quinta-feira, 6 de junho de 2019

- Bom dia Comandante!


- O anspeçada primeiro não queria acordar o comandante. Eram ordens. Leônidas insistiu firme e o comandante teve de pular da cama.



- Bom dia Carcereiro!


Bom dia Comandante!

Paulo Preto transforma prisão em academia e via Eduardo Cunha como rival
Preso pela Lava Jato, ex-diretor da Dersa se aproximou de ex-governador do PSDB

04/06/2019 - 17h27min

FOLHAPRESS
Wálter Nunes

CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) - Logo no início da manhã, assim que as celas são abertas, o detento Paulo Vieira de Souza veste roupas para ginástica e segue até o portão, no início do corredor. Enche os pulmões e dispara em direção ao fundo da ala. Quando chega à parede ao final da galeria, gira o corpo e, com rapidez, volta no mesmo trote.

Conhecido como Paulo Preto, o engenheiro repete a série dezenas de vezes durante boa parte da manhã, no Complexo Médico Penal de Pinhais, no Paraná. Depois faz musculação, suspendendo com os braços garrafas pets cheias de água, usadas no presídio como pesos de academia.

Acusado de ser operador de caixa dois de campanhas do PSDB, o ex-diretor da Dersa, estatal paulista que cuida de obras viárias, vangloria-se do porte atlético, surpreendente para um senhor de 70 anos.

Sou "iron man" (homem de ferro), repete para os colegas de presídio, em referência ao fato de ser praticante de triátlon, modalidade que combina pedaladas, corrida e natação em grandes distâncias.

Paulo Preto foi preso três vezes na Lava Jato. Duas delas em um processo que corre em São Paulo no qual é acusado pela Procuradoria de beneficiar quatro empregadas com apartamentos e auxílios-mudança que deveriam ir para os reassentados pela obra viária do Rodoanel. Nenhuma delas morava no traçado.

Ele saiu da cadeia nas duas ocasiões graças a um habeas corpus do ministro Gilmar Mendes (STF). Ainda assim, acabou condenado em primeira instância a 145 anos de prisão.


Ex-diretor da Dersa Paulo Vieira de Souza, conhecido como Paulo Preto – TV Globo Reprodução


A terceira prisão, em fevereiro, veio pela Lava Jato de Curitiba. Os procuradores acusaram o engenheiro de operar dinheiro ilícito com o setor de propinas da Odebrecht.

A juíza Gabriela Hardt, que até abril substituiu Sergio Moro à frente da Lava Jato, foi quem determinou a prisão.

Segundo um preso que convive com ele no Complexo Médico Penal, o engenheiro diz que não ficará muito tempo atrás das grades. Repete pelos corredores que seu "goleiro" o tiraria dali. Mas o ex-diretor da Dersa nunca revelou o nome verdadeiro do dono desse apelido.

Durante pouco mais de duas semanas, entre o final de março e o início de abril, Paulo Preto conviveu na prisão com o ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB). O político tucano foi preso sob suspeita de desvios de verbas da educação do estado.

Richa ocupou uma cela especial antes do portão da entrada da sexta galeria, onde ficavam os presos da Lava Jato. O espaço antes era um lugar de descanso para os carcereiros.

Após a prisão do ex-presidente Lula, o quarto foi reformado para abrigar o petista, caso a Justiça decidisse transferi-lo para um presídio estadual --desde abril do ano passado Lula cumpre em uma sala da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba.

Paulo Preto, assim que terminava seus exercícios matinais, seguia para a cela de Richa, onde ficava por horas. Os dois ficaram conhecidos na galeria como a turma do 45, referência ao número de campanha do PSDB.

Richa saiu da cadeia em 4 de abril. Paulo Preto buscou então novas alianças.
Em uma disputa velada contra o ex-deputado Eduardo Cunha (MDB) pela liderança da ala, o engenheiro passou a conversar mais com outros presos.

