terça-feira, 1 de novembro de 2016

Ilidir e Elidir os argumentos

animus domini
Intenção de ser dono, de agir como dono. De assenhorear-se


“Merece especial atenção o fato do longo prazo de posse afastar o requisito da boa-fé, vez que tal requisito torna-se ilidido ante a fluência do tempo.” Edilene Dantas de Vasconcelos Eduardo Régis Girão Castro Pinto


“(...) o que principalmente há de são e fecundo no conhecimento dos fatos [cognitione rerum] é que consideras todos os modelos exemplares, depositados num monumento, em plena luz: daí colhes para ti e para teu estado [rei publicae] o que imitar; daí evitas o que é infame em sua concepção e em sua realização.86 (...)
86 TITO LIVIO. Ab Urbe Condita, Proemio, 10, p.207. In: HARTOG, François. A história de Homero a Santo Agostinho. Tradução de Jacyntho Lins Brandão”





Postado dia: 30/10/2016 às 06:00


A equipe da Lava Jato formou-se para o combate a crimes financeiros e de lavagem de dinheiro praticados por doleiros como Alberto Youssef. Jamais se imaginou, inicialmente, topar com um esquema de corrupção.
Foi uma surpresa quando se reuniram provas da lavagem de cerca de R$ 26 milhões ligados a um contrato da refinaria Abreu e Lima. Meses depois, quando Paulo Roberto Costa decidiu colaborar, sua narrativa foi estarrecedora: a confissão foi muito além daquele contrato.
Propinas eram pagas nos grandes negócios da Petrobras. Estávamos falando, como descobriríamos mais tarde, de R$ 6,2 bilhões só de subornos, valor que seria reconhecido pela estatal.
Mas as investigações -e o prejuízo aos cofres públicos- não pararam por aí.
Como observou o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, "onde você destampa tem alguma coisa errada".
Removidas as tampas, emergiram propinas nas diretorias da Petrobras, nos ministérios do Planejamento e da Saúde, na Caixa Econômica Federal e na Eletronuclear.
A sistemática era a mesma. Dirigentes eram escolhidos por partidos e políticos com o compromisso de arrecadar propinas. Currículos e critérios técnicos ficaram em segundo plano.
Nesse esquema, empresários pagavam agentes públicos (dirigentes e políticos) por meio de operadores financeiros, que faziam o dinheiro sujo chegar com aparência limpa aos destinatários.
Até o momento, em primeira instância, as investigações levaram a 52 acusações contra 241 pessoas, por crimes como corrupção, lavagem e organização criminosa.
Dentre elas, 110 foram condenadas a penas que ultrapassam mil anos de prisão. O ressarcimento soma mais de R$ 3,6 bilhões -antes da Lava Jato, virtualmente nenhum caso recuperou mais de R$ 100 milhões, e a regra é não reaver um tostão sequer.
No entanto, talvez o maior impacto da Lava Jato tenha sido a responsabilização igualitária dos criminosos, pouco importando cargo ou bolso. Perseguiu-se a "grande corrupção", aquela que deslegitima as instituições e até então era imune ao Judiciário.
A corrupção de que tratamos afeta a eficiência da gestão pública, drena recursos de serviços essenciais, desequilibra o processo democrático e violenta os princípios republicanos.
É a corrupção que mata pela fila do SUS, pela falta de manutenção das estradas, que nutre a violência pela ausência de políticas públicas e que atrasa o país pela deficiência da infraestrutura.
Como o mensalão, a Lava Jato tem se mostrado excepcionalmente diferente em relação à impunidade. É a exceção que confirma a regra.
Precisamos reconhecer que o relativo sucesso é fruto de uma multidão de fatores, que incluem um trabalho coordenado, inovador e profissional de vários órgãos, o amadurecimento de leis e instituições e... muitos lances de sorte. Foi valioso ainda o apoio da sociedade.
O avanço se deu sobre um tripé formado por colaborações premiadas, cooperações internacionais e transparência.
As delações -sempre ponto de partida, jamais de chegada- permitiram a expansão exponencial da investigação. Embasaram buscas e apreensões, colheita de depoimentos e quebras de sigilo fiscal, bancário e telefônico; as transações bancárias rastreadas somam mais de R$ 1 trilhão.
As cooperações internacionais -mais de 120 intercâmbios com 34 países- permitiram alcançar documentos de contas secretas no exterior usadas há décadas.
Por fim, a realização de entrevistas coletivas, o lançamento do primeiro website de um caso criminal do país, a assistência de assessores de comunicação e a publicidade dos processos eletrônicos garantiram o que Albert Meijer denominou transparência virtual, facilitando o acesso à informação, o acompanhamento da investigação e, principalmente, propiciando o controle social.
