A quem interessar possa...
“...intermediário
é vulgarmente conhecido por testa-de-ferro, homem de palha, empresta-nome,
cabeça de pau ou fantoche.”
Quem quer mais do que lhe convém,
perde o que quer e o que tem. Padre António Vieira
Documento,
no entanto, nunca foi assinado pelas partes
POR O
GLOBO
17/03/2016
15:24 / atualizado 17/03/2016 18:57
Documento
— mais um forte indício de que Lula é o verdadeiro dono do Sítio Santa Bárbara
— previa pagamento de 800 000 reais por uma parte da propriedade. A proposta de
compra e venda foi encontrada no apartamento de Lula em São Bernardo do Campo
Por: Robson
Bonin17/03/2016 às 13:40 - Atualizado em 17/03/2016 às 16:08
Polícia Federal faz buscas no sítio frequentado pelo ex-presidente Lula e por familiares em Atibaia, no interior de São Paulo, na sexta-feira (04)(Avener Prado/Folhapress)
Na
operação de busca realizada pela Polícia Federal no dia 4 de março, durante a
24ª fase da Operação Lava Jato, os investigadores da Operação Lava-Jato
encontraram a minuta de um contrato de compra e venda (clique para ler o documento em PDF) no qual Fernando Bittar -- dono no papel do sítio de Atibaia
frequentado pelo ex-presidente Lula e reformado por empreiteiras do petrolão -
transfere a propriedade para o petista e sua mulher, Marisa Letícia.
Na
minuta, não assinada, Fernando Bittar repassa a propriedade para Lula e Marisa
pelo valor de 800 000 reais.
O
documento foi localizado pela Polícia Federal durante as buscas no apartamento
de Lula em São Bernardo. Pelo texto, Lula se comprometia a pagar pelo sítio 200
000 reais de entrada, no ato da compra, e quitar o restante da dívida com
Bittar em três parcelas iguais de 200 000 reais.
Diz
a minuta de contrato: "Pelo preço adiante ajustado, vendem, ao comprador,
o imóvel descrito, transmitindo-lhe desde já, a posse, domínio, direitos e
ações que sobre o mesmo tinham e exerciam, para que dele, o comprador use, goze
e livremente disponha como bem e melhor lhe convier".
Apesar
de ser uma minuta, sem a assinatura das partes envolvidas, o documento é mais
um forte indício de que Lula é, de fato, o verdadeiro dono do Sítio Santa
Bárbara. Em abril de 2015, VEJA revelou a existência do sítio usado por Lula
para passar os fins de semana de descanso em Atibaia. Lula sempre negou ser o
proprietário, embora tenha sido obrigado a admitir o uso do sítio. A propriedade
é investigada pela Operação Lava Jato desde que VEJA revelou que a construtora
OAS havia realizado obras de reforma no sítio.
Os
investigadores também localizaram no apartamento do ex-presidente Lula em São
Bernardo notas fiscais relacionadas à obra do Sítio Santa Bárbara. Um
cronograma (imagem abaixo) detalhado das melhorias realizadas na propriedade
durante a reforma também foi apreendido. No documento é possível identificar as
principais obras realizadas na propriedade.
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Aviso aqueles que usam Laranjas
O
contrato assinado por "laranja" é considerado simulação se este não
está ciente de ilegalidade ou prejuízo a terceiro?
No
defeito simulação deve-se ter, necessariamente, ciência de prejuízo a terceiro
ou à lei?
Assim,
seria simulação ou não o contrato assinado por um "laranja" que ele
não saiba que está sendo usado para prejudicar terceiro ou burlar a lei?
civil
simulação
Perguntado
por Milene Oliv. em 6 de Outubro de 2013
Editado
por Renan Akamine em 6 de Outubro de 2013
Resposta
A
simulação, vício invalidante do negócio jurídico, opera-se quando é celebrado
um negócio aparentemente normal, mas que não pretende atingir o efeito que
juridicamente deveria produzir.
Segundo
a doutrina, existem duas formas de simulação:
a)
absoluta: as partes criam um negócio jurídico destinado a não produzir efeito
jurídico algum (é um jogo de cena);
b)
relativa: na simulação relativa, por sua vez, as partes criam um negócio
destinado a encobrir outro negócio jurídico de efeitos proibidos (pode ocorrer
também por interposta pessoa).
Em
havendo simulação, absoluta e relativa, o negócio jurídico é inválido. A
simulação gera nulidade absoluta (art. 167), nos termos do CC de 2002,
diferentemente do que acontecia no CC de 1916, onde a simulação era tratada
como causa de nulidade relativa. (Observar a data do contrato na prova).
OBS:
Na simulação relativa, à luz do Enunciado 153 da III Jornada de Direito Civil,
o negócio simulado é nulo, mas o negócio encoberto poderá ser aproveitado se
não ofender a lei ou a terceiro.
OBS:
Uma vez que a simulação é causa de nulidade absoluta do negócio jurídico,
poderá ser alegada por qualquer pessoa até mesmo por uma das partes contra a
outra (Enunciado 294 da IV Jornada de Direito Civil).
Logo,
para sua ocorrência, imagino não ser necessário a comprovação do “animus” da
pessoa que o está assinando, pois a simulação é no contrato e não na pessoa.
Assim,
contrato celebrado por "laranja" continua sendo contrato simulado.
Respondido
por Gabrielle Castro Novato em 15 de Outubro de 2013
Fonte:
http://www.perguntedireito.com.br/1512/contrato-considerado-simulacao-ilegalidade-prejuizo-terceiro
Art. 167.
É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se
válido for na substância e na forma.
I
- aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às
quais realmente se conferem, ou transmitem;
§
2o Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes
do negócio jurídico simulado.
Enunciado 153 – Art. 167:
Na simulação relativa, o negócio simulado (aparente) é nulo, mas o dissimulado
será válido se não ofender a lei nem causar prejuízos a terceiros.
Enunciado 294 – Arts. 167 e 168.
Sendo a simulação uma causa de nulidade do negócio jurídico, pode ser alegada
por uma das partes contra a outra.
CÍVEL,
31/08/2010
No
presente e simplório estudo, não nos propomos a esgotar o tema. A intenção é,
apenas, trazer alguma luz ao instituto do contrato de comissão. Nesse aspecto,
tal propósito se apresentou um tanto desafiador, porque o contrato de comissão
se configura um instrumento que não tem fim em si mesmo, pois é contrato
preparatório de outros. No entanto, pudemos aferir que se trata de um
instrumento muito interessante e que se mostra como sendo uma ferramenta muito
útil aos operadores do direito.
Vejamos
os motivos: a expressão “comissão” vem do latim commissione que significa
“incumbência”, “atribuição de uma tarefa a alguém”, ”ato de cometer, de
encarregar” que já teve, ao longo da história, várias acepções. A acepção do
presente estudo é a prevista nos arts. 693 a 709 do CC, os quais regem o
contrato de comissão mercantil e a sua realização através do ajuste de vontades
entre partes contratantes para a realização, por uma delas, de negócios
mercantis, de interesse da outra parte.
