Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
quarta-feira, 25 de agosto de 2021
Pallida mors
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Pallida Mors - song by Damned By the Pope | Spotify
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Pallida mors aequo pulsat pede pauperum tabernas/Regumque turres - "A pálida morte bate com pé igual nos casebres dos pobres e nos palácios dos reis" - Horácio
Fonte: https://www.migalhas.com.br/coluna/latinorio/75362/expressoes-latinas-n--121
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Idioma: Latín
Enunciado: Pallida mors aequo pulsat pede pauperum tabernas regumque turres
Traducción literal: La muerte hiere con el mismo pie las tabernas de los pobres y las torres de los reyes
Fuentes: Arthaber n.º 843; Cantera2005a n.º 2209; Duarte n.º 2236; Garate2004 n.º 2315; HerreroLlorente n.º 6147; SánchezDoncel n.º 7178; Tosi n.º 604; Walther n.º 15112
Observaciones: Proviene de un verso de Horacio (Odae I 4,13)
Machado de Assis preferia a ironia dos livros à militância das ruas, diz professor
Fonte: Centro Virtual Cervantes © Instituto Cervantes, 1997-2021. Reservados todos los derechos. cvc@cervantes.es
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Crônicas do Dr. Semana
Crônicas do Dr. Semana
Texto-fonte: Obra Completa, Machado de Assis,
Rio de Janeiro: Edições W. M. Jackson,1938.
Publicado originalmente na Semana Ilustrada, Rio de Janeiro, de 08/12/1861 a 26/06/1864.
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CLÍNICA CIRÚRGICA DO DR. SEMANA
8 DE DEZEMBRO DE 1861
O Dr. Semana tem a honra de participar ao respeitável público, que se acha nesta corte, onde fixou sua residência, pronto sempre a ministrar aos necessitados os socorros de sua infalível ciência.
Não produzirá a relação das memórias que tem no Instituto Imperial de França e que o fizeram conhecido em ambas as Américas. Limita-se a publicar, apenas, o resultado de sua clínica durante o curto espaço de tempo em que aqui se acha.
Estes dados estatísticos são úteis: trazem proveito. A humanidade lucra com eles, quando insertos nas folhas diárias de grande extração, porque fica sabendo onde ir procurar a saúde e conhecer de perto quais têm sido os triunfos da ciência.
Aí vai a estatística.
Tumores sub epidérmicos. — Operei 200. Estes tumores são formados por uma substância perlea mais ou menos consistente. Opero-os com uma simples manobra digital, ou quando muito com o auxílio da extremidade aberta do cilindro oco da chave da máquina gnomônica de Nuremberg. Todos quantos operei eram do rosto, e foram coroados de sucesso.
Ditos microscópicos ou acari-phlyctenoides. — Tratei de alguns por meio da grattage com a rugina unguicular do Dr. Egratigneur.
Quistos. — Operei 40. Emprego metódico das agulhas d'Inglaterra (por um processo meu). Todos estes quistos eram formados pelo pulex penetrans, com acidentes locais, como phlogose, prurido, tensão e calor urente. Consegui banir da prática o uso da nicotina em pó e o carbonato calcário para favorecer a cicatrização.
Hérnias glóssicas através do orifício oral. — Tenho curado um grande número sem operação sangrenta. Reduzo-as, por meio de uma hábil e engenhosa combinação de esforços musculares. Operação rápida e sem dor.
N. B. — Emprazo os meus colegas desta corte para uma apreciação e discussão, cujo proveito será seguro. Este acidente de hérnias glóssicas é mais comum do que se pensa, sobretudo em indivíduos de temperamento dúbio e caráter ingênuo. Dois casos vi complicados com luxação da mandíbula.
Corpos estranhos. — Fragmentos dos tecidos musculares tendinosos e aponeuróticos, decoctos e putrefatos, profundamente implantados em vastas escavações devidas à cárie dos processos odônticos dos maxilares. Odontalgias. Extração por meio da engenhosa alavanca do Dr. Curedent.
Excretos superabundantes. — Dez casos de substância superexcretada das glândulas ceruminosas dos condutos auditivos externos. Emprego da mencionada alavanca, modificada por mim. Superexcreção das glândulas de Meibonnio; imensos casos. Loções metódicas com protóxido de hidrogênio; cura constante.
Ortopedia. — Desvio sinistroso dos apêndices capilares da extremidade cefálica do corpo, no plano compreendido entre os pontos occipital, frontal e temporais, incluindo vértex. Emprego constante (em 100 casos) do myriodonte de caout-chouc dos Drs. Chassepoux e Niobey.
Amputações. — Dos extremos livres dos referidos apêndices pelo processo de Mr. Beaumely e com tesouras de minha invenção. Casos numerosos; cura sem acidente.
São estas as operações que tenho praticado nesta corte em uma quinzena. Possuo agradecimentos, cientificamente redigidos e com assinaturas reconhecidas, que podem ser examinados no meu consultório, à Rua dos Arcos n.° 66.
Dr. Semana.
**** *** https://www.machadodeassis.ufsc.br/obras/cronicas/CRONICA,%20Cronicas%20do%20Dr.%20Semana,%201861.htm *** ***
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A tradição literária brasileira
entre a periferia e o centro
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IDENTIDADE DE UM GÊNIO
Machado de Assis preferia a ironia dos livros à militância das ruas, diz professor
O maior escritor brasileiro fez profundas críticas sociais à escravidão e à elite branca em suas obras
PNPaulo Nogueira
postado em 26/06/2020 04:00 / atualizado em 26/06/2020 07:40
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Artista Adriana Cardozo fez releitura de uma famosa foto de Machado de Assis, então com 57 anos, em 1896
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Artista Adriana Cardozo fez releitura de uma famosa foto de Machado de Assis, então com 57 anos, em 1896
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"A partir de Memórias póstumas..., Machado vai assumindo um tom cada vez irônico, mais cáustico para com aquela elite que ele gostaria de estar desconstruindo na obra dele"
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ENTREVISTA/EDUARDO DE ASSIS DUARTE / Professor do Programa de Pós-graduação em Letras:Estudos Literários,da UFMG
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SAIBA MAIS
04:00 - 26/06/2020
A arte da reparação
04:00 - 26/06/2020
Conheça o verdadeiro Machado de Assis: negro e crítico da escravidão
04:00 - 26/06/2020
Escritor faz provocação em livro que tem Machado de Assis como personagem racista
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Depois de mergulhar na obra do escritor carioca para escrever Machado de Assis afrodescendente, o professor Eduardo de Assis Duarte aniquila o discurso da branquitude e da omissão com a escravidão atribuídos por mais de um século ao Bruxo do Cosme Velho e afirma: “Machado de Assis usa um discurso que rejeita o tom de palanque, o tom de panfleto, prefere a finesse do humor, da ironia para fazer as críticas dele”.
O autor de Dom Casmurro e Memórias póstumas de Brás Cubas usou 23 pseudônimos em suas crônicas para jornais para não ser identificado e assim poder fazer suas críticas, porque escrevia para um público restrito e elitista, que era o leitor do jornal em seu tempo, já que 84% da população era analfabeta. Assis Duarte aponta Memórias póstumas de Brás Cubas como a obra em que Machado é mais contundente na denúncia contra a escravidão e o racismo, nesta entrevista exclusiva ao Estado de Minas.