O debate transcendeu o meio jurídico e, para nossa sorte, ganhou o gosto popular.
O acervo probatório produzido é imenso. Como a usual tática dos investigados de negar os fatos já não funcionava, passaram a difundir a falsa ideia de abusos na Lava Jato.
Tal noção não se sustenta. Foram feitas somente prisões excepcionalmente necessárias. Apenas 9% dos acusados estão presos -e só 3% estão encarcerados sem condenação.
Diante da inusitada perspectiva de punição, a colaboração passou a ser a melhor estratégia de defesa: 70% delas foram feitas com réus soltos, e diariamente recusam-se novos acordos por não se vislumbrar ganho efetivo.
Observe-se ainda que, se "abusos" ou "excessos" existissem, os tribunais os corrigiriam. Mesmo contestados por grandes bancas advocatícias em três cortes, os atos do juiz Sergio Moro foram confirmados em mais de 95% dos casos.
Alega-se também que as investigações são partidárias. Outro disparate! Além de as equipes de procuradores, delegados e auditores terem sido formadas, em grande parte, antes de se descobrirem os crimes na Petrobras, trata-se de dezenas de profissionais de perfil técnico, sem histórico de vínculo político.
A alegada perseguição é o mantra da defesa política quando a defesa jurídica não prospera.
Verdade que os partidos mais atingidos na Lava Jato são PT, PP e PMDB. No Supremo, dentre os 17 políticos acusados, 9 são do PP, 4 do PMDB, 3 do PT e 1 do PTC.
Contudo, isso não ocorre por escolha dos investigadores, e sim porque as indicações de dirigentes de órgãos federais se dão pelo partido no poder ou sua base aliada. Assim, os cargos de diretoria da Petrobras foram ocupados por essas legendas, e não pela oposição ao governo petista.
O ataque mendaz à credibilidade da Lava Jato e dos investigadores tem um propósito. Prepara-se o terreno para, em evidente desvio de finalidade, aprovar projetos de abuso de autoridade, de obstáculos à colaboração premiada, de alterações na leniência e de anistia ao caixa dois.
O Brasil, quarta nação mais corrupta do mundo segundo ranking do Fórum Econômico Mundial, está numa encruzilhada.
Se forem aprovados projetos como os mencionados, seguiremos o caminho da Itália, que, nas palavras de um procurador da Mãos Limpas -operação da década de 90 semelhante à Lava Jato-, lutou contra a corrupção, mas perdeu.
O Brasil, porém, pode seguir os passos de Hong Kong, nos anos 1960 considerado o lugar mais corrupto do mundo. Após um escândalo na década seguinte, realizaram-se reformas e, hoje, é o 18º país mais honesto no ranking da Transparência Internacional (o Brasil está na 76ª posição).
A história do Brasil é também uma história de fracassos na luta contra a corrupção. Casos como Anões do Orçamento, Marka Fonte-Cindam, Propinoduto, Banestado, Maluf, Castelo de Areia, Boi Barrica e tantos outros caíram na vala comum da impunidade.
A corrupção tem alto custo ao país. Temos de fechar essas brechas por onde escapam os ladrões e o dinheiro público.
Alterações legislativas, como a reforma política e as dez medidas contra a corrupção, sanam problemas estruturais e podem nos pôr no rumo de Hong Kong, o que recomenda seu debate, aperfeiçoamento e aprovação pelo Congresso.
É importante, ainda, incentivar controles sociais e que os cidadãos, bem informados, repilam os políticos desonestos pelo voto.
É impossível reduzir o nível de corrupção a zero, mas estamos no polo oposto. A grande corrupção tem de ser extirpada para surgir um Brasil competitivo, inovador, igualitário, democrático, republicano e, sobretudo, orgulhoso de si.
A sociedade tem de reagir. Parafraseando Martin Luther King, estamos rodeados da perversidade dos maus, mas o que mais tememos é o silêncio dos bons.
DELTAN DALLAGNOL, 36, mestre pela Harvard Law School (EUA), é procurador da República. Integra a força-tarefa da da Operação Lava Jato em Curitiba
ORLANDO MARTELLO, 47, mestre em gestão e políticas públicas pela Fundação Getulio Vargas, é procurador da República. Integra a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba
Publicado originalmente na Folha de S. Paulo





DOM, 30/10/2016 - 14:34


Jornal GGN - O advogado Cristiano Martins, um dos defensores de Lula nos processos da Lava Jato e outras investigações, rebateu um artigo publicado por Deltan Dallagnol e Orlando Martelo, na Folha deste domingo (30), no qual os procuradores afirmam que o ex-presidente lança mão de ataques à força-tarefa e ao juiz Sergio Moro porque não tem uma defesa plausível para as acusações de ter sido beneficiado pelo esquema de corrupção na Petrobras.