Após a libertação de um advogado capturado em uma operação de combate à corrupção, Paulo Preto pediu para ficar com os pertences que o colega deixaria para trás. Não porque precisasse de algo. Mas porque doaria esse material para um novo detento, na tentativa de angariar sua simpatia.

Paulo Preto tinha percebido que Cunha fazia algo parecido, ao fornecer colchões a internos que chegavam na sexta galeria.

Há duas semanas, Paulo Preto e os presos da Lava Jato foram transferidos da sexta galeria para um espaço no Hospital Penitenciário, que fica dentro do Complexo Médico Penal e estava fechado aguardando reformas.

O Depen (Departamento Penitenciário do Paraná) justificou a troca de local dizendo que, nos quatro primeiros meses do ano, houve aumento de 3.635 presos no sistema paranaense e que novas vagas não foram criadas. Já a sexta galeria tinha espaço ocioso, com 35 presos e 96 vagas.

Foi criada, então, a sétima galeria, com celas coletivas para sete pessoas.

O hospital permanecerá fechado e lá agora estão os presos da Lava Jato e de outras operações policiais que miram crimes do colarinho branco.

Paulo Preto não terá mais que competir com Eduardo Cunha pelo protagonismo do lugar. O ex-deputado foi transferido na última sexta-feira (31) para um presídio do Rio, onde mora sua família.





Bom dia Carcereiro!

Candidatos à PGR criticam eventual escolha de Dodge fora da lista tríplice


A procuradora-geral da República, Raquel Dodge
Imagem: Fábio Motta - 25.mar.2019/Estadão Conteúdo

Bernardo Barbosa
Do UOL, em São Paulo
04/06/2019 20h13Atualizada em 04/06/2019 22h33


Candidatos à PGR (Procuradoria-Geral da República) que participaram hoje de debate em São Paulo criticaram a possibilidade da recondução ao cargo da atual procuradora-geral, Raquel Dodge, fora da lista tríplice eleita por procuradores federais. A votação está marcada para o dia 18.

Ao contrário dos dez procuradores que participaram do debate hoje, Dodge não se declarou candidata a mais um mandato de dois anos --o dela termina em setembro. No entanto, recentemente sinalizou estar disponível a prosseguir no cargo ao dizer que continuaria "a serviço" da instituição e do país. O procurador-geral ou procuradora-geral será escolhido(a) pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) --de cuja equipe Dodge teria recebido um aceno no sentido de que poderia ser novamente indicada ao cargo.

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Por lei, Bolsonaro não tem a obrigação de escolher um nome da lista tríplice eleita pelos membros da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) e precisa apenas indicar um integrante desta carreira. O presidente já deu declarações no sentido de que não ficará preso à lista --como fez Fernando Henrique Cardoso em 2001. De lá para cá, os presidentes Lula (PT), Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB) sempre escolheram um dos três nomes escolhidos pelos procuradores,

Para o subprocurador-geral Mário Bonsaglia, que figurou nas últimas duas listas tríplices para a PGR, uma eventual recondução de Dodge causará "surpresa, porque ela participou da eleição de 2017 e se comprometeu com a lista tríplice”.

"Se queria outro mandato, deveria ter se inscrito de novo", afirmou.


Candidatos à PGR participam do debate em São Paulo
Imagem: Divulgação/ANPR


Com a ressalva de que falava em tese, porque Dodge não disse publicamente que quer continuar na PGR, o procurador regional José Robalinho Cavalcanti, ex-presidente da ANPR, disse que uma eventual recondução dela ao cargo seria pior do que a escolha de alguém fora da lista tríplice.

"Ela tem contas a prestar. Não a nós apenas, mas à sociedade. Ela exerceu a procuradoria-geral por dois anos e, em vez de enfrentar um processo dialógico como nós, ela prefere se ocultar de todo o processo e depois tentar uma indicação para mais dois anos, indo contrário a tudo o que ela defendeu", disse. "Mas eu realmente não acredito que isso aconteça”.