De onde surgiu a ideia do livro sobre a afrodescendência de Machado de Assis? Foi a necessidade de desconstruir a hipocrisia em torno do escritor branco forjado a partir do atestado de óbito dele, em 1908, e reconstruí-lo e resgatá-lo em sua verdadeira identidade étnica?
O tema sobre a afrodescendência em Machado de Assis sempre me instigou. O livro nasce dessa preocupação, claro, e também do projeto de pesquisa que coordenei na UFMG na década passada. O olhar de Machado de Assis é simpático aos de baixo, aos subalternos. É um olhar que analisa a escravidão a partir do ponto de vista do escravo, do escravizado, essa é a minha visão.
Em paralelo com isso, surge esse problema sério da tentativa de embranquecimento do nosso maior escritor. Isso é fruto do racismo estrutural na sociedade brasileira, que não vai admitir que o maior escritor, não só da literatura brasileira, o maior ficcionista, na minha modesta opinião, de toda a língua portuguesa, com todo esse talento, com toda essa finesse, com toda essa cultura, como é que ele poderia ser negro? Então, começa-se todo um processo de embranquecimento de Machado de Assis visando negar suas origens, o seu pertencimento a essa grande maioria que compõe a afrodescendência no Brasil como parcela majoritária da população.
Então, o meu livro tem, sim, esse sentido político, de tentar pôr as coisas nos seus devidos lugares, porque não tem mais cabimento acontecer como aconteceu tempos atrás de uma propaganda da Caixa Econômica Federal usar um ator branco para fazer o papel de Machado de Assis. Há todo esse esforço de embranquecer Machado de Assis. Isso tem a ver com o preconceito incrustado, estrutural, naturalizado na sociedade brasileira. Se o autor constrói a obra, a obra também constrói o autor.
O Machado de Assis que surge nas páginas do meu livro é o afrodescendente, porque ele está sendo construído pelo que ele escreveu. Essa afrodescendência surge dos textos para a biografia do escritor. Ela complementa a biografia do escritor e joga por terra essa balela de que Machado de Assis era branco.
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"É uma literatura de anti-heróis, de crítica social. Os protagonistas brancos são todos anti-heróis. Brás Cubas é canalha, Bentinho é fracassado. É toda uma desconstrução da elite branca"
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A garimpagem dos trechos sobre escravidão e racismo, que exigiu mergulho na obra de Machado, teve também o objetivo de pinçar nas entrelinhas as críticas ao servilismo que outros autores não viram?
O livro Machado de Assis afrodescendente, em sua terceira edição, reúne crônicas, críticas de teatro publicadas em jornal, poemas, contos e trechos de romances. De fato, isso exigiu a releitura de toda a obra, inclusive de textos machadianos ainda fora das edições em livro, fora da chamada obra completa. Aliás, é impressionante isso, até hoje a obra completa ainda está incompleta. Daí a demora.
Começamos essa pesquisa no início de 2001 para 2002 e a primeira edição só ficou pronta em 2007, porque tivemos que ir e voltar, ir novamente, a todas as obras e muito também de garimpagem de textos que estão nos jornais de época. E ainda há muita coisa de Machado de Assis publicada nos jornais do século 19 sob pseudônimo, que a obra completa ignora. Fizemos a primeira edição do livro em 2007 e, para ter uma ideia, em 2008 saiu nova edição da obra completa, da editora Aguilar, que antes havia publicado três volumes, em 1992, com quase mil páginas cada um, aquele papel bíblia, fininho.
Em 2008, saiu a nova edição da Aguilar com quatro volumes. A obra de Machado de Assis é um manancial quase inesgotável, uma produção literária imensa que ele deixou. Essa garimpagem, por- tanto, demorou cinco anos, e implicou de fato a releitura de tudo que já se conhecia antes e também de textos descobertos ao longo da pesquisa. E nessa edição de 2020 incluímos um conto pouquíssimo conhecido de Machado, A mulher pálida, um conto cômico, ferino na sátira que ele faz a essa obsessão brasileira pela brancura, pela beleza branca importada da Europa.
Então, precisou-se debruçar pacientemente sobre a obra para encontrar esses elementos muitas vezes disfarçados de crítica ao establishment daquela época, pautado fundamentalmente sobre a escravização dos africanos e dos seus descendentes.
Autor-caramujo, capoeira literária, poética da dissimulação, “rabo de arraia”. Afinal, por que Machado de Assis foi tão dissimulado em suas denúncias? Por causa do perfil elitista dos leitores dos jornais para os quais escrevia, do emprego público que tinha, para não evidenciar sua condição de afrodescendente...? Lima Barreto, por exemplo, era afrodescendente também e foi perseguido pelas críticas aos seus contemporâneos ao publicar Recordações do escrivão Isaías Caminha, em 1909.
Por que Machado usa um discurso que rejeita o tom de palanque, o tom de panfleto? Por que prefere a finesse do humor, da ironia para fazer as críticas dele? Essas críticas não são menos contundentes se fossem faladas num palanque, num comício, esbravejadas por cima de um palanque. A tradição literária que temos aí, milenar, mostra o poder que a comédia, que o humor tem em termos de crítica. É o que Machado está fazendo.
Há um detalhe muito importante, não podemos esquecer nunca de um fator público. Quem era o leitor de Machado de Assis? O censo demográfico, o primeiro realizado no Brasil por dom Pedro II, em 1872, teve seus resultados co- nhecidos só quatro anos depois, em 1876. Ali está colocado que 84,6% da população brasileira daquele época, 1870, era analfabeta. Só 15,4% sabiam ler. O leitor de livros daquele momento era o leitor da elite branca. E o leitor de jornais também E, além disso, Machado não era um homem rico, não era da elite, era um funcionário público. E muitos funcionários, inclusive nobres, amigos de dom Pedro II, foram perseguidos, demitidos por ter publicado um artiguinho no jornal criticando a escravatura.
O professor Alfredo Bosi, inclusive, tem uma frase ótima que diz que Machado precisava, para fazer suas críticas, circular nos meios literários do seu tempo, precisava ter aquela compostura exigida dos homens de cor. Lima Barreto, ao contrário, nem sempre teve isso, sempre foi alguém que disse tudo o que precisava dizer e no tom que lhe é peculiar. E Lima Barreto foi extremamente discriminado. Chegou um momento em que nenhum jornal do Rio de Janeiro queria publicar coisas de Lima Barreto. Lima Barreto é um homem que floresce na idade adulta a partir já do século 20.
E mesmo no fim do século 19, quando já não havia mais escravidão, Lima Barreto se declara abertamente negro ou mulato, como queiram. Já Machado de Assis, raramente, acho que nunca, bateu no peito e disse sou negro, porque nos tempos da escravidão, no século 19, negro, sobretudo, era sinônimo de escravo. Fala-se muito isso, Machado nunca se assumiu como negro, mas também nunca escreveu que fosse branco. Essa questão do emprego público, da censura que havia nos meios de comunicação, jornais foram empastelados, jornalistas foram perseguidos, agredidos no meio da rua.
Havia um clima de violência, de opressão naquele momento que ele precisava evitar enquanto homem pobre, que pagou aluguel a vida toda. Ele precisava, sim, do emprego público dele. Tudo isso forma um contexto que vai exigir e, ao mesmo tempo, justificar essa capoeira literária, essa poética da dissimulação que a gente vê em praticamente toda a obra de Machado, não só nos jornais. Nas suas crônicas, ele chegou a usar 23 pseudônimos para não ser identificado. Quem é que estava fazendo aquela crônica, aquela denúncia, não só nos jornais, como também nos romances que eram lidos por aquele elite branca do seu tempo?
