ao som de um oficlide e de uma flauta
De certo
modo terpsícore não tem definição, vem da mitologia grega como nome
de uma deusa que tem como atributo a dança, assim o nome terpsícore se
define como "delicia de dançar", seu estilo puxa para a dança da
lira um som suave e romântico.
Terpsícore
Musa da
dança
Musa da
Música e da dança óleo sobre tela de
Jean-Marc Natier 1739
A culpa foi de um oficlide e de uma flauta.
Terpsícore
Terpsícore
A esperança é a apólice do pobre; ele
ficou abastado por alguns dias.
Os números eram bonitos. Ele, que não
tinha cabeça aritmética, já os levava de cor. Eram bonitos, bem combinados,
principalmente um deles, por causa de um 5 repetido e de um 9 no meio. Não era
certo, mas podia ser que tirasse alguma coisa.
E por que é que não havia de ser? Em
que é que as outras moças eram melhores que ela? Não fosse ele pobre, e ela
andaria de carro...
— Mas é justamente isso, Porfírio;
nós não podemos.
Calava-se por superstição; não queria
assustar a fortuna.
Glória, arrastada por ele, entrou
também a dançar a sério, na sala estreita, sem orquestra nem espectadores.
Contas, aluguéis atrasados, nada veio ali dançar com eles.
Mas a fortuna espreitava-os.
Dias depois, andando a roda, um dos
bilhetes do Porfírio saiu premiado, tirou quinhentos mil-réis.
Deus não desampara os seus.
— A primeira coisa é ter em caixa,
logo, uns duzentos ou trezentos mil-réis.
Glória ouvia em boa-fé, pois só sabia
contar por dúzias; as centenas de mil-réis não lhe entravam na cabeça. Ouvia em
boa-fé, calada, com os olhos nele, que ia contando devagar para não errar.
Feitas as contas, sobravam perto de duzentos mil-réis.
— Duzentos? Vamos botar na Caixa.
— Quem é que precisa de um vestido de
seda, coisa chique, feito na modista?
— Deixa disso, Porfírio. Que vestido,
o quê? Pobre não tem luxo. Bota o dinheiro na Caixa.
— O resto boto; mas o vestido há de
vir. Não quero mulher esfarrapada. Então, pobre não veste? Não digo lá comprar
uma dúzia de vestidos, mas um, que mal faz? Você pode ter necessidade de ir a
alguma parte, assim mais arranjadinha. E depois, você nunca teve um vestido
feito por francesa.
— Você é uma santa. Vive aqui metida
no trabalho; entra mês, sai mês, e nunca se diverte: nunca tem um dia que se
diga de refrigério. Isto até é mau para a saúde.
— Pois vamos passear.
— Não digo isso. Passear só não
basta. Se passear bastasse, cachorro não morria de lepra, acrescentou ele,
rindo muito da própria idéia. O que eu digo é outra coisa. Falemos franco,
vamos dar um pagode.
— No dia da Glória, vamos à festa da
Glória. Porfírio refletiu um instante.
— Uma coisa não impede a outra, disse
ele. Não convido muita gente, não; patuscada de família; convido o Firmino e a
mulher, as filhas do defunto Ramalho, a comadre Purificação, o Borges...
— Mais ninguém, Porfírio; isso basta.
Depois de um jantar simples e alegre,
começou o baile, que foi de estrondo, tão concorrido que não se podia andar.
E voltava logo batendo palmas,
bradando que não esfriassem, que um dia não eram dias, que havia tempo de
dormir em casa.
Então o oficlide roncava alguma
coisa, enquanto as últimas velas expiravam dentro das mangas de vidro e nas
arandelas.
Publicado
originalmente em Gazeta de Notícias, de 25/3/1886.
Glória,
abrindo os olhos, deu com o marido sentado na cama, olhando para a parede, e
disse-lhe que se deitasse, que dormisse, ou teria de ir para a oficina com
sono.
— Que dormir
o quê, Glória? Já deram seis horas.
— Jesus! Há
muito tempo?
— Deram
agora mesmo.
Glória
arredou de cima de si a colcha de retalhos, procurou com os pés as chinelas,
calçou-as, e levantou-se da cama; depois, vendo que o marido ali ficava na
mesma posição, com a cabeça entre os joelhos, chegou-se a ele, puxou-o por um
braço, dizendo-lhe carinhosamente que não se amofinasse, que Deus arranjaria as
coisas.