Para o procurador regional Vladimir Aras, Dodge "deveria estar conosco debatendo, se legitimando, como outros procuradores-gerais fizeram", como Antônio Fernando de Souza, Roberto Gurgel e Rodrigo Janot.

A subprocuradora-geral Luiza Frischeisen também lembrou que estes procuradores-gerais disputaram a indicação para a lista tríplice. "Acho que, se ela [Dodge] pretende ser reconduzida, deveria ter concorrido", disse. "A lista é muito importante para nós, que somos mais de 1.100 procuradores”.

O procurador regional Lauro Cardoso declarou que Dodge, caso pretenda permanecer no cargo, deveria participar da eleição junto à categoria. Segundo ele, a disputa "constitui, embora não seja obrigatória a observância da lista, um diálogo respeitoso da carreira com o presidente da República”.

Tentam "implodir" lista, diz candidato

Os candidatos também falaram sobre a possibilidade da indicação, em geral, de um procurador que não integre a lista tríplice e afirmaram que alguém escolhido desta forma não teria legitimidade junto à classe para conduzir a PGR. O subprocurador Augusto Aras, por exemplo, se colocou como candidato "por fora”.

Para Vladimir Aras --que é primo de Augusto-- "há uma tentativa interna de implosão da lista, mais do que externa", o que considerou preocupante para a "legitimação da liderança" do procurador-geral.

Aras, no entanto, não citou nomes que estariam tentando "implodir" a lista. "Não quero fulanizar a questão", disse.

Lauro Cardoso também disse que a votação para a lista faz parte de "um processo de legitimação" para que o procurador-geral "possa exercer sua função com autonomia, independência funcional e exerça a liderança em uma instituição que não é organizada na base da hierarquia”.

Mário Bonsaglia disse confiar que a escolha do sucessor de Raquel Dodge será feita com base na lista tríplice e que as candidaturas fora dela "não têm condições de prosperar”.

José Robalinho Cavalcanti, por sua vez, afirmou que "não há por que acreditar" que Bolsonaro indicará alguém fora da lista tríplice.

"Ele sempre foi uma pessoa defensora de um Ministério Público atuante e independente, escolheu como ministro da Justiça um dos ícones da Lava Jato (Sergio Moro). Ele sabe que a Lava Jato seria uma sombra do que foi sem a lista tríplice", disse.

Segundo Luiza Frischeisen, os procuradores ficariam decepcionados caso o presidente não escolha um integrante da lista tríplice.

"O MPF entende que esse é um patrimônio institucional, que a gente conseguiu construir", disse. "Ele pode escolher fora da lista, mas, se ele escolher da lista, nós do MPF ficaremos mais satisfeitos, com certeza”.

A Constituição impõe a formação de uma lista tríplice para a escolha dos procuradores-gerais dos Ministérios Públicos estaduais, o que costuma ser usado como argumento por defensores do uso deste mecanismo para a escolha do procurador-geral da República.

No entanto, a mesma Constituição não traz as mesmas condições para a definição do mais alto cargo do MPF. Segundo o artigo 128, o procurador-geral da República deve ser "nomeado pelo presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de 35 anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução”.

Além dos entrevistados, concorrem à lista tríplice os procuradores Antônio Carlos Fonseca, Blal Dalloul, José Bonifácio de Andrada, Nívio de Freitas e Paulo Bueno. Os candidatos já estiveram em Belém e Recife. Amanhã, debatem no Rio de Janeiro. Porto Alegre (dia 11) e Brasília (dia 14) receberão os últimos debates antes da eleição da lista.



Revolução Constitucionalista de 1932
São Paulo pega em armas: a Revolução Constitucionalista de 1932




Sem dúvida um dos mais importantes e dramáticos acontecimentos da história republicana brasileira. Expressão da insatisfação dos paulistas com a Revolução de 1930, o movimento serviu, antes de mais nada, para convencer o Governo Provisório de Getúlio Vargas da necessidade de pôr fim ao caráter discricionário do regime sob o qual vivia o país. Isto só aconteceria quando a constituição de 1890, tornada sem efeito, fosse substituída por outra

Mas por quê a decisão de pegar em armas?



