“Tu te tornas eternamente responsável por
aquilo que cativas”
“Que os desafios se tornem recompensa, e que
nunca pare de lutar.”
O que é a 'elite do atraso'?
sábado, 21 de dezembro de 2019
“Desde a sua formação, o capital
variável, o do trabalho, encolheu em face do capital constante, o da máquina. O
capital mudou de composição à custa da crescente insignificância do trabalho e
da pessoa que trabalha. Esta é a sociedade do desemprego, dos que foram
descartados pelo sistema produtivo. Para que esta sociedade funcione, é
necessário que haja sempre desempregados. São eles que tornam o trabalho barato
para o capital. Portanto, a classe operária da formação do PT já não é mais a
mesma. Os filhos do proletariado dos tempos de Lula ascenderam para a classe
média, mergulharam na sociedade de consumo, já não aspiram apenas ao salário,
tornaram-se adeptos do capitalismo, conservadores e até reacionários. As
eleições no ABC mostram isso cada vez mais.
Um outro setor decisivo na formação do
PT foi o setor católico, das comunidades de base e da aguerrida base dos
trabalhadores rurais sem-terra, informalmente ligados à Igreja. No entanto,
esse grupo está muito modificado. O episcopado já não tem pelo PT o mesmo
apreço de antes. Em 2003, Lula foi entusiasticamente acolhido na assembleia da
Conferência Episcopal. Não há nenhum indício de que os bispos se dispusessem,
hoje, a repetir o ato. Ao longo dos últimos anos, não só Lula descartou os
militantes católicos do PT que faziam a ligação entre bases sociais do governo
e a CNBB, como os bispos reduziram significativamente sua proximidade com o
partido.
Antes mesmo que o PT surgisse, uma
parcela dos agentes de pastoral formou o MST, libertando-se da tutela dos
bispos. Foram ativíssimos no enfraquecimento do governo FHC, com as ocupações
de terras reguladas pelo calendário eleitoral. Mas foram enfraquecidos pelo
surgimento de mais de setenta organizações similares e dissidentes. Foram
decisivos na eleição de Lula. Mas quando Lula assumiu a Presidência, tratou, em
pouco tempo, de esvaziar o protagonismo dessa organização, xiiita, como ele a
denominava, sobretudo com a criação da versão petista do Bolsa Família, que
acabou instituindo uma tutela sobre 42 milhões de pessoas, capaz de esvaziar um
campo decisivo no recrutamento de militantes do movimento.
O futuro do PT não poderá depender da
reconstituição de suas bases de origem, que foram as bases do PT radical e
demolidor. Elas foram minadas pelos próprios governos petistas, mais por Dilma
do que por Lula. O PT se aliou a inimigos históricos dessas bases. Vai ser
difícil justificar essas alianças e ganhar novamente a confiança dos que foram
deixados para trás. No entanto, Lula tem um carisma próprio e resistente que
poderá dar ao partido novas oportunidades, especialmente num cenário em que os
outros partidos estão enfraquecidos e desgastados. Talvez uma nova geração de
dirigentes possa valer-se de Lula para reconstituir o partido, promovendo
internamente uma rotação de elites.
No entanto, a principal arma que o PT
começou a brandir, no dia da condução coercitiva de Lula à Polícia Federal, foi
a da ameaça ‘posso incendiar o país’. Pode. Várias demonstrações tópicas da
ação de multidões têm se espalhados pelo Brasil, raramente com clareza
suficiente para agregar simpatizante e aderentes. O PT poderá eleger não só o
governo Temer como alvo desse ímpeto incendiário. Mas os partidos que
historicamente foram escolhidos por sua obsessão antagônica desde a disputa
entre Lula e Fernando Henrique Cardoso, em 1998, já não estão desabrigados.
Estão munidos e documentados de todos os problemas que o PT deixa, justamente, nos
campos mais nobres de suas promessas não cumpridas ou mal comprimidas.
O PT de hoje é um partido desprotegido
e frágil, ainda que possa mobilizar multidões para vingar a derrota da eficácia
de seu milenarismo, cujo governo está em julgamento. A consigna de considerar
que a guerra ainda é a dos éticos do PT contra os maus das oposições não
resistirá à metamorfose dialética que converte os opostos no seu contrário".
*Cf. “Uma nova chave do poder”. In As
esquerdas e a democracia, coletânea organizada por José A. Segatto, M. Lahuerta
e Raimundo Santos. Brasília: Verbena Editora/FAP, dez. de 2018.
E-book: As esquerdas e a democracia
'O sociólogo Jessé Souza, ex-presidente
do IPEA, é o convidado do 'Sala de Professores' da semana. “Quem faz uma
sociedade, no fundo, é a força de suas instituições. E a grande instituição que
existia aqui desde 1532 é a escravidão”, afirma o pesquisador, que está
lançando o livro "A Elite do Atraso – da Escravidão à Lava Jato"
neste mês. Confira o programa na íntegra na TV Fepesp: http://bit.ly/2vPao2x. '
A Elite do Atraso - Sala de Professores
“O país vive um período de descrédito
em suas instituições. O presidente Michel Temer encontra o juiz do STF em casa
e, às escuras, os dois jantam com o chefe do Congresso. Tudo sem publicidade. O
que eles combinam por trás das portas? Quem manda neste país? “Quem faz uma sociedade,
no fundo, é a força de suas instituições. E a grande instituição que existia
aqui desde 1532 é a escravidão”, diz Jessé Souza, pesquisador e ex-presidente
do IPEA, uma fundação pública ligada ao Ministério do Planejamento. Jessé está
lançando o livro “A Elite do Atraso: da Escravidão à Lava Jato” e é o convidado
do próximo ‘Sala de Professores’, da TV Fepesp. Em entrevista a Celso
Napolitano e Gilberto Maringoni, professor da UFABC, o pesquisador fala sobre
como se dá a corrupção corporativa e como a reforma trabalhista ainda reforça
práticas que remontam aos tempos da escravidão.”
Revista Brasileira de Ciência Política
Print version ISSN 0103-3352On-line version ISSN 2178-4884
Rev. Bras. Ciênc.
Polít. no.29 Brasília Mayo/Aug. 2019
Epub Sep 09, 2019
http://dx.doi.org/10.1590/0103-335220192907
ARTIGOS
Para Além da Sociologia da
Inautenticidade? Um Diálogo com Jessé Souza
Marcos Abraão Ribeiro1
http://orcid.org/0000-0002-6185-2448
http://orcid.org/0000-0002-6185-2448
1 Professor
do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense (IFF), campus
Campos Centro, Campos dos Goytacazes, RJ, Brasil. E-mail: <olamarcos@yahoo.com.br>
RESUMO
Este artigo tem como objetivo
questionar a ruptura de Jessé Souza com a sociologia da inautenticidade,
representada pela obra de Sérgio Buarque de Holanda. O trabalho de Souza foi
fundamental para demarcar a insuficiência das grandes interpretações
culturalistas e essencialistas do Brasil contemporâneo, que nos interpretam
como pré-modernos e completamente inferiores aos países modernos como os
Estados Unidos. Com sua teorização, Souza trouxe uma importante contribuição
para, a partir da periferia, também produzir teoria sociológica. Mesmo assim,
defendo que Souza repete o dualismo rural (tradicional) - urbano (moderno) que
é crucial para o autor permanecer à sombra da sociologia da
inautenticidade e continuar reproduzindo, assim, a imagem do Brasil como
incompletude, desvio e falta quando comparado aos países centrais, como ocorre
com a interpretação de Holanda criticada pelo sociólogo.
Palavras-chave: Jessé Souza;
modernização seletiva; subcidadania; sociologia da inautenticidade; dualismo
ABSTRACT:
This article aims to question the
rupture of Jessé Souza with the sociology of inauthenticity, represented
by the work of Sérgio Buarque de Holanda. Souza’s work was fundamental to
demarcate the insufficiency of the great culturalist and essentialist
interpretations of contemporary Brazil, which interpret us as pre-modern and
completely inferior to modern countries such as the United States. With his
theorization, Souza made an important contribution to, from the periphery, also
to produce sociological theory. Nonetheless, I argue that Souza repeats rural
dualism (traditional)- urban (modern) that is crucial for the author to remain
in the shadow of the sociology of inauthenticity and continue to
reproduce Brazil’s image as incompleteness, diversion and absence when compared
to the central countries, as it happens with the interpretation of the
Netherlands criticized by the sociologist.
Keywords: Jessé Souza; selective
modernization; sub-citizenship; sociology of inauthenticity; dualism
Desde a publicação de A
modernização seletiva (2000) Jessé Souza tem realizado um esforço
sistemático2 para construir uma reinterpretação
do processo de modernização e da profunda desigualdade social brasileira. O
sociólogo tem como objetivo construir uma verdadeira teoria crítica
sobre o Brasil moderno (Souza, 2018). Suas teses vão de encontro às
interpretações culturalistas de Sérgio Buarque de Holanda, Roberto DaMatta e
Raymundo Faoro, que defendem, cada qual ao seu modo, que teríamos na herança
ibérica pré-moderna um traço essencial e estruturante que explicaria nossos
conflitos sociopolíticos principais.
Como defende Bastos (2013), o elemento mais importante
presente no pensamento social brasileiro é o tema do atraso. Por conta
disso, o Brasil seria marcado por um déficit de modernidade, uma vez
que teríamos como elementos explicativos centrais categorias como patrimonialismo e personalismo.
Assim, reproduziríamos uma formação incompleta3 quando comparados aos países
centrais.
Segundo Villas Bôas (2006, p. 167), as
interpretações contemporâneas têm no entrelaçamento entre condutas tradicionais
e modernas o caminho para explicar os dilemas contemporâneos como a cidadania,
a democracia e a violência que, por sua vez, demonstrariam a força explicativa
de conceitos como patriarcalismo, mandonismo e patrimonialismo.
O Brasil contemporâneo, portanto, não teria conseguido diferenciar
funcionalmente Estado, economia e sociedade para que eles pudessem ser
desenvolvidos a partir de lógicas e códigos próprios (Martins, 2014, p. 591).
Na mesma linha de Bastos e Villas
Bôas, Lynch (2016) argumenta que o pensamento
político brasileiro tem como questões centrais analisar o atraso da
periferia e sua especificidade. Esta maneira de nos interpretar está
relacionada com a internalização e a naturalização do atraso e da
subalternidade (Lynch, 2016). Assim, os conflitos
brasileiros ainda permaneceriam estruturados por elementos pré-modernos
responsáveis pela singularidade e, consequentemente, pelas diferenças
essenciais que existiriam entre os países centrais e o Brasil.
O trabalho de Souza foi fundamental
para demarcar a insuficiência das interpretações produzidas pela sociologia
da inautenticidade de Holanda, DaMatta e Faoro, através da definição dos
pressupostos e das limitações existentes nas leituras culturalistas e
essencialistas do Brasil. Conjuntamente, o sociólogo produziu uma teorização
alternativa para defender o caráter estritamente moderno dos dilemas brasileiros,
uma vez que a hierarquia social e sua legitimação tem um mecanismo de
reprodução semelhante no centro e na periferia, que são os capitais econômico e
cultural (Souza, 2018). Estes capitais seriam
responsáveis por hierarquizar toda sociedade moderna (Souza, 2018). Ao contrário da sociologia
da inautenticidade, Souza defende que temos sociedades do mesmo tipo, ou seja,
a modernidade possui um caráter contraditório na periferia e no centro, que
poderia ser visto através da reprodução simbólica do capitalismo. Com a
teorização do sociólogo, teríamos motivos estritamente modernos para a exclusão
social. Nesse sentido, Souza possui grande relevância entre nossas tradicionais
interpretações, pois as mais importantes leituras têm no atraso, como
vimos, o elemento decisivo a explicar os dilemas brasileiros4.
Lynch (2013) afirma que nossos intelectuais
têm como característica fundamental considerar suas produções como inferiores
àquelas formuladas na Europa e nos Estados Unidos, que são nossas referências
de teoria. Assim, não encontramos possibilidade de produzir teoria, tendo como
única alternativa aplicar aquelas dos países cêntricos (Lynch, 2013). Com sua teorização, Jessé
Souza traz uma importantíssima contribuição para fugirmos do fantasma da condição
periférica, que faz com que nos representemos permanentemente como inferiores e
incapazes de teorizar (Lynch, 2013).
No entanto, Sérgio Tavolaro (2005) defende que Souza, mesmo
fazendo uma crítica forte à sociologia da inautenticidade, termina ficando
à sombra desta mesma sociologia porque sua teorização em torno da modernização
seletiva reproduz uma perspectiva singular de modernidade, que contem a imagem
de desvio inequívoco do Brasil em relação aos países centrais (Tavolaro, 2005).
Apesar de concordar com a tese de que
Souza fica à sombra da sociologia da inautenticidade, vou construir minha
interpretação em sentido diferente daquele defendido por Tavolaro. Isso porque
acredito que a ligação de Souza com os autores clássicos por ele criticados não
ocorre apenas pela reiteração da imagem de desvio da realidade brasileira
quando comparada aos países centrais, mas pela reprodução das interpretações
sobre o Brasil agrário e escravista que estes construíram e que são repetidas
acriticamente pelo sociólogo.