— Tudo há de
acabar bem, Porfírio. Você mesmo acredita que o senhorio bote os nossos trastes
no Depósito? Não acredite; eu não acredito. Diz aquilo para ver se a gente
arranja o dinheiro.
— Sim, mas é
que eu não arranjo, nem sei onde hei de buscar seis meses de aluguel. Seis
meses, Glória; quem é que me há de emprestar tanto dinheiro? Seu padrinho já
disse que não dá mais nada.
— Vou falar
com ele.
— Qual, é à
toa.
— Vou,
peço-lhe muito. Vou com mamãe; ela e eu pedindo...
Porfírio
abanou a cabeça.
— Não, não,
disse ele. Você sabe o que é melhor? O melhor é arranjar casa por estes dias,
até sábado; mudamo-nos, e depois então veremos se se pode pagar. Seu padrinho o
que podia era dar uma carta de fiança... Diabo! tanta despesa! Conta em toda a
parte! é a venda! é a padaria! é o diabo que os carregue. Não posso mais. Gasto
todo o santo dia manejando a ferramenta, e o dinheiro nunca chega. Não posso,
Glória, não posso mais...
Porfírio deu
um salto da cama, e foi preparar-se para sair, enquanto a mulher, lavada a cara
às pressas, e despenteada, cuidou de fazer-lhe o almoço. O almoço era sumário:
café e pão. Porfírio engoliu-o em poucos minutos, na ponta da mesa de pinho,
com a mulher defronte, risonha de esperança para animá-lo. Glória tinha as
feições irregulares e comuns; mas o riso dava-lhe alguma graça. Nem foi pela
cara que ele se enamorou dela; foi pelo corpo, quando a viu polcar, uma noite,
na Rua da Imperatriz. Ia passando, e parou defronte da janela aberta de uma
casa onde se dançava. Já achou na calçada muitos curiosos. A sala, que era
pequena, estava cheia de pares, mas pouco a pouco foram-se todos cansando ou
cedendo o passo à Glória.
— Bravos à
rainha! exclamou um entusiasta.
Da rua,
Porfírio cravou nela uns olhos de sátiro, acompanhou-a em seus movimentos
lépidos, graciosos, sensuais, mistura de cisne e de cabrita. Toda a gente dava
lugar, apertava-se nos cantos, no vão das janelas, para que ela tivesse o
espaço necessário à expansão das saias, ao tremor cadenciado dos quadris, à
troca rápida dos giros, para a direita e para a esquerda. Porfírio misturava já
à admiração o ciúme; tinha ímpetos de entrar e quebrar a cara ao sujeito que
dançava com ela, rapagão alto e espadaúdo, que se curvava todo, cingindo-a pelo
meio.
No dia
seguinte acordou resoluto a namorá-la e desposá-la. Cumpriu a resolução em
pouco tempo, parece que um semestre. Antes, porém, de casar, logo depois de
começar o namoro, Porfírio tratou de preencher uma lacuna da sua educação;
tirou dez mil-réis mensais à féria do ofício, entrou para um curso de dança,
onde aprendeu a valsa, a mazurca, a polca e a quadrilha francesa. Dia sim, dia
não, gastava ali duas horas por noite, ao som de um oficlide e de uma flauta,
em companhia de alguns rapazes e de meia dúzia de costureiras magras e
cansadas. Em pouco tempo estava mestre. A primeira vez que dançou com a noiva
foi uma revelação: os mais hábeis confessavam que ele não dançava mal, mas
diziam isso com um riso amarelo, e uns olhos muito compridos. Glória
derretia-se de contentamento.
Feito isso,
tratou ele de ver casa, e achou esta em que mora, não grande, antes pequena,
mas adornada na frontaria por uns arabescos que lhe levaram os olhos. Não
gostou do preço, regateou algum tempo, cedendo ora dois mil-réis, ora um, ora
três, até que, vendo que o dono não cedia nada, cedeu ele tudo.