Por que não existe um protagonista negro relevante nas obras de Machado de Assis? Isso é outro fator de dissimulação?
Exato, as pessoas sempre perguntam a respeito da ausência de um herói negro. Eu sempre devolvo a pergunta dizendo o seguinte: quem é o herói branco nos romances de Machado de Assis? Então, tem um projeto literário antiépico. É uma literatura de anti-heróis, é uma literatura de crítica social, passa por outro diapasão totalmente diferente do que se fazia, por exemplo, no romantismo de José de Alencar, que tem heróis que são, inclusive, senhores de escravos, de chicote na mão, como dom Antônio de Mariz, de O guarani.
E com relação aos protagonistas brancos, são todos anti-heróis. Por exemplo, Brás Cubas é um canalha, Bentinho (Dom Casmurro) é fracassado, alguém que se julga traído a vida toda, que renega o próprio filho, que tenta matar o próprio filho, que deseja a morte do próprio filho. Enfim, é toda uma desconstrução da elite branca daquele tempo.
É uma literatura cética, não tem muito espaço para grandes arroubos de heroísmo, e também isso, evidentemente, coloca a ficção de Machado de Assis dentro desse propósito, desse projeto de uma literatura também pautada pela dissimulação, pela ironia, em que o texto, muitas vezes, está dizendo aquilo que não está explícito lá em cima na página. Para você compreender melhor, tem que ler, reler, comparar.
José de Alencar, a quem Machado admirava, foi ativista contra a abolição. Mesmo assim, Machado o escolheu como o patrono de sua cadeira na Academia Brasileira de Letras. Não é uma contradição ou esse fato vai para a conta do anacronismo?
A relação de José de Alencar e Machado de Assis é uma questão muito interessante que ultrapassa a divisão política que separava ambos. Alencar era conservador, escravocrata, mas era, até então, o principal nome da literatura brasileira, dando os seus primeiros passos, o primeiro grande romancista. Há uma relação entre ambos de profundo respeito. Para se ter uma ideia, Machado tinha 27 anos e José de Alencar escreve um artigo no Jornal do Commercio, que era o jornal da elite imperial de maior circulação, tirava 27 mil cópias.
José de Alencar, com o intuito de apresentar o jovem Castro Alves a Machado de Assis, o faz de público através de uma carta em que ele recomenda o jovem poeta baiano recém-chegado a essa corte. E ele inicia as palavras dele chamando Machado de Assis de Vossa Excelência. Machado já era um nome conhecido como crítico, tanto de teatro quanto literário, de romances, contos e novelas. Mas Machado tinha 27 anos e já era chamado de Vossa Excelência. Não é que existisse amizade profunda, mas havia um respeito muito grande entre eles.
Tanto que o filho de José de Alencar, Mário de Alencar, após a morte do pai, se aproxima de Machado e eles se tornam grandes amigos até a morte de Machado, em 1908. Então, creio que essa questão da academia é mais de respeito no sentido de que Alencar tem um papel muito importante na consolidação do romance brasileiro do século 19 e da literatura brasileira como um todo.
Em linhas gerais, há alguma diferença no tratamento que Machado dá à escravidão entre as duas fases de sua obra, do romantismo ao realismo?
Essa divisão da obra de Machado de Assis em duas metades é muito questionada. Uma primeira fase romântica, uma segunda fase realista, é muito questionável porque aprisiona a obra a um esquema muito estreito, que é o esquema dos estilos de época.
Dizer, por exemplo, que Machado de Assis inaugura o realismo brasileiro com Memórias póstumas de Brás Cubas, publicado inicialmente em folhetins na Revista Brasileira, em 1880, em livro em 1881, é muito arriscado. A gente estudou isso nos livros, nos compêndios de história da literatura brasileira. Mas que realismo é esse em que a história é contada por um defunto? Então, é muito questionável essa divisão romantismo e realismo.
Machado está muito acima disso, é um escritor moderno, o realismo dele antecipa procedimentos literários que só vão se fixar com o modernismo do século 20. É um precursor, antecipa procedimentos que só mais tarde vão ser atitudes corriqueiras na criação literária. Quanto à questão da escravidão, acredito, por exemplo, que Helena, que, teoricamente, seria parte da fase romântica, tem ali a relação entre Helena e o escravo Raimundo de uma forma muito especial. Raimundo é humanizado, tratado como ser humano importante.
Não vejo grande separação, o que pode haver, talvez, é uma mudança de tom. A partir de Memórias póstumas..., Machado vai assumindo um tom cada vez irônico, mais cáustico para com aquela elite que ele gostaria de estar desconstruindo na obra dele.
Em que livro ou conto Machado de Assis foi mais explícito na denúncia da escravidão?
Essa é uma questão complicada. Penso que talvez em Memórias póstumas de Brás Cuba. A cena do Prudêncio criança e o Brás também criança, e o Prudêncio sendo colocado de quatro como se fosse um animal, passada uma corda em sua boca e o menino branco sentado em cima como se o menino negro fosse uma cavalgadura, e xingando o menino toda vez que ele reclamava, é uma baita alegoria de toda a situação do negro na história do Brasil até aquele momento.
O negro transformado em cavalgadura sobre a qual o branco senta e trepa em cima. O papel do negro reduzido a simples cavalgadura para o branco explorar, bater, oprimir, torturar. Essa cena é muito vigorosa, é simbólica, ela resume, aparentemente, numa coisa infantil, inocente, uma verdade cruel sobre a situação do negro. Em seguida, passam-se as páginas do livro, ambos crescem, Brás vai para a Europa desfrutar, fingindo que está estudando, da herança do pai, do dinheiro acumulado do pai pela escravização de tantos outros que trabalhavam para ele.
E quando Brás volta, Prudêncio já está livre, não é mais escravo. Antes de o pai falecer, ele deu alforria a Prudêncio. E Prudêncio faz o quê? O que muita gente pobre fazia naquele momento, usar a compra de um escravo como poupança. Prudêncio, então, compra outro escravo com o dinheiro que ele vai acumulando, ele compra alguém. Depois, Brás Cubas vê numa praça pública o Prudêncio batendo num negro que era escravo dele. E repetindo as palavras que ele, quando criança, ouvia do Brás, o famoso “cala a boca, besta”.
Quando o escravo gemia, Brás gritava “cala a boca, besta”. É raro na literatura universal uma cena tão forte como essa, no sentido de que está mostrando que, uma vez que o branco animaliza o seu semelhante, trata esse outro como se fosse uma coisa, um bicho, nesse momento é porque o branco já se animalizou há muito tempo. Machado faz isso muito antes de Freud teorizar sobre essa questão.
Se você trata alguém como objeto, se trata alguém como animal, é porque já se animalizou, se desumanizou há muito tempo. Essas duas cenas mostram de forma metafórica, simbólica toda uma crítica que Machado faz aos efeitos deletérios do regime escravocrata no Brasil.
O que dificultou o processo de abolição?