Na
lição de Maria Helena Diniz, contrato de comissão é o contrato pelo qual uma
pessoa (comissário) adquire ou vende bens em seu próprio nome e
responsabilidade, mas por ordem e conta de outrem (comitente), em troca de
certa remuneração, obrigando-se para com terceiros, com quem contrata.
Para
o ilustre professor Humberto Theodoro Junior: “É, pois, um contrato em que se
estabelece um mandato, mas que com este não se confunde porque, a despeito de
haver cometimento de encargo a terceiro para que pratique ato ou celebre
contrato em benefício do mandante, não agirá o comissário em nome do comitente,
mas em seu próprio nome.
Diz-se
correntemente que se trata de um mandato sem representação, justamente porque
não tem poderes o comissário de obrigar a pessoa do comitente perante
terceiros. (…) Pode-se conceituá-lo, pois, como uma modalidade excepcional de
mandato que autoriza o comissário a agir em se próprio nome e sob sua exclusiva
responsabilidade”. (Contrato de Comissão no Novo Código Civil. in Revista
Síntese de Direito Civil e Processual Civil, Porto Alegre, v. 5, n. 25, p.
110).
Com
a entrada em vigor do novo Código Civil em 2002, os arts. 165 a 190 do Código
Comercial de 1850 que disciplinavam a matéria foram revogados, não sendo mais
necessária a distinção entre comissão mercantil e civil, além do comissário não
precisar ser necessariamente empresário, tendo em vista a ausência de previsão
legal.
A
comissão, na linguagem antiga do Código Comercial, seria um mandato sem
representação, um contrato de colaboração empresarial. Ao contrário do mandato,
entretanto, o comissário não representa, nos negócios que pratica, o comitente.
O
comissário adquire ou vende bens à conta do comitente, mas contrata em nome
próprio, e não em nome da empresa a que presta colaboração (art. 693),
figurando, portanto, como parte no contrato.
Ao
contrário do mandato, o comissário não gere os negócios do comitente, tampouco
age como seu procurador o que dispensa a apresentação de documento que o
habilite. Para que a comissão seja devida e o contrato respeitado é necessário
a conclusão dos negócios por sua conta e em seu próprio nome (o que por si
descaracteriza, portanto, a representação).
Significa
dizer que o comissário obriga-se diretamente perante terceiros e que a sua
presença na realização do negócio afasta totalmente o comitente do terceiro que
com aquele negocia. Assim, as relações jurídicas são distintas: uma é interna,
entre o comitente e o comissário, e a outra é externa, entre o comissário e o
terceiro com quem negocia, o que reflete uma certa autonomia daquele. Inexiste
em decorrência disso, relação jurídica entre o terceiro e o comitente,
permitindo que este, inclusive e se for do seu interesse, mantenha-se
literalmente e juridicamente estranho/desconhecido do terceiro com quem o
comissário negocia.
É
importante registrar que, como não poderia deixar de ser, por cuidar dos
interesses do comitente, o comissário deve agir de acordo com suas ordens e
instruções, devendo agir com cuidado e diligência, tanto para evitar-lhe
prejuízos como para, e principalmente, proporcionar o lucro e/ou o objetivo
para o qual foi contratado. Ao se afastar das instruções do comitente,
acarretando-lhe prejuízos, responde o comissário, exceto nos casos fortuitos
ou, como regra geral, em caso de insolvência dos terceiros com quem contratar.
Há
ainda a hipótese de pactuação prévia de cláusula del credere, expressão em
latim que, traduzida, significa “da confiança”. Quanto é feito tal pacto no
contrato de comissão, o comissário se torna responsável solidário (perante o
comitente) das obrigações contraídas pelas pessoas por ele contratadas, o que
garante dessa maneira a execução do contrato, no todo ou em parte. Como se
afigura maior risco assumido, normalmente o comissário faz jus, nesses casos, a
um acréscimo na remuneração (comissão).
Já
no que se refere à obrigatoriedade de prestação de contas e de seguimento das
ordens e instruções do comitente na prática das atividades decorrentes de seu
cargo, o comissário terá os excessos que praticar justificados, quando destes
decorrer vantagem ao comitente ou ainda quando a conclusão do negócio se faz
necessária, sem retardo, e, mantenha suas ações em conformidade com os usos. Em
qualquer outro caso, que não esses, havendo aprovação do comitente, ainda que
tácita, estará saneado o excesso.
Para
efeitos didáticos e quem sabe acadêmicos, podemos pontuar que o contrato de
comissão é:
i)
bilateral, por criar obrigações recíprocas tanto para o comissário como
para o comitente;
ii) consensual, tendo em vista bastar o simples consenso entre o comissário e o comitente, independe da entrega do bem;
iii) não solene, ou seja, sem exigências legais de formalidade;
iv) oneroso, pois obriga o comitente a recompensar monetariamente o comissário pelos serviços prestados, e;
v) pessoal, em virtude da presença do intuitus personae. Assim, apenas o contratado poderá cumprir a obrigação, sendo obrigação intransferível, gerando a presunção de confiança mútua entre o comitente e o comissário, que pode ser tanto pessoa física quanto jurídica.
ii) consensual, tendo em vista bastar o simples consenso entre o comissário e o comitente, independe da entrega do bem;
iii) não solene, ou seja, sem exigências legais de formalidade;
iv) oneroso, pois obriga o comitente a recompensar monetariamente o comissário pelos serviços prestados, e;
v) pessoal, em virtude da presença do intuitus personae. Assim, apenas o contratado poderá cumprir a obrigação, sendo obrigação intransferível, gerando a presunção de confiança mútua entre o comitente e o comissário, que pode ser tanto pessoa física quanto jurídica.
Além
de concluir o negócio em seu próprio nome, o comissário tem como obrigação:
i)
seguir as ordens e instruções do comitente, ou na ausência destas,
observar os usos e costumes da praça onde o negócio se realiza, com cuidado e
diligência;
ii) comunicar o comitente assim que concluído o negócio, informando o nome do terceiro beneficiário e as datas ajustadas para pagamento;
iii) informar a ocorrência de avarias nas mercadorias ou divergência entre valores;
iv) prestar contas através da transferência dos valores angariados com a transação, ficando a seu cargo as deduções autorizadas pela lei;
v) pagar juros pela mora na entrega dos fundos que pertencerem ao comitente, e;
vi) se responsabilizar pela guarda e conservação dos bens do comitente.
vii) relativamente a terceiros, o comissário se responsabiliza pelas obrigações contraídas, visto que o contrato é celebrado em seu nome, assim como, por perda e extravio de dinheiro.
ii) comunicar o comitente assim que concluído o negócio, informando o nome do terceiro beneficiário e as datas ajustadas para pagamento;
iii) informar a ocorrência de avarias nas mercadorias ou divergência entre valores;
iv) prestar contas através da transferência dos valores angariados com a transação, ficando a seu cargo as deduções autorizadas pela lei;
v) pagar juros pela mora na entrega dos fundos que pertencerem ao comitente, e;
vi) se responsabilizar pela guarda e conservação dos bens do comitente.
vii) relativamente a terceiros, o comissário se responsabiliza pelas obrigações contraídas, visto que o contrato é celebrado em seu nome, assim como, por perda e extravio de dinheiro.