Tratou das
bodas. A futura sogra propôs-lhe que fossem a pé para a igreja, que ficava
perto; ele rejeitou a proposta com seriedade, mas em particular com a noiva e
os amigos riu da extravagância da velha: uma coisa que nunca se viu, noivos,
padrinhos, convidados, tudo a pé, à laia de procissão; era caso de levar
assobio. Glória explicou-lhe que a intenção da mãe era poupar despesas. Que
poupar despesas? Mas se num dia grande como esse não se gastava alguma coisa,
quando é que se havia de gastar? Nada; era moço, era forte, trabalho não lhe
metia medo. Contasse ela com um bonito coupé, cavalos brancos, cocheiros
de farda até abaixo e galão no chapéu.
E assim se
cumpriu tudo; foram bodas de estrondo, muitos carros, baile até de manhã.
Nenhum convidado queria acabar de sair; todos forcejavam por fixar esse raio de
ouro, como um hiato esplêndido na velha noite do trabalho sem tréguas. Mas
acabou; o que não acabou foi a lembrança da festa, que perdurou na memória de
todos, e servia de termo de comparação para as outras festas do bairro, ou de
pessoas conhecidas. Quem emprestou dinheiro para tudo isso foi o padrinho do
casamento, dívida que nunca lhe pediu depois, e lhe perdoou à hora da morte.
Naturalmente,
apagadas as velas e dormidos os olhos, a realidade empolgou o pobre marceneiro,
que a esquecera por algumas horas. A lua-de-mel foi como a de um simples duque;
todas se parecem, em substância; é a lei e o prestígio do amor. A diferença é
que Porfírio voltou logo para a tarefa de todos os dias. Trabalhava sete e oito
horas numa loja. As alegrias da primeira fase trouxeram despesas excedentes, a
casa era cara, a vida foi-se tornando áspera, e as dívidas foram vindo,
sorrateiras e miudinhas, agora dois mil-réis, logo cinco, amanhã sete e nove. A
maior de todas era a da casa, e era também a mais urgente, pois o senhorio
marcara-lhe o prazo de oito dias para o pagamento, ou metia-lhe os trastes no
Depósito.
Tal é a
manteiga com que ele vai untando agora o pão do almoço. É a única, e tem já o
ranço da miséria que se aproxima. Comeu às pressas, e saiu, quase sem responder
aos beijos da mulher. Vai tonto, sem saber que faça; as idéias batem-lhe na
cabeça à maneira de pássaros espantados dentro de uma gaiola. Vida dos diabos!
tudo caro! tudo pela hora da morte! E os ganhos eram sempre os mesmos. Não
sabia onde iria parar, se as coisas não tomassem outro pé; assim é que não
podia continuar. E soma as dívidas: tanto aqui, tanto ali, tanto acolá, mas
perde-se na conta ou deixa-se perder de propósito, para não encarar todo o mal.
De caminho, vai olhando para as casas grandes, sem ódio — ainda não tem ódio às
riquezas — mas com saudade, uma saudade de coisas que não conhece, de uma vida
lustrosa e fácil, toda alagada de gozos infinitos...
Às
aves-marias, voltando a casa, achou Glória abatida. O padrinho respondeu-lhe
que eles tinham as mãos rotas, e não dava mais nada enquanto fossem um par de
malucos.
— Mas o que
dizia eu a você, Glória? Para que é que você foi lá? Ou então era melhor ter
pedido uma carta de fiança para outro senhorio... Par de malucos! Maluco é ele!
Glória
aquietou-o, e falou-lhe de paciência e resolução. Agora, o melhor era mesmo ver
outra casa mais barata, pedir uma espera, e depois arranjar meios e modos de
pagar tudo. E paciência, muita paciência. Ela pela sua parte contava com a
madrinha do céu. Porfírio foi ouvindo, estava já tranqüilo; nem ele pedia outra
coisa mais que esperanças. A esperança é a apólice do pobre; ele ficou abastado
por alguns dias.
No sábado,
voltando para a casa com a féria no bolso, foi tentado por um vendedor de
bilhetes de loteria, que lhe ofereceu dois décimos das Alagoas, os últimos.