Foi o egoísmo da classe senhorial brasileira em aceitar os novos tempos que fez com que o Brasil fosse o último a abolir escravos. Em 1871, Pedro II já queria fazer a abolição. Aliás, ele já tinha feito a abolição quando acaba a Guerra do Paraguai. Ela faz a abolição lá no Paraguai, que estava ocupado pelo Exército brasileiro. No Brasil, há crise política e o máximo que o imperador consegue é a Lei do Ventre Livre, que vai adiar de 1871 para 1888 o fim do regime, pelo menos o fim teórico.
O que vai dificultar a abolição é a insistência dos senhores em manter o regime. Os conservadores tinham maioria no Legislativo. Tanto que os projetos mais liberais, nenhum deles foi aprovado. Havia o projeto do senador Dantas de fazer a reforma agrária junto com a abolição, distribuindo terras governamentais que estavam sobrando. E foram doadas tantas terras públicas para os imigrantes europeus. Queria-se doar terras também para os antigos escravos, o famoso projeto do senador Dantas.
E o projeto não foi aprovado e teve a abolição pela metade. Os antigos escravizados foram jogados ao deus-dará e viraram marginais, viraram essa periferia, que até hoje temos essa grandiosa maioria da nossa população, carente ainda de condições mínimas para exercer a cidadania.
Sem instrução e sem opção de subsistência, alforriados continuavam agregados aos seus senhores. A abolição foi feita pela metade. Como defendia José de Alencar, ainda não estava na hora sem um processo preparatório?
Os antigos escravizados foram abandonados, completamente jogados ao deus-dará. Acabou o regime, agora, cada um que se vire. Esse fato é explorado por Machado de Assis em diversos escritos dele. Estávamos passando de uma escravização oficial para uma escravização dissimulada, fantasiada de emprego formal, mas com salários de miséria.
Machado denuncia isso em vários momentos, inclusive nas crônicas dele no jornal. Essa abolição pela metade existiu não porque ainda não estava na hora, porque faltou tempo para fazer o processo preparatório, de modo algum. Foram duas décadas batendo na mesma tecla, desde 1871, com muitos debates, projetos. O que faz a abolição ser feita pela metade é o racismo estrutural, que via no negro um indivíduo subumano e em segundo lugar o interesse das elites em não querer abrir mão dessa mão de obra gratuita.
É o egoísmo das elites brasileiras que permanece até hoje. Nenhum país passa impunemente por mais de 300 anos de escravização. Isso tem consequências, entra pelo século 20. Estamos vendo as consequências agora em pleno século 21. Fazer a reforma agrária e distribuir as terras aos antigos escravos. Hoje, o Brasil seria outro se isso tivesse sido feito em 1888.
Da forma como feita, a abolição criou outro tipo de escravidão, a miséria, já notória na modernização urbana do Rio no início do século 20. Essa herança maldita é a principal causa da segregação racial e socioeconômica que perdura no Brasil 132 anos depois da abolição?
A nova escravidão é a miséria. Temos um país com desigualdade criminosa. A grande maioria vive num estado de pobreza em que se tira dela qualquer resquício de cidadania. Haja vista o tratamento que essas pessoas recebem nas periferias, nas comunidades, inclusive pelo Estado. A primeira coisa que o Estado faz é mandar a polícia, atira primeiro e pegunta depois.
Essa subcidadania é efeito direto de mais de 300 anos de escravatura. Essa herança maldita que causa toda essa segregação. No caso do Brasil, segregação disfarçada em boa aparência, disfarçada de mil formas. Não é só elite, o quanto que a gente tem uma classe média reacionária e que não escondeu seu racismo, que não gosta de negros. Isso é uma coisa visível. Em qualquer família de classe média brasileira, você vai encontrar sempre um racista. Infelizmente, 132 anos depois, o país paga até hoje o preço dessa segregação.
Quantas pessoas de classe média branca são contra cotas nas universidades públicas pagas com os impostos de toda a população. Tem um setor da classe média que se considera usurpado, que acha que deveriam ser reservadas para os seus filhinhos. Temos que assumir uma atitude firme contra o racismo. Racismo nunca mais.
*** *** https://www.em.com.br/app/noticia/pensar/2020/06/26/interna_pensar,1159973/machado-de-assis-preferia-ironia-livros-a-militancia-das-ruas.shtml *** ***
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Prólogo
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Rangeu enfim o último degrau da escada ao peso do vasto corpo do major Bento. O major
deteve-se um minuto, respirou à larga, como se acabasse de subir, não a escada do
sobrinho, mas a de Jacó, e enfiou pelo corredor adiante.
A casa era na Rua da Misericórdia, uma casa de sobrado cujo locatário sublocara três
aposentos a estudantes. O aposento de Máximo era ao fundo, à esquerda, perto de uma
janela que dava para a cozinha de uma casa da rua D. Manuel. Triste lugar, triste
aposento, e tristíssimo habitante, a julgá-lo pelo rosto com que apareceu às pancadinhas
do major. Este bateu, com efeito, e bateu duas vezes, sem impaciência nem sofreguidão.
Logo que bateu a segunda vez, ouviu estalar dentro uma cama, e logo um ruído de
chinelas ao chão, depois um silêncio curto, enfim, moveu-se a chave e abriu-se a porta.
— Quem é? — ia dizendo a pessoa que abrira. E logo: — é o tio Bento.
A pessoa era um rapaz de vinte anos, magro, um pouco amarelo, não alto, nem elegante.
Tinha os cabelos despenteados, vestia um chambre velho de ramagens, que foram
vistosas no seu tempo, calçava umas chinelas de tapete; tudo asseado e tudo pobre. O
aposento condizia com o habitante: era o alinho na miséria. Uma cama, uma pequena
mesa, três cadeiras, um lavatório, alguns livros, dois baús, e pouco mais.
— Viva o sr. estudante, disse o major sentando-se na cadeira que o rapaz lhe oferecera.
— Vosmecê por aqui, é novidade, disse Máximo. Vem a passeio ou negócio?
— Nem negócio nem passeio. Venho...
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Machado de Assis (A Mulher Pálida)
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*** *** https://nuhtaradahab.wordpress.com/2011/02/20/machado-de-assis-a-mulher-palida/ *** ***
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A mulher pálida
Texto-fonte:
http://www2.uol.com.br/machadodeassis/.
Publicado originalmente em A Estação, de 15/08/1881 a 30/09/1881.
CAPÍTULO PRIMEIRO
Rangeu enfim o último degrau da escada ao peso do vasto corpo do Major Bento. O major deteve-se um minuto, respirou à larga, como se acabasse de subir, não a escada do sobrinho, mas a de Jacó, e enfiou pelo corredor adiante.
A casa era na Rua da Misericórdia, uma casa de sobrado cujo locatário sublocara três aposentos a estudantes. O aposento de Máximo era ao fundo, à esquerda, perto de uma janela que dava para a cozinha de uma casa da Rua D. Manuel. Triste lugar, triste aposento, e tristíssimo habitante, a julgá-lo pelo rosto com que apareceu às pancadinhas do major. Este bateu, com efeito, e bateu duas vezes, sem impaciência nem sofreguidão. Logo que bateu a segunda vez, ouviu estalar dentro uma cama, e logo um ruído de chinelas ao chão, depois um silêncio curto, enfim, moveu-se a chave e abriu-se a porta.
— Quem é? — ia dizendo a pessoa que abrira. E logo: — é o tio Bento.
