quarta-feira, 30 de abril de 2025

"SENHORA LIBERDADE"

Poesia | Sempre a mesma primavera, de Pablo Neruda Mundo, mundo, vasto mundo Se eu me chamasse Raimundo Seria uma rima, não seria uma solução Mundo, mundo, vasto mundo Mais vasto é meu coração Eu não devia te dizer Mas essa Lua Mas esse conhaque Botam a gente comovido como o diabo Composição: Carlos Drummond de Andrade. Poema de Sete Faces Carlos Drummond de Andrade OPINIÃO Justiça que Condena, Política que Flutua O caso Débora, o pós-Bolsonaro e o desafio de reinventar a democracia representativa Por ARNALDO RAIMUNDO MARECHAL 🎵 Ouça "O Bêbado e a Equilibrista" – Aldir Blanc e João Bosco, na voz de Elis Regina. Símbolo da esperança em tempos de censura, sua melodia abre este artigo como um lembrete de que a resistência democrática, muitas vezes, se expressa melhor pela arte do que pela retórica. O Brasil enfrenta um momento-chave na consolidação de sua democracia constitucional. A resposta institucional ao 8 de Janeiro de 2023, somada ao declínio do bolsonarismo eleitoral e à recente reorganização da centro-direita, expõe com crueza a frágil maturidade de nossas instituições — sejam elas judiciais, sejam partidárias. Do lado da justiça, o artigo “O paradoxo de Sobral Pinto” – Elio Gaspari, O Globo, 30 de abril de 2025, revisita um caso emblemático: a condenação a 14 anos de prisão de Débora Rodrigues dos Santos, cabeleireira que pichou com batom a estátua da Justiça durante a intentona bolsonarista em Brasília. Embora sua conduta seja moral e juridicamente reprovável, a sentença que a alcançou foi desproporcional e — como bem apontado pelo voto vencido do ministro Luiz Fux — descolada dos fatos objetivos. Gaspari aponta o “paradoxo de Sobral Pinto”: o defensor heroico das liberdades, antes foi promotor da repressão aos tenentes insurgentes nos anos 1920. Os julgamentos do presente carregam, portanto, o risco da obsolescência moral futura. A justiça que se pretende pedagógica pode se transformar em instrumento de injustiça simbólica. Os julgadores de hoje, como os promotores de ontem, devem temer a lápide da História mais do que os aplausos das redes. No meio desse processo, é impossível não recordar que durante a ditadura varguista — quando a repressão já rondava os estúdios e as rádios — surgiram vozes de contestação que, de forma sutil ou frontal, denunciavam o autoritarismo. 🎵 Ouça “O Bonde de São Januário” – Wilson Batista e Ataulfo Alves. Entre metáforas e ironias, a canção tornou-se um hino do trabalhador urbano que resistia ao controle ideológico do Estado Novo. A música popular brasileira, desde sempre, atravessou as ditaduras com coragem poética. Na arena política, como mostrou “Federação e fusão de partidos miram o pós-Bolsonaro” – Luiz Carlos Azedo, Correio Braziliense, 30 de abril de 2025, as movimentações partidárias da centro-direita já ignoram a figura de Bolsonaro como peça eleitoral viável. PP e União Brasil formaram uma federação poderosa — União Progressista —, enquanto PSDB e Podemos preparam sua fusão como alternativa centrista. As elites políticas, notadamente as de perfil liberal-conservador, buscam reconfigurar o tabuleiro com olhos em 2026, sem ancorar-se nas carismáticas — e instáveis — lideranças familiares. A questão é: representam quem? Como ao longo de toda a história brasileira pós-Segunda Guerra, o sistema partidário se equilibra entre uma retórica desenvolvimentista e práticas patrimonialistas. A UDN, o PSD varguista, a Arena da ditadura, o PFL da Nova República e agora os blocos como PL, União, PSD e PP operam, em larga medida, como estruturas de mediação de interesses econômicos, regionais e corporativos, sem densidade ideológica contínua. Ao contrário, PT, PDT e PSOL buscam manter vínculos com camadas organizadas do trabalho e dos movimentos sociais, mas também enfrentam dilemas de representação e renovação. A trajetória da direita e centro-direita brasileiras, portanto, nunca esteve totalmente dissociada do pragmatismo. Mas agora, com a erosão do bolsonarismo e a rejeição crescente ao autoritarismo retórico, o campo está aberto a um novo tipo de disputa política: aquela que não se sustenta na figura de um "mito", mas sim em programas e compromissos democráticos minimamente consistentes. Essa reinvenção só será possível se acompanhada de uma reforma da cultura política — que una responsabilidade fiscal a justiça social, e justiça punitiva a proporcionalidade. Como lembrou o ministro Alcides Carneiro, na ditadura: “Se não absolveu por compaixão, não condenou por fraqueza”. É esse espírito que deve guiar não só os magistrados, mas também os partidos, os eleitores e os jornalistas. 🎵 Ouça “Senhora Liberdade” – Wilson Moreira e Nei Lopes. Esta canção ecoou nas ruas quando Tancredo foi eleito presidente em 1985 — embora tenha morrido antes da posse. Símbolo da redemocratização, ela encerra este artigo como canto de esperança: a liberdade ainda tem muito a ensinar a quem hoje ocupa o poder. Referências históricas e contextuais Gaspari, Elio. O paradoxo de Sobral Pinto – O Globo, 30/04/2025 Azedo, Luiz Carlos. Federação e fusão de partidos miram o pós-Bolsonaro – Correio Braziliense, 30/04/2025 Canções populares: “O Bêbado e a Equilibrista” – João Bosco & Aldir Blanc “O Bonde de São Januário” – Wilson Batista & Ataulfo Alves “Senhora Liberdade” – Wilson Moreira & Nei Lopes

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