavam os mensaleiros, o ex-senador Luiz Estevão e presos
mais vulneráveis e que não tinham crime de sangue — boa parte era crime sexual
—, e a gente sempre dava muita força a eles. Na camaradagem a conversa era
sobre futebol. Eram todos gente boa, entre aspas. São todos seres humanos, como
eu também. Era cada um cumprindo a sua pena, tendo as suas angústias. Não se
pode fazer nada. O ser humano se adapta.
O
senhor denunciaria tudo de novo?
O
“se” é muito difícil. Se eu fizesse isso, se eu fizesse aquilo… Não sei se
faria diferente. As pessoas se afastaram. Ninguém queria ser visto comigo.
Nunca mais fui ao Congresso, mas não me interessa. Consegui restabelecer minha
vida e acho que estou vivendo bem.
Como
o senhor gostaria de ser lembrado?
Preferia
que me esquecessem. Para que lembrar disso tudo depois de 25 anos? Não
quero aparecer mais. O que vou ganhar com isso? Todo mundo morre um dia. Eu já
estou no lucro, com 75 anos. O que não quero é sofrer, morrer sofrendo, ficar
na cama entrevado. Deixa eu levar minha vida tranquilo. Quero ficar quieto.
https://amapamais.com.br/citei-todos-eles-e-todos-eles-estao-ai-diz-delator-dos-anos-90-2/
TRADICIONAL 1993
... ANÕES DO ORÇAMENTO, CAPA DE
VEJA
Nenhum comentário:
Postar um comentário