A pessoa era um rapaz de vinte anos, magro, um pouco amarelo, não alto, nem elegante. Tinha os cabelos despenteados, vestia um chambre velho de ramagens, que foram vistosas no seu tempo, calçava umas chinelas de tapete; tudo asseado e tudo pobre. O aposento condizia com o habitante: era o alinho na miséria. Uma cama, uma pequena mesa, três cadeiras, um lavatório, alguns livros, dois baús, e pouco mais.
— Viva o senhor estudante, disse o major sentando-se na cadeira que o rapaz lhe oferecera.
— Vosmecê por aqui, é novidade, disse Máximo. Vem a passeio ou negócio?
— Nem negócio nem passeio. Venho...
Hesitou; Máximo reparou que ele trazia uma polegada de fumo no chapéu de palha, um grande chapéu da roça de onde era o Major Bento. O major, como o sobrinho, era de Iguaçu. Reparou nisso, e perguntou assustado se morrera alguma pessoa da família.
— Descanse, disse o major, não morreu nenhum parente de sangue. Morreu teu padrinho.
O golpe foi leve. O padrinho de Máximo era um fazendeiro rico e avaro, que nunca jamais dera ao sobrinho um só presente, salvo um cacho de bananas, e ainda assim, porque ele se achava presente na ocasião de chegarem os carros. Tristemente avaro. Sobre avaro, misantropo; vivia consigo, sem parentes — nem amigos, nem eleições, nem festas, nem coisa nenhuma. Máximo não sentiu muita comoção à notícia do óbito. Chegou a proferir uma palavra de desdém.
— Vá feito, disse ele, no fim de algum tempo de silêncio, a terra lhe seja leve, como a bolsa que me deixou.
— Ingrato! bradou o major. Fez-te seu herdeiro universal.
O major proferiu estas palavras estendendo os braços para amparar o sobrinho, na queda que lhe daria a comoção; mas, a seu pesar, viu o sobrinho alegre, ou pouco menos triste do que antes, mas sem nenhum delírio. Teve um sobressalto, é certo, e não disfarçou a satisfação da notícia. Pudera! Uma herança de seiscentos contos, pelo menos. Mas daí à vertigem, ao estontear que o major previa, a distância era enorme. Máximo puxou de uma cadeira e sentou-se defronte do tio.
— Não me diga isso! Deveras herdeiro?
— Vim de propósito dar-te a notícia. Causou espanto a muita gente; o Morais Bicudo, que fez tudo para empalmar-lhe a herança, ficou com uma cara de palmo e meio. Dizia-se muita coisa; uns que a fortuna ficava para o Morais, outros que para o vigário, etc. Até se disse que uma das escravas seria a herdeira da maior parte. Histórias! Morreu o homem, abre-se o testamento, e lê-se a declaração de que você é o herdeiro universal.
Máximo ouviu contente. No mais recôndito da consciência dele insinuava-se esta reflexão — que a morte do coronel era uma coisa deliciosa, e que nenhuma outra notícia lhe podia ir mais direta e profunda ao coração.
— Vim dizer isto a você, continuou o major, e trazer um recado de tua mãe.
— Que é?
— Simplesmente saber se você quer continuar a estudar ou se prefere tomar conta da fazenda.
— Que lhe parece?
— A mim nada; você é que decide.
Máximo refletiu um instante.
— Em todo o caso, não é sangria desatada, disse ele; tenho tempo de escolher.
— Não, porque se você quiser estudar dá-me procuração, e não precisa sair daqui. Agora, se...
— Vosmecê volta hoje mesmo?
— Não, volto sábado.
— Pois amanhã resolveremos isto.
Levantou-se, atirou a cadeira ao lado, bradando que enfim ia tirar o pé do lodo; confessou que o padrinho era um bom homem, apesar de seco e misantropo, e a prova...
— Vivam os defuntos! concluiu o estudante.
Foi a um pequeno espelho, mirou-se, consertou os cabelos com as mãos; depois deteve-se algum tempo a olhar o soalho. O tom sombrio do rosto dominou logo a alegria da ocasião; e se o major fosse homem sagaz, poderia perceber-lhe nos lábios uma leve expressão de amargura. Mas o major nem era sagaz, nem olhava para ele; olhava para o fumo do chapéu, e consertava-o; depois despediu-se do estudante.
— Não, disse este; vamos jantar juntos.
O major aceitou. Máximo vestiu-se depressa, e, enquanto se vestia, falava das coisas de Iguaçu e da família. Pela conversa sabemos que a família é pobre, sem influência nem esperança. A mãe do estudante, irmã do major, tinha um pequeno sítio, que mal lhe dava para comer. O major exercia um emprego subalterno, e nem sequer tinha o gosto de ser verdadeiramente major. Chamavam-lhe assim, porque dois anos antes, em 1854, disse-se que ele ia ser nomeado Major da Guarda Nacional. Pura invenção, que muita gente acreditou realidade; e visto que lhe deram desde logo o título, repararam com ele o esquecimento do governo.
— Agora, juro-lhe que vosmecê há de ser major de verdade, dizia-lhe Máximo pondo na cabeça o chapéu de pêlo de lebre, depois de o escovar com muita minuciosidade.
— Homem, você quer que lhe diga? Isto de política já me não importa. Afinal, é tudo o mesmo...
— Mas há de ser major.
— Não digo que não, mas...
— Mas?
— Enfim, não digo que não.
Máximo abriu a porta e saíram. Ressoaram os passos de ambos no corredor mal alumiado. De um quarto ouviu-se uma cantarola, de outro um monólogo, de outro um tossir longo e cansado.
— É um asmático, disse o estudante ao tio, que punha o pé no primeiro degrau da escada para descer.
— Diabo de casa tão escura, disse ele.
— Arranjarei outra com luz e jardins, redargüiu o estudante.
E dando-lhe o braço, desceram à rua.
CAPÍTULO II
Naturalmente a leitora notou a impressão de tristeza do estudante, no meio da alegria que lhe trouxe o tio Bento. Não é provável que um herdeiro, na ocasião em que se lhe anuncia a herança, tenha outros sentimentos que não sejam de regozijo; daí uma conclusão da leitora — uma suspeita ao menos — suspeita ou conclusão que a leitora terá formulado nestes termos:
— O Máximo padece do fígado.
Engano! O Máximo não padece do fígado; goza até uma saúde de ferro. A causa secreta da tristeza súbita do Máximo, por mais inverossímil que pareça, é esta: — O rapaz amava uma galante moça de dezoito anos, moradora na Rua dos Arcos, e amava sem ventura.
Desde dois meses fora apresentado em casa do Senhor Alcântara, à Rua dos Arcos. Era o pai de Eulália, que é a moça em questão. O Senhor Alcântara não era rico, exercia um emprego mediano no Tesouro, e vivia com certa economia e discrição; era ainda casado e tinha só duas filhas, a Eulália, e outra, que não passava de sete anos. Era um bom homem, muito inteligente, que se afeiçoou desde logo ao Máximo, e que, se o consultassem, não diria outra coisa senão que o aceitava para genro.
Tal não era a opinião de Eulália. Gostava de conversar com ele — não muito —, ouvia-lhe as graças, porque ele era gracioso, tinha repentes felizes; mas só isso. No dia em que o nosso Máximo se atreveu a interrogar os olhos de Eulália, esta não lhe respondeu coisa nenhuma, antes supôs que fora engano seu. Da segunda vez não havia dúvida; era positivo que o rapaz gostava dela e a interrogava. Eulália não pode ter-se que não comentasse o gesto do rapaz, no dia seguinte, com umas primas.