Precisamente, defendo que Souza repete
o dualismo rural-urbano que é crucial para o autor permanecer à sombra da sociologia
da inautenticidade e continuar reproduzindo, assim, a imagem do Brasil como
incompletude, desvio e falta quando comparado aos países centrais, e que
Tavolaro demarca tão bem. Mesmo trazendo uma concepção inovadora das ações de
mercado e Estado quando comparada às interpretações do pensamento social e
político brasileiro, defendo que a permanência do dualismo na teorização de
Souza faz com que suas teses sobre a modernização seletiva e a ralé
estrutural fiquem organizadas sobre bases frágeis. Isto ocorre porque as
ações de mercado e Estado estão limitadas ao âmbito urbano, o que resulta na
reiteração da imagem do Brasil agrário e escravista presente nas interpretações
clássicas criticadas pelo sociólogo. Como consequência das ações limitadas das
duas principais instituições do mundo moderno, sustento que Souza se aproxima
das interpretações que, em princípio, estariam completamente afastadas de sua
teorização.
Problematizo a ruptura de Souza com
a sociologia da inautenticidade a partir da exposição do
clássico Raízes do Brasil, uma vez que o sociólogo considera Sérgio
Buarque de Holanda como o fundador das ciências sociais conservadoras no país.
Minha leitura, todavia, é construída em sentido contrário àquele produzido
por Leal e Matos (2016), que criticam a obra de
Souza para exaltar a interpretação culturalista de Holanda. Também se difere da
crítica feita por Ruy Braga (2017), que, apesar de observar
consequências políticas importantes para a constituição de uma ação coletiva
transformadora da ralé estrutural, prefere concentrar seu esforço na
crítica à leitura de Souza da teoria do populismo de Francisco Weffort (2003). Meu objetivo é
problematizar a ruptura de Souza com a sociologia da inautenticidade, mas
deixando bem demarcados os avanços e limites presentes em sua teorização5.
Para alcançar meus objetivos, divido o
artigo em cinco partes. Na primeira, faço uma leitura contextual de Raízes
do Brasil que inexiste na interpretação de Souza. Conjuntamente, demonstro
o peso central que o dualismo possui na sociologia brasileira. Na segunda parte
apresento as críticas de Souza à sociologia da inautenticidade e a
Holanda, em particular. Na terceira, exponho as suas teses sobre a modernização
seletiva e a subcidadania. Na quarta, apresento a leitura de Souza das obras de
Florestan Fernandes e Maria Sylvia de Carvalho Franco, que possuem importância
central para o autor.
Por fim, exponho uma leitura de Franco
diferente da realizada por Souza, para sustentar que o sociólogo reproduz de
forma acrítica as leituras clássicas sobre o Brasil rural e escravista.
Conjuntamente, exponho a interpretação de Cardoso (2008, 2010), que me auxilia a sustentar empiricamente as
críticas às teses de Souza sobre a singularidade da modernidade brasileira e da
desigualdade social.
Como primeiro caminho para
problematizar a ruptura de Jessé Souza com a sociologia da inautenticidade,
exponho a interpretação de Holanda em Raízes do Brasil, levando em
consideração o contexto no qual estava inserida e enfatizando a relação dual
entre rural (tradicional) e urbano (moderno). Acredito que o enfoque
contextualizado proporciona condições para sustentar meu argumento. Antes,
porém, é necessário demonstrar que essa relação de contraposição entre as duas
esferas não foi algo sempre presente na obra de Holanda, como a interpretação
descontextualizada de Souza deixa transparecer.
Feldman (2013) realiza uma análise
diacrônica das três primeiras edições de Raízes do Brasil, publicadas em
1936, 1948 e 1956, para defender que as afirmações que são feitas sobre a obra
clássica de Holanda só possuem exatidão quando uma das edições é alçada como
elemento de referência. Este é um ponto muito importante, pois além de trazer
uma leitura descontextualizada de Raízes do Brasil, Souza ainda apresenta
as teses da versão definitiva como se elas sempre tivessem a mesma formatação.
De acordo com Feldman (2013, p. 120), existem três
mudanças centrais que justificam a análise cuidadosa a partir da edição
escolhida, que são as seguintes questões: (i) a variação de sua postura
axiológica acerca da tradição; (ii) a substituição do personalismo pela
democracia como saída política para a nascente ordem urbana; e (iii) a
reformulação do enunciado do desterro com condição característica do
brasileiro. Vou focar na questão da tradição, pois é elemento central para a
leitura de Souza da obra de Holanda.
Na edição de 1936, Holanda avalia que
as perspectivas de modernização da sociedade brasileira deveriam ser avaliadas
com reticências, uma vez que a força da cultura do personalismo, da ética da
aventura, do ruralismo e da cordialidade recomendava esse tipo de comportamento
(2013, p. 121). Nesse momento, o americanismo era visto como
alternativa problemática ao iberismo, pois havia a indicação da
conciliação entre tradicional e moderno (Feldman, 2013). Na edição de 1948, por sua
vez, a clivagem entre tradição e modernização se coloca como uma relação de
profunda incompatibilidade:
Tal como reconstruída até aqui, a
disjunção entre a argumentação das edições de 1936 e de 1948 envolve, naquela,
a reticência frente às perspectivas de implante da modernização (para a qual
seria necessária, no mínimo, uma composição com as estruturas existentes) e,
nesta, a necessidade de algum tipo de ruptura com o tradicional para a
implantação do moderno (Feldman, 2013, p.123).
Outro elemento central que precisa ser
enfatizado é a caracterização do homem cordial. Na primeira edição do
livro, o homem cordial representava a contribuição brasileira à
humanidade e, consequentemente, formaria o caráter nacional, pois a
cordialidade teria um modo incontornável (Feldman, 2013, p.123). Nessa edição,
portanto, o autor constrói o homem cordial como uma categoria
abrangente que caracterizaria o brasileiro de maneira geral, pois seria a
contribuição nacional ao mundo (Feldman, 2013). Todavia, nas edições de
1948 e 1956, Holanda se afasta da relação entre cordialidade e caráter nacional
presente na edição de 1936. A partir das edições posteriores, a antítese
cordialidade-civilidade é intensificada, mesmo constituindo uma dialética sem
síntese (Feldman, 2013, p.124). Assim, é um equívoco
afirmar que o homem cordial se apresenta como uma categoria
abrangente para caracterizar o brasileiro na edição definitiva de Raízes
do Brasil.
Outra questão central é a
caracterização do personalismo feita pelo autor. Ao apontar as
transformações ocorridas no Brasil a partir do final do século XIX, Holanda
afirmava na edição de 1936 que as modificações políticas em termos de
implantação da democracia eram infrutíferas, uma vez que o personalismo funcionava
como elemento estabilizador, ou seja, o equilíbrio político apenas poderia ser
alcançado por seu intermédio (Feldman, 2013, p.128). Nessa edição,
portanto, Holanda reproduz uma perspectiva conservadora próxima de Gilberto
Freyre, este último considerado um natural antípoda de Holanda por Souza (2016). De acordo com Feldman (2013) “Sobressai no texto da
segunda edição a crítica à classe dominante e ao esvaziamento do programa
democrático pelo tradicionalismo, ausentes na versão original (p. 126)”. A
partir das diferenças existentes nas edições de Raízes do Brasil, Feldman (2013) demonstra como a obra do
autor se tornou um dos pilares da interpretação progressista sobre o Brasil.
Essa posição só foi possível porque o autor modificou sua resignação pragmática
com a cordialidade na edição de 1936, para uma aproximação cética com a
civilidade nas edições de 1948 e 1956 (Feldman, 2013, p.137).
Além de apontar as modificações nas
edições de Raízes do Brasil, é importante assinalar também que as teses
contidas no livro não constituem a interpretação definitiva do autor sobre o
Brasil, como a leitura generalista e descontextualizada de Jessé Souza deixa
transparecer. Wegner (1999) analisa os trabalhos de
Holanda sobre o bandeirantismo e monções para defender que, nessas obras que
tratam sobre a conquista do Oeste brasileiro, Holanda deixa de lado a
interpretação genética presente em Raízes do Brasil para a construção
de uma explicação situacional, “incorporando no argumento um ‘americanismo’ no
sentido da dinâmica própria ao Novo Continente, o que leva a uma modulação da
relação entre tradição e modernidade em sua obra” (Wegner, 1999, p. 241). Com essa
perspectiva, Holanda estaria preocupado em apontar, por exemplo, os elementos
em comum para construir uma análise comparativa com os Estados Unidos, e não a
reprodução de uma comparação em termos absolutos como existente em Raízes
do Brasil. A fronteira seria o caminho para analisar o processo de
americanização em sentido continental. No seu livro Monções, publicado em
1945, que trata do comércio fluvial entre o planalto paulista e Cuiabá, Holanda
não utiliza generalizações como cordialidade e civilidade presentes
em Raízes do Brasil (Wegner, 2009, p. 219). A partir dessa
perspectiva, Holanda constrói uma nova relação entre tradição ibérica e
modernização em suas obras dos anos 1940:
Aplicando, para esse momento da obra
de Holanda (no qual as grandes caracterizações e o recurso a tipos ideais são
evitados), os termos utilizados em Raízes do Brasil, poderíamos dizer que agora
a cordialidade lentamente se disciplina e se civiliza, sem contudo romper
radicalmente com suas características iniciais. Dessa maneira, estamos diante
de uma situação em que a nossa tradição se moderniza ‘por dentro’, não
ocorrendo, como antes, uma absoluta incompatibilidade entre modernização e
tradição, e sim uma possível convergência destes com os influxos externos de
modernização (Wegner, 1999, p.254).
Como visto na citação acima, Raízes
do Brasil não representou a única intepretação de Holanda sobre a relação
entre tradição e modernidade. Como a interpretação de Souza sobre Holanda é
marcada pela ausência de contextualização e por uma generalização abusiva, é
importante contextualizar as publicações para demonstrar que a crítica de
sociólogo recai sobre as apropriações que são feitas da obra de Holanda, e não
sobre os argumentos do autor em si. Abaixo, exponho a interpretação de Holanda
na versão definitiva de Raízes do Brasil para enfocar como o autor
trabalha a dicotomia rural (tradicional) - urbano (moderno).
Wegner (1999) argumenta que Raízes do
Brasil teve como ponto central analisar os dilemas da modernização
brasileira, através de uma perspectiva genética das raízes do tradicionalismo.
A partir da versão definitiva da obra temos a relação de contraposição entre
cordialidade e democracia, tradição e modernidade (Wegner, 2009, 1999). Ocorre a relação contrastante entre
racionalidade e abstração representando a modernidade existente no âmbito
urbano, contraposta à cordialidade produzida pelo mundo rural. Mesmo sem um
projeto político, Raízes do Brasil tem uma aposta no processo de
modernização como caminho para vencer o atraso representado pelos
valores da cordialidade construídos no Brasil rural.
Holanda (2010) defende que recebemos como
herança ibérica a cultura personalista que possuía como traços característicos
a acentuação do irracional, do afetivo e do consequente tradicionalismo. Essa herança,
por sua vez, dependia essencialmente das instituições agrárias (Candido, 2010). O Brasil colonial e rural
teve o domínio do tradicional em detrimento da atrofia das qualidades modernas,
impessoais e ordenadoras que seriam marcas do âmbito urbano (Holanda, 2010). Como exemplo, Holanda cita
a organização interna da família patriarcal, que tinha no personalismo e no
afeto seus elementos essenciais. Assim, uma organização a partir de interesses
impessoais ou ideias racionais seria algo absolutamente estranho àquela
realidade.
Devido à força que possuía como fator
estruturante de todas as relações sociais, econômicas e políticas existentes no
período colonial, essa estrutura agrária, personalista e tradicionalista
terminou sendo transplantada depois do processo de independência (Holanda, 2010).
A vinda da família real é vista por
Holanda como a primeira ação de ameaça aos valores rurais, uma vez que trazia
consigo a cultura cosmopolita construída em âmbito urbano. O Brasil imperial
recebeu como herança a estrutura agrária, patriarcal, escravista e de razão
essencialmente diversa do capitalismo que, por sua vez, seria expressão de uma
cultura burguesa e urbana. Essa herança foi possível devido à força da escravidão.
Dentro dessa lógica, o homem cordial seria um representante típico do
Brasil agrário, patriarcal e tradicional, que teria nos sentimentos, e não nos
interesses racionais e impessoais, o elemento definidor da ação social. Assim,
o Brasil rural, personalista e tradicional terminou sendo o elemento
vencedor. Holanda (2010) defende que o fim da
escravidão, em 1888, representou o término do predomínio agrário e o início da
lenta revolução brasileira no sentido da construção de um país no qual os
valores urbanos, racionais, impessoais e modernos fossem os pilares centrais.