Em
contrapartida o comissário tem o direito de ser reembolsado dos valores
eventualmente gastos na celebração dos negócios contraídos por conta do
comitente, com juros (a não ser que pagos antecipadamente), além de ter o
direito a:
i)
reter bens e valores, antes do repasse ao comitente, para garantir o
pagamento de sua comissão ou o reembolso de despesas;
ii) ser indenizado, no caso de prejuízos decorrentes da atividade que exercer, também acrescido de juros, quando cabível;
iii) ser remunerado pelos atos negociais praticados, ainda que proporcionalmente no caso de impossibilidade de conclusão, que independa de sua vontade;
iv) perceber perdas e danos, além da remuneração devida e pactuada, quando dispensado sem justa causa;
v) dilatar prazos para pagamento, exceto quando houver instrução contrária do comitente, e;
vi) gozar de crédito privilegiado no caso de falência ou insolvência do comitente.
ii) ser indenizado, no caso de prejuízos decorrentes da atividade que exercer, também acrescido de juros, quando cabível;
iii) ser remunerado pelos atos negociais praticados, ainda que proporcionalmente no caso de impossibilidade de conclusão, que independa de sua vontade;
iv) perceber perdas e danos, além da remuneração devida e pactuada, quando dispensado sem justa causa;
v) dilatar prazos para pagamento, exceto quando houver instrução contrária do comitente, e;
vi) gozar de crédito privilegiado no caso de falência ou insolvência do comitente.
O
comitente tem por obrigação precípua remunerar o serviço do comissário, ainda
que proporcionalmente quando não concluído por: motivo de força maior, morte e dispensa
com ou sem justa causa do comissário. Também é obrigado a:
i)
fornecer fundos para possibilitar a realização de negócios;
ii) ressarcir as despesas realizadas pelo comissário nos atos decorrentes da atividade de comissão, com juros;
iii) executar o contrato celebrado, de acordo com suas instruções, pelo comissário;
iv) pagar juros pelos valores adiantados pelo comissário para conclusão de negócios decorrentes de instruções suas.
ii) ressarcir as despesas realizadas pelo comissário nos atos decorrentes da atividade de comissão, com juros;
iii) executar o contrato celebrado, de acordo com suas instruções, pelo comissário;
iv) pagar juros pelos valores adiantados pelo comissário para conclusão de negócios decorrentes de instruções suas.
De
outra borda, o comitente tem direito a mover ação, contra o comissário, pelos
atos de comissão praticados em desrespeito à previsão legal, e diretamente
contra os terceiros quando o comissário lhe ceder seus direitos, bem como a:
i)
exigir que o comissário pague, imediatamente, valores não recebidos em
decorrência de dilação de prazo concedida contrariamente às suas orientações,
ou até mesmo quando não lhe for dado conhecimento sobre nomes e datas de
pagamentos;
ii) alterar as instruções passadas ao comissário, que deverão ser observadas inclusive para negócios pendentes;
iii) reivindicar valores e bens que sejam de sua propriedade e estejam em poder do comissário e receber diretamente dos terceiros que com este contrataram, no caso da falência ou insolvência deste.
ii) alterar as instruções passadas ao comissário, que deverão ser observadas inclusive para negócios pendentes;
iii) reivindicar valores e bens que sejam de sua propriedade e estejam em poder do comissário e receber diretamente dos terceiros que com este contrataram, no caso da falência ou insolvência deste.
Na
doutrina dominante prevalece a exegese extraída do art. 694, o qual prevê que:
“O comissário fica diretamente obrigado para com as pessoas com quem contratar,
sem que estas tenham ação contra o comitente, nem este contra elas, salvo se o
comissário ceder seus direitos a qualquer das partes”.
No
entanto, alguns juristas e estudiosos já ousam inovar sobre o dispositivo
legal, prosperando, na doutrina mais recente, opinião contrária, no sentido de
que, por exercer direito próprio, o comitente, independentemente de cessão de
direitos do comissário, pode exigir o cumprimento do contrato diretamente do
terceiro.
Orlando
Gomes apresenta a figura do comissário como titular formal do crédito, alegando
que nesta condição é que deve reclamar o pagamento. Todavia, segundo seu ponto
de vista, o direito de ação do comissário não impede que o comitente promova
diretamente a realização do crédito, visto que é a ele que interessa o
recebimento.
Assim,
por duas formas poderia se dar o confronto do comitente com o terceiro:
diretamente (conforme nova doutrina) ou por cessão dos direitos do comissário
(hipótese ausente de controvérsia quanto a seu cabimento).
Fábio
Ulhoa Coelho, explicitando as características da comissão mercantil, ensina:
“Acentue-se que as negociações levadas a efeito pelo comissário atendem, na
verdade, aos interesses do comitente, sendo, por esta razão, empreendidas por
conta e risco deste último. Assim, todos os riscos comerciais do negócio cabem,
em princípio, ao comitente.
Mesmo
na comissão del credere, correm por conta do comitente os demais riscos, como o
de vício na coisa vendida ou evicção.”
Para
Waldemar Ferreira, citado por Bulgarelli, o Código Comercial afastou,
peremptoriamente, “qualquer relação entre o comitente e o terceiro que
interveio no negócio em seu prol realizado pelo comissário. O comissário, reza
o art. 166, ‘fica diretamente obrigado às pessoas com quem contratar, sem que
estas tenham ação contra o comitente, nem este contra elas’. Eis o ponto
saliente. Não age o comissário como representante do comitente. Este é inteiramente
estranho ao negócio jurídico levado por aquele a cabo. Se, todavia, quiser nele
intervir, será indispensável outro negócio jurídico — a cessão de direito, para
que lhe suceda na relação jurídica: ‘salvo se o comissário fizer cessão dos
seus direitos a favor de uma das partes’.”
(FERREIRA,
Waldemar. Aspectos econômicos e financeiros do contrato de comissão mercantil.
Revista de Direito Mercantil, 1953, ano III, n. 2.403, p. 100-101. apud
BULGARELLI, Waldirio. Contratos Mercantis. 8 ed. São Paulo: Atlas, 1995. n.
2.13.10, p. 496) — sublinhou-se.
Enfim,
afora a discussão jurídica acerca do direito do comitente de, independentemente
de cessão de direitos do comissário, exigir o cumprimento do contrato
diretamente do terceiro, concluímos que o contrato de comissão é um instrumento
jurídico muito interessante e que pode ser brilhantemente utilizado para
celebração de negócios jurídicos simples, bem como para celebração de negócios
jurídicos de alta complexidade e relevância.