— Ora vejam!
— Mas que tem? aventurou uma das primas.
— Que tem? Não gosto dele; parece que é razão bastante. Realmente, há pessoas a quem não se pode dar um pouco de confiança. Só porque conversou um pouco comigo já pensa que é motivo para cair de namoro. Ora não vê!
Quando no dia seguinte, Máximo chegou à casa do Senhor Alcântara, foi recebido com frieza; entendeu que não era correspondido, mas nem por isso desanimou. Sua opinião é que as mulheres não eram mais duras do que as pedras, e entretanto a persistência da água vencia as pedras. Além deste ponto de doutrina, havia uma razão mais forte: ele amava deveras. Cada dia vinha fortalecer a paixão do moço, a ponto de lhe parecer inadmissível outra coisa que não fosse o casamento, e próximo; não sabia como seria próximo o casamento de um estudante sem dinheiro com uma dama, que o desdenhava; mas o desejo ocupa-se tão pouco das coisas impossíveis!
Eulália, honra lhe seja, tratou de desenganar as esperanças do estudante, por todos os modos, com o gesto e com a palavra; falava-lhe pouco, e às vezes mal. Não olhava para ele, ou olhava de relance, sem demora nem expressão. Não aplaudia, como outrora, os versos que ele ia ler em casa do pai, menos ainda lhe pedia que recitasse outros, como as primas; estas sempre se lembravam de um Devaneio, um Suspiro ao luar, Teus olhos, Ela, Minha vida por um olhar, e outros pecados de igual peso, que o leitor pode comprar hoje por seiscentos réis, em brochura, na rua de S. José nº..., ou por trezentos réis, sem o frontispício. Eulália ouvia todas as belas estrofes compostas especialmente para ela, como se fossem uma página de S. Tomás de Aquino.
— Vou arriscar uma carta, disse um dia o rapaz, ao fechar a porta do quarto, da Rua da Misericórdia.
Efetivamente entregou-lhe uma carta alguns dias depois, à saída, quando ela já não podia recusá-la. Saiu precipitadamente; Eulália ficou com o papel na mão, mas devolveu-lho no dia seguinte.
Apesar desta recusa e de todas as outras, Máximo conservava a esperança de triunfar enfim da resistência de Eulália, e não a conservava senão porque a paixão era verdadeira e forte, nutrida de si mesma, e irritada por um sentimento de amor próprio ofendido. O orgulho do rapaz sentia-se humilhado, e, para perdoar, exigia a completa obediência. Imagine-se, portanto, o que seriam as noites dele, no quartinho da Rua da Misericórdia, após os desdéns de cada dia.
Na véspera do dia em que o major Bento veio de Iguaçu comunicar ao sobrinho a morte e a herança do padrinho, Máximo reuniu todas as forças e deu batalha campal. Vestiu nesse dia um paletó à moda, umas calças talhadas por mão de mestre, deu-se ao luxo de um cabeleireiro, retesou o princípio de um bigode mal espesso, coligiu nos olhos toda a soma da eletricidade que tinha no organismo, e foi para a Rua dos Arcos. Um colega de ano, confidente dos primeiros dias do namoro, costumava a fazer do nome da rua uma triste aproximação histórica e militar. — Quando sais tu da ponte d’Arcole? — Esta chufa sem graça nem misericórdia doía ao pobre sobrinho do major Bento, como se fosse uma punhalada, mas não o dizia, para não confessar tudo; apesar das primeiras confidências, Máximo era um solitário.
Foi; declarou-se formalmente, Eulália recusou formalmente, mas sem desdém, apenas fria. Máximo voltou para casa abatido e passou uma noite de todos os diabos. Há fortes razões para crer que não almoçou nesse dia, além de três ou quatro xícaras de café. Café e cigarros. Máximo fumou uma quantidade incrível de cigarros. Os vendedores de tabaco certamente contam com as paixões infelizes, as esperas de entrevistas, e outras hipóteses em que o cigarro é confidente obrigado.
Tal era, em resumo, a vida anterior de Máximo, e tal foi a causa da tristeza com que pôde resistir às alegrias de uma herança inesperada — e duas vezes inesperada, pois não contava com a morte, e menos ainda com o testamento do padrinho.
— Vivam os defuntos! Esta exclamação, com que recebera a notícia do major Bento, não trazia o alvoroço próprio de um herdeiro; a nota era forçada demais.
O major Bento não soube nada daquela paixão secreta. Ao jantar, via-o de quando em quando ficar calado e sombrio, com os olhos fitos na mesa, a fazer bolas de miolo de pão.
— Tu tens alguma coisa, Máximo? perguntava-lhe.
Máximo estremecia, e procurava sorrir um pouco.
— Não tenho nada.
— Estás assim... um pouco... pensativo...
— Ah! é a lição de amanhã.
— Homem, isto de estudos não deve ir ao ponto de fazer adoecer a gente. Livro faz a cara amarela. Você precisa de distrair-se, não ficar metido naquele buraco da Rua da Misericórdia, sem ar nem luz, agarrado aos livros...
Máximo aproveitava estes sermões do tio, e voava outra vez à Rua dos Arcos, isto é, às bolas de miolo de pão e aos olhos fitos na mesa. Num desses esquecimentos, e enquanto o tio despia uma costeleta de porco, Máximo disse em voz alta:
— Justo.
— O que é? perguntou o major.
— Nada.
— Você está falando só, rapaz? Hum? aqui há coisa. Hão de ver as italianas do teatro.
Máximo sorriu, e não explicou ao tio por que motivo lhe saíra aquela palavra da boca, uma palavra seca, nua, vaga, susceptível de mil aplicações. Era um juízo? uma resolução?
CAPÍTULO III
Máximo teve uma idéia singular: experimentar se Eulália, rebelde ao estudante pobre, não o seria ao herdeiro rico. Nessa mesma noite foi à Rua dos Arcos. Ao entrar, disse-lhe o Senhor Alcântara:
— Chega a propósito; temos aqui umas moças que ainda não ouviram o Suspiro ao luar.
Máximo não se fez de rogado; era poeta; supunha-se grande poeta; em todo caso recitava bem, com certas inflexões langorosas, umas quedas da voz e uns olhos cheios de morte e de vida. Abotoou o paletó com uma intenção chateaubriânica, mas o paletó recusou-se a intenções estrangeiras e literárias. Era um prosaico paletó nacional, da Rua do Hospício nº... A mão ao peito corrigiu um pouco a rebeldia do vestuário; e esta circunstância persuadiu a uma das moças de fora que o jovem estudante não era tão desprezível como lhe havia dito Eulália. E foi assim que os versos começaram a brotar-lhe da boca — a adejar-lhe, que é melhor verbo para o nosso caso.
— Bravo! bravo! diziam os ouvintes, a cada estrofe.
Depois do Suspiro ao luar, veio o Devaneio, obra nebulosa e deliciosa ao mesmo tempo, e ainda o Colo de neve, até que o Máximo anunciou uns versos inéditos, compostos de fresco, poucos minutos antes de sair de casa. Imaginem! Todos os ouvidos afiaram-se para tão gulosa especiaria literária. E quando ele anunciou que a nova poesia denominava-se Uma cabana e teu amor — houve um geral murmúrio de admiração. Máximo preparou-se; tornou a inserir a mão entre o colete e o paletó, e fitou os olhos em Eulália.