Se o Partido Republicano Paulista (PRP) congregava as forças conservadoras do estado, por outro lado, o Partido Democrático de São Paulo desde o início se envolveu com a campanha da Aliança Liberal e com as articulações da Revolução de 1930. É sabido que o estado de São Paulo foi a principal base política da chamada República Velha e do sistema oligárquico por ela instaurado, ou seja, representava exatamente aquilo que o movimento de 1930 pretendia mudar.
Pode-se compreender, portanto, como seria difícil estabelecer, após a vitória da revolução, um novo equilíbrio de forças no estado. Deposto o presidente Washington Luís, e enquanto o país passava a ser governado por uma junta militar, o governo paulista foi assumido pelo comandante da 2ª Região Militar, general Hastínfilo de Moura. Nesse momento, o PD forneceu a maioria do novo secretariado. Mas, logo em seguida, Getúlio Vargas assumiu a chefia do Governo Provisório e, pressionado pela liderança tenentista, decidiu nomear um delegado militar para governar São Paulo, o tenente João Alberto Lins de Barros.



Ficou clara, então, a divergência entre os projetos políticos dos paulistas e dos tenentes. João Alberto governou até 13 de julho de 1931, e no período seguinte houve grande instabilidade: Plínio Barreto (paulista, civil e constitucionalista, mas fiel ao Governo Provisório e indicado por João Alberto) foi cogitado para interventor, mas desistiu; Laudo Ferreira de Camargo (também paulista e civil, apresentado como solução de compromisso, embora sem o apoio do PD e do PRP), tomou posse mas renunciou em novembro de 1931; finalmente assumiu Manuel Rabelo, que não contou com o apoio dos constitucionalistas, por ser militar e ligado aos tenentes.
Em fevereiro de 1932 a situação se agravou. O PD rompeu com Vargas e seu governo, ao mesmo tempo que se aproximaou dos antigos adversários do PRP, formando a Frente Única Paulista (FUP), que se tornou a porta-voz das reivindicações de reconstitucionalização e de autonomia administrativa para o estado de São Paulo. Mais do que isso, a FUP passou a articular, junto aos meios militares e a algumas das principais entidades de classe do patronato paulista, a preparação de um movimento armado contra o Governo Provisório.




Vargas, por seu lado, procurando contornar a situação, optou pela nomeação de Pedro de Toledo para a interventoria paulista, quase ao mesmo tempo em que apresentava o novo Código Eleitoral (ambas as medidas de fevereiro de 1932) e marcava eleições para 1933 (em maio). Esse recuo, no entanto, não conseguiu estancar a exaltação da FUP e dos paulistas em geral, apesar de o PD, a essa altura, já controlar o secretariado do novo interventor. A morte de estudantes em um confronto com forças legais acabou introduzindo no cenário político o ingrediente que faltava: mártires. Suas iniciais – Miragaia, Martins, Dráusio e Camargo – passaram a designar a sociedade secreta MMDC, interessada em articular a derrubada de Vargas.
A 9 de julho de 1932 eclodiu na capital paulista a Revolução Constitucionalista, liderada pelo general Isidoro Dias Lopes, o mesmo do levante de 1924. Contando com a participação de vários remanescentes do movimento de 1930, como os militares Bertoldo Klinger e Euclides Figueiredo, a revolução contou com amplo apoio dos mais diversos segmentos das camadas médias paulistas.