Além de apontar como o dualismo está
presente em Raízes do Brasil, é importante demonstrar como esse elemento é
central no pensamento social e político brasileiro, sobretudo nas sociologias
modernistas existentes entre as décadas de 1930 e 1950, como veremos a seguir.
Martins (2014) analisa a sociologia
modernista produzida nos anos 1930, que tinha como ponto central a crítica à
ausência de universalidade nas relações entre Estado e sociedade, porque
apontava os empecilhos para a construção da vida pública no Brasil (Martins, 2014, p. 584). As características
agrárias eram interpretadas por essa sociologia como tradicionalismo e, consequentemente,
como grande empecilho para a institucionalização da modernidade ocidental no
país (Martins, 2014). Para a sociologia
modernista, o grande dilema brasileiro para a construção da modernidade estava
na estrutura colonial e agrária, sobretudo no que se refere a dimensões como a
separação entre público e privado, a diferenciação social, a racionalização e a
secularização, pois não conseguimos instituir um desenvolvimento similar ao
existente nos países centrais (Martins, 2014).
Muito além de construir uma visão
a-histórica do brasileiro, a sociologia modernista tinha como objetivo usar
suas produções para vencer a dicotomia rural-urbano que se tornava nosso maior
dilema (Martins, 2014). Não por acaso, os anos 1930
tiveram como uma das marcas fundamentais a combinação entre cultura e política,
como demonstrada pela atuação da sociologia: “o modernismo, ao pensar um código
moral civilizatório distinto e animado pela construção nacional ancorada em uma
geografia original, permitia a afirmação do moderno através da modernização” (Martins, 2014, p. 594).
Villas Bôas (2006) aponta que as análises
sobre a modernização que tinham como objetivo provocar a mudança social foram
centrais no período entre 1945 e 1964, visto que essas interpretações analisam
os impasses para a plena realização da sociedade moderna no Brasil (Cazes, 2014). Para essas interpretações
seria necessária uma mudança provocada, capitaneada por eles no sentido da
implantação de uma ordem plenamente moderna, estrutura pela sociedade de
classes. Era fundamental, portanto, superar o passado atrasado (Cazes, 2014). Essa sociedade, por sua vez,
teria como elemento intrínseco o ideal de competição justa, secularizada,
democrática e subordinada a uma ordem burocrática, impessoal e legal (Villas Bôas, 2006, p. 61).
Segundo Villas Bôas (2014), a institucionalização
da sociologia não representou a criação de novas questões ou hipóteses. Ela
representou, no entanto, a reelaboração das questões anteriores através da
demarcação da dualidade brasileira, dividida entre tradicional e moderna. Sobre
a sociologia dos anos 1950, Villas Bôas (2014) argumenta:
A questão da modernidade se impõe à
sociologia. O transplante de ideias, padrões científicos, hábitos e costumes
“racionais” passam a constituir um dos focos polêmicos da atenção dos
sociólogos. Embora discordassem quando à modalidade de integração do Brasil no
conjunto das sociedades modernas, aceitavam esse desafio como exigência
histórica, política e intelectual (p. 14).
A demarcação do objetivo central da
sociologia brasileira entre as décadas de 1930 e 1950 é fundamental para eu
sustentar que Souza não rompe com um traço central do pensamento social e
político brasileiro, que é o dualismo entre rural e urbano ou tradição e
modernidade, sobretudo se levarmos em consideração que o autor utiliza obras
clássicas para reinterpretar o Brasil.
Jessé Souza (1999) volta suas críticas às
interpretações que partem da sociologia da dominação weberiana para conceituar
o atraso brasileiro, que o sociólogo define como ideologia do
atraso6. De acordo com Werneck Vianna (1999), o Weber recepcionado
no Brasil não fora aquele das patologias da modernidade, mas sim do acesso ao
moderno. Essas interpretações pressupõem a aceitação sem restrições do
diagnóstico weberiano sobre o desenvolvimento ocidental (Souza, 1999). Como consequência, o que é
tradicional e moderno fica implícito nas análises como referência absoluta (Souza, 1999, p. 17). Desta forma, a
denominação ideologia do atraso é justificada porque somos comparados
aos Estados Unidos, que seriam essencialmente um país moderno, protestante e
democrático, marcado pelo controle de afetos e pela disciplina impessoal, pois
foi onde o racionalismo ocidental teria se desenvolvido de forma plena7 (Souza,1999). Se os Estados Unidos tiveram a
herança moderna do protestante ascético, o Brasil, por sua vez, é caracterizado
pela pré-modernidade, representado pelo catolicismo e pelas relações pessoais e
afetivas (Souza, 1999). Souza (1999) afirma que um princípio
absoluto para construção de comparações culturais não serve à ciência, mas
apenas à ideologia. Isso porque as interpretações culturalistas que demarcam
o atraso brasileiro constroem formulações baseadas na indeterminação,
não favorecendo a um conhecimento preciso do que teríamos de efetivamente
atrasado em relação aos Estados Unidos (1999). A maneira como são construídas
essas interpretações nos deixa em posição de permanente subalternidade.
Holanda (2010) possui importância central
para a construção da visão hegemônica sobre o Brasil contemporâneo, pois seria
o grande sistematizador das ciências sociais no século XX através da junção das
teses do personalismo e do patrimonialismo, conceitos que
demonstrariam como a sociedade brasileira enfatizaria os laços pessoais como
unidade moral organizadora das relações sociais (Souza, 2006b).
Raízes do Brasil teria produzido
a interpretação dominante do mito nacional através da tese do homem
cordial (Souza, 2016). Holanda seria
responsável por incorporar acriticamente o racismo científico, uma vez que nos
interpreta como possuidores de uma tendência inata à corrupção (Souza, 2016, p. 35). O homem cordial seria
a representação do brasileiro genérico de todas as classes, emotivo, indigno de
confiança, presos às paixões do corpo e tendencialmente corrupto (Souza, 2015, p. 49).
Com a obra de Holanda, a corrupção
tornou-se um dilema interpretado como exclusivamente brasileiro (Souza, 2016). Desta forma, o homem
cordial nada mais é do que a incorporação da dominação e a consequente
reprodução do sentimento permanente de inferioridade (Souza, 2016). A interpretação de Raízes
do Brasil foi fundamental para a construção, portanto, de uma separação
ontológica entre os países do Atlântico Norte e o Brasil (Souza, 2015).
Em caminho contrário à argumentação de
Souza, é importante apontar que o sentido definitivo da noção de homem
cordial não tinha como objetivo fazer uma caracterização geral do
brasileiro, mas sim uma crítica ao Brasil agrário e seus representantes. A
caracterização geral do brasileiro, como vimos, é realizada apenas na edição de
1936. Assim, reitero que as críticas de Souza recaem sobre a apropriação das
teses de Holanda e não sobre os argumentos do autor em si, como demonstra o
trecho a seguir:
Uma ideologia melhor para os
interesses da elite econômica não existe. A leitura de Sérgio Buarque foi
ensinada nas escolas e nas universidades de todo país - como acontece até hoje
- e tornou possível fazer de mote da corrupção apenas do Estado o núcleo de uma
concepção de mundo que permite a elite mais mesquinha fazer todo um povo de
tolo (Souza, 2017, p. 33).
Mata (2018) traz uma questão interessante
sobre Souza e a sociologia da inautenticidade, porque o sociólogo
construiu uma relação contraditória entre a defesa da modernidade periférica e
o atraso de nossa sociologia. Precisamente, a sociedade brasileira
moderna teria uma sociologia presa em um estágio pré-sociológico. Assim,
teríamos uma sociologia do atraso da sociologia com Jessé Souza (Mata, 2018, p. 429). Mesmo com a demarcação
de uma questão relevante, Mata (2018) critica Souza sem
aproximá-lo analiticamente da sociologia da inautenticidade, o que
acredito ser o elemento mais consistente para a crítica às suas teses.
Nesse primeiro momento de embate com
as interpretações culturalistas do Brasil, Souza demonstra seus pressupostos e
defende a necessidade de construirmos comparações empiricamente fundadas para
saber o que realmente temos de atrasados em relação aos Estados Unidos, por
exemplo. Certamente, é um dos pontos altos de sua teorização.
Depois de criticar a visão hegemônica
sobre o Brasil, Souza (2006a) procura levar a cabo seu
paradigma alternativo, definido como a construção de uma teoria crítica da
modernização periférica. Em A Modernização Seletiva (2000), Souza
propõe um diálogo crítico com a sociologia da inautenticidade, que
recepcionou o Weber do atraso, para a construção de outra leitura do
sociólogo alemão para pensar o processo de modernização do país e nossos
principais dilemas. Essa releitura foi realizada a partir do Weber do racionalismo
ocidental e das patologias da modernidade8. Além da proposição de uma nova leitura
da sociologia weberiana, Souza parte de um diálogo com as duas principais obras
de Gilberto Freyre, Casa-Grande & Senzala e Sobrados e Mucambos.
Souza (2006a) inicia sua reinterpretação
através da obra Casa-Grande & Senzala. O sociólogo segue Freyre (2005) ao defender que durante o
período colonial o Estado mostrou-se uma realidade ausente, uma vez que o
patriarcalismo teria funcionado como fator estruturante não apenas da
sociabilidade existente, mas também das relações políticas e econômicas. A
sociedade colonial giraria em torno do patriarca, uma vez que a família seria o
alfa e ômega da organização social da colônia (Souza, 2006a, p. 104). Não existiam limites
à autoridade do patriarca, pois a ausência de limitações externas fazia com que
as inclinações emotivas do patriarca fossem decisivas para as relações sociais
(Souza, 2017, p. 53-4). O patriarca,
portanto, era o bárbaro que não conhecia nenhuma noção de limites para seus
impulsos primários, pois eram sádicas as relações do senhor com as mulheres
índias e negras, com as próprias mulheres brancas, com os filhos e com os
escravos (Souza, 2017, p. 52). Não havia, portanto,
nenhuma possibilidade de ações de racionais de conteúdo impessoal na sociedade
colonial. Teríamos sido fruto de uma sociedade singular estruturada pelo sadomasoquismo9, que demonstrava como o poder pessoal
vigia de forma plena no Brasil colonial e tradicional:
É nesse contexto de total dependência
dos escravos em relação ao senhor, sem a proteção que o costume e a tradição
garantiam ao elemento dominado em outras sociedades tradicionais,
possibilitando desse modo, em alguma medida pelo menos, formas de constituição
de auto-estima e reconhecimento social independentes da vontade do senhor, é
que podemos compreender a especificidade do tipo de sociedade, baseada no poder
pessoal, que aqui se constituiu (Souza, 2006a, p. 121).
Souza (2006a) concede ênfase decisiva à
escravidão, que ele analisa da mesma forma como fazem Freyre e Florestan. Para
Souza, a escravidão, herança cultural moura, era um verdadeiro sistema social
responsável por estruturar toda sociedade e também explicar a existência dos
seus conflitos mais importantes: “Sendo uma espécie de ‘instituição total’ no
Brasil, a forma peculiar da escravidão traria consigo a ‘semente’ da forma
específica que assumiu o poder pessoal e familístico entre nós” (Souza, 2006a, p. 112).
Souza (2006a), seguindo Freyre (2005), defende que o Brasil
escravista e colonial era uma ordem singular e plenamente tradicional, fruto da
herança cultural moura na forma de escravidão. A partir do tipo de escravidão
que foi constituída no Brasil é que poderíamos compreender o peso decisivo da
dominação pessoal de razão essencialmente diversa aos imperativos oriundos do
sistema capitalista. A demarcação deste ponto é fundamental porque Souza
continuará a interpretar o Brasil agrário durante o Império como uma ordem
estruturada pela dominação pessoal tradicionalista e de sentido essencialmente
distinto da ordem moderna, como veremos através de sua leitura distorcida da
obra de Franco.
O domínio pleno do tradicionalismo
durante o período colonial faz com que Souza (2000) interprete a modernidade
chegando ao Brasil de maneira singular se comparada com a modernidade central,
representada pela Europa e os Estados Unidos. As sociedades centrais tiveram
uma herança religiosa forte e bem estruturada, a ponto de fazer com que as
ideias fossem anteriores às práticas sociais, pois tiveram na ética religiosa
um elemento central para que passassem por um processo de modernização de
caráter transclassista. O Brasil, por sua vez, não possuiu essa herança
religiosa de conteúdo moral e ético, fazendo com que a nossa esquematização da
modernidade nos legasse as práticas sociais primeiro que as ideias. Desta
forma, nos tornamos singularmente modernos, pois reproduzimos um processo de modernização
seletiva10 e desviante em relação aos países
centrais.
Como defendem Perlatto e Lima (2009), a tese sobre a
instituição da modernidade brasileira fez com que a inautenticidade criticada
por Souza aparecesse em sua própria teorização, uma vez que o sentimento de
falta, incompletude e desvio em relação à modernidade central permanece como
uma dimensão fundamental da explicação11.