Abaixo, a nota de Martins sobre o artigo na Folha.

***

O artigo publicado hoje na Folha de S. Paulo por dois procuradores da República, que atuam na Lava Jato, longe de superar a perseguição política dirigida a alguns partidos políticos e, particularmente, ao ex-Presidente Luiz Inacio Lula da Silva, apenas deixa tal abuso ainda mais evidente.

A Lava Jato promove verdadeira guerra jurídica, mediante o uso manipulado das leis e dos procedimentos jurídicos, para perseguir seus inimigos políticos, fenômeno que é documentado por especialistas internacionais como “lawfare”.

Por que será que o PSDB não está dentre os partidos “mais atingidos” pela Lava Jato?  Por que documentos que envolvem seus políticos tramitam em sigilo, em nome do “interesse público”, ao passo que aqueles relativos a Lula, inclusive os que têm sigilo garantido pela Constituição Federal, são devassados e expostos a todos em nome do mesmo “interesse público”? Não há como responder. Uma rápida consulta às reportagens produzidas pela própria Folha - a exemplo de outros veículos de imprensa - comprova a tese de dois pesos e duas medidas. Há muito a mídia perdeu sua imparcialidade.

Nações desenvolvidas não permitiriam que a Lava Jato deixasse de cumprir a lei, como ocorre no Brasil. Mas os procuradores não pensam assim, bem como o próprio TRF4, que julga os recursos da Lava Jato. Quando a lei é deixada de lado – seja por qual motivo for -, é o próprio Estado Democrático de Direito que está em risco. Você que está lendo esta publicação aceitaria ser investigado e julgado sem o rito das leis, mas, sim, pelas regras de conveniência de procuradores e juízes – por melhores que sejam suas intenções? É evidente que não!

Cada alegação dos procuradores em relação a Lula foi fulminada no campo jurídico por peças robustas que apresentamos nos autos e que podem ser consultadas em www.abemdaverdade.com.br. Ou seja, no plano estritamente jurídico, as frívolas acusações foram todas superadas pela defesa. Mas a Lava Jato, ao menos em relação a Lula, não busca o debate jurídico, mas o uso da violência da lei para promover perseguição política. Pretende reescrever a história. Pretende desconstruir a imagem e a reputação do ex-Presidente. E, para isso, usam da aparência da legitimidade de um procedimento, que devido processo legal nada tem!

Não é preciso ir longe para perceber isso. A denúncia apresentada contra Lula em 14/09/2016, com 172 páginas, não é uma peça jurídica; mas política. Aliás, depois que o próprio juiz Moro reconheceu, em recente despacho, que nenhum recurso relativo aos três contratos da Petrobras ali tratados foi destinado “diretamente a Lula”, a acusação perdeu qualquer sentido. Mas esse fato foi usado não para encerrar o caso, como seria de rigor, mas para indeferir provas que foram requeridas!

Se os procuradores e o juiz do caso efetivamente buscassem uma investigação legitima e dentro do devido processo legal, não estariam focados em uma pessoa – Lula -, mas sim em fatos. Não estariam promovendo acusações sem materialidade em rede nacional, com auxílio de assessoria de imprensa e, ainda, o uso de powerpoint semelhante a similar até já condenado pela Suprema Corte Americana, por violar a garantia da presunção de inocência. Não estariam violando inúmeras garantias fundamentais e desafiando até mesmo alguns dogmas do direito de defesa – como, por exemplo, ao grampear advogados 














A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao invés de tentar ilidir os argumentos de acusação da Lava Jato busca elidi-los simplesmente pela retórica.








FELIPE CHARBEL TEIXEIRA Doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica – Rio de Janeiro


RESUMO O artigo analisa a concepção retórica da história tal qual exposta por Cícero no segundo livro do diálogo De Oratore. Argumenta-se que o entendimento da história como uma construção de fatos e palavras tanto enfatiza seu caráter retórico quanto o compromisso da história com a verdade, sendo que, para Cícero somente um orador prudente pode se mostrar capaz de produzir um texto digno de ser chamado “história”, texto que simultaneamente deleite e produza em seus leitores e ouvintes lições de virtude.
Palavras-chave historiografia, retórica, Cícero




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