— Forte tolo! disse a moça consigo.
Geralmente, quando uma mulher tem de um homem a idéia que Eulália acabava de formular — está prestes a mandá-lo embora de uma vez ou a adorá-lo em todo o resto da vida. Um moralista dizia que as mulheres são extremas: ou melhores ou piores do que os homens. Extremas são, e daí o meu conceito. A nossa Eulália estava no último fio da tolerância; um pouco mais, e o Máximo ia receber as derradeiras despedidas. Naquela noite mais do que nunca, pareceu-lhe insuportável o estudante. A insistência do olhar — ele, que era tímido, — o ar de soberania, certa consciência de si mesmo, que até então não mostrara, tudo o condenou de uma vez.
— Vamos, vamos, disseram os curiosos ao poeta.
— Uma cabana e teu amor, repetiu Máximo.
E começou a recitar os versos. Essa composição intencional dizia que ele, poeta, era pobre, muito pobre, mais pobre do que as aves do céu; mas que à sombra de uma cabana, ao pé dela, seria o mais feliz e mais opulento homem do mundo. As últimas estrofes — juro que não as cito senão por ser fiel à narração — as estrofes derradeiras eram assim:
Que me importa não tragas brilhantes,
Refulgindo no teu colo nu?
Tens nos olhos as jóias vibrantes,
E a mais nítida pérola és tu.
Pobre sou, pobre quero ajoelhado,
Como um cão amoroso, a teus pés,
Viver só de sentir-me adorado,
E adorar-te, meu anjo, que o és!
O efeito destes versos foi estrondoso. O Senhor Alcântara, que suava no Tesouro todos os dias para evitar a cabana e o almoço, um tanto parco, celebrado nos versos do estudante, aplaudiu entusiasticamente os desejos deste, notou a melodia do ritmo, a doçura da frase, etc...
— Oh! muito bonito! muito bonito! exclamava ele, e repetia entusiasmado:
Pobre sou, pobre quero ajoelhado,
Como um cão amoroso a teus pés,
Amoroso a teus pés... Que mais?
Amoroso a teus pés, e... Ah! sim:
Viver só de sentir-me adorado,
E adorar-te, meu anjo, que o és!
Note-se — e este rasgo mostrará a força de caráter de Eulália —, note-se que Eulália achou os versos bonitos, e achá-los-ia deliciosos, se os pudesse ouvir com orelhas simpáticas. Achou-os bonitos, mas não os aplaudiu.
“Armou-se uma brincadeira” para usar a expressão do Senhor Alcântara, querendo dizer que se dançou um pouco. — Armemos uma brincadeira, bradara ele. Uma das moças foi para o piano, as outras e os rapazes dançaram. Máximo alcançou uma quadrilha de Eulália; no fim da terceira figura disse-lhe baixinho:
— Pobre sou, pobre quero ajoelhado...
— Quem é pobre não tem vícios, respondeu a moça rindo, com um pouco de ferocidade nos olhos e no coração.
Máximo enfiou. Não me amará nunca, pensou ele. Ao chá, restabelecido do golpe, e fortemente mordido do despeito, lembrou-se de dar a ação definitiva, que era noticiar a herança. Tudo isso era tão infantil, tão adoidado, que a língua entorpeceu-se-lhe no melhor momento, e a notícia não lhe saiu da boca. Foi só então que ele pensou na singularidade duma notícia daquelas, em plena ceia de estranhos, depois de uma quadrilha e alguns versos. Esse plano, afagado durante a tarde e a noite, que lhe parecia um prodígio de habilidade, e talvez o fosse deveras, esse plano apareceu-lhe agora pela face obscura, e achou-o ridículo. Minto: achou-o ousado apenas. As visitas começaram a despedir-se, e ele foi obrigado a despedir-se também. Na rua, arrependeu-se, chamou-se covarde, tolo, maricas, todos os nomes feios que um caráter fraco dá a si mesmo, quando perde uma ação. No dia seguinte meteu-se a caminho para Iguaçu.
Seis ou sete semanas depois, tornado de Iguaçu, a notícia da herança era pública. A primeira pessoa que o visitou foi o Senhor Alcântara, e força é dizer que a pena com que lhe apareceu era sincera. Ele o aceitara ainda pobre; é que deveras o estimava.
— Agora continua os seus estudos, não é? perguntou ele.
— Não sei, disse o rapaz; pode ser que não.
— Como assim?
— Estou com idéias de ir estudar na Europa, na Alemanha, por exemplo; em todo o caso, não irei este ano. Estou moço, não preciso ganhar a vida, posso esperar.
O Senhor Alcântara deu a notícia à família. Um irmão de Eulália não se teve que não lançasse em rosto à irmã os seus desdéns, e sobretudo a crueldade com que os manifestara.
— Mas se não gosto dele, e agora? dizia a moça.
E dizia isso arrebitando o nariz, e com um jeito de ombros, seco, frio, enfarado, amofinado.
— Ao menos confesse que é um moço de talento, insistiu o irmão.
— Não digo que não.
— De muito talento.
— Creio que sim.
— Se é! Que bonitos versos que ele faz! E depois não é feio. Você dirá que o Máximo é um rapaz feio?
— Não, não digo.
Uma prima, casada, teve para Eulália os mesmos reparos. A essa confessou Eulália que o Máximo nunca se declarara deveras, embora lhe mandasse algumas cartas.
— Podia ser caçoada de estudante, disse ela.
— Não creio.
— Podia.
Eulália — e aqui começa a explicar-se o título deste conto — Eulália era de um moreno pálido. Ou doença, ou melancolia, ou pó-de-arroz, começou a ficar mais pálida depois da herança do Iguaçu. De maneira que, quando o estudante lá voltou um mês depois, admirou-se de a ver, e de certa maneira sentiu-se mais ferido. A palidez de Eulália tinha-lhe dado uns trinta versos; porque ele, romântico acabado, do grupo clorótico, amava as mulheres pela falta de sangue e de carnes. Eulália realizara um sonho; ao voltar de Iguaçu o sonho era simplesmente divino.
Isto acabaria aqui mesmo, se Máximo não fosse, além de romântico, dotado de uma delicadeza e de um amor-próprio extraordinários. Essa era a outra feição principal dele, a que me dá esta novelita; porque se tal não fora... Mas eu não quero usurpar a ação do capítulo seguinte.
CAPÍTULO IV
— Quem é pobre não tem vícios. Esta frase ainda ressoava aos ouvidos de Máximo, quando já a pálida Eulália mostrava-se outra para com ele — outra cara, outras maneiras, e até outro coração. Agora, porém, era ele que desdenhava. Em vão a filha do Senhor Alcântara, para resgatar o tempo perdido e as justas mágoas, requebrava os olhos até onde eles podiam ir sem desdouro nem incômodo, sorria, fazia o diabo; mas, como não fazia a única ação necessária, que era apagar literalmente o passado, não adiantava uma linha; a situação era a mesma.