Precisamente, a modernização singular
fez com que o elemento tradicional do período colonial fosse transplantado para
o Império brasileiro. Ora, nesse sentido, a teorização de Souza não se difere
das interpretações feitas pela sociologia da inautenticidade, a ponto de
defender a existência de uma relação dual entre uma parte tradicional no campo
e outra moderna, existente no meio urbano. Nesta questão, por exemplo, Souza
segue a interpretação de Holanda, que critica com veemência como o intelectual
responsável por produzir a interpretação mais conservadora sobre o Brasil
contemporâneo.
A caracterização do período colonial
como plenamente tradicional tem uma função estratégica no argumento de Souza (2000), que é defender a tese segundo
a qual a modernidade central foi transplantada para o Brasil a partir de dois
eventos históricos ocorridos no século XIX: a abertura dos portos e a chegada
da Corte Portuguesa de Dom João VI, que fugia das tropas napoleônicas. Souza (2000) assimila a tese de Max Weber
sobre o racionalismo ocidental para defender a transplantação da modernidade
para o Brasil. Isto fez com que a abertura dos portos e a transplantação do
Estado português significassem a entrada no Brasil de Estado e mercado
como artefatos prontos. Esses eventos representariam o ponto zero da
modernização brasileira (Souza, 2017).
A partir da transplantação destas
instituições centrais da modernidade para a periferia, houve, segundo o autor,
toda uma modificação nas relações de sociabilidade e na conduta dos indivíduos.
Desta forma, as ações passaram a ser regidas pelas demandas oriundas das duas
principais instituições do mundo moderno, responsáveis por reproduzir uma
dominação impessoal, mesmo que restrita ao âmbito urbano, pois foi instituída
uma hierarquia das cidades baseada nas seguintes dualidades:
“doutores/analfabetos, homens de boas maneiras/joões-ninguém. Competentes,
incompetentes etc.” (Souza, 2017, p. 72). A partir da ação
seletiva de Estado e mercado, constituiu-se uma relação dual entre cidade e
campo. As ações de Estado e mercado ocorreram de forma paulatina porque as
instituições ainda não estavam constituídas em suas formatações maduras (Souza, 2006a).
Ao enfatizar a importância central de
Estado e mercado, Souza não os analisa como realidades materiais ou neutras.
Estas, por sua vez, reproduziriam uma hierarquia valorativa que produziria
certo tipo de personalidade fundamental para o processo de reconhecimento
social. Desta forma, aqueles que não se enquadrassem no tipo de personalidade
requerida por estas instituições não seriam reconhecidos e, portanto, ficariam
excluídos. Esta forma de concepção de Estado e mercado os coloca como fontes
morais, pois estas instituições hierarquizariam o comportamento dos indivíduos
(Souza, 2006a).
Devido à força moral de Estado e
mercado, Souza defende que o processo de reeuropeização narrado
por Freyre (2006) em Sobrados e Mucambos não
era simplesmente um elemento superficial. Para o sociólogo pernambucano, apesar
das modificações ocorridas no século XIX, o tradicionalismo continuava a ser o
elemento decisivo.
Souza (2006a), por sua vez, defende que o
processo narrado por Freyre teve como característica mais importante mudar a
organização social brasileira de ponta à cabeça, pois o domínio pleno do
tradicionalismo passou a ser duramente combatido pela força das instituições
modernas transplantadas do centro. Com o processo de modernização em âmbito
urbano, o poder tradicionalista do patriarca começava a ser questionado no
Brasil do século XIX: “São esses novos valores burgueses e individualistas que
irão se tornar o núcleo da ideia de modernidade e europeidade enquanto
princípio ideologicamente hegemônico da sociedade brasileira a partir de então”
(Souza, 2017, p. 63). Através de sua leitura
alternativa da obra freyriana sobre o século XIX, Souza (2000) defende, portanto, que o
Brasil começava a ser tornar um país singularmente moderno através da chegada
de navio da modernidade europeia (Souza, 2017, p. 69). Mesmo em sentido
diferente da sociologia da inautenticidade, o eurocentrismo também
está presente na teorização de Souza.
A modernidade que paulatinamente se
instituía no período imperial não fazia com que repetíssemos a história
pregressa da Europa como apontamos acima, pois a esquematização de
Estado e mercado fez com que constituíssemos uma modernidade singular. A Europa
constituiu uma modernidade responsável por modernizar todas as classes. Através
da generalização e homogeneização de um único tipo humano para todas as
classes, foi possível criar condições para a universalização de uma efetiva e
atuante ideia de cidadania (Souza, 2005, p. 67). Nossa singular esquematização,
por sua vez, fez com que chegássemos à modernidade através de um caminho
particular, que seria responsável por constituir seres humanos seletivamente
modernizados e diferenciados.
A anterioridade das práticas em
relação às ideias fez com que constituíssemos uma modernização seletiva, pois
modernizamos apenas uma parte da sociedade que teve condições de responder às
demandas modernas de Estado e mercado. A outra parte situada no campo, regida
por uma lógica tradicional, acabou não sofrendo o processo de modernização e,
com isso, terminou não reconhecida na ordem capitalista com o mesmo estatuto de
cidadania. Construímos, portanto, um padrão específico de cidadania e
subcidadania (Souza, 2006a). Para Souza (2017), a singularidade ocorria
porque os valores individualistas e universalistas de Estado e mercado não
foram generalizados para a base da sociedade, por isso o caráter seletivo e
segmentado da modernidade entre nós (Souza, 2017, p. 59).
Em decorrência da seletividade do
processo de modernização, a modificação da sociedade escravista para a
sociedade de classes deixou como grande nódoa a constituição de uma nova
hierarquia valorativa do capitalismo, estruturada por uma ordem competitiva
pautada pela ideologia do mérito (Souza, 2006a). Essa mudança foi responsável
por produzir uma massa de inadaptados às demandas de Estado e mercado, devido à
modernização seletiva que os manteve tradicionais. Não houve a incorporação dos
valores necessários para o reconhecimento social, porque os inadaptados não
eram vistos como produtivos, disciplinados e socialmente úteis (Souza, 2005, p. 63).
Se nas sociedades centrais houve um
processo histórico de aprendizado coletivo que resultou na homogeneização de
uma economia emocional para todos os indivíduos, responsável por ser o
fundamento do reconhecimento social infra e ultrajurídico e da moderna noção de
cidadania (Souza, 2006a), esse processo ocorreu de
forma seletiva e segmentada no Brasil. Em decorrência, não houve
compartilhamento por todos da noção de dignidade do produtor útil, que é o
elemento central para a disseminação da dimensão jurídica da cidadania e da
igualdade garantida pela lei (Souza, 2006a, p. 116).
Tivemos o embate valorativo entre dois
sistemas, ou seja, entre os europeizados e os não europeizados.
Ou seja, entre aqueles que conseguiram incorporar uma economia moral moderna
transplantada da Europa e aqueles que ficaram à margem do processo.
Precisamente, a forma como a modernização foi esquematizada no Brasil
fez com que reproduzíssemos uma ordem dual entre modernizados e tradicionais,
que se transformariam no Brasil moderno em adaptados e não adaptados à
sociedade capitalista (Souza, 2017). Houve a redefinição moderna
do negro e do dependente formalmente livre (Souza, 2006a, p. 161), pois ficaram
excluídos e formaram um grande contingente designado pelo autor como ralé
estrutural. O estilo de vida capitalista possuiria um potencial civilizatório e
emancipatório que não teria se institucionalizado plenamente na periferia, por
conta dos obstáculos advindos de uma ordem rural e tradicional e do consequente
processo de modernização seletiva.
A partir do debate com Charles Taylor12 e Pierre Bourdieu13, Souza (2006a) reforça a visão de Estado e
mercado como fontes morais, como já havia feito em sua leitura sobre Max Weber.
Essas instituições hierarquizariam de forma opaca e invisível os indivíduos que
se organizariam na sociedade capitalista de acordo com a sua ideologia
espontânea da igualdade de oportunidades, seja no centro ou na periferia.
Souza (2006a) defende que a ideologia que é reproduzida pela sociologia da
inautenticidade como um fato concreto apenas existe como uma justificativa
moral para a naturalização da desigualdade.
Para defender a singularidade da
modernização e da cidadania brasileiras, Souza (2006a) constrói uma leitura
alternativa do conceito de habitus de Bourdieu (2009). Se Bourdieu defende a
existência de um único tipo de habitus, Souza advoga que a modernização
seletiva foi responsável por gerar, como vimos, tipos humanos diferenciados,
resultando em um padrão de (sub)cidadania típico da nova periferia14. Assim, Souza (2006a) defende a existência de uma
pluralidade de habitus, cujo determinante de nossa desigualdade seria
o habitus precário.
O habitus precário representou
a reprodução de certo tipo de personalidade que terminou sendo
julgada como improdutiva e disruptiva para a sociedade (Souza, 2005, p. 59). Isso ocorria porque
esses indivíduos não tinham as precondições psicossoais para o reconhecimento
na sociedade de classes, que são o habitus primário e a personalidade
moderna (Souza, 2006a, p. 170). Como consequência,
houve a produção de uma massa de inadaptados às demandas modernas e capitalistas
de Estado e mercado na sociedade de classes, pois não conseguiram se modernizar
de forma plena. Foi o habitus precário a causa última da inadaptação
e da marginalização, pois representou a reprodução de uma massa de indivíduos
inadequados para o trabalho produtivo no mercado capitalista competitivo (Souza, 2005, p. 64). Em virtude disso,
a ralé estrutural não seria reconhecida como cidadã efetiva, sendo a
desigualdade brasileira explicada pelo não reconhecimento social de cerca de um
1/3 de sua população: “O que singulariza nossa sociedade como um todo, a
intuição inicial que guiou todos os meus trabalhos, é, portanto, a subclasse
dos subhumanos” (Souza, 2017, p.153). A partir da teorização
de Souza, o Brasil teria uma forma moderna de exclusão social, que servia para
desautorizar as interpretações culturalistas e essencialistas do atraso brasileiro:
Nesse sentido, meu argumento implica
que nossa desigualdade e sua naturalização na vida cotidiana é moderna, posto
que vinculada a eficácia de valores e instituições modernas com base em um
bem-sucedida importação de “fora para dentro”(Souza, 2006a, p.17).
Nesse sentido, Souza afirma que as
interpretações que focam o dilema da desigualdade como fruto de fatores
pré-modernos, como o patrimonialismo, repetem uma visão do mundo como se
este fosse transparente. Para o sociólogo, todavia, a sociedade moderna produz
consensos opacos e inarticulados responsáveis pelo esquecimento da ralé
estrutural e pela consequente naturalização da desigualdade: “Ora, é
precisamente o abandono secular do negro e do dependente de qualquer cor à
própria sorte, a ‘causa’ óbvia de sua inadaptação” (Souza, 2005, p. 66).
Em contraste com a modernidade
periférica, que produziu uma dualidade intrínseca entre adaptados e
inadaptados, ou seja, entre cidadãos e subcidadãos, a modernidade central teve
como elemento decisivo, na passagem da sociedade tradicional para a moderna, a
generalização do tipo único de personalidade burguesa, responsável por
generalizar atributos como o domínio da razão sobre as emoções, cálculo
prospectivo e auto responsabilidade às classes dominadas (Souza, 2006a, p. 165). As sociedades
centrais, portanto, tiveram como consequência um amplo processo de aprendizado
moral e político que inexistiu na modernidade periférica.
Até o governo Vargas seríamos regidos
ainda por uma ordem dual, ou seja, tendencialmente moderna nas cidades e
tradicional no campo (Souza, 2006a, p. 183). Com a revolução de
1930, tivemos “a entronização da lógica da dominação material e simbólica
tipicamente impessoal e opaca do capitalismo, também na periferia, que engloba
e redimensiona, segundo sua própria lógica, todas as relações sociais” (Souza, 2006a, p. 182). A partir desse
momento, houve a intensificação da exclusão de 1/3 da população brasileira com
a modernização em grande escala.
Como resultado da modernização
singular, constituímos, como vimos, uma dualidade entre setores europeizados (modernizados)
e setores não europeizados (tradicionais), ou seja, entre aqueles que
conseguiram se adaptar às demandas modernas de Estado e mercado e aqueles que,
devido à inadaptação, terminaram formando a ralé estrutural:
Com a designação “europeu” eu não
estou me referindo, obviamente, à entidade concreta “Europa”, nem muito menos a
um fenótipo ou tipo físico, mas ao lugar e a fonte histórica da concepção
culturalmente determinada de ser humano que vai ser cristalizada na ação
empírica de instituições como mercado competitivo e Estado racional
centralizado, as quais, a partir da Europa, literalmente “dominam o mundo” em
todos os seus rincões e cantos, como exemplarmente mostra o caso brasileiro em
detalhe que já examinamos (Souza, 2006a, p. 281).
