A privataria da saúde não toma jeito
Costuraram
no escurinho de Brasília um avanço sobre as Unidades Básicas de Saúde do SUS,
conseguiram um decreto, que gerou gritaria e acabou sendo retirado
A turma da privataria
da saúde desprezou um velho conselho de Tancredo Neves e deu-se mal: “Esperteza
quando é muita come o dono”.
Costuraram
no escurinho de Brasília um avanço sobre as Unidades Básicas de Saúde do SUS,
conseguiram um decreto, provocaram uma gritaria, tomaram um momentâneo
contravapor de Bolsonaro e avacalharam o general Eduardo Pazuello. Seu
ministério disse que a ideia veio da ekipekonômika. Já o doutor Guedes
disse inicialmente que ela veio do ministério do general.
Em 2019,
essa turma produziu em segredo um projeto que virava de cabeça para baixo a
legislação que rege os planos de saúde. Tinha 89 artigos, nenhum a favor da
clientela. A peça havia sido produzida num escritório de advocacia por um
consórcio de entidades, seguradoras e operadoras, e a consulta ao seu texto era
sigilosa. Divulgada, a armação explodiu e ficou sem pai nem mãe. Covardemente,
ninguém saiu em sua defesa, nem os autores.
De lá para
cá, veio uma pandemia e roubalheiras público-privadas com a saúde foram
expostas em Rio, Amazonas, Pará, Brasília e Santa Catarina. Três secretários de
Saúde passaram pela cadeia, e dois governadores estão com o mandato a perigo.
Individualmente, entre os çábios da privataria médica há renomados profissionais, ou respeitados gestores. Coletivamente, eles se misturam com larápios e operadores do escurinho de Brasília, incapazes de botar a cara na vitrine. Se praticassem esse tipo de promiscuidade no tratamento de seus pacientes privados, a medicina brasileira já teria migrado para Miami.
A menina Rachel Clemens Coelho se recusa a
cumprimentar o presidente Figueiredo
(Foto: Guinaldo Nicolaevsky)
http://g1.globo.com/minas-gerais/noticia/2015/04/mulher-que-quando-crianca-negou-se-dar-mao-figueiredo-morre-em-bh.html
Figueiredo, general de vitrine
Está
chegando às livrarias “Me esqueçam: Figueiredo — A biografia de uma
presidência”, de Bernardo Braga Pasqualette. Conta o governo do general João
Baptista Figueiredo, o último governante do ciclo que foi de 1964 a 1985.
Estourado e
vulgar (um lorde nos dias de hoje) deixou a Presidência pedindo para ser
esquecido. Conseguiu, mas os tempos estranhos do século XXI pediam que seu caso
fosse contado e Pasqualette ralou, entrevistando centenas de sobreviventes do
ocaso da ditadura. Figueiredo foi um personagem trágico. É visto como o último
presidente da ditadura, mas assinou a anistia de 1979, respeitou as regras do
jogo e deixou o palácio por uma porta lateral para não passar a faixa a José
Sarney, que assumiu por conta da doença de Tancredo Neves. Seria seu grande
momento. Foi o retrato de um temperamental desorientado.
Sua
administração foi errática e ruinosa, mas a ele também se deve o fecho da
transição para um regime democrático.
Figueiredo
era um general de vitrine, tríplice coroado nas escolas militares, fazia o
gênero do cavalariano desbocado e atlético. Ali havia um cardiopata inseguro e
dissimulado. Muita medalha e pouco mérito. Ele passou mais tempo no palácio do
que em comandos de tropa e viveu parte da Segunda Guerra como instrutor da
cavalaria na escola de Realengo.
GEISEL PASSA A FAIXA PRESIDENCIAL A fIGUEIREDO
https://folhapress.folha.com.br/foto/696533
Faixas
Ao tempo do
general Figueiredo, o governo tinha mania de condecorações. Ela voltou, com
mais um penduricalho: as faixas. Este adereço monárquico exige bons modos e
elegância. Quando o uso de faixas era coisa de miss em concurso de beleza, as
moças vestiam-nas como rainhas.