Porfírio sentiu uma coisa no coração, um palpite, vacilou, andou, recuou e
acabou comprando. Calculou que, no pior caso, perdia dois mil e quatrocentos;
mas podia ganhar, e muito, podia tirar um bom prêmio e arrancava o pé do lodo,
pagava tudo, e talvez ainda sobrasse dinheiro. Quando não sobrasse, era bom
negócio. Onde diabo iria ele buscar dinheiro para saldar tanta coisa? Ao passo
que um prêmio, assim inesperado, vinha do céu. Os números eram bonitos. Ele,
que não tinha cabeça aritmética, já os levava de cor. Eram bonitos, bem
combinados, principalmente um deles, por causa de um 5 repetido e de um 9 no
meio. Não era certo, mas podia ser que tirasse alguma coisa.
Chegando a
casa — na Rua de S. Diogo — ia mostrar os bilhetes à mulher, mas recuou;
preferiu esperar. A roda andava dali a dois dias. Glória perguntou-lhe se
achara casa; e, no domingo, disse-lhe que fosse ver alguma. Porfírio saiu, não
achou nada, e voltou sem desespero. De tarde, perguntou rindo à mulher o que é
que ela lhe daria se ele lhe trouxesse naquela semana um vestido de seda.
Glória levantou os ombros. Seda não era para eles. E por que é que não havia de
ser? Em que é que as outras moças eram melhores que ela? Não fosse ele pobre, e
ela andaria de carro...
— Mas é
justamente isso, Porfírio; nós não podemos.
Sim, mas
Deus às vezes também se lembra da gente; enfim, não podia dizer mais nada.
Ficasse ela certa de que tão depressa as coisas... Mas não; depois falaria.
Calava-se por superstição; não queria assustar a fortuna. E mirando a mulher,
com olhos derretidos, despia-lhe o vestido de chita, surrado e desbotado, e
substituía-o por outro de seda azul, — havia de ser azul, — com fofos ou
rendas, mas coisa que mostrasse bem a beleza do corpo da mulher... E
esquecendo-se, em voz alta:
— Corpo como
não há de haver muitos no mundo.
— Corpo quê,
Porfírio? Você parece doido, disse Glória, espantada.
Não, não era
doido, estava pensando naquele corpo que Deus lhe deu a ela... Glória torcia-se
na cadeira, rindo, tinha muitas cócegas; ele retirou as mãos, e lembrou-lhe o
acaso que o levou uma noite a passar pela Rua da Imperatriz, onde a viu
dançando, toda dengosa. E, falando, pegou dela pela cintura e começou a dançar
com ela, cantarolando uma polca; Glória, arrastada por ele, entrou também a dançar
a sério, na sala estreita, sem orquestra nem espectadores. Contas, aluguéis
atrasados, nada veio ali dançar com eles.
Mas a
fortuna espreitava-os. Dias depois, andando a roda, um dos bilhetes do Porfírio
saiu premiado, tirou quinhentos mil-réis. Porfírio, alvoroçado, correu para a
casa. Durante os primeiros minutos não pôde reger o espírito. Só deu acordo de
si no Campo da Aclamação. Era ao fim da tarde; iam-se desdobrando as primeiras
sombras da noite. E os quinhentos mil-réis eram como outras tantas mil estrelas
na imaginação do pobre-diabo, que não via nada, nem as pessoas que lhe passavam
ao pé, nem os primeiros lampiões, que se iam acendendo aqui e ali. Via os
quinhentos mil-réis. Bem dizia ele que havia de tirar o pé do lodo; Deus não
desampara os seus. E falava só resmungando, ou então ria; outras vezes dava ao
corpo um ar superior. Na entrada da Rua de S. Diogo achou um conhecido que o
consultou sobre o modo prático de reunir alguns amigos e fundar uma irmandade
de S. Carlos. Porfírio respondeu afoitamente:
— A primeira
coisa é ter em caixa, logo, uns duzentos ou trezentos mil-réis.
Atirava
assim quantias grandes, embriagava-se de centenas. Mas o amigo explicou-lhe que
o primeiro passo era reunir gente, depois viria dinheiro; Porfírio, que já não
pensava nisso, concordou e foi andando. Chegou a casa, espiou pela janela
aberta, viu a mulher cosendo na sala, ao candeeiro, e bradou-lhe que abrisse a
porta. Glória correu à porta assustada, ele quase que a deita no chão,
abraçando-a muito, falando, rindo, pulando, tinham dinheiro, tudo pago, um
vestido; Glória perguntava o que era, pedia-lhe que se explicasse, que
sossegasse primeiro. Que havia de ser? Quinhentos mil-réis. Ela não quis crer;
onde é que ele foi arranjar quinhentos mil-réis? Então Porfírio contou-lhe
tudo, comprara dois décimos, dias antes, e não lhe disse nada, a ver primeiro
se saía alguma coisa; mas estava certo que saía; o coração nunca o enganou.