A teorização de Jessé Souza sobre a
subcidadania faz com que a ralé estrutural não tenha condições de
superar sua situação de classe, ou seja, havia uma incapacidade congênita para
os excluídos alcançarem o reconhecimento social para que pudessem romper com o
círculo de ferro no qual elas estavam enredados. Precisamente, não havia
condições para uma ação coletiva transformadora da ralé estrutural. Mesmo
partindo de um ponto de vista distinto, a incapacidade transformativa das
classes populares presente na sociologia da inautenticidade também é
repetido pela sofisticada teorização de Souza. Ademais, apesar de negar o
culturalismo e as interpretações que demarcam o tradicionalismo como nosso
principal dilema, Souza também reproduz uma perspectiva culturalista para
compreender a inexistência de reconhecimento da ralé estrutural. Isto
porque Estado e mercado são vistos como fontes morais, ou seja, valorativas. É
a não incorporação dos valores da sociedade capitalista moderna que explicaria
a desigualdade social: “A teoria crítica da estratificação social trilha, a seu
modo, a mesma viagem redonda de que falava Raymundo Faoro, e o ponto de fuga da
crítica ao culturalismo é algo como um culturalismo de segunda ordem” (Mata,
2017, p. 434).
Minha hipótese é que as teses sobre a
modernização seletiva e a subcidadania terminam não conseguindo se desvencilhar
totalmente das interpretações que são utilizadas de forma instrumental pelo
autor, como são os casos de Freyre e Florestan, e àquelas que ele critica como
é o caso de Holanda. Precisamente, as teses principais de Souza ficam muito
próximas das interpretações dos autores acima citados, porque a teorização
sobre a modernização seletiva e a subcidadania é tributária da dualidade
rural-urbano. Assim, vale o questionamento se, de fato, temos como marca
distintiva uma modernização seletiva e uma ralé estrutural nos moldes
construídos pelo autor.
Passo a analisar a interpretação que
Souza realiza dos trabalhos de Franco e Florestan, que são utilizados para
corroborar suas teses sobre a modernização seletiva e a subcidadania. O
trabalho de Franco daria a possibilidade de Souza demonstrar como o
tradicionalismo do negro, que terminou fazendo com que ele não se adaptasse às
demandas capitalistas, modernas e impessoais da ordem competitiva, também fosse
elemento presente no homem livre pobre de qualquer cor, uma vez que o personalismo possuiria
um lugar estrutural em todas as relações sociais do sistema escravista (Souza, 2006a).
Através da obra de Franco, Souza
demonstraria, portanto, como o tradicionalismo presente no comportamento dos
escravos era elemento estruturante do Brasil agrário e escravista. Esse domínio
estrutural do tradicionalismo ocorreria porque o dependente formalmente livre
seria um subproduto deste sistema responsável por embasar todas as relações
sociais (Souza, 2006a). Através do trabalho de
Franco, seria possível sustentar a existência de um padrão de subcidadania
típico do Brasil e da nova periferia.
De acordo com Souza (2006a), o trabalho de Franco lhe
interessara porque oferecia uma investigação empírica do drama psicossocial do
dependente formalmente livre, que possibilitava a generalização da pesquisa da
autora sobre Guaratinguetá, no Vale do Paraíba, ao restante do Brasil. Esta
região do Estado de São Paulo tinha como uma marca crucial a pobreza. Souza (2006a) aponta corretamente como
a análise de Franco era generalizável a outras regiões do país, mesmo que em
sentido oposto àquele defendido pela autora.
Souza (2006) enfatiza a dimensão
prático-moral para apontar como a violência era um fator estruturante das
relações sociais e, consequentemente, para a ausência de um código moral que
impusesse padrões institucionalizados de conduta como havia ocorrido no centro.
Em virtude disso, instituímos uma ordem desviante em relação àquela realidade,
pois nos formamos de maneira inferior em termos materiais e simbólicos: “Aqui
notamos a mesma ausência da institucionalização de uma esfera moral autônoma de
fundo ético-religioso, que caracteriza a nova periferia, que também havíamos
notado em Casa Grande e Senzala” (Souza, 2006a, p. 12).
Devido ao déficit ético-religioso,
tivemos no Brasil escravista o personalismo e a honra como elementos decisivos
das relações sociais. Souza (2006a) utiliza o trabalho de Franco
para corroborar seu argumento sobre o peso da escravidão como instituição
total, mas que é negado pela autora.
O sociólogo defende que a imposição da
violência como elemento estruturante das relações sociais não era apenas
reflexo da pobreza material e da escassez que explicariam o horizonte moral do
dependente, mas de sua pobreza espiritual, moral e simbólica, que transformava
a violência no único código legítimo (Souza, 2006a, p. 124). A violência,
portanto, representava o tradicionalismo do sistema escravista interpretado
como instituição total:
No entanto, o que existe aos meus
olhos de mais interessante e importante no trabalho de Carvalho Franco é o
magistral desvelamento do código de honra que unia, numa relação vertical cujo
vínculo hierárquico era tomado naturalizado e intransparente, dependente e
senhor de terras. É esse vínculo hierárquico naturalizado e tornado
intransparente que esclarece a importância do escravo como “presença ausente”
conferindo, apesar de não ser um ele direto da referida relação, o seu caráter
peculiar. Como vimos, era o escravo que ocupava o lugar produtivo fundamental
no sistema escravocrata. Vimos também que o dependente livre era, por conta
disto, obrigado a ocupar as franjas e os interstícios da atividade econômica
principal. Isso o obrigava a uma dependência objetiva em relação ao senhor de
terras, apesar da ilusão subjetiva de liberdade ser um componente construtivo
dessa forma peculiar de dominação pessoal (Souza, 2006a, p. 124-5).
Para Souza (2006a), o elemento mais importante
do trabalho de Franco é a revelação da força e das vicissitudes da dominação
pessoal de razão essencialmente diferente dos valores do sistema capitalista.
Ao enfocar as relações de favor do agregado com o senhor, Souza (2006a) afirma que a peculiaridade
da dominação pessoal brasileira está na ausência de um código moral explícito e
compartilhado por todos, fato não ocorrido no centro que teve a religiosidade
ética como elemento estruturante para constituição da sociedade moderna,
racional, secular e regida por uma lógica impessoal:
O primeiro aspecto relevado por
Carvalho Franco é o fechamento de horizonte de possibilidades dessa população
para a compreensão de qualquer relação impessoal. Todo horizonte de
significados, no contexto examinado, é sempre redutível a motivos e atributos
de sujeitos concretos. Não existe a possibilidade de “abstração valorativa” que
pudesse permitir pensar-se em termos de valores universalistas ou impessoais (Souza, 2006a, p. 126).
A relação de contraprestação de
favores e proteção apontava para um quadro de sujeição absoluta à boa vontade
do senhor, ou seja, demonstrava o domínio inconteste da dominação pessoal e do
tradicionalismo no Brasil rural e escravista, assim como está presente nas
obras de Holanda e, sobretudo, Freyre, com a qual o trabalho de Franco
guardaria várias similitudes. O elemento estruturante dessa sociedade,
portanto, é a dominação pessoal e tradicionalista.
Escravos e homens livres possuíam o
mesmo caráter de submissão pessoal aos desejos do senhor (Souza, 2006a). Para tanto, Souza (2006a) defende a existência de
uma contiguidade entre a pesquisa de Freyre sobre a escravidão muçulmana e
a realizada por Franco sobre o dependente formalmente livre, pois elas
demonstrariam a inexistência de tomada de consciência racional dos seus
interesses:
Ambos irão formar a “ralé” dos
imprestáveis e inadaptados ao novo sistema impessoal que chega de fora para
dentro “como prática institucional” pura, sem o arcabouço ideal que, nas
sociedades centrais, foi o estímulo último para o gigantesco processo de
homogeneização do tipo humano contingente e improvável que serve de base à
economia emocional burguesa, e que permite a sua generalização também para as
classes subalternas. É apenas quando este processo é levado a cabo com alguma
medida significativa de sucesso, que poderemos ter a chance de que a lei
abstrata que serve de substrato à noção de cidadania seja uma realidade efetiva
(Souza, 2006a, p. 129).
A leitura unilateral e
descontextualizada do trabalho de Franco realizada por Souza, como argumento na
próxima seção, termina retirando os elementos mais significativos da crítica da
autora às interpretações dualistas que defendem a existência de uma diferença
essencial entre centro e periferia que, fundamentalmente, é um dos principais
objetivos dos trabalhos produzidos por Souza. O sociólogo, portanto, realiza
uma leitura de Franco contra Franco, uma vez que a obra da autora é utilizada
em sentido contrário ao seu objetivo ao produzir a tese sobre a velha
civilização do café.
De Florestan, Souza utiliza a primeira
parte da Revolução Burguesa no Brasil e o primeiro volume da Integração
do Negro na Sociedade de Classes. Assim como realizado com Franco, a utilização
dos trabalhos de Florestan tinha como objetivo corroborar a teorização sobre a
modernização seletiva e a subcidadania, respectivamente, como veremos a seguir.
Souza utiliza A Revolução Burguesa no Brasil para reforçar sua tese
sobre o processo de modernização de fora para dentro, bem como seu caráter
seletivo. Precisamente, Souza (2006a) faz um uso instrumental da
obra de Florestan (2006). Assim o processo de
Independência, ocorrido em 1822, representou a incorporação no Brasil do padrão
do mundo ocidental moderno:
Florestan percebe, com clareza e
agudeza impecáveis, que o ponto essencial neste contexto é a compreensão do
‘padrão de civilização dominante a partir da transformação estrutural das
formas econômicas, sociais e políticas fundamentais (Souza, 2006a, p. 130).
Mesmo reproduzindo esse padrão
civilizatório, a institucionalização que ocorreu entre nós teve um caráter
desviante e incompleto devido ao déficit ético-religioso que fez com
que o tradicionalismo fosse transplantado para a sociedade nacional, sendo
fator decisivo para explicar as condutas e relações sociais existentes no
âmbito rural.
Por conta da singular
institucionalização do padrão civilizatório ocidental, o liberalismo narrado
por Florestan (2006) não conseguiu
formular, como nos casos europeu e norte-americano, expectativas de longo prazo
para a sociedade com um alto grau de consciência e intencionalidade. Assim, não
teríamos homogeneizado o tipo de personalidade e economia emocional burguesa
como existentes nos países centrais (Souza, 2006a, p. 135). Esse desvio em
relação à modernidade central ocorreria, por sua vez, pela permanência do
tradicionalismo como elemento central da sociedade escravista e rural, como
pode ser visto através da obra de Florestan15:
Assim, até a derrocada do escravismo
(1888) e do Império (1889), as novas forças e práticas sociais em ação desde o
início do século XIX mostram-se ainda sob a lente de distinções estamentais da
ordem anterior. É precisamente esse “déficit” de articulação que dá conteúdo à
noção de Florestan de uma revolução burguesa “encapuzada”. Ela se produz
molecularmente, capilarmente, em pequeno, no dia a dia e nas práticas
cotidianas, mas sem a articulação consciente e de longo prazo de uma visão de
mundo adequada a seus próprios interesses (Souza, 2006a, p. 133).
Depois de utilizar a Revolução
Burguesa no Brasil para reforçar sua teorização sobre a modernização
seletiva, Souza traz a leitura do clássico A Integração do Negro na
Sociedade de Classes para sustentar de forma empírica sua
teorização sobre a subcidadania. Ao se debruçar sobre a obra de Florestan,
Souza procura construir uma interpretação crítica ao analisar o equívoco de se
pensar os conflitos de classes como frutos de resíduos da ordem tradicional.
Todavia, o sociólogo parte de uma leitura equivocada sobre o significado do
tradicionalismo para a interpretação de Florestan Fernandes. Florestan (2008a, 2008b) não analisa o tradicionalismo como
resíduo, ou seja, como elemento pertencente à ordem tradicional que estaria
sendo solapado pelo processo de modernização.
O sociólogo paulista, todavia, aponta
o tradicionalismo como elemento estruturante da ordem escravista e também da
sociedade de classes, uma vez que fora responsável por gerar uma ordem social
competitiva incompleta e distorcida quando comparada à congênere dos países
centrais que teriam conseguido romper de forma plena com o antigo regime tradicionalista
através da constituição de uma ordem social competitiva aberta “A integração
do negro é uma análise sobre os limites da democracia no Brasil e pode ser
alinhado à atualidade que põe em questão a concepção formal de justiça e de
igualdade de condições sociais, política e culturais” (Cohn apudBotelho et al., 2018, p. 38). A
citação acima demonstra que a tese dos resíduos não se sustenta, pois Florestan
não acreditava que os elementos tradicionais que impediam a institucionalização
plena da ordem competitiva e da democracia iriam ser derruídos com o
aprofundamento do processo de modernização.
Ao construir sua tese sobre o
capitalismo dependente, Florestan (2006) advoga que a junção
do tradicionalismo ao moderno é um traço indissolúvel do capitalismo
dependente, pois a unidade contraditória entre ambos só se encerraria com o
término do próprio capitalismo existente na periferia. Para Florestan,
portanto, a formação brasileira seria marcada pelo encontro reiterado em
tradição e modernidade, mesmo que dinâmico e diverso (Botelho et al., 2018, p. 17).
