(...) Conte com as circunstâncias, que também são fadas.
Conte mais com o imprevisto. O imprevisto é uma espécie de deus avulso, ao qual
é preciso dar algumas ações de graças; pode ter voto decisivo na assembléia dos
acontecimentos. (...) (Aires in Esaú e
Jacó) Machado de Assis Capítulo CXV Troca de Opiniões
(...) Eu costumo dizer que a única
coisa que evoluiu no Brasil foi o atraso. (...) Levir Culpi:
Entrevista
Entrevista
Em uma longa entrevista ao Estadão, em 17/11/2014, sobre suas experiências futebolísticas, humanas e culturais, o técnico de futebol Levir Culpi, de forma arguta, sincera e lúcida faz elevadas reflexões sobre praticamente uma vida dedicada à uma única atividade, segundo suas palavras: o futebol.
Pós Copa
do Mundo no Brasil em 2014, a mesma é eivada de ensinamentos e realismo que
podem ser muito úteis para todos que, direta ou indiretamente, tenham algum
envolvimento com esse esporte e suas consequências na vida de todos os
brasileiros, senão como mero torcedor.
Tendo
trabalhado por seis anos no Japão, é um expectador privilegiado para analisar,
criticar e propor caminhos sem falsas ilusões e manipulações como sói acontecer
em momentos que a trilha da tergiversação é a mais cômoda para quem está em fim
de linha ou incapaz de apreender as transformações sociais e políticas das
circunstâncias de que nem sempre se detém a posição de controle.
Vale a
pena acompanhar os ensinamentos simples de uma pessoa aparentemente arrogante
em Entrevista. Levir Culpi:
De volta depois de seis anos no Japão,
treinador do Atlético-MG também se esforça para educar jogadores
'Nós somos meio bipolares', afirma técnico Levir Culpi
Almir Leite
17 Novembro 2014 | 07h 00
Levir
Culpi passou 6 anos no Japão. Era admirado, respeitado. Decidiu voltar ao
Brasil no final do ano passado e em abril deste ano retornou ao Atlético
Mineiro, clube de onde saiu em 2007 rumo ao Oriente. Pressentia que iria viver
fortes emoções nessa quarta passagem pelo Galo. Acertou em cheio.
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Precisou
“enquadrar’’ alguns jogadores, foi decisivo para que o já desmotivado
Ronaldinho Gaúcho seguisse seu caminho, mandou indisciplinados embora, deu
chance a garotos como Jemerson e Carlos. Formou um time competitivo, já tem um
título (da Recopa Sul-Americana) e está bem perto de comandar uma das
conquistas mais importantes da história do clube, a Copa do Brasil, que se vier
no próximo dia 26 será em cima do arquirrival Cruzeiro. Gloria suprema.
Tudo
com muita emoção, como nas vitórias por 4 a 1 sobre Corinthians e Flamengo pelo
torneio. Tudo sem perder o humor, as tiradas inteligentes e a franqueza.
Sinceridade que lhe permite dizer com todas as letras que o brasileiro é um
povo de boa índole, mas carente de educação. E lamentar esse atraso que, diz,
se reflete no comportamento dos jogadores.
Aos
61 anos, Levir revela ao Estado não pensa em parar. Se o fizer, vai
sentir falta até de ser xingado pela torcida. Xingamentos que inspiraram o
título do livro que escreveu. “Um burro com sorte’’, lançado este ano, tem toda
a renda revertida para o Hospital Pequeno Príncipe de Curitiba, referência em
pediatria. É a forma que Levir encontrou para contribuir com a sociedade.
Duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas,
no que respeita ao universo, ainda não adquiri a certeza absoluta.
Já Albert Einstein, o físico revolucionário alemão, não
obstante soar bastante pessimista, em uma avaliação de uma das características
humanas, o pai da Teoria da Relatividade, e humanista contumaz, em suas lutas
pelos direitos civis, radicaliza num aforismo a ele atribuído que, para
expressar sua eterna dúvida com o perigo do absolutismo, em qualquer campo do
conhecimento e da vida, abre ressalva apenas para a estupidez humana.
ALMIR
PAZZIANOTTO PINTO - O ESTADO DE S. PAULO
13 Janeiro 2015 | 07h 20
13 Janeiro 2015 | 07h 20
"A única coisa que evoluiu
no Brasil foi o atraso", Levir Culpi, Estado, 17/11/2014
Diferentemente do que ocorreu com
outras organizações partidárias, o PT evoluiu rapidamente, mas rumo ao atraso.