Publicado
em 03/2012. Elaborado em 08/2010.
CAPÍTULO
V
A INTERPOSIÇÃO DE PESSOAS
Entre
nós é extremamente vulgar a interposição de pessoas quer no contrato de compra
e venda, principalmente de pais ou avós a filhos e netos,
para evitar a exigência do consentimento dos outros filhos ou netos, ou o seu
suprimento judicial, quer no contrato de doação que muitas vezes se dissimula
sob a forma do contrato de compra e venda com interposta pessoa, quer nos
contratos de arrendamento, quer nos testamentos.
José
Beleza dos Santos[129]
A
espécie dissimulação apresenta como modalidade subjetiva a interposição de
pessoas. Nela, há um estranho entre os contratantes, com o fim de esconder o
verdadeiro interessado. Este intermediário é vulgarmente conhecido por
testa-de-ferro, homem de palha, empresta-nome, cabeça de pau ou fantoche.
Para
Beleza dos Santos, “a interposição de pessoas consiste, assim, em alguém, a
quem não pertencem os interesses em causa, praticar um ato jurídico em vez do
titular desses interesses”[130].
Adverte
Francesco Ferrara[131] que o conceito de interposta pessoa, na doutrina, é
dominado por uma confusão inextrincável entre relações de índole heterogênea,
fonte de equívocos e contradições.
A
primeira distinção que se deve estabelecer é entre a interposição fictícia de
pessoas, modalidade de simulação (para alguns doutrinadores, de dissimulação
subjetiva) e interposição real de pessoas, configurando verdadeiro mandato sem
representação. Como pontua Fernando de Sandy Lopes Pessoa Jorge, “há vantagem
em separar as duas situações –interposição real e aparente– a fim de
contrariar, quando possível, a tendência corrente de considerar necessariamente
a interposta pessoa como um caso de simulação”[132].
Enquanto
na interposição real de pessoas, vínculos decorrentes de negócios jurídicos
verdadeiramente celebrados são estabelecidos entre interponente e interposto e,
depois, entre interposto e o outro contraente (que pode se pretender ocultar,
embora não necessariamente se pretenda), na interposição fictícia de pessoas o
único vínculo decorrente de um só negócio jurídico se estabelece diretamente
entre o interponente e o contraente oculto (que se pretende, necessariamente,
ocultar). O interposto, na segunda hipótese, em momento algum intervém
efetivamente no negócio celebrado entre interponente e contraente. Apenas
empresta seu nome.
Para
distinção entre as figuras e, conseqüentemente, compreensão da interposição
fictícia de pessoas, é fundamental que se tracem algumas observações gerais
sobre o contrato de mandato e sobre a representação, conceitos que não se
confundem.
Nos
termos do art. 653 do Código Civil de 2002, “opera-se o mandato quando alguém
recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar
interesses. A procuração é o instrumento do mandato”. O texto legal repete, não
integralmente apenas por uma vírgula a menos, o art. 1.288 do Código Civil de
1916, “opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes, para, em seu
nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do
mandato”. São características do contrato de mandato ser consensual, gratuito
(embora não essencialmente), intuitu personae, bilateral (ainda que impróprio,
para Clovis Bevilaqua[133], ou imperfeito, para Orlando Gomes[134]),
preparatório e revogável (salvo as hipóteses previstas expressamente nos arts.
683 a 686, parágrafo único do Código Civil). Tem por objetivo permitir que um
interessado (mandante), em um negócio jurídico que não pode, ou não quer
realizá-lo diretamente, faça-o por intermédio de outra pessoa (o mandatário).
Na
representação, o representante emite vontade em nome do representado, obrigando
ou adquirindo direitos este e não aquele. Para assim proceder e com tais
conseqüências em esfera jurídica alheia, deve estar investido de poder[135].
Pode ser a representação legal ou de ofício, quando o poder provém de
determinação legislativa. Pode também ser convencional ou voluntária, “quando
uma pessoa encarrega outra de praticar em seu nome negócios jurídicos ou
administrar interesses, sendo normal para este efeito a constituição do
mandato”[136]. Normal, mas não necessariamente mandato. Do mesmo modo, nem
sempre que ocorrer mandato, ocorrerá a representação.
Caio
Mário da Silva Pereira afirma que “nosso direito não guarda fidelidade ao
Romano [...] no direito brasileiro, como no francês, no português etc., a
representação é essencial e a sua falta desfigura o contrato para prestação de
serviços”[137]. O mandatário, portanto, apenas executaria contrato de mandato
quando age em nome do representado.
Assim
também entendia Clovis Bevilaqua, como se vê na seguinte passagem do seu
Direito das Obrigações: “Há mandato, quando alguem constitue outrem seu
representante, conferindo-lhe poderes para que execute um acto ou um série de
actos jurídicos, tendo esse representante de agir em nome e segundo a vontade
do representado”[138].
Ocorre,
todavia, que a própria lei reconhece o mandato sem representação, não o
convertendo necessariamente em prestado de serviços, ao dispor, no art. 663 do
Código Civil de 2002: “sempre que o mandatário estipular negócios expressamente
em nome do mandante, será este o único responsável; ficará, porém, o mandatário
pessoalmente obrigado, se agir no seu próprio nome, ainda que o negócio seja de
conta do mandante”. Não inovou o legislador de 2002, visto que também o Código
Civil de 1916 tinha redação semelhante, no art. 1.307: “Se o mandatário obrar
em seu próprio nome, não terá o mandante ação contra os que com ele
contrataram, nem estes contra o mandante. Em tal caso, o mandatário ficará
diretamente obrigado, como se seu fora o negócio, para com a pessoa, com quem
contratou”.
Orlando
Gomes, ainda em comentários ao Código Civil de 1916, já havia observado que a
representação não era essencial ao contrato de mandato, afirmando que “é
possível, outrossim, a existência de mandato sem representação, como admitia
o direito romano e atualmente os
códigos suíço, alemão e italiano. Não se deve, pois, confundir mandato com
representação”[139].
Francesco
Ferrara, combatendo a idéia de o mandato ser necessariamente representativo,
esclarece que mandato e representação são duas relações jurídicas diferentes,
podendo ou não existir conjuntamente. Para ele, “o mandato nasce do
acordo entre o mandante e o mandatário; o poder de representação deriva da
declaração unilateral de vontade do mandante, declaração que se sobrepõe e
acrescenta ao contrato em que se confere o encargo, e que pode até
faltar”[140]. O mandato circunscreve às relações internas (intra-partes). A
representação dirige-se para o mundo (terceiros), agindo o representante sempre
em contemplatio domini. O representante e os terceiros que com ele contratam
têm vontade comum de que os efeitos do contrato se reflitam diretamente sobre o
representado, tanto na representação legal, quanto na representação voluntária.