Bolsonaro
veste suas faixas com tamanha desatenção que elas podem acabar virando
cachecóis. Em seu benefício, diga-se que nunca usou faixa com o paletó aberto,
coisa que pelo menos um dos seus generais já fez.
"Você
tem um amigo aqui" disse Lula ao ex-presidente, que contou ter ficado
muito emocionado ao passar a faixa ao petistaLula caiu na real
"Fiz
o que pude; vou descansar", diz FHC
WILSON
SILVEIRA
ANDRÉ SOLIANI
HUMBERTO MEDINA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc0201200350.htm
Com o PT a
pão e água nas pesquisas para a eleição dos prefeitos de Rio, São Paulo e Belo
Horizonte, Lula caiu na real.
Em junho ele
se recusava a assinar manifestos que julgava poluídos por eventuais adesões
como as de Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer.
Nas suas
palavras: “Eu não tenho mais idade para ser maria vai com as outras. O PT já
tem história neste país, já tem administração exemplar neste país. Eu,
sinceramente, não tenho condições de assinar determinados documentos com
determinadas pessoas”.
Passaram-se
quatro meses e a “metamorfose ambulante” mudou, anunciando que “podemos ter uma
ampla coalizão contra o Bolsonaro em 2022”.
Graças a uma
costura de Camilo Santana, o governador petista do Ceará, “Nosso Guia”
restabeleceu a comunicação com Ciro Gomes, a quem ele e o comissariado petista
maltratavam.
Quando os
dois se estranhavam, Ciro Gomes disse, com razão, que “o PT se acha dono dos
votos” e Lula “se acha o maioral”.
Veja as
gafes em posses presidenciais
RECORDTV
01/01/2011
- 14h10 (Atualizado em 24/11/2016 - 09h23)
“O
general João Batista Figueiredo preferiu sair pelas portas dos fundos do que
passar o poder para José Sarney. Em 2003, Fernando Henrique Cardoso se
atrapalhou na hora de passar a faixa presidencial para Luís Inácio Lula da
Silva.”
https://recordtv.r7.com/videos/veja-as-gafes-em-posses-presidenciais-24112016
O governador eleito do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC)Imagem: Jose
Lucena/Futura Press/Estadão Conteúdo
'A polícia vai mirar na cabecinha e... fogo', afirma Wilson Witzel
https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2018/11/01/a-policia-vai-mirar-na-cabecinha-e-fogo-afirma-wilson-witzel.htm
Witzel
saudita
O doutor
Wilson Witzel (Harvard Fake’ 15) ameaça: “Se perceber que há perseguição
política e cooptação das instituições contra mim e a minha família, pretendo
pedir asilo político no Canadá”.
Ex-juiz,
Witzel deve procurar um advogado ou pensar num outro tipo de fuga. É improvável
que a embaixada do Canadá dê asilo político a um cidadão acusado de improbidade
que tenha sido afastado do governo num processo público e irretocável.
Isso,
fazendo-se de conta que o governador afastado do Estado do Rio defendia os
direitos humanos quando dizia que “a polícia vai mirar na cabecinha e… fogo”.
O Canadá tem
uma tradição humanitária e recebeu dezenas de milhares de refugiados, quase
todos do andar de baixo. Talvez Witzel possa tentar a Arábia Saudita, que em
1979 asilou o balofo ugandense Idi Amin Dada, ou Marrocos, onde o larápio
general congolês Mobutu terminou seus dias.
https://pbs.twimg.com/media/DuDV-DtW0AAHVTF?format=jpg&name=small
·
O deputado Djalma Marinho (ARENA-RN)
renunciou à presidência da Comissão porque foi voto vencido. "Ao Rei tudo,
menos a honra", ele disse.