De acordo com Souza, a reprodução do
comportamento tradicional do negro foi um fator decisivo para sua inadaptação
ao ambiente moderno e concorrencial da sociedade de classes nascente:
Ao negro, fora do contexto
tradicional, restava o deslocamento social na nova ordem. Ele não apresentava
os pressupostos sociais e psicossociais que são os motivos últimos do sucesso
no meio ambiente concorrencial (Souza, 2006a, p. 154).
Souza (2006a) argumenta que a questão
central abordada por Florestan (2008a) é a organização
psicossocial do negro como um pré-requisito fundamental para a participação com
chances reais de êxito na sociedade capitalista. Faltava ao ex-escravo uma
pré-socialização que o preparasse para a vida em uma sociedade capitalista,
moderna e de classes, cuja estratificação não se daria mais por códigos
tradicionais como o personalismo que, por sua vez, era traço estruturante na
sociedade escravista (Souza, 2006a).
Assim, o tradicionalismo do negro
torna-se o elemento central a explicar sua marginalização continuada que, na
interpretação de Souza, seria generalizável para os dependentes formalmente
livres de qualquer cor que viviam à margem do sistema escravista. Esse
contingente não possuiria as condições psicossociais de personalidade para se
adaptar ao trabalho livre e agir conforme os requisitos da sociedade
competitiva (Souza, 2006a).
O comportamento tradicionalista e de
razão essencialmente diversa daquele requerido pela sociedade moderna e de
classes foi reproduzido pelos negros devido ao padrão familiar desorganizado: “A
vida familiar desorganizada, aliada à pobreza, era responsável por um tipo de
individualização ultra egoísta e predatória” (Souza, 2006a, p. 158). Em razão da
reprodução secular deste padrão disruptivo e tradicionalista de desorganização
familiar, foi gerada a ralé estrutural, que seria incapaz de
incorporar a disciplina produtiva do capitalismo:
Ora, é precisamente o abandono secular
do negro e do dependente de qualquer cor à própria sorte a “causa” óbvia de sua
inadaptação. Foi este abandono que criou condições perversas de eternização de
um “habitus precário”, que constrange esses grupos a uma vida marginal e
humilhante à margem da sociedade incluída (Souza, 2006a, p. 160).
Apesar da sofisticação da análise e
dos elementos inovadores trazidos para a compreensão da modernização brasileira
e da desigualdade social, Souza repete o dualismo representado pela disjuntiva
Brasil rural tradicional-Brasil urbano moderno presente na sociologia
da inautenticidade. Esta é uma das armadilhas em que nossos intérpretes caem ao
analisar o antigo regime sob o prisma do sistema escravista
como instituição total.
Ademais, Souza termina seguindo
Holanda em sua caracterização do Brasil agrário, escravista, patriarcal e
personalista. É por conta dessa continuidade que defendo que Souza não se
afastou completamente da sociologia da inautenticidade como defende
ter feito, e não apenas por construir uma imagem da modernidade periférica que
se constitui como desvio, falta e incompletude em relação aos países centrais,
que faria com que não houvesse similitudes de conteúdo em relação às
interpretações da sociologia da inautenticidade e a teorização de
Jessé Souza.
Analiso a seguir o trabalho de Franco
sobre os homens livres pobres em um sentido diferente daquele trabalhado por
Souza, pois apresento uma leitura contextualizada de sua obra que inexiste na
interpretação do sociólogo. Assim, procuro trazer elementos para apontar a
complexidade do período escravista e demonstrar que o elemento moderno não foi
resultante apenas do processo de reeuropeização, mas também das relações
de produção que aqui foram constituídas. No final da seção, apresento algumas
importantes questões trazidas por Cardoso (2008, 2010) que me auxiliarão à crítica a Jessé
Souza. Com isso, procuro trazer elementos para questionar as teses centrais de
Souza e aproximá-lo da sociologia da inautenticidade.
Como argumentei acima, defendo que
Jessé Souza retira o elemento de menor importância e ainda de uma forma
distorcida da interpretação de Franco, que é o argumento da autora sobre a
importância central da dominação pessoal. Como último ponto desta parte,
gostaria de expor elementos da interpretação de Maria Sylvia de Carvalho Franco
sobre o Brasil escravista e também as críticas feitas por ela em relação às
interpretações produzidas pela Cadeira de Sociologia I da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP), bem como às
leituras hegemônicas durante os anos 1950-1960. De acordo com Cazes (2014):
O alvo de suas críticas eram as
interpretações “dualistas” da sociedade brasileira - aquelas que pensavam de
forma disjuntiva os pólos “tradição” e “modernidade”, ou “feudalismo” e
“capitalismo” - que colocavam numa passado “atrasado” as peias para o pleno
desenvolvimento da ordem moderna industrial. Problematizando os próprios termos
da polarização “arcaico” versus “moderno”, a autora desafiava tanto
as leituras “ortodoxas” do marxismo etapista, quanto a sociologia da
modernização de cunho estrutural-funcionalista, hegemônica nas Ciências Sociais
da época (p. 116).
Franco (1997) trabalha com a noção de
unidade contraditória para caracterizar o período escravista, uma vez que
defende que não houve o domínio pleno dos elementos tradicionais e
nem dos modernos, pois a organização econômica formada nos latifúndios
tinha como objetivo tanto a produção dos meios de vida quanto de mercadorias
voltadas para o mercado internacional. Nesse sentido, a interpretação de Franco
assemelha-se à obra clássica de Caio Prado Junior (2000), que defende que
o sentido da colonização era explorar recursos naturais em proveito
do comércio europeu16. Cazes (2014) argumenta que Franco retoma a
tese do sentido da colonização de forma particular. A singularidade
de sua perspectiva ocorre porque, ao caracterizar a gênese burguesa de nossa
formação no período colonial, a interpretação de Franco radicaliza a relação
entre capitalismo e escravidão existente na obra de Caio Prado (Cazes, 2014, p. 122).
Para Franco (2011), a escravidão e a violência
eram funcionais ao capitalismo. Nesse sentido, e aliadas à maior complexidade
que a produção escravista passou a ter no século XVIII, ligada diretamente ao
mercado internacional, a autora vê como problemática a conceituação do modo de
produção a partir do escravo, ou seja, da escravidão como instituição
total como fazem Freyre, Florestan, Holanda e Jessé Souza.
Franco (2011) afirma que a Faculdade de
Filosofia contribuiu para o desenvolvimento do capitalismo no Brasil, pois os
trabalhos que analisavam a sociedade escravista e o pré-capitalismo nela
existente iluminaram de maneira silenciosa a racionalidade capitalista, além
dos trabalhos feitos no CESIT, “de onde saíram os estudos sobre o empresariado
e sobre a classe operária, projetados sobre o pano de fundo do capitalismo clássico,
e tributários do ‘atraso’ brasileiro” (Franco, 2011, p. 176). As interpretações
construídas na FFCL foram responsáveis por construir uma justificação
intelectual que acabou desaguando no chamado “milagre brasileiro”. De acordo
com Botelho (2013): “Sua obra sociológica,
antes problematiza que corrobora alguns dos pressupostos empíricos, históricos
e teóricos dos trabalhos do seu orientador Florestan Fernandes e de seu grupo
como um todo” (p. 357).
A autora nos dá a possibilidade de
observar como a formação particular do sistema capitalista global pode gerar
formações modernas para além daqueles advindas dos países centrais. Ou, nas
palavras de Franco, seriam analisadas as peculiaridades da formação capitalista
brasileira dentro do sistema capitalista global. O cuidado da autora com a
dimensão histórica e a inexistência em seu argumento dos pressupostos caros à
teoria da modernização a fazem questionar duramente a utilização das categorias
da sociologia da dominação weberiana para analisar o suposto tradicionalismo da
sociedade brasileira como fazem Florestan (2008c) e Cardoso (2003):
Procurei usar os conceitos de relação
comunitária, de autoridade tradicional e de sociedade estamental conforme os
requisitos dos tipos ideais, para esclarecer sua inadequação à sociedade
brasileira e, ao mesmo tempo, ressaltar a técnica defeituosa de generalização
que tem levado à inapropriedade no uso desses conceitos. De passagem, quero
apenas advertir que essa objeção não se resolve com o argumento da distância
entre situações empíricas e conceitos puros. A referida inapropriedade vem de
se esquecer que os tipos ideais, em que pese seu caráter formal, são
construções teóricas que expõem o caráter singular dos fenômenos culturais.
Nessa medida são históricos. São conceitos genéticos, cujo rigor supõe a
observância dos nexos de sentido entre seus componentes, da configuração em que
estão arranjados, com suas tendências essenciais e o princípio que as governa.
A negligência desses requisitos transforma-os em conceitos classificatórios que
meramente sumariam traços comuns a certos fenômenos empíricos (Franco, 1997, p. 15-6).
Por conta da análise a partir do modo
de produção escravista, a sociedade brasileira terminou sendo considerada
estamental, pois estruturada pelo tradicionalismo. Para Franco (2011, p. 176), os trabalhos que
constituíram uma proposição dualista para criticar o pré-capitalismo e a
sociedade escravista tinham como elemento implícito a iluminação da
racionalidade civilizadora da modernidade: “Tradicional e moderno serviam para
distinguir sociedades ‘atrasadas’ e sociedades ‘avançadas’ que constituem o
começo e o fim de um processo de modernização” (Villas Bôas, 2014, p. 24). A partir de uma
perspectiva estruturada pela historicidade, Franco desautoriza a reificação das
categorias tradicional e moderno, que possuíam um caráter
normativo e que também foram incorporadas de maneira acrítica (Botelho, 2013, p. 354).
De acordo com Franco (2011), o conceito de estamento foi
utilizado como categoria classificatória e não como conceito histórico, pois
tinha a função de distinguir a sociedade brasileira escravista do capitalismo
como instância civilizadora:
Nem do ponto de vista teórico, nem da
pesquisa histórica, sustenta-se a caracterização “estamental” da sociedade
brasileira, mas este rótulo cumpriu a importante tarefa ideológica de separar o
economicamente “irracional e improdutivo”, o “socialmente violento e
preconceituoso”, o “politicamente reacionário”, do moderno, do progressista, do
último termo do milenarismo, ora escondido, ora confessado: o capitalismo como
instância civilizadora. Sociedade escravista e estamental, de razão
essencialmente diversa da sociedade de classes, do trabalho livre e da
racionalidade capitalista: este é o quadro em que se entrincheirava a teoria da
história brasileira (Franco, 2011, p. 173).
Portanto, não era no sentido exposto
por Souza (2006a) que Franco defendeu que a
dominação pessoal era um elemento central no Brasil escravista, pois a
pessoalização demarcada pela socióloga era individualizada, ou seja, voltada
para uma conduta moderna (Cazes, 2014). Como afirma Cazes (2014), dominação pessoal e dominação
burguesa estavam entrelaçados na velha civilização do café através de
um padrão autocrático de mando. Assim, a dominação pessoal relatada por Franco
apenas possui inteligibilidade quando é relacionada à atividade lucrativa e ao
interesse econômico que eram decisivos naquela sociedade. Portanto, a dominação
pessoal estava relacionada diretamente com a lógica impessoal do capitalismo,
pois o elemento considerado velho era funcional ao novo voltado
para a acumulação capitalista. Desta forma, a junção entre esses dois elementos
seria suficiente para demonstrar como construímos uma formação capitalista
autêntica na periferia porque o sentido da produção aqui realizada não se
diferia daquele existente nas sociedades do capitalismo originário. Por isso,
defendo que Souza distorce o potencial interpretativo contido no trabalho de
Franco, ao utilizá-lo para corroborar sua teorização sobre o caráter
tradicional da dominação pessoal no Brasil agrário.
Franco tinha como objetivo defender a
impropriedade da tese das resistências à mudança que preferiam acentuar a força
dos elementos tradicionais: “[...] procurei esclarecer como o conjunto de
elementos que formalmente poderiam ser identificados como tradicionais apenas
se torna inteligível quando referido à produção lucrativa” (Franco, 2011).
Outro ponto muito importante para o
questionamento do pretenso caráter tradicional da sociedade rural e escravista
refere-se à organização interna das famílias pertencentes às camadas
dominantes. Franco (1997) questiona a tese de que os
senhores de terra teriam uma organização interna rígida o suficiente para
reproduzir uma concepção estamental de vida:
Consideremos o padrão de organização
da família tradicional brasileira, vigente entre as camadas altas da sociedade,
até os fins do século XIX. Durante esse período em que tendeu para um padrão
patriarcal de organização, a família brasileira apresentou uma dupla estrutura:
um núcleo legal, composto do casal e seus filhos legítimos, e a periferia,
constituída por toda sorte de servidores e dependentes. O casamento, longe de
ser deixado à discrição das partes diretamente interessadas, decidia-se conforme
ponderações impessoais e de acordo com os interesses da família enquanto grupo.