Como
rápida (todavia, oportuna) digressão, registre-se o interessante esclarecimento
de Fernando de Sandy Lopes Pessoa Jorge: “A contemplatio domini não significa
propriamente actuação do representante no interesse do representado, mas sim
que aquele deve revelar que realiza o acto em nome deste.” E, mais à frente, na
mesma obra, “a própria origem etimológica da palavra contemplatio denota a
idéia de mostrar para que se possa ver: vem do verbo contemplo ou contemplor,
que por sua vez deriva de templus, como locus qui ab omni parte aspici, vel ex
quo omnis pars videri potest”. Quanto ao mandato, esclarece que a palavra
“corresponde fundamentalmente à idéia de alguém confiar a outrem a realização
de um acto”. Não se trata, “como poderia dar a entender o significado atual do
verbo mandar, de ordenar, mas sim de confiar”[141].
A
figura da procuração também não se confunde com o mandato ou com a
representação. É comumente empregada para designar o instrumento de concessão
de poderes, podendo ser verbal ou escrita.
Fernando
de Sandy Lopes Pessoa Jorge define a procuração como “acto unilateral do
constituinte dirigido à pessoa ou pessoas com quem o representante deve
contratar, pelo qual aquele declara antecipadamente apropriar-se dos efeitos
jurídicos desses actos”[142]. Trata-se de ato unilateral destinado ao
conhecimento daqueles com quem o mandatário vai contratar, não intervindo em
sua contextura o representante.
Ao
inserir no texto do art. 653 do Código Civil que “a procuração é o instrumento
do mandato”, o legislador acabou por reforçar a confusão entre o ato unilateral
(destinado ao conhecimento do outro contratante), a representação voluntária
(ato unilateral compreendido como a concessão de poderes de uma pessoa a outra
para que esta pratique ato no nome daquela, celebrando negócios jurídicos ou
administrando interesses) e o contrato de mandato.
No
negócio jurídico, se o mandatário age em nome do mandante, o mandato diz
representativo. O mandatário substitui o mandante, colocando-se no lugar dele
e, juridicamente, tudo se passa como se fosse o próprio mandante o contratante.
Nos termos legais, “sempre que o mandatário estipular negócios expressamente em
nome do mandante, será este o único responsável” (art. 663, caput, CC).
Noutro
sentido, se age o mandatário em nome próprio, sem representar o mandante,
assume na sua própria esfera jurídica todos os efeitos do ato que pratica. Para
o outro contratante, não interessa aquele anterior contrato de mandato
celebrado entre mandante e mandatário (exclusivamente intra-partes). Celebra
ele contrato exclusivamente com o mandatário, ainda que este, posteriormente,
por força da convenção contratual, deva retransmitir o objeto do contrato ao
mandante. Nos termos legais, “ficará, porém, o mandatário pessoalmente
obrigado, se agir no seu próprio nome, ainda que o negócio seja de conta do
mandante” (art. 663, caput, in fine, CC).
Este
último perfil era, na realidade, o adotado no direito romano para o contrato de
mandato. Esclarece Fernando de Sandy Lopes Pessoa Jorge que o formalismo dos
atos jurídicos não coadunavam com a idéia de projeção de efeitos dos contratos
sobre pessoas diversas à relação jurídica. O mandato aparecia, assim, no
direito romano, como mandato sem representação:
O
mandatário, em execução do encargo, actuava em nome próprio, comprometia-se
pessoalmente para com terceiros, era ele que se tornava credor e devedor; não
tendo o mandante qualquer ação contra a pessoa com quem o mandatário
contratava, nem esta contra aquele, não se estabeleciam entre eles relações
directas[143].
Esta
singular característica do mandato sem representação o torna funcional,
permitindo realizar por outrem certo negócio jurídico com a projeção dos
efeitos sobre o verdadeiro interessado.
Mandatário
sem representação não precisa revelar o nome do mandante. E muitas vezes o
objetivo desta espécie de contrato é exatamente a ocultação da figura do
mandante. Toma o mandatário, então, lugar no negócio como único destinatário
dos seus efeitos. “Trata-se muitas vezes de uma ocultação inocente com o
intuito de evitar especulações, de conseguir condições mais justas para um
contrato, de manter o segredo do negócio ou de se esconder um benefício a
outrem”[144].
Pode
acontecer, diversamente, que esta ocultação do nome do mandante sequer ocorra,
como por exemplo, “se o preço é pago no próprio acto, ou mesmo por preferir [o
contratante] ficar ligada à interposta pessoa, cuja honestidade e solvabilidade
lhe inspiram maior confiança do que o interessado real”[145].
Neste
ponto, é importante destacar que o Código Civil brasileiro de 2002 passou a
tratar o contrato de comissão como típico, o regulamentando nos arts. 693 a
709. Nos termos do art. 693, “O contrato de comissão tem por objeto a aquisição
ou a venda de bens pelo comissário em seu próprio nome, à conta do comitente”.
Para Orlando Gomes, “pelo contrato de comissão obriga-se alguém a vender ou
comprar bens em seu próprio nome, mas por conta de outrem, em troca de certa
remuneração. A comissão é mandato sem representação”[146].
O
contrato de comissão é essencialmente oneroso, tendo o comissário direito à
remuneração ajustada, e, na falta de estipulação, à que resultar dos usos
correntes no lugar (art. 701, CC). Ao contrato de comissão são aplicáveis, no
quer couber, as regras sobre o mandato, nos termos do Código Civil (art. 709,
CC).
Tem-se,
de qualquer forma, que “este aspecto, ligado ao fraccionamento da operação
econômica unitária em dois actos jurídicos distintos (mandato e negócio
mandado), cria frequentemente a sensação de que se trata de uma operação
simulada e como tal ilícita”[147].
A
interposição real de pessoas, em si, não é ilícita. Poderá ser ilícita,
contudo, caso viole alguma proibição legal, do que seria um exemplo, burlar
incapacidades de qualquer natureza. A sanção legal, no caso, é a mesma da
violação direta da proibição. Como leciona Francesco Ferrara, “a lei quer que
os seus mandamentos sejam observados e infringe o mesmo castigo contra toda
sorte de transgressões”[148].
Ocorrendo
a efetiva transmissão de direitos e obrigações entre o interponente e
contratante será necessário posteriormente um (ou vários) negócio(s)
translativo(s) para que o negócio passe da esfera jurídica do interposto para
do mandante.
A
doutrina clássica vê no caso dupla transferência dos efeitos dos negócios
praticados pelo mandatário. Do interponente para o interposto (mandatário) e
deste para o outro contratante ou do contratante para o interposto (mandatário)
e deste para o interponente.