Glória
abraçou-o então com lágrimas. Graças a Deus, tudo estava salvo. E chegaria para
pagar as dívidas todas? Chegava: Porfírio demonstrou-lhe que ainda sobrava
dinheiro e foi fazer as contas com ela, ao canto da mesa. Glória ouvia em
boa-fé, pois só sabia contar por dúzias; as centenas de mil-réis não lhe
entravam na cabeça. Ouvia em boa-fé, calada, com os olhos nele, que ia contando
devagar para não errar. Feitas as contas, sobravam perto de duzentos mil-réis.
— Duzentos?
Vamos botar na Caixa.
— Não
contando, acudiu ele, não contando certa coisa que hei de comprar; uma coisa...
Adivinha o que é?
— Não sei.
— Quem é que
precisa de um vestido de seda, coisa chique, feito na modista?
— Deixa
disso, Porfírio. Que vestido, o quê? Pobre não tem luxo. Bota o dinheiro na
Caixa.
— O resto
boto; mas o vestido há de vir. Não quero mulher esfarrapada. Então, pobre não
veste? Não digo lá comprar uma dúzia de vestidos, mas um, que mal faz? Você
pode ter necessidade de ir a alguma parte, assim mais arranjadinha. E depois,
você nunca teve um vestido feito por francesa.
Porfírio
pagou tudo e comprou o vestido. Os credores, quando o viam entrar, franziam a
cara; ele, porém, em vez de desculpas, dava-lhes dinheiro, com tal naturalidade
que parecia nunca ter feito outra coisa. Glória ainda opôs resistência ao
vestido; mas era mulher, cedeu ao adorno e à moda. Só não consentiu em mandá-lo
fazer. O preço do feitio e o resto do dinheiro deviam ir para a Caixa
Econômica.
— E por que
é que há de ir para a Caixa? perguntou ele ao fim de oito dias.
— Para
alguma necessidade, respondeu a mulher.
Porfírio
refletiu, deu duas voltas, chegou-se a ela e pegou-lhe no queixo; esteve assim
alguns instantes, olhando fixo.
Depois,
abanando a cabeça:
— Você é uma
santa. Vive aqui metida no trabalho; entra mês, sai mês, e nunca se diverte:
nunca tem um dia que se diga de refrigério. Isto até é mau para a saúde.
— Pois vamos
passear.
— Não digo
isso. Passear só não basta. Se passear bastasse, cachorro não morria de lepra,
acrescentou ele, rindo muito da própria idéia. O que eu digo é outra coisa.
Falemos franco, vamos dar um pagode.
Glória
opôs-se logo, instou, rogou, zangou-se; mas o marido tinha argumentos para
tudo. Contavam eles com esse dinheiro? Não; podiam estar como dantes, devendo
os cabelos da cabeça, ao passo que assim ficava tudo pago, e divertiam-se. Era
até um modo de agradecer o benefício a Nosso Senhor. Que é que se levava da
vida? Todos se divertiam; os mais reles sujeitos achavam um dia de festa; eles
é que haviam de gastar os anos como se fossem escravos? E ainda ele, Porfírio,
espairecia um pouco, via na rua uma coisa ou outra; ela, porém, o que é que
via? Nada, não via nada; era só trabalho e mais trabalho. E depois, como é que
ela havia de estrear o vestido de seda?
— No dia da
Glória, vamos à festa da Glória. Porfírio refletiu um instante.
— Uma coisa
não impede a outra, disse ele. Não convido muita gente, não; patuscada de
família; convido o Firmino e a mulher, as filhas do defunto Ramalho, a comadre
Purificação, o Borges...
— Mais
ninguém, Porfírio; isso basta.