O processo de seleção dos cônjuges deixa bem claro o quanto as uniões estiveram
fundadas em considerações racionais de interesses. Completa-se esse quadro ao
se indicar que, mediante alianças intrafamiliares, estabelecia-se uma
intrincada, ampla e solidária rede de parentesco, integrando-se assim grandes
grupos que constituíram um poderoso sistema de dominação socioeconômica. A
família moldou-se dominantemente para realizar essa função ordenadora das
relações sociais antes que para resolver problemas de ordem emocional ou sexual
(Franco, 1997, p. 35).
A partir da citação de Franco faço os
seguintes questionamentos: se a organização patriarcal era fundada em
interesses racionais e impessoais, como a modernização brasileira foi seletiva
e voltada unicamente para o âmbito urbano? É sustentável a tese da dualidade
entre rural e urbano? Ao contrário da interpretação de Souza, era a dimensão
impessoal e racional do interesse que funcionou como elemento norteador para a
formação familiar entre as camadas dominantes durante o período escravista que
durou até o final do século XIX.
Franco (1997) refere-se à organização da
produção do café através da ênfase nos seus tipos sociais característicos: o
fazendeiro, o tropeiro e o vendeiro, estes últimos sendo os dependentes que
estariam submetidos à dominação personalista e estritamente tradicional segundo
a interpretação de Souza. Franco argumenta que a organização interna da fazenda
foi realizada a partir de critérios de mercado, o que desautorizava a
caracterização de tipo estamental. A diferença que existia entre as fazendas
não se dava pela tradição e pelos valores estamentais, mas sim devido a
critérios produtivos e de mercado, como o tamanho e a escala de produção.
Assim, o mercado funcionava como elemento definidor das ações que nelas eram
tomadas (Franco, 1997).
Através da análise desses tipos
sociais, que representavam a diferenciação social existente, é possível
observar como a sociedade escravista possuía uma organização dinâmica que
auxiliou mais uma vez a autora a questionar a interpretação da sociedade
escravista como rígida, estamental e, portanto, estritamente tradicional. A
dependência pessoal não seria a prova da força da dominação estamental e
tradicionalista, porque estava pautada pelo interesse econômico.
O elemento moderno era o fator
estruturante daquela sociedade, uma vez que tinha papel crucial desde a
organização familiar dos grupos dominantes, as relações entre os homens livres
e dos fazendeiros com os escravos.
Franco (1997) demonstra como as economias
de mercado e de subsistência foram realidades correlatas durante o século XIX,
coexistindo como unidades contraditórias. Aliás, esse seria o traço principal a
caracterizar a realidade brasileira escravista que, apesar de ter no moderno
interesse econômico o seu elemento norteador, tinha dentro de si fatores que
coexistiam de maneira funcional e contraditaria, como a dominação pessoal, a
escravidão, o desvirtuamento do poder público em interesse privado e o arbítrio
através da violência estrutural. Bem, todos esses elementos são interpretados
como fatores impeditivos à plena realização do capitalismo. Para a autora,
todavia, esses fatores eram funcionais ao desenvolvimento do capitalismo
durante o período escravista da história brasileira.
A análise de Franco (1997) alia teoria social com
análise histórica densa para defender ao longo do trabalho a impropriedade em
se caracterizar o Brasil escravista como pré-moderno e a inadequação em
compreendê-lo, a partir da escravidão, como um sistema social capaz de explicar
todas as relações sociais e de produção. Como lembra Botelho (2013), Franco produziu a crítica
teórica mais detalhada e consistente das visões disjuntivas entre tradição e
modernidade que eram centrais às teorias da modernização de seu tempo.
Ao contrário de Souza, a interpretação
de Franco trouxe a possibilidade de questionar a leitura ainda hegemônica sobre
o Brasil escravista, que é interpretado como estamental, personalista e,
portanto, estruturado pelo tradicionalismo17. Levando-se em consideração o
endereçamento das críticas feitas pela socióloga podemos observar não apenas a
relevância de suas teses, como também o equívoco da leitura de sua obra
clássica realizada por Jessé Souza.
Como último ponto nesta seção, trago
alguns elementos de interpretação de Adalberto Cardoso (2008, 2010) que me auxiliam a sustentar empiricamente a
crítica à obra de Souza. Cardoso constrói uma interpretação multifatorial e
consistente para explicar o regime escravista que me permite conectá-la à
interpretação de Franco e, ao mesmo tempo, trazer elementos para questionar as
teses centrais de Souza.
Cardoso (2010) defende que temos uma
herança escravocrata marcada por alguns elementos centrais, quais sejam: ética
do trabalho degradado; a imagem depreciativa do elemento nacional; a
indiferença moral das elites quanto às necessidades da maioria; e uma
hierarquia social de grande rigidez no topo, que fez com que as aspirações de
ascensão social não existissem no horizonte dos setores subalternos.
Assim como Souza, Cardoso (2010) defende que a sociabilidade
capitalista possui uma pesada herança do sistema escravista. Se os autores
concordam sobre o peso da escravidão para a formação da sociedade de classes
profundamente desigual, eles divergem sobre a imagem que constroem do sistema
escravista e da herança deixada por ele.
Cardoso (2008) argumenta que existiram
diferentes tipos de escravidão no Brasil, o que fez com que o ex-escravo também
fosse mão de obra ativa. A transição para o trabalho livre que ocorreu em São
Paulo, e que é central para a teorização de Souza, deve ser pensada como uma
exceção ao que ocorreu no restante do Brasil, uma vez que a imigração teve um
papel decisivo apenas em São Paulo. Cardoso (2010), portanto, diverge da
explicação sãopaulocêntrica que é central para Souza construir sua
tese sobre a ralé estrutural. Segundo Cardoso (2008), em outras regiões como
Minas Gerais, Ceará, Pernambuco ou Maranhão, as funções agrícolas foram sendo
assumidas por ex-escravos, seus descendentes e brasileiros livres.
A análise da escravidão a partir da
identificação de regimes diferentes possibilitou a crítica à interpretação do
Brasil-colônia como um território marcado de forma exclusiva por plantations monocultoras,
cuja estrutura social seria marcada pela simplicidade, como está presente na
interpretação de Freyre e que é reproduzida acriticamente por Souza:
Escravos e donos de terras eram sem
dúvida as classes centrais, mas elas conviviam com uma infinidade de outros
grupos, também importantes para a sustentabilidade da ordem escravista:
artesãos e artífices nos ofícios urbanos, comerciantes, tropeiros, criadores de
animais, pequenos produtores de víveres para o mercado interno, mercadores de
escravos, financistas, milicianos, construtores, feitores, pequeno proprietários
rurais que produziam para si mesmos...Mais ainda, a plantation, grande extensão
de terra ocupada por monocultura empregando centenas de escravos, foi exceção
no período colonial e depois (Cardoso, 2010, p. 58-9).
Cardoso (2008, p. 75) defende que a
identificação de diferentes regimes de escravidão possibilitou observar que
houve, desde o século XVIII, a convivência entre o trabalho escravo e diversos
tipos de trabalho não escravo. Segundo Cardoso (2008, p. 75): “Homens livres ou
libertos se avolumavam ao longo dos séculos, obtendo meios de vida cujas formas
perderam cada vez mais o cariz intersticial que lhes atribui a literatura até
meados dos anos 1980”.
Assim, a crítica de Franco sobre as
análises que interpretam a escravidão como uma instituição total, ou seja,
a partir das plantations monocultoras e da consequente relação
senhor-escravo mostra-se uma crítica acertada, pois se simplificarmos a
estrutura social da maneira como é feita sob a perspectiva acima citada apenas
observaremos o tradicionalismo e uma razão essencialmente diversa do
capitalismo como elemento estruturante e dominante em todas as relações
sociais.
Portanto, não foi a inadaptação ao
trabalho livre que terminou sendo o elemento central para o não reconhecimento
da maioria da população como agente produtivo e cidadão na sociedade de
classes, visto que o exemplo de São Paulo não foi a regra no restante do país.
Desta forma, inexiste sustentação empírica para defender a tese da ausência das
precondições para atender às demandas de Estado e mercado como o fator último
da exclusão vista como ausência de personalidade moderna, ou seja, a tese da
inadaptação à sociedade capitalista, competitiva e de classes em todo Brasil.
Seguindo a explicação multidimensional
de Cardoso, a rigidez da estrutura social brasileira e sua abissal desigualdade
social podem ser pensadas a partir do antiliberalismo de nossas elites que
impactou de forma decisiva suas práticas e visões de mundo, que se desdobrou em
uma ética de desvalorização do trabalho braçal e do não reconhecimento da
grande parcela da população brasileira como cidadão trabalhador.
Como argumentei no início deste
artigo, Jessé Souza possui grande importância entre nossos intérpretes contemporâneos,
pois interpelou criticamente as tradicionais imagens culturalistas e
essencialistas do Brasil, produziu uma grande interpretação teórica em um
momento de especialização das ciências sociais (Werneck Vianna, 2004b) e defendeu de forma
sistemática o caráter essencialmente moderno de nossos dilemas.
Os méritos se tornaram ainda maiores
quando o sociólogo criticou a tese defendida no primeiro mandato do Presidente
Luís Inácio Lula da Silva (PT) pelo economista Marcelo Nery, então presidente
do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), de que o Brasil teria
constituído uma nova classe média. Na verdade, como defende Souza (2010), o Brasil produziu uma nova
classe trabalhadora precarizada e que havia conseguido romper com o
círculo de ferro no qual está enredada a ralé estrutural.
Além da crítica à tese de Nery, o
trabalho de Souza (2010) sobre os batalhadores representou
uma apropriação crítica de sua teorização sobre a subcidadania que, por sua
vez, não dava possibilidades à ralé estrutural de ascensão social
devido à reprodução geracional de sua condição de classe. Souza (2016, 2017)
também tem se engajado de maneira firme na denúncia do golpe parlamentar (Santos, 2017) que retirou a presidente
Dilma Rousseff do poder, em 2016, e dos interesses que o nortearam juntamente
com uma crítica severa à Operação Lava Jato. Estes elementos demonstram a
importância da obra de Souza para a compreensão crítica de nossos dilemas mais
importantes.
Mesmo com todos os méritos, a obra de
Souza possui problemas significativos que necessitam ser tematizados, como sua
relação com as interpretações culturalistas clássicas do Brasil, das quais ele
advoga ter se afastado completamente. Como defendi durante o artigo, Souza fica
à sombra da sociologia da inautenticidade, como afirma Tavolaro (2005), porque sua teorização
reproduz o dualismo que é elemento decisivo para a reprodução da imagem
distorcida, desviante e incompleta frente aos países centrais. Outro elemento
que liga Souza à sociologia da inautenticidade é a reprodução
do nacionalismo metodológico, uma vez que o campo empírico para a
construção da modernidade periférica é o Brasil, o que termina
reforçando as características brasileiras. A interpretação construída neste
artigo, portanto, sistematiza e aprofunda a tese de Tavolaro sobre a relação de
Souza com os autores que o sociólogo critica.
Caso não tivesse reproduzido uma
leitura distorcida da obra Franco (1997), Souza teria condições de
fugir do dualismo e, ao mesmo tempo, formular uma interpretação baseada na
totalidade, ou seja, a análise do sistema capitalista a partir de uma
perspectiva global (Cazes, 2014). Como consequência, poderia
observar que a racionalidade também estava presente como instância decisiva das
relações sociais no Brasil agrário e escravista. Desta forma, acredito que o
sociólogo teria condições efetivas de se afastar plenamente da sociologia
de inautenticidade. Esse afastamento pleno ocorreria porque a interpretação de
Franco nos traz a possibilidade de construir uma narrativa moderna do caso
brasileiro marcado por um efetivo patamar de autenticidade, pois seríamos
regidos por valores e interesses modernos como ocorrem nos países centrais,
mesmo que sua institucionalização possua particularidades nacionais demarcas
pela contingência histórica.
Portanto, mesmo com as contribuições
de Jessé Souza, acredito que, na formação brasileira, o processo de
modernização e a desigualdade social seguem como questões em aberto para nossos
intelectuais.
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2É
importante frisar que o primeiro trabalho em que Jessé Souza produz uma análise crítica sobre as
interpretações que ele caracteriza como sociologia da inautenticidade é
o artigo A ética protestante e a ideologia do atraso brasileiro, publicado
em 1998, e que se coloca como uma continuação do artigo de Luiz
Werneck Vianna, Weber e a Interpretação do Brasil. O artigo de Werneck
Vianna influenciou diretamente a leitura que o sociólogo realiza dos autores
que utilizam a sociologia da dominação weberiana, sobretudo o conceito de
patrimonialismo, para caracterizar o atraso brasileiro. O trabalho ainda
influenciou diretamente a leitura distorcida que Souza realiza da obra de Maria
Sylvia de Carvalho Franco, uma vez que esta reproduziria uma leitura similar à
realizada por Florestan Fernandes sobre o Brasil escravista.
3É
importante enfocar o trabalho pioneiro de Bolívar Lamounier (1985), em que o
cientista político registra como o pensamento politico brasileiro era demarcado
analiticamente pela falta e incompletude como comparado aos países centrais.