Uma
formulação especial desta modalidade foi elaborada por Francesco Ferrara, por
meio da Teoria da Transmissão Fiduciária. De acordo com ela, o mandante
investiria o mandatário na propriedade da
coisa a alienar por meio de um negócio fiduciário, “por força do qual, por um
lado, a interposta pessoa fica comprometida a agir no interesse doutrem, a não
usar em seu próprio benefício dos direitos adquiridos, (e) a restituir estes ao
mandante ou a um destinatário convencionado”[149].
Os
negócios fiduciários, para Francesco Ferrara, distinguem-se dos simulados,
precisamente por que aqueles “são sérios e efetivam-se realmente entre as
partes com o fim de obter um efeito prático determinado. Os contraentes querem
o negócio com todas as suas conseqüências jurídicas, ainda que se sirvam dele
para uma finalidade econômica diversa”[150]. Os negócios fiduciários produzem a
transferência plena do direito, tornando o fiduciário proprietário perante
todos.
Nesta
teoria, se para alienar é necessário um negócio fiduciário, para adquirir já
não seria necessário. Na aquisição, a propriedade do mandatário resulta do
próprio objeto do contrato de mandato.
Sobre a distinção entre negócio
fiduciário e o simulado, ensina Pontes de Miranda:
NEGÓCIOS
JURÍDICOS FIDUCIÁRIOS E SIMULAÇÃO. – Os negócios jurídicos de fidúcia e outros
atos jurídicos fiduciários são queridos. Não são aparentes: são. Em verdade,
são plus: por eles, transmite-se direito para fim econômico que não exigiria
tal transmissão. O fiduciário é proprietário em frente a todos; apenas a sua
propriedade não é eficaz quanto ao fiduciante (relatividade da eficácia, não da
propriedade). O fiduciante fia-se no fiduciário. Não há negócio ou ato jurídico
aparente: há negócio jurídico, que é. Por ele, cria-se relação jurídica de
fidúcia, que obriga o fiduciário a destinar o bem fiduciário ao fim da fidúcia.
As espécies mais notáveis são a transmissão abstrata para segurança (a
abstrakte Sicherungsubereignung) e a compra-e-venda fiduciária. Nem aquela nem
essa é ato jurídico aparente ou simulado. Por isso é, e não é anulável conforme
os arts. 102, 104 e 105[151].
Há
corrente, todavia, para a qual a admissibilidade do negócio fiduciário, ou pelo
menos a produção de seus efeitos naturais é questionada. Encabeça os que o
inadmitem José Beleza dos Santos, sob argumento de se voltarem especificamente
a fim prático que não aquele que determina e explica sua regulamentação
jurídica. “Entre a causa, razão de ser do ato, e os efeitos que o direito lhe
atribui, há, portanto, uma divergência que mostra bem a incompatibilidade
estrutural do contrato positivo de transmissão, com o pacto fiduciário que o
desfigura”[152]. É desta contradição, conclui José Beleza dos Santos, que
resulta serem as conseqüências jurídicas do negócio fiduciário inadmissíveis.
Fernando
de Sandy Lopes Pessoa Jorge, por sua vez, sustenta a completa inexistência, na
hipótese, de negócio fiduciário ou qualquer outro análogo. Atendendo à vontade
do mandante e do mandatário, ocorreria transferência direta do bem. Se o
mandatário assume pessoalmente as obrigações, cabendo a ele cumpri-las, caso
não o faça o mandante, no plano dos efeitos reais, “o direito que o mandatário
aliena, em execução do mandato, passa recta via ao adquirente, assim como o que
adquire, se transfere ao mandante, sem se inserir, em momento algum na sua
esfera jurídica”[153]. Esta concepção qualifica os atos do mandatário como atos
de administração de interesses (gerência em geral).
A
doutrina de J. M. de Carvalho Santos, no sentido da existência no direito
brasileiro dos negócios fiduciários, aclara o entendimento sobre o tema. O
autor delimita os contornos, bem como realiza a distinção entre as figuras da
simulação e do negócio fiduciário, nos seguintes termos:
Negócios fiduciários.
Embora tenham alguma semelhança com os simulados deles diferem, por que são
realmente concluídos pelas partes, não aumentando, porém, o patrimônio do
adquirente, justamente porque visam a outros fins. No negócio fiduciário, sem
dúvida, verifica-se a transferência do direito, mas é subtraído ao adquirente o
exercício de determinada faculdade, conservando, pois, intato o conteúdo do
direito. É o que se dá, por exemplo, com o sujeito que adquire a plena
titularidade do direito, mas se obriga para com o transmitente a não exercitar
determinada faculdade: adquire, v.g., a propriedade, mas se obriga a não usar
da coisa ou a não aliená-la, ou a restitui-la, ou ainda, a transferi-la a
outrem. É uma limitação fundada, como observa Barassi, somente sobre o honesto
e escrupuloso cumprimento desta obrigação de abstenção; não atinge a ausência
[sic] ou substância do direito e repousa sobre a confiança no adquirente
(Inst., cit., §45)[154].
Caio
Mário da Silva Pereira pretendeu, em seu projeto de Código de Obrigações,
dar tipicidade ao contrato de
fidúcia. O Código Civil de 2002 não o tipificou, apenas se atendo à compra e
venda fiduciária, com a finalidade de garantia (arts. 1.361 a 1.368-A, sem
correspondência no Código Civil de 1916).
De
acordo com Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald,
Como
negócio jurídico bilateral, perfaz-se a alienação fiduciária quando o credor
fiduciário adquire a propriedade resolúvel e a posse indireta de bem móvel (excepcionalmente
de imóvel), em garantia de financiamento efetuado pelo devedor alienante –que
se mantém na posse direta da coisa –, resolvendo-se o direito do credor
fiduciário com o posterior adimplemento da dívida garantida[155].
Antes
da entrada em vigor do Código Civil de 2002, o assunto era tratado, nos
aspectos material e processual, pelo Decreto-Lei n° 911, de 1° de outubro de
1969. Observam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald que a incorporação
da disciplina de direito material da propriedade fiduciária pelo Código Civil
esvazia, mas não revoga de todo o Decreto-Lei n° 911/69, pois “a normatização
instrumental do processo de busca
e apreensão lá se mantém presente, tendo,
porém, sofrido relevantes alterações pela Lei n° 10.931/04”[156].
Segundo
Caio Mário da Silva Pereira, na etiologia, o negócio fiduciário se desdobra em
dois momentos, sendo um real e ostensivo e outro pessoal e secreto. Neste se
formula a ressalva, contendo a obrigação do fiduciante retransferir a coisa
adquirida, no prazo e condições estipulados[157].
A
liberdade de estipular contratos atípicos, conferida às partes pelo art. 425 do
Código Civil[158], faz admissível, no direito brasileiro, o negócio fiduciário.
Assim entendia o STJ, mesmo na vigência do Código Bevilaqua, como se vê na
ementa do Recurso Especial n° 155.242/RJ, de
relatoria do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira,
DIREITO CIVIL. NEGÓCIO FIDUCIÁRIO.