Nos poucos meses de conflito, São Paulo viveu um verdadeiro esforço de guerra. Não apenas as indústrias se mobilizaram para atender às necessidades de armamentos, mas também a população se uniu na chamada Campanha do Ouro para o Bem de São Paulo. Pela primeira vez buscavam-se iniciativas não apenas militares para romper o isolamento a que o estado fora submetido. Faltou, no entanto, a esperada adesão das forças mineiras e gaúchas. Os governos de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul, embora apoiassem a luta pela constitucionalização, decidiram manter-se leais ao Governo Provisório.
Isolado, o movimento fracassou. Em 1º de outubro de 1932 foi assinada a rendição que pôs fim à Revolução Constitucionalista. Enquanto os principais líderes tiveram seus direitos políticos cassados e foram deportados para Portugal, o general Valdomiro Lima – gaúcho e tio de Darcy Vargas, mulher de Getúlio – era nomeado interventor militar em São Paulo, cargo em que permaneceria até 1933.
Das armas ao voto: o saldo da Revolução de 1932




Se, do ponto de vista militar, os paulistas saíram derrotados do movimento de 1932, o mesmo não se pode dizer em relação à política e à economia. São Paulo continuava a ser o principal fornecedor de divisas do país, num quadro de crise econômica mundial e de queda do preço do café no mercado internacional. Assim pressionado, o Governo Provisório manteve a política de valorização do café, comprando e retendo estoques, além de permitir o reescalonamento das dívidas dos cafeicultores e aceitar bônus de guerra como moeda legal, entre outras medidas.
Em termos políticos, o que se verificou na prática foi o fortalecimento do projeto constitucionalizante, com Vargas reativando a comissão que elaboraria o anteprojeto de Constituição e com a criação de novos partidos para concorrer às eleições para a Assembléia Nacional Constituinte. Estas, realizadas em maio de 1933, deram a vitória à Chapa Única por São Paulo Unido, composta por membros da FUP que haviam permanecido no país e amplamente dominada por representantes do PRP. Além disso, em agosto de 1933, São Paulo finalmente viu chegar um civil e paulista à chefia do governo do estado, com a indicação de Armando de Sales Oliveira para substituir o general Valdomiro Lima. Em 1935, Armando Sales foi eleito governador constitucional de São Paulo pela Assembléia Constituinte Estadual.
Regina da Luz Moreira
Para saber mais:
Dica: na consulta, escolha TODOS ARQUIVOS, clique no tipo de documento desejado (se quiser ver mais fotos, escolha AUDIOVISUAL), selecione da lista de assuntos Revolução Constitucionalista de 1932, Frente Única Paulista, Partido Democrático de São Paulo, Campanha do Ouro para o Bem de São Paulo, Legião Revolucionária de São Paulo (1930-1932), ou aos personagens envolvidos e execute a pesquisa.
Sugerimos a leitura de alguns verbetes que se encontram disponíveis no Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro, tais como: O Estado de São Paulo, Revolução de 1932 e Getúlio Vargas.
Muitos outros textos sobre o tema podem ser consultados no dossiê Navegando na História - A era Vargas (1º tempo), particularmente os módulos Anos 20 e Anos de Incerteza.
Outros documentos e informações relacionadas ao assunto estão disponíveis on-line. Basta realizar a consulta em nossa base de dados Accessus.






Guerra Civil



- O anspeçada primeiro não queria acordar o comandante. Eram ordens. Leônidasinsistiu firme e o comandante teve de pular da cama.



Contos Avulsos por 
Alcântara Machado
Guerra Civil



Em Caguaçu os revolucionários. Em São Tiago os legalistas. Entre os dois indiferente o rio Jacaré. O delegado regional de Boniteza mandara recolher as barcas e as margens só podiam mesmo estreitar relações no infinito. De dia não acontecia nada. Os inimigos caçavam jararacas esperando ataques que não vinham. Por isso esperavam sossegados. Inutilmente os urubus no vôo lindo deles se cansavam indo e vindo de bico esfomeado. Os guerreiros gozavam de perfeita saúde.
De noite tinha o silêncio. Qualquer barulho assustava. Os soldados de guarda se preparavam para morrer no seu posto de honra. Mas era estalo de árvores. Ou correria de bicho. A madrugada se levantava sem novidades. Por isso a luta entre irmãos decorria verdadeiramente fraternal.
Porém uma manhã chegou a Boniteza a notícia de que do lado de Caguaçu qualquer coisa de muito grave se preparava. Tropas marchavam na direção do rio trazendo canhões, carros de combate, grande provisão de gases asfixiantes comprada na Argentina, aeroplanos, bombas de dinamite, granadas de mão e dinheiro, todos esses elementos de vitória. Um engenheiro russo construiria em dois tempos uma ponte sobre o Jacaré e o resto seria uma corrida fácil até a capital do país. Desta vez a cousa iria mesmo.
Boniteza se surpreendeu mas não se acovardou. Com rapidez e entusiasmo começou a preparar tudo para a defesa. Ao longo do rio se abriu uma trincheira inexpugnável. Caminhões descarregaram tropas em todos os pontos. As metralhadoras foram ajustadas, os fuzis engraxados, os caixotes de munições abertos. Costureiras solícitas pregaram botões nas fardas das praças mais relaxadas. Nas barbearias os vidros de loção estrangeira se esvaziaram na cabeça dos sargentos. Era de guerra o ar que se respirava.
A noite encontrou os combatentes a postos. Na trincheira eles velavam apoiados nos fuzis. Sentinelas foram destacadas para vigiar a margem inimiga. Entre elas o sorteado Leônidas Cacundeiro.
Era infeliz porque sofria de dor de dentes crônica, piscava sem parar e gaguejava. Foi para o seu posto de observação, deitou-se de barriga num cobertor velho. Só o busto meio erguido, ficou olhando na frente dele de fuzil na mão. Tinha ordens severas: vulto que aparecesse era mandar tiro nele. Sem discutir.
Leônidas Cacundeiro deu de pensar. Pensava uma cousa, o ventinho frio jogava o pensamento fora, pensava outra. Tudo quieto. Ainda bem que havia luar. Do alto da ribanceira ele examinava as águas do Jacaré. Ou então erguia o olhar e descobria nas nuvens a cabeleira de um maestro, um cachorro sem rabo, duas velhinhas, pessoas conhecidas.
Agora o frio era o frio da madrugada. O Doutor Adelino costumava dizer: Quando vocês sentirem frio pensem no Pólo Norte e sentirão logo calor. Pensou no Pólo Norte. Lembranças vagas de uma fita vista há muito tempo. Gelo e gelo e mais gelo. No meio do gelo um naviozinho encalhado. Homens barbudos, jogando fumaça pela boca, encapotados e enluvados, com cachorros felpudos. Duas barracas à esquerda. E aquela branquidão. Forçou bem o olhar. Um urso pardo com duas bandeirinhas. Um urso em pé com uma bandeirinha na pata direita, outra bandeirinha na pata esquerda. Nenhuma arma.
Deu um berro: - Alto!
Ficou em posição de tiro. O soldado não podia mesmo dar um passo à frente senão caía no rio. Começou a mexer com os braços. Levantava uma bandeirinha, abaixava outra, levantava as duas.
Leônidas pensou: - Que negócio será aquele?
Foi chamar o sargento. O sargento veio, olhou muito, disse: - Que negócio será aquele? Vá chamar o tenente!
Leônidas foi chamar o tenente, veio correndo com ele. O tenente limpou os óculos com o lenço de seda, verificou se o revólver estava armado, olhou muito, falou coçando a nuca: - Que negócio será aquele? Vá chamar o major!
Leônidas partiu em busca do major. No acampamento não estava. Foi até Boniteza. Encontrou um cabo. O cabo mandou Leônidas bater na casa da viúva Dona Birigüi ao lado do Correio. O major apareceu na janela com má vontade. Resmungou: - Já vou. Leônidas comboiou o major até o rio, o major teve uma conferência com o tenente, subiu num pé de pitanga, falou lá de cima: - Que negócio será aquele? Vá chamar o comandante!
O anspeçada primeiro não queria acordar o comandante. Eram ordens. Leônidas insistiu firme e o comandante teve de pular da cama. Leônidas fazendo continência explicou o caso. O coronel disse:
- Às seis estou lá.
Eram cinco, Leônidas voltou com o recado. O major, o tenente, o sargento estavam nervosos. De vez em quando um deles chegava mais perto da margem e o soldado do outro lado recomeçava a ginástica: bandeirinha na frente, bandeirinha atrás, bandeirinha apontando o céu, bandeirinha apontando o chão. Ia repetindo com uma paciência desgraçada.
Então já havia passarinhos cantando, barulho de vida em Boniteza, só a cara amarrotada dos insones não resplendia na luz da manhãzinha. Toques de cometa chegavam de longe despedaçados. Na banda de lá do Jacaré o homem da bandeirinha habitava sozinho a paisagem com uma vontade louca de tomar café bem quente e bem forte. Era a hora da raiva e todos se espreguiçavam com o sol que chegava.
O Coronel Jurupari ouviu calado a narração do estranho caso. Fez em seguida duas ou três perguntas hábeis com o intuito de esclarecê-lo tanto quanto possível. Chamou de lado o major e o tenente, os três discutiram muito, emitiram suas opiniões sobre assuntos de estratégia e balística que pareciam oportunos naquela emergência, fumaram vários cigarros. Afinal o coronel entre o major e o tenente avançou até a margem de binóculo em punho. Assim que ele assentou o binóculo, da outra banda do Jacaré recomeçou a dança das bandeirinhas. O coronel olhando. A sua primeira observação foi: - É um cabo e não tem má cara. Depois de uns minutos veio a segunda: - Hoje é dor de cabeça na certa com este noroeste. A terceira alimentou ainda mais a já angustiosa incerteza dos presentes: - Mas que negócio será aquele? Daí a uns instantes repetiu: - Mas que diabo de negócio será mesmo aquele? Porém acrescentou numa ordem para o Leônidas: - Vá chamar o sinaleiro!
O sinaleiro veio chupando o nariz. Olhou, deu uma risadinha, tirou um papel e um lápis do bolso traseiro da calça, ajoelhou-se com uma perna só, pôs o papel na coxa da outra, passou a ponta do lápis na língua, começou a tomar nota. Dava uma espiada, as bandeirinhas se mexiam, escrevia. O Coronel Jumpari, o major, o tenente, o sargento e o sorteado Leônidas Cacundeiro esperavam o resultado de armas na mão e ansiedade nos olhos.
O sinaleiro se levantou, ficou em posição de sentido e com voz pausada e firme leu a mensagem enviada pelos revolucionários de Caguaçu: Saúde e Fraternidade.
O coronel mandou responder agradecendo e retribuindo. Ex-corde.



Contos Avulsos por 
Alcântara Machado
Guerra Civil
 



Obras – Antônio de Alcântara Machado


- O anspeçada primeiro não queria acordar o comandante. Eram ordens. Leônidasinsistiu firme e o comandante teve de pular da cama.


Referências

https://f.i.uol.com.br/fotografia/2019/03/01/15514843585c79c5c6ed87d_1551484358_3x2_xl.jpg
https://gauchazh.clicrbs.com.br/politica/noticia/2019/06/paulo-preto-transforma-prisao-em-academia-e-via-eduardo-cunha-com-rival-cjwi98yex02hn01lxycwj0mll.html
https://conteudo.imguol.com.br/c/noticias/a5/2019/03/25/a-procuradora-geral-da-republica-raquel-dodge-durante-o-seminario-transparencia-e-combate-a-corrupcao-realizado-na-manha-desta-segunda-feira-25-de-marco-de-3019-no-museu-do-amanha-no-centro-da-1553530289288_v2_900x506.jpg
https://conteudo.imguol.com.br/c/noticias/a3/2019/06/04/4jun2019---candidatos-a-pgr-procuradoria-geral-da-republica-participam-de-debate-na-sede-da-procuradoria-regional-da-republica-da-3-regiao-em-sao-paulo-1559690474150_v2_600x337.jpg
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/06/04/candidatos-a-pgr-criticam-eventual-escolha-de-dodge-fora-da-lista-triplice.htm
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https://pt.wikisource.org/wiki/Guerra_Civil

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