No que diz
respeito ao ex-advogado de Sindicatos do ABC paulista, nos idos da década de 1970,
momento tenebroso para a democracia e prevalência do autoritarismo, hoje um ex
- ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho), transcreve-se, a seguir, um
seu artigo publicado no Estadão, de 17/11/2014, sobre a mutação, no menor
espaço de tempo na história desse país, do menor ao maior partido trabalhista
da América, ao longo de pouco mais de 30 anos. Fenômeno inédito na história
mundial como nunca visto.
O ex - ministro
do TST conviveu com sindicalistas que ajudaram a organizar, ao lado de intelectuais
democratas, líderes de movimentos fora das instituições consideradas legais
pelo regime ilegal em vigor e membros de comunidades de bases uma rede que
alcançasse formações sociais que almejavam transformações sociais, políticas,
econômicas e culturais em um país integrado numa aldeia global com alguns
colhendo os frutos mais apetitosos em detrimento de maiorias, em geral,
excluídas em direitos e liberdade, apesar dos deveres cumpridos no que tange às
responsabilidades assimétricas cobradas por um Leviatã Moderno.
Está,
portanto, Pazzianoto em posição privilegiada e isenta para fazer o balanço de
um período de nossa história em que sempre se postou nas lutas que envolviam
trabalho e justiça. Ele que, como deputado estadual pelo então MDB (Movimento
Democrático Brasileiro), oposição legal e consentida pelo regime de então, e
também como advogado trabalhista, é mencionado por FHC, em seu livro a seguir
citado, como aquele jovem deputado estadual por São Paulo recomendado para trabalhar
pela sublegenda do MDB para o acadêmico em sua primeira incursão nas artes da
política institucional, como candidato a senador pelo mesmo estado de São
Paulo, ao lado do democrata-cristão André Franco Montoro, também advogado
trabalhista, alta voz dos trabalhadores no Senado Federal por São Paulo.
O retrato
de Almir é sem retoques e doi quando o projetamos no monitor com suas
transformações camaleônicas num curto intervalo de uma vida institucional. Dispensável
seria a epígrafe de Levir Culpi, extraído da entrevista anteriormente citada nesse
espaço.
Diferentemente do que ocorreu com outras organizações
partidárias, o PT evoluiu rapidamente, mas rumo ao atraso.
Lançado por Lula em 1979 no ABCD, o PT visava o monopólio de
representação da classe operária. Na primeira eleição, disputada em 1982,
elegeu 8 deputados federais e 12 estaduais. Em 1986 foram 16 federais e 39
estaduais. Aumentava, também, o número de prefeitos e vereadores: em 1982 havia
sido apenas 1, em Diadema, e 179 vereadores em poucos municípios, quantidade
que saltou, quatro anos depois, para 112 e 1.881.
No ano de 1994 elegeu 2 governadores, no Espírito Santo e no
Distrito Federal, número que subiu a 3 em 1998, quando foi vitorioso no Rio
Grande do Sul, em Mato Grosso do Sul e no Acre, embora derrotado no Distrito
Federal, não conseguindo reeleger Cristovam Buarque.
Como explicar a ascendente trajetória do partido que em apenas
24 anos conquistou a Presidência da República com Luiz Inácio Lula da Silva,
após ser derrotado por Fernando Collor em 1989 e, em 1994 e 1998, por Fernando
Henrique Cardoso?
Lula fez-se conhecido em 1975, quando alcançou a presidência do
Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo. Até então fora suplente do conselho
fiscal e primeiro-secretário, encarregado do departamento jurídico.
Em abril de 1976 o sindicato rompeu com a Federação dos
Metalúrgicos ao recorrer contra decisão do Tribunal Regional do Trabalho de São
Paulo (TRT-SP) que ignorou a pauta anual de reivindicações para lhe impor
convenção coletiva de trabalho celebrada pela Fiesp com a federação estadual,
dirigida por pelegos.
A vitória obtida no Tribunal Superior do Trabalho (TST), em setembro, deferindo cinco cláusulas adicionais, como a de estabilidade da gestante, repercutiu na imprensa e consolidou a liderança de Lula na classe operária, na qual passou a ser visto como dirigente independente do Ministério do Trabalho. O Brasil estava sob o regime militar e gestos de desafio eram algo novo na política trabalhista brasileira.
A vitória obtida no Tribunal Superior do Trabalho (TST), em setembro, deferindo cinco cláusulas adicionais, como a de estabilidade da gestante, repercutiu na imprensa e consolidou a liderança de Lula na classe operária, na qual passou a ser visto como dirigente independente do Ministério do Trabalho. O Brasil estava sob o regime militar e gestos de desafio eram algo novo na política trabalhista brasileira.
No ano seguinte Lula deflagrou campanha pela recuperação de
perdas decorrentes da manipulação dos índices de custo de vida e em 1978
liderou a primeira greve bem-sucedida pós-1964. Decretada a ilegalidade pelo
TRT-SP, os metalúrgicos de São Bernardo não recuaram e obrigaram as indústrias automobilísticas
a retomar negociações até assinatura de vitorioso acordo coletivo em 31 de
maio.