SIMULAÇÃO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL COM PROMESSA DE DEVOLUÇÃO. PAGAMENTO DE
PARTE DO FINANCIAMENTO PELO VENDEDOR. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. NEGÓCIO REAL E
NÃO APARENTE. ARTS. 102, 103 E 104 DO CC. VALORES JURÍDICOS. HERMENÊUTICA.
RECURSO PROVIDO.
I
– O negócio fiduciário, embora sem regramento determinado no direito positivo,
se insere dentro da liberdade de contratar própria do direito privado e se
caracteriza pela entrega de um bem, geralmente em garantia, com a condição,
verbi gratia, de ser devolvido posteriormente.
II
– Na lição de Francesco Ferrara, “o negócio fiduciário, como querido realmente,
produz todos os efeitos ordinários, ainda que entre si os contratantes assumam
a obrigação pessoal de usar dos efeitos obtidos unicamente para o fim entre
eles estabelecido” (A simulação dos negócios jurídicos, São Paulo: Saraiva,
1939, p. 76).
III
– No negócio simulado há uma distância entre a vontade real e a vontade
manifestada, ao contrário do negócio fiduciário, no qual a vontade declarada
corresponde à realidade.
IV
– No cotejo entre dois valores protegidos pelo Direito, cabe ao julgador
prestigiar o de maior relevo e que no caso se manifesta com maior nitidez. (Sem
grifos no original)[159].
Como
exceção à liberdade de estipular contratos atípicos, devem-se destacar,
todavia, os contratos relativos aos negócios reais.
Pelo
princípio da taxatividade, os direitos reais são listados em número fechado na
lei, em especial no art. 1.225 do Código Civil (mas não exclusivamente nele).
Esclarecem Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald que, “destinando-se a operar
contra toda a coletividade, não pode qualquer direito real ser reconhecido
juridicamente se não houver prévia norma que sobre ele faça previsão”[160], ao
que aduzem que a taxatividade “importa considerar que fora do catálogo legal
exclui-se a possibilidade de a autonomia privada conceder direitos reais que
produzam conseqüências erga omnes”[161].
Mesma
opinião é a de Orlando Gomes, segundo o qual, malgrado alguma doutrina
divergente, domina no Brasil o entendimento de que “a constituição dos direitos
reais obedece ao sistema do numerus clausus, ao contrário da formação dos
contratos, na qual, vigorando o princípio da liberdade de estruturação do
conteúdo, prevalece o sistema do numerus apertus”[162].
De
qualquer forma, é de se notar que o Código Civil de 2002, não tendo adotado
expressamente nenhuma das teorias sobre o negócio fiduciário, não deixou de
disciplinar, ainda que modo incidental, o assunto. Assim, nos termos do art.
668, “o mandatário é obrigado a dar contas de sua gerência ao mandante, transferindo-lhe
as vantagens provenientes do mandato, por qualquer título que seja”, e do art.
670: “pelas somas que devia entregar ao mandante ou recebeu para despesa, mas
empregou em proveito seu, o mandatário pagará juros, desde o momento em que
abusou”.
Totalmente
diversa da interposição real de pessoas, é a chamada interposição fictícia de
pessoas. Nesta, o nome dado pela doutrina esclarece aspecto fundamental: na
realidade não ocorre interposição alguma. O contrato é celebrado diretamente
entre os interessados, sem que o interposto tenha qualquer intervenção efetiva
no negócio.
Ante a figura, Fernando de Sandy
Lopes Pessoa Jorge fez a pergunta: “mas o que é, afinal, a interposição
fictícia?”, à qual respondeu nos seguintes termos:
A
interposição fictícia verifica-se quando um negócio jurídico é realizado
simuladamente com uma pessoa, dissimulando-se nele um outro negócio (real), de
conteúdo idêntico ao primeiro, mas celebrado com outra pessoa. A declara vender
determinada coisa a B, que manifesta a sua vontade de a comprar; mas sob esta
aparência, esconde-se o verdadeiro contrato, não entre A e B, mas entre A e
C[163].
Entre
o testa-de-ferro e um dos contratantes não ocorre contrato de mandato, uma vez
que o acordo entre eles não tem por objeto a prática de atos jurídicos. Também
não é o cabeça de pau representante de um dos contraentes. Celebrado o contrato
entre as partes, o homem de palha ficará apenas titular aparente, titular
nominal, com o objetivo de subtrair ao conhecimento de terceiros o nome de uma
das partes envolvida no contrato ou de violar a lei.
Diferentemente do que ocorre na
interposição real de pessoas, na interposição fictícia não há efetiva
cooperação jurídica do interposto, pelo que afirma Francesco Ferrara:
Entre
o contratante secreto e a interposta de pessoa só se dá uma relação secundária,
em virtude da qual a interposta pessoa se obriga a cooperar no engano,
emprestando seu nome, e, eventualmente, a não abusar da sua qualidade aparente,
que, por efeito reflexo doutras normas, pode produzir uma modificação
jurídica[164].
Como
a interposta pessoa não intervém no contrato, a ela não ocorre transmissão de
direitos e obrigações, que são atribuídos diretamente nas esferas dos
verdadeiros contratantes. Assim, para a formação do contrato, somente será
necessária a intervenção jurídica dos dois verdadeiros contratantes, sendo o
interposto completamente estranho à relação jurídica estabelecida. O
interposto, “quando muito presta-se a uma simples cooperação material, que pode
consistir em comparecer pessoalmente como parte contratual para tornar perfeita
a mise-en-scène e repetir, mecanicamente, a declaração que lhe posta na
boca”[165].
Francesco
Galgano, que reputa o pacto simulatório elemento essencial no contrato simulado,
entende que o acordo para simulação relativa por interposição fictícia de
pessoas é um acordo a três, já que participam na contra-declaração seja as
partes do contrato simulado, seja o terceiro interponente.
Não
basta um acordo a dois, entre o interposto e o interponente: é preciso a
participação do terceiro ou, quando menos, a sua adesão sucessiva ao acordo. O
contraente direto do interposto, se não fosse partícipe da contra-declaração,
poderia exigir do interposto, no lugar do interponente, a execução do contrato
(por exemplo, o pagamento do preço de venda)[166].
A
interposição fictícia de pessoas é simulação relativa e não absoluta,
porque sob a aparência de um negócio (o fictício) tem-se um negócio verdadeiro,
escondido. A dissimulação nesta espécie exige que, além dos contratantes,
também o interposto saiba os termos do acordo simulatório, distinguindo-se (por
esta ciência) o testa-de-ferro do vulgarmente chamado laranja.
Os
fins conducentes à utilização da dissimulação subjetiva podem ser, como de
resto em toda simulação, lícitos (honestos ou inocentes) ou ilícitos
(fraudulentos ou nocentes).
Destaca
Fernando de Sandy Lopes Pessoa Jorge que o mais característico nesta
interposição é o seu caráter subjetivo. A dissimulação do negócio se dá por
meio de um dos sujeitos e não no conteúdo do contrato[167].