·
Em resposta a
e
Dr Djalma era um homem de bem,nosso
vizinho durante mais de 30 anos, amigo do meu pai, que inclusive foi colega de
turma das suas filhas, Hebe e Tânia, na faculdade de direito. Todo patrimônio
que fez, e não era grande, o fez como advogado brilhante. Honrado!
https://twitter.com/1968agora/status/1072188697297281024
Guedes x
Marinho
O doutor
Paulo Guedes sempre soube que a Febraban opera a serviço dos bancos, até porque
já esteve naquele lado do balcão. Como ministro, atacou a guilda acusando-a de
financiar “estudos que não têm nada a ver com a atividade de defesa das
transações bancárias, financiando ministro gastador para ver se fura o teto,
para ver se derruba o outro lado”.
A fala seria
trivial, mas seu final ficou críptico. Pode-se deduzir que o “ministro
gastador” é Rogério Marinho. Falta explicar o uso da palavra “financiando”.
Pelo nível
das cotoveladas que os dois trocam, poderiam ouvir o conselho de Djalma
Marinho, avô de Rogério, em 1968, quando o governo armava o bote do AI-5: “Ao
rei, tudo, menos a honra”.
O futuro de
Salles
A segurança
de Ricardo Salles no ministério do Meio Ambiente tornou-se idêntica à de uma
jazida em reserva indígena.
Quando o
general da reserva Santos Cruz reclamou do “desrespeito geral, por despreparo,
inconsequência e boçalidade” que envenenam o ar, não deu nome aos bois, mas
passou sua boiada.
Elio
Gaspari
O
Globo / Folha de S. Paulo
domingo, 1
de novembro de 2020
https://gilvanmelo.blogspot.com/2020/11/elio-gaspari-privataria-da-saude-nao.html
“Defenda o SUS”,
da frase abstrata à ação política
https://reporterpopular.com.br/defenda-o-sus/
A menina Rachel
Clemens Coelho se recusa a
cumprimentar o presidente Figueiredo
(Foto: Guinaldo Nicolaevsky)
http://g1.globo.com/minas-gerais/noticia/2015/04/mulher-que-quando-crianca-negou-se-dar-mao-figueiredo-morre-em-bh.html
Ao rei tudo.
Menos a honra
Murilo Melo Filho
Os trabalhos legislativos corriam em
Brasília, mornos e monótonos no fim daquela tarde de 3 de setembro de 1968,
quando o deputado Marcio Moreira Alves, falando no ''pinga-fogo'', pronunciou
um discurso que bem poderia ter ficado inédito, porque proferido para um
plenário vazio e que constaria de um registro sem o menor destaque ou
importância no Diário do Congresso. Dizia ele mais ou menos o seguinte:
- Com a proximidade do 7 de setembro,
a ditadura certamente vai determinar que os colégios participem do desfile
militar. Apelo para que os pais não permitam aos seus filhos marcharem ao lado
dos carrascos que os agridem e os fuzilam nas ruas. E proponho às moças que não
dancem com os cadetes no baile da Independência.
Por coincidência, justamente naquela
semana estava sendo encenada, em São Paulo, a comédia grega Lisístrata, de
Aristófanes, com a história das atenienses que fecharam as portas de suas casas
para os maridos derrotados na volta de uma batalha. Interpretou-se o discurso
como uma insinuação para que as brasileiras se fechassem (sic) aos oficiais,
seus maridos, numa interpretação absurdamente sexual.
Os militares da linha ''dura'' estavam
precisando de um pretexto e aquele era simplesmente ótimo. O discurso foi
reproduzido em milhares de cópias mimeografadas e distribuídas em todos os
quartéis e guarnições.