Assim, teríamos uma irremediável particularidade nacional: “Seria ingênuo supor
que a noção de ‘adaptação’ à realidade não se tenha transformado ao tornar-se
moeda corrente no vocabulário político brasileiro” (Lamounier, 1977, p. 394).
4 Werneck Vianna (2004b) argumenta sobre
as interpretações do Brasil produzidas na década de 1970, quando foram
formuladas grandes ensaios sobre o país: “A situação de transparência a que o
regime militar expôs a outrora enigmática antinomia atraso-moderno implicava
para a ciência social um novo desafio, qual seja, o de formular a natureza
particular do processo de modernização conservadora no Brasil. A produção dos
anos 70 investe nessa direção, retomando a grande-angular do ensaísmo das
antigas elites intelectuais e da Sociologia macroestrutural da década de 1950”
(p. 223). E demonstra também como a construção de uma grande interpretação do
Brasil deixa de ser elemento central: “O fato é que essa bibliografia encerra a
controvérsia sobre a polaridade atraso-moderno, elegendo a década seguinte
outros temas e outros problemas, transitando-se do state-building à cidadania -
como anunciava o influente Cidadania e justiça, publicado em 1979, de Wanderley
Guilherme dos Santos, sinalizando o que vai ser o momento de retorno da
Sociologia como disciplina da reforma social.” (p. 224).
5No sentido
proposto acima irei, evidentemente, trilhar um caminho contrário às
interpretações que naturalizam a crítica de Jessé Souza à sociologia da
inautenticidade, como é o caso do trabalho de Delgado (2017), que tece elogios e repete
as críticas de Souza aos autores por ele analisados. Como disse acima,
reconheço méritos na empreitada teórica de Jessé Souza. No entanto, também
existem problemas importantes que necessitam ser tematizados e criticados, que
não diminuem as contribuições trazidas pelo sociólogo.
6Neste
artigo estou utilizando também as obras atuais de Jessé Souza, como a Tolice
da inteligência brasileira (2015), A radiografia do golpe (2016)
e A elite do atraso: da escravidão à Lava Jato (2017), para reforçar
os argumentos sobre a sociologia da inautenticidade formulados
originalmente em A modernização seletiva: uma reinterpretação do dilema
brasileiro (2000) e A construção social da subcidadania: para uma
sociologia política da modernidade periférica (2006a). Os argumentos novos
apresentados por essas obras, sobretudo referentes às classes sociais e à
conjuntura política iniciada com as Jornadas de Junho foram abordados em outro
lugar (Ribeiro, 2017).
67 É
importante frisar que Jessé Souza não é o primeiro a interpelar criticamente as
interpretações de base culturalista que nos comparam aos Estados Unidos para
caracterizar o atraso brasileiro. Werneck Vianna (2004a) faz uma importante
análise dos diagnósticos e projetos políticos apresentados pelos americanistas,
além de contrapô-las às intepretações iberistas que, por sua vez,
valorizam a herança cultural deixada pela colonização portuguesa.
8De acordo
com Sell (2007), apesar de Souza partir da uma
leitura neoevolucionista de obra de Weber, sua interpretação não se constitui
como propriamente weberiana: “O ponto a destacar aqui é que Jessé de Souza não
pôde lançar mão nem da literatura weberiana brasileira nem mesmo de elementos
extraídos do próprio Weber para detectar, empiricamente, a especificidade da
modernidade brasileira. Weber serve-lhe para caracterizar a modernidade em si
e, apenas nesta forma indireta, vincula-se à caracterização da ‘modernidade
brasileira’” (Sell, 2007, p. 246). Já Perlatto e Lima (2009), por sua vez,
defendem que Habermas possui uma posição de centralidade na teorização de Jessé
Souza sobre a modernidade periférica: “Uma interpretação sociológica densa da
realidade periférica do Brasil, assim como a prática política consequente,
requerem a compreensão de que, longe de estarmos aquém da modernidade,
encontramo-nos, com efeito, embebidos na modernidade (e nas suas patologias).
Eis a contribuição decisiva (mas não inédita, no panorama da nossa sociologia)
que Jessé Souza, habermazianamente, nos lega” (Perlatto e Lima, 2009, p. 31).
9Jessé Souza
diverge da interpretação clássica de Gilberto Freyre formulada por Ricardo Benzaquen de Araújo (1994), por
considerá-la a principal interpretação do sociólogo pernambucano: “Se a noção
de ‘neolamarkiansmo’ é fundamental para uma adequada compreensão da obra de
Gilberto Freyre, o mesmo não se pode dizer da interpretação ‘conteudista da
obra como formulada por Araújo. O argumento do autor nesse ponto particular, ao
enfatizar o elemento da contradição, que sem dúvida se refere a um ponto real e
importante da reflexão freyriana, termina por se congelar na proposição de
‘hybris’, que por ser mero ‘excesso’, seja criativo ou destrutivo como afirma o
autor, pode ser tudo e nada ao mesmo tempo, como a própria ‘anarquia’ vista por
Araújo como a forma social da ‘hybris’. A ‘hybris’ é feticizada e proposta como
solução quando na realidade ela é um sintoma de um problema não resolvido,
Ela acaba por se tornar uma pseudoexplicação” (p. 216-17). Além do trabalho de
Benzaquen de Araújo, é importante fazer menção ao seminal trabalho de Elide Rugai Bastos, As Criaturas do Prometeu (2006) que,
no momento da publicação de A Modernização Seletiva ainda não havia sido
lançado.
10Mesmo
possuindo uma importante singularidade e um grau de seletividade, Souza (2000) defende que esta
característica não é exclusiva do caso brasileiro: “Primeiro, esse exame de
casos concretos nos permitirá demonstrar que a seletividade, ou seja, a
realização parcial de aspectos do que usualmente associamos com a singularidade
da cultura ocidental, é um atributo comum de todas as formas concretas de
desenvolvimento observáveis no Ocidente” (p. 127). Para sustentar sua tese,
Souza expõe os caos americano, alemão e brasileiro.
11Segundo Perlatto e Lima (2009): “A inautenticidade
retorna, assim, por meio de uma apropriação weberianamente enviesada da
habermasiana distinção entre sistemas e mundo-da-vida: o contexto
religioso-valorativo específico da Europa ocidental na aurora da modernidade
explicaria, assim, por negação, os casos heterodoxos de modernização. E com
isso se explicaria porque o Brasil, importando práticas institucionais sem
possuir o ‘lastro ideal e valorativo que lhe permita articulação, reflexividade
e consciência de longo prazo dos dilemas e contradições’(Ibidem), constituiria
esse monomento vivo de patologias da modernidade.” (p. 9).
12Sobre a
importância de Charles Taylor, Jessé Souza (2006a) afirma: “Instituições
como Estado e mercado, assim como as demais práticas sociais e culturais, já
possuem implícita e inarticuladamente uma intepretação acerca do que é bom, do
que é valorável perseguir, do valor diferencial dos seres humanos etc. A
hermenêutica tayloriana tem como alvo principal precisamente tornasse pano de
fundo implícito articulável e consciente” (p. 24).
13As
referências feitas a Charles Taylor e Pierre Bourdieu têm como objetivo
apresentar os argumentos principais de Souza para que eu tenha condições de
sustentar a ligação do autor com a sociologia da inautenticidade. Não
tenho, portanto, intenção de expor as teorias dos autores ou avaliar como Souza
as recepciona. Os autores foram fundamentais para a reconstrução da hierarquia
moral subjacente ao mundo moderno (Souza, 2018). Este trabalho, certamente
importante, fica como questão para um trabalho futuro. Outro ponto importante a
ser demarcado é a relação direta e complementar entre A Modernização
Seletiva e A Construção Social da Subcidadania: “Os dois livros são,
assim, partes de um mesmo projeto que venho realizando desde a juventude:
desconstruir a falsa teoria hegemônica sobre o Brasil, que “tira onda” de
crítica social, baseada no que chamaria mais tarde de ‘corrupção dos tolos’ e
que logrou se tornar uma espécie de ‘segunda pele’ dos brasileiros” (Souza, 2018, p.9-10).
14 Souza (2006a, p. 181) defende que o
processo de modernização seletiva e a constituição de um padrão especifico de
cidadania e subcidadania não se restringe ao caso brasileiro: “Estou convencido
de que o mesmo vale para o que chamei de ‘nova periferia’, de modo a nomear um
conjunto de sociedades, como as latino-americanas, por exemplo, resguardadas as
peculiaridades históricas e regionais, que se constituem, como sociedades
complexas, sob o impacto direto da expansão mundial da Europa”.
15De fato,
Florestan interpreta São Paulo como o ponto de partida da modernização
brasileira, uma vez que em curto período tornou-se nossa maior metrópole.
Todavia, essa excepcionalidade para por aí, pois mesmo o centro burguês por
excelência ainda permanecia regido por uma lógica tradicionalista como era
marca das outras regiões do Brasil. Se formos comparar seu argumento com
um Schwartzman (1988), por exemplo, que coloca
São Paulo como base da representação no lugar da cooptação existente no
restante do Brasil, meu argumento fica bastante claro.
16Assim com
Franco, a intepretação de Caio Prado vai de encontro à dualidade rural-urbano:
“As diversas características de uma organização social bastante diferente da
europeia surgiram de um objetivo básico: fornecer produtos primários para a
metrópole. A colônia, como totalidade social, se constituiria, portanto, a
outra totalidade social, a metrópole.” (Ricupero, 2009, p. 232).
17Como
defende Tavolaro (2014), construímos nossa
singularidade a partir da comparação com um discurso sociológico que define a
modernidade como uma ordem composta pela racionalização, secularização,
complexificação social e separação estrita em público e privado. É por conta
disso que nossos principais intérpretes, apesar de observarem as flagrantes
modificações na realidade brasileira, continuam interpretando nossos conflitos
como resultantes da herança tradicionalista que nos deixa em posição
essencialmente diferente dos países centrais que, por sua vez, teriam vencido
plenamente o “antigo regime” tradicionalista e seriam material e simbolicamente
superiores. Assim, constituiríamos um verdadeiro hiato em relação aos países
cêntricos.
Recebido: 28 de Fevereiro de 2019;
Aceito: 25 de Julho de 2019
“Tu deviens responsable pour toujours de ce
que tu as apprivoisé”
Citações
“Tu te tornas eternamente responsável
por aquilo que cativas”. Quem nunca leu o Petit Prince ou já viu essa
frase em algum post de amigos, ou estampado por ai em diversas artes? O livro
de enorme sucesso que ultrapassa gerações, é a terceira obra literária
mais traduzida em todo o mundo. De origem francesa, o autor Antoine de
Saint-Exupéry marcou varias décadas com sua obra.
Le Petit Prince é uma das melhores
dicas de livros para treinar a leitura do francês, claro que o uso de algumas
palavras poucos comuns no texto pode ser uma dificuldade, mas para aqueles que
já sabem todo o livro de trás pra frente (como eu) irá conseguir assimilar
muito bem todo o enredo da história com o que já conhece, apresentando algumas
dúvidas mas posso garantir que será uma leitura deliciosa.
Se você nunca leu, vale a pena.
Você sabia que a tradução literal da
frase “Tu deviens responsable pour toujours de ce que tu as apprivoisé” é “Tu
te tornas responsável para sempre por aquilo que domesticastes”, fica meio
estranho né? Essa adaptação mais atualizada para o português reforça que é mais
importante entendermos a essência do termo do que traduzir ao pé da letra.
Outras citações do Petit Prince
Ao ler Le Petit Prince você encontrará
outras famosas frases do livro como, por exemplo:
“Voici mon secret. Il est très simple:
on ne voit bien qu’avec le cœur. L’essentiel est invisible pour les yeux.”
“Si quelqu’un veut un mouton, c’est la
preuve qu’il en existe un.”
“Je me souvenais du renard. On risque
de pleurer un peu si l’on s’est laissé apprivoiser…”
“Les hommes, ils s’enfournent dans les rapides, mais ils ne savent plus
ce qu’ils cherchent. Alors ils
s’agitent et tournent en rond. Ce n’est pas la peine.”
Será que você acerta todas? Resista ao
google tradutor, por favor.
“Les yeux sont aveugles. Il faut
chercher avec le coeur.”
http://bemiranda.com/petit-prince/
PALESTRA COMPLETA:
Aula Magna - Políticas Públicas e
Desigualdade em Tempos de Crise
Palestrante: Prof. Dr. Jessé Souza -
Docente Titular UFF e Presidente do IPEA. Data: 07/04/2016 Local: A001 - Bloco
Beta - Câmpus São Bernardo do Campo Evento promovido pelo Bacharelado em
Políticas Públicas da UFABC (BPP-UFABC), com o apoio dos cursos de Ciências e
Humanidades (BCH), Planejamento Territorial (BPT), Ciências Econômicas (BCE),
Relações Internacionais (BRI) e do Centro Acadêmico de Políticas Públicas
(CAPOL).
O PENSAMENTO USPIANO:
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