Porfírio
esteve por tudo, e pode ser que sinceramente; mas os preparativos da festa
vieram agravar a febre, que chegou ao delírio. Queria festa de estrondo, coisa
que desse o que falar. No fim de uma semana eram trinta os convidados. Choviam
pedidos; falava-se muito do pagode que o Porfírio ia dar, e do prêmio que ele
tirara na loteria, uns diziam dois contos de réis, outros três e ele,
interrogado, não retificava nada, sorria, evitava responder; alguns concluíam
que os contos eram quatro, e ele sorria ainda mais, cheio de mistérios.
Chegou o
dia. Glória, iscada da febre do marido, vaidosa com o vestido de seda, estava
no mesmo grau de entusiasmo. Às vezes, pensava no dinheiro, e recomendava ao
marido que se contivesse, que salvasse alguma coisa para pôr na Caixa; ele dizia
que sim, mas contava mal, e o dinheiro ia ardendo... Depois de um jantar
simples e alegre, começou o baile, que foi de estrondo, tão concorrido que não
se podia andar.
Glória era a
rainha da noite. O marido, apesar de preocupado com os sapatos — novos e de
verniz — olhava para ela com olhos de autor. Dançaram muitas vezes, um com o
outro, e a opinião geral é que ninguém os desbancava; mas dividiam-se com os
convidados, familiarmente. Deram três, quatro, cinco horas. Às cinco havia um
terço das pessoas, velha guarda imperial, que o Porfírio comandava,
multiplicando-se, gravata ao lado, suando em bica, concertando aqui umas
flores, arrebatando ali uma criança que ficara a dormir a um canto e indo
levá-la para a alcova, alastrada de outras. E voltava logo batendo palmas,
bradando que não esfriassem, que um dia não eram dias, que havia tempo de
dormir em casa.
Então o
oficlide roncava alguma coisa, enquanto as últimas velas expiravam dentro das
mangas de vidro e nas arandelas.
O Flautista de Hamelin - Contos de
Fadas (Dublado e Completo)
teatrodecontosdefada
Publicado em
30 de jun de 2012
Ophicleide e Bombardino - Terna
Saudade (Anacleto de Medeiros)
Publicado em
17 de out de 2015
Everson
Moraes - Oficleide Thiago Osório - Tuba Paula Borghi - Violão Lucas Oliveira -
Cavaquinho Gabriel Leite - Pandeiro
OFICLEIDE
Oficleide
O oficleide ou ophicleide,
também conhecido popularmente como figle é um instrumento
musical de sopro da família dos metais. Seu nome se origina do grego óphis,eós(serpente)
+ kleís,kleidós (chave), já que o instrumento apresenta uma forma
semelhante à de uma cobra com chaves ao longo do corpo.
A primeira
aparição escrita deste instrumento em orquestra foi na ópera Olímpia, de Gaspare
Spontini em 1819. Outras célebres composições para o oficleide são
Elias e Sonho de uma Noite de Verão, de Felix Mendelssohn, além da
Sinfonia Fantástica, de Berlioz. Também Verdi e Wagner compuseram
para Oficleide.
O oficleide
foi muito utilizado pelos músicos de choro na segunda metade do século
XIX e nas primeiras décadas do século XX. Durante a fase de
consolidação deste gênero musical, só perdia em popularidade para a flauta,
o violão e o cavaquinho1 . Foi o instrumento em que se delineou
uma das características mais marcantes do gênero, ocontracanto denominado baixaria,
hoje habitualmente realizado pelos violões de sete cordas.
Mundo Instrumental
4 de janeiro
de 2015
Feliz aniversário, Sr. Oficleide!
O nome pode
hoje parecer estranho, mas o oficleide foi um dos instrumentos da moda na
segunda metade do século XIX, tendo sido usado na música sacra, nas bandas, nas
orquestras e nos primeiros grupos de choro.
Patenteado
em 24 de março de 1821 (portanto há exatos 194 anos) pelo construtor francês de
instrumentos musicais Jean Hilaire Asté (1775–1840), o oficleide designa, em
seu nome, uma "serpente de chaves", em parte por conta do tubo
retorcido que o músico sopra, mas também por conta do instrumento que o
oficleide substituiu: o serpentão (usado como baixo das bandas e da música
sacra no século XVIII), cuja forma realmente lembra um ofídeo, e cujos som e
imagem podem ser aqui apreciados: https://youtu.be/0eafB4QqziA
O oficleide
chegou rapidamente ao Brasil e, por volta de 1850, já estava em uso na grande
maioria dos conjuntos musicais. O Museu da Música de Mariana possui inúmeras
partes manuscritas para oficleide, além de dois exemplares do século XIX em
nossa exposição, e que pertenceram à antiga Banda do Seminário de São José.