José Beleza dos Santos sintetiza a
interposição fictícia de pessoas por meio dos elementos necessários à sua
existência:
1
Que haja duas ou mais pessoas a quem interesse a realização de um determinado
ato jurídico;
2
Que todos ou alguns dos interessados não queiram ou não possam realizar
diretamente realizar;
3
Que exista um intermediário por meio de quem o ato se pratique e com quem os
diretamente interessados estabeleçam relações jurídicas;
4
Que esse intermediário não tenha interesse próprio na realização do ato em que
intervém como parte[168].
Exemplo
de interposição fictícia de pessoas seria a que visa burlar a regra do art. 496
do Código Civil, segundo a qual “é anulável a venda de ascendente a
descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante
expressamente houverem consentido”. Deste modo, pai, querendo celebrar com um
dos filhos contrato de compra e venda sem consentimento de outros filhos e, por
não poderem efetuar o contrato diretamente, se utilizam de um intermediário
(fictício) que apareça como adquirente do pai para vender ao filho, tendo o
contrato se dado, na realidade, imediata e diretamente entre pai e filho[169].
A
disciplina de (in)validade dessa simulação é a geral. Em seus termos, o Código
Civil afirma ser nulo o negócio simulado. O dissimulado, contudo, subsistirá se
válido for, na forma e na substância. Da mesma forma, terceiros de boa-fé que
contratarem com o interposto, têm ressalvados seus direitos em face dos
contraentes do negócio jurídico simulado. É de se observar, no caso, que o
interposto nem mesmo chegou a ter em sua esfera jurídica direitos e obrigações
decorrentes do negócio simulado.
Estabelecida
a necessária diferenciação entre as interposições de pessoas – real e fictícia
– e firmado que não são espécies de dissimulação, apenas o sendo a fictícia, é
pertinente anotar que casos sejam inocentes, não causando prejuízos a terceiros
(ainda que apenas em potencial) invalidade alguma ocorrerá. Sendo ilícitas, por
outro lado, o dispositivo legal que fundamenta sua invalidade é diverso.
Tem-se
assim, que a dissimulação subjetiva, quando nocente, considera-se nula, nos
termos do art. 167, § 1°, I do Código Civil, por “aparentarem conferir ou
transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente conferem, ou
transmitem”. Já na hipótese de interposição real de pessoas, por meio de negócios
que buscariam resultado proibido, configurar-se-ia fraude à lei. Nos termos do
art. 166, VI do Código Civil: “é nulo o negócio jurídico quando: [...] VI-
tiver por objetivo fraudar lei imperativa”.
Assuntos relacionados
Autor
Bacharel
em Direito (UFMG). Especialista em Direito Processual (PUC Minas). Concluiu o
Curso de Formação de Oficiais na Academia de Polícia Militar de Minas Gerais
(curso equivalente aos superiores de graduação). É oficial da reserva
não-remunerada da PMMG. Analista Judiciário-Área Judiciária na Justiça Federal
de Primeiro Grau em Minas Gerais. Professor voluntário de Direito Civil na
UFMG.
Sem sítio, A Praça é Nossa
Paulo
Silvino, Silvio Cesar & Carlos Alberto de Nóbrega(quadro do açucareiro)A
Praça é Nossa,90's
RIO
DE JANEIRO - No recente encontro de Lula com Bento XVI, no Vaticano, o
presidente brasileiro sugeriu que o Papa, em suas mensagens públicas, fizesse
algum comentário referente à crise econômica e financeira que o mundo
atravessa. Ignoro o que Bento XVI respondeu. É possível que tenha agradecido a
sugestão, dado o caráter cordial e protocolar da visita.
Até
certo ponto, o conselho não deixa de ser ocioso. A Igreja Católica romana tem
uma tradição formada há séculos, explicitada sobretudo nas encíclicas “Rerum
novarum” (1891) e “Populorum progressio” (1967). Para ser claro: sua estrutura
temporal sempre foi capitalista, em alguns momentos chegou a ser imperialista,
desde que, de certa forma, substituiu o Império Romano na esfera ocidental.
Mas,
em seu conteúdo pastoral, sua mensagem foi bem sintetizada por João Paulo II,
que, no início de seu pontificado, em Puebla, disse que “o capital tem uma
hipoteca social”. Está dito tudo neste simples enunciado. O Papa não condenou o
capitalismo em si, mas lembrou que o capital existe, se forma e sobrevive à
custa da sociedade que trabalha e nem sempre é recompensada pelos lucros que
gera.
Não
se trata de pregar a caridade, o assistencialismo que muitas vezes integra o
programa dos governantes. A idéia da hipoteca social é um preço proporcional
que o capital tem de pagar ao trabalho, como um dos fatores do próprio capital,
sendo mesmo o principal elemento da concentração da riqueza em mãos do Estado
ou das empresas.
A
crise que agora preocupa o mundo é a manifestação do capital mal-organizado e
mal-operado. Erguido à categoria de arco e flecha do desenvolvimento humano, é
um ídolo sem consistência desde que não pague a hipoteca que deu início a seu
processo dentro da sociedade.
Folha
de S. Paulo (SP) 18/11/2008
Defesa de Lula entrega a Moro recibos do apartamento vizinho ao seu em São Bernardo
Defesa de Lula entrega a Moro recibos do apartamento vizinho ao seu em São Bernardo
“O
proprietário fantasma recebeu da inquilina defunta em um dia que não existe”.
Comentário sobre o recibo de aluguel de Lula, com
data de 31 de junho.
Força-tarefa da Lava Jato alega que imóvel, que
pertence a primo de Bumlai, seria propina da Odebrecht; termina nesta
segunda-feira, 25, prazo para Lula apresentar sua defesa nesta ação
Marianna Holanda e Ricardo Galhardo, O Estado de
S.Paulo
25 Setembro 2017 | 18h33
BRASÍLIA - A defesa do ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva apresentou, nesta segunda-feira, 25, contrato de aluguel e
recibos do apartamento vizinho ao do petista em São Bernardo do Campo. A
força-tarefa da Lava Jato alega que Lula é o verdadeiro proprietário do imóvel,
que teria sido recebido como propina da Odebrecht.
O apartamento 121 do Edifício Hill House, vizinho ao
122 onde mora o ex-presidente, pertence a Glaucos da Costamarques, primo do
pecuarista José Carlos Bumlai. Além do contrato, assinado por Dona Marisa,
falecida em fevereiro deste ano, foram anexados recibos de 2011 até 2015, todos
assinados pelo proprietário.
O
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva Foto: Paulo Fonseca/EFE
O petista alega que o apartamento era alugado por
sua família e que quem cuidava dos recibos era sua esposa Dona Marisa, falecida
em fevereiro deste ano. Em seu último depoimento a Sérgio Moro, Lula foi
duramente questionado a respeito de provas do suposto aluguel.
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