Os ministros do Exército, Aeronáutica
e Marinha - Lyra Tavares, Márcio Melo e Rademaker - exigiram um processo contra
o deputado, que o ministro da Justiça, Gama e Silva, transformou imediatamente
num pedido de licença para cassação do seu mandato. Realizaram-se então muitas
negociações entre o Palácio do Planalto e a Comissão de Constituição e Justiça,
que tinha de dar seu parecer sobre o pedido de licença e que era presidida por
Djalma Marinho, um corajoso deputado lá do Rio Grande do Norte.
Nesse ínterim, a polícia, que vinha
espionando de perto todos os passos dos promotores do 30º Congresso Nacional
dos Estudantes, marcado para o dia 14 de outubro em Ibiúna, conseguiu
surpreender os seus organizadores e invadiu o recinto do conclave, prendendo em
flagrante, numa detalhada operação, os principais líderes da UNE: José Dirceu,
José Travassos e Vladimir Palmeira, além de dezenas dos 700 delegados presentes.
Esgueirando-se por um portão nos fundos do sítio, Jean Marc van der Weide foi
um dos únicos a escapar do cerco policial.
Enquanto isto, realizavam-se as
negociações entre o Planalto e a CCJ. Duas sugestões foram aí feitas e
recusadas:
1. A do senador Daniel Krieger, líder
do governo no Senado, para uma punição intramuros do parlamentar, que sofreria
uma espécie de advertência, interna corporis, em vez de uma cassação.
2. E a do deputado Djalma Marinho, que
propunha o adiamento da decisão para março seguinte, após as férias
legislativas, quando os parlamentares teriam oportunidade de consultar suas
bases e regressar a Brasília com mais elementos que ensejassem uma solução do
impasse. (Essa idéia foi inicialmente aceita pelo próprio marechal Costa e
Silva, mas depois recusada pelo ministro Gama e Silva).
Com o fracasso de ambas as sugestões,
o senador Krieger renunciou à liderança no Senado, refugiando-se em sua fazenda
Lami, a 37km de Porto Alegre. O deputado Djalma Marinho, após recusar um
dramático e comovente apelo do senador Dinarte Mariz, renunciou à presidência
da Comissão, pronunciando um histórico discurso:
- Na minha sofrida vida pública, como
representante de um pequeno estado, tenho mantido fidelidade à ordem
democrática. Ao longo do tempo, mesmo na minha humildade, a ela ofereci a minha
vassalagem, mas nunca o atendimento a exigências e concessões absurdas, como
esta. Passada a tormenta e esclarecidos os homens, virá o tempo da
reconstrução. Rejeitar este pedido é um ato de bravura moral, igual àquele
oferecido por Pedro Calderón de La Barca: ''Ao rei tudo, menos a honra''.
Sem o seu presidente, a Comissão de
Justiça já havia estrategicamente substituído vários deputados da Arena
contrários à concessão da licença e deu parecer favorável a ela, por 17 votos
contra 9. A votação no plenário foi marcada para o dia 12 de dezembro, acusando
o seguinte resultado: 141 votos a favor da licença, 24 abstenções e 12 em
branco. A maioria de 216 votos, estimulada pelo discurso de Djalma, recusou a
sua concessão, num ato de ousada e surpreendente coragem.
Derrotado, o governo militar reagiu no
dia seguinte, 13 de dezembro de 1968, há quase 36 anos, portanto, decretando o
AI-5, com todo aquele cortejo de violências, seqüestros, torturas, cassações e
prisões.
Uma densa e prolongada noite de trevas
iria abater-se sobre o país, mas restaria para sempre aquele valente protesto e
aquela sábia advertência de Djalma Marinho, meu conterrâneo e um exemplo para
toda a sua geração, que foi inspirar-se no grande teatrólogo madrilenho do
Século 17:
- Ao rei (Costa e Silva), tudo, menos
a honra (minha).
Jornal do Brasil (Rio de Janeiro - RJ)
em 21/04/2004
https://www.academia.org.br/artigos/ao-rei-tudo-menos-honra
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