Máximo deixou de freqüentar a casa algumas semanas depois da volta de Iguaçu, e Eulália voltou as esperanças para outro ponto menos nebuloso. Não nego que as noivas começaram a chover sobre o recente herdeiro, porque negaria a verdade conhecida por tal; não foi chuva, foi tempestade, foi um tufão de noivas, qual mais bela, qual mais prendada, qual mais disposta a fazê-lo o mais feliz dos homens. Um antigo companheiro da Escola de Medicina apresentou-o a uma irmã, realmente galante, D. Felismina. O nome é que era feio; mas que é um nome? What is a name? como diz a flor dos Capuletos.
— D. Felismina tem um defeito, disse Máximo a uma prima dela, um defeito capital; D. Felismina não é pálida, muito pálida.
Esta palavra foi um convite às pálidas. Quem se sentia bastante pálida afiava os olhos contra o peito do ex-estudante, que em certo momento achou-se uma espécie de hospital de convalescentes. A que se seguiu logo foi uma D. Rosinha, criatura linda como os amores.
— Não podes negar que D. Rosinha é pálida, dizia-lhe um amigo.
— É verdade, mas não é ainda bem pálida, quero outra mais pálida.
D. Amélia, com quem se encontrou um dia no Passeio Público, devia realizar o sonho ou o capricho de Máximo; era difícil ser mais pálida. Era filha de um médico, e uma das belezas do tempo. Máximo foi apresentado por um parente, e dentro de poucos dias freqüentava a casa. Amélia apaixonou-se logo por ele, não era difícil — já não digo por ser abastado, — mas por ser realmente belo. Quanto ao rapaz, ninguém podia saber se ele deveras gostava da moça, ninguém lhe ouvia coisa nenhuma. Falava com ela, louvava-lhe os olhos, as mãos, a boca, as maneiras, e chegou a dizer que a achava muito pálida, e nada mais.
— Ande lá, disse-lhe enfim um amigo, desta vez creio que encontraste a palidez mestra.
— Ainda não, tornou Máximo; D. Amélia é pálida, mas eu procuro outra mulher mais pálida.
— Impossível.
— Não é impossível. Quem pode dizer que é impossível uma coisa ou outra? Não é impossível; ando atrás da mulher mais pálida do universo; estou moço, posso esperá-la.
Um médico, das relações do ex-estudante, começou a desconfiar que ele tivesse algum transtorno, perturbação, qualquer coisa que não fosse a integridade mental; mas, comunicando essa suspeita a alguém, achou a maior resistência em crer-lha.
— Qual doido! respondeu a pessoa. Essa história de mulheres pálidas é ainda o despeito que lhe ficou da primeira, e um pouco de fantasia de poeta. Deixe passar mais uns meses, e vê-lo-emos coradinho como uma pitanga.
Passaram-se quatro meses; apareceu uma Justina, viúva, que tratou de apoderar-se logo do coração do rapaz, o que lhe custaria tanto menos, quanto que era talvez a criatura mais pálida do universo. Não só pálida de si mesma, como pálida também pelo contraste das roupas de luto. Máximo não encobriu a forte impressão que a dama lhe deixou. Era uma senhora de vinte e um a vinte e dois anos, alta, fina, de um talhe elegante e esbelto, e umas feições de gravura. Pálida, mas, sobretudo, pálida.
Ao fim de quinze dias o Máximo freqüentava a casa com uma pontualidade de alma ferida, os parentes de Justina trataram de escolher as prendas nupciais, os amigos de Máximo anunciaram o casamento próximo, as outras candidatas retiraram-se. No melhor da festa, quando se imaginava que ele ia pedi-la, Máximo afastou-se da casa. Um amigo lançou-lhe em rosto tão singular procedimento.
— Qual? disse ele.
— Dar esperanças a uma senhora tão distinta...
— Não dei esperanças a ninguém.
— Mas enfim não podes negar que é bonita?
— Não.
— Que te ama?
— Não digo que não, mas...
— Creio que também gostas dela...
— Pode ser que sim.
— Pois então?
— Não é bem pálida; eu quero a mulher mais pálida do universo.
Como estes fatos se reproduzissem, a idéia de que Máximo estava doido foi passando de um em um, e dentro em pouco era opinião. O tempo parecia confirmar a suspeita. A condição da palidez que ele exigia da noiva, tomou-se pública. Sobre a causa da monomania disse-se que era Eulália, uma moça da Rua dos Arcos, mas acrescentou-se que ele ficara assim porque o pai da moça recusara o seu consentimento, quando ele era pobre; e dizia-se mais que Eulália também estava doida. Lendas, lendas. A verdade é que nem por isso deixava de aparecer uma ou outra pretendente ao coração de Máximo; mas ele recusava-as todas, asseverando que a mais pálida ainda não havia aparecido.
Máximo padecia do coração. A moléstia agravou-se rapidamente; e foi então que duas ou três candidatas mais intrépidas resolveram-se a queimar todos os cartuchos para conquistar esse mesmo coração, embora doente, ou parce que... Mas, em vão! Máximo achou-as muito pálidas, mas ainda menos pálidas do que seria a mulher mais pálida do universo.
Vieram os parentes de Iguaçu; o tio major propôs uma viagem à Europa; ele, porém, recusou. — Para mim, disse ele, é claro que acharei a mulher mais pálida do mundo, mesmo sem sair do Rio de Janeiro.
Nas últimas semanas, uma vizinha dele, em Andaraí, moça tísica, e pálida como as tísicas, propôs-lhe rindo, de um riso triste, que se casassem, porque ele não acharia mulher mais pálida.
— Acho, acho; mas se não achar, caso com a senhora.
A vizinha morreu daí a duas semanas; Máximo levou-a ao cemitério.
Mês e meio depois, uma tarde, antes de jantar, estando o pobre rapaz a escrever uma carta para o interior, foi acometido de uma congestão pulmonar, e caiu. Antes de cair teve tempo de murmurar.
— Pálida... pálida...
Uns pensavam que ele se referia à morte, como a noiva mais pálida, que ia enfim desposar, outros, acreditaram que eram saudades da dama tísica, outros que de Eulália, etc... Alguns crêem simplesmente que ele estava doido; e esta opinião, posto que menos romântica, é talvez a mais verdadeira. Em todo caso, foi assim que ele morreu, pedindo uma pálida, e abraçando-se à pálida morte. Pallida mors, etc.
*** *** https://www.literaturabrasileira.ufsc.br/documentos/?action=download&id=132416 *** ***
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*** *** https://www.youtube.com/watch?v=JRKzueqUSYE *** ***
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Damned by the Pope - Pallida Mors
858 visualizações16 de out. de 2015
Pull the Trigger Productions
67 inscritos
Directed and Edited by: Mallory Hord
Film Crew: Nathan Baergan, Levi Michael, and Mallory Hord
© Pull The Trigger Productions
*** *** https://www.youtube.com/watch?v=Fiad_eWpYbo *** ***
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Comissões
24/08/2021
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#CPIdaPandemia recebe Emanuel Catori, sócio da farmacêutica Belcher, nesta terça
Senadores da CPI ouvem o depoimento de Catori com o objetivo de esclarecer negociações para venda da vacina chinesa Convidecia, do laboratório Cansino.
*** *** https://www12.senado.leg.br/tv/plenario-e-comissoes/cpi-da-pandemia/2021/08/cpidapandemia-recebe-emanuel-catori-socio-da-farmaceutica-belcher-nesta-terca *** ***
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