Seguiram-se as greves de 79 e 80. Em ambas o sindicato sofreu
intervenção e na última Lula foi preso e processado pela Lei de Segurança
Nacional.
Encerrado o mandato em 1981, Lula não voltou ao sindicato nem à
Villares, onde era torneiro mecânico. Optou pela política, com o propósito de
disputar o governo estadual. Muito antes, em abril de 1980, após ser deposto da
direção do sindicato, entrevistado pela revista IstoÉ (23/4/1980) sobre se
cogitava de se candidatar à Presidência da República, seguro de si Lula
respondeu: “Isso é brincadeira. Mas, falando sério e sem falsa modéstia, eu
seria muito melhor do que o Figueiredo. Seria muito melhor que Maluf, Delfim, esse
pessoal todo”.
Foi com tal autossuficiência que o líder, cuja aversão aos
livros é conhecida, imprimiu orientação radical ao PT. Exemplo disso foi a
abstenção dos petistas no colégio eleitoral que deu a vitória a Tancredo Neves,
contra Paulo Maluf, em janeiro de 1985. Os deputados que ousaram divergir foram
execrados e banidos.
O PT adotou, como programa, fazer oposição sistemática,
agressiva e intolerante a quem se encontrasse no governo. Barba cerrada, munido
de megafone, camiseta estampada com a figura de João Ferrador e a frase “hoje
não tô bom”, Lula comparecia a portões de fábricas para acusar as injustiças
sociais, o arrocho salarial, a corrupção e o peleguismo sindical, propondo a
tomada do poder.
Em semanas, jornalistas, universitários, servidores públicos,
jovens da classe média, artistas aderiram às fileiras do novo partido,
fornecendo-lhe militância gratuita que se transformou em poderosa massa de
eleitores. Ao passo que Lula adquiria nome e prestígio, partidos fortes, como o
PMDB e o PFL, definhavam, acossados sem cessar pelos militantes petistas.
O sucesso do Plano Real, magistral criação da equipe de Fernando
Henrique Cardoso, não foi suficiente para eleger José Serra, a grande esperança
dos tucanos, batido por Lula nas eleições de 2002. Em 2006 derrotou Geraldo
Alckmin, obtendo o segundo mandato. Detentores de invejáveis carreiras
universitárias e políticas, não conquistaram votos para derrotar o metalúrgico
iletrado, cuja admiração por ditadores fora dissimulada em hábil campanha
publicitária.
A chegada à Presidência da República revelaria, entretanto, a
face oculta do PT: nem capitalista, tampouco socialista, apenas demagogo,
aético, arrogante, fisiológico.
Tendo por programa a tomada do poder, mas sem saber o que fazer
com ele, nos primeiros quatro anos se beneficiou do legado do PSDB na condução
da economia, cuja estabilidade fora recuperada. Perdidas, porém, as armas da
agitação e da greve, e incapaz de planejar e executar medidas de larga
envergadura, optou pela gastança, pelo endividamento e pelo assistencialismo
estéril e barato: estava criado o Bolsa Família, o maior cabo eleitoral de
todos os tempos.
Em 12 anos de petismo desenfreado, marcados por escândalos,
entre os quais se destacam o mensalão e o “Lava Jato”, o Brasil evoluiu, mas no
sentido do atraso, como sentenciou Levir Culpi, perspicaz treinador do Atlético
Mineiro.
A frase antológica traduz, com clareza, o que pensam do petismo
milhões de brasileiros.
*Almir Pazzianotto Pinto é
advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do TST
Fernando
Henrique Cardoso
A
Arte da Política: A História que
Vivi
O ex - Presidente
da República, que passou a faixa do Planalto exatamente para o eleito à sua
sucessão pelo partido ora radiografado por Almir; antes de mencionar, em
passagem posterior de seu livro, o jovem advogado trabalhista dos sindicatos
dos trabalhadores nas greves do ABC dos 1970’s; faz uma colocação bem contextualizada
para o momento presente envolvendo
O Poder e a Moral n’A Arte da
Política em Contextos.
(...) É certo, porém, que a origem de
classe ou a posição política ancestral, por si sós, são de pouca valia para
explicar o comportamento político efetivo. Os valores assumidos, a evolução da
cultura política, a configuração do jogo de poder, a posição dos atores polares
desempenham papel de maior relevância na definição dos rumos pessoais. Em
qualquer hipótese, entretanto, a "abertura mental", o comportamento
tolerante, a aceitação do outro e da diversidade político-cultural são
condições propícias para o exercício da liderança democrática. 18 Erasmo de Roterdã ou Tomás Moro tinham
uma visão menos descarnada do