Nem sempre
lembramos, mas o oficleide tomou parte ativa nos grupos de choro do início do
século XX. Alexandre Gonçalves Pinto, no famoso livro "O choro", de
1936, comenta que "os acompanhamentos eram violão, cavaquinho, oficleide,
bombardão, instrumentos estes que naquela época faziam pulsar os corações dos
chorões, quando eram manejados pelos batutas da velha guarda",
acrescentando que "os verdadeiros choros eram constituidos de flauta,
violões e cavaquinhos, entrando muitas vezes o sempre lembrado oficleide e
trombone, o que constituia o verdadeiro choro dos antigos chorões".
Nas imagens
vemos, em primeiro lugar, um oficleide na capa de uma partitura francesa para
banda do século XIX, depois uma parte de oficleide usada no século XIX para se
tocar o Ofício de Sexta-feira Santa de Lobo de Mesquita.A terceira imagem é uma
"escala de oficleide", uma instrução manuscrita de 1870 para os
principiantes do instrumento. Por fim, a quarta imagem é a página inicial de
uma partitura manuscrita de música para banda, na qual os dois pentagramas
inferiores, que clareamos nesta foto, foram designados para um oficleide em dó e
um oficleide em si bemol.
O oficleide
caiu em desuso na entrada do século XX, basicamente por conta do sucesso do
saxofone que, segundo algumas versões, foi idealizado a partir da aplicação de
um bocal de clarineta a um oficleide. O velho oficleide, no entanto, deixou
muita história e, aos poucos, vem sendo estudado novamente. Muitos oficleides
têm sido restaurados e começam a ser ouvidos em várias partes do Brasil.
Para ter um
contato sonoro com o oficleide, podemos ouvir a Ária e Variações de Hyacinthe
Klosé para oficleide e piano, interpretadas por David Guerrier (oficleide) e
Bertrand Chamayou (piano) em https://youtu.be/-RfkgsMENx8
Valeu, seu
Jean Hilaire, grande invenção!
#MuseudaMusicadeMariana
https://twitter.com/MuseuMusicaMna
http://mmmariana.com.br/
https://twitter.com/MuseuMusicaMna
http://mmmariana.com.br/
Museu da
Música de Mariana
Março de
2015
Referências
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/4/4a/Terpsichore.jpg
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/4/4a/Terpsichore.jpg/200px-Terpsichore.jpg
https://pt.wikipedia.org/wiki/Terps%C3%ADcore
http://www.machadodeassis.ufsc.br/obras/contos/avulsos/CONTO,%20Terpsicore,%20%201886.htm
https://youtu.be/sZKbK0X0Nwo
https://www.youtube.com/watch?v=sZKbK0X0Nwo
https://youtu.be/IeOEBNGauX4
https://www.youtube.com/watch?v=IeOEBNGauX4
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh9Wz9UfSW0u-_-mLCiWid-QkJZXYJ9pOjSZtCncRVFNR_Fvxm00DH2RL1SOD7NipgZhKzVZnxjMg6ZYioEqJV_qh1URHxyFSwRRPcSs0GFss8IE1RSfbREvBbsicm5CkRI0xsuVrAkjbQ/s1600/OFICLE.jpg
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgUGewemv3caJuBlrZQ7TgK_y-5MRzFR20lQJVS6isdBPXRt9-joQIDzCe0UKf_ZFWxnyOCFvWCLSeUIZiHO5vvbxt0v2LLZ5X0bYcwp7TzgtFZ-sFY1UkI7g-8ArdC5HSQAyjHekIwA78/s1600/IFICLEIDE.jpg
http://instrumentosmusicaiscompleto.blogspot.com/2015/01/oficleide.html
https://www.facebook.com/MuseuDaMusicaDeMariana/posts/feliz-anivers%C3%A1rio-sr-oficleideo-nome-pode-hoje-parecer-estranho-mas-o-oficleide-/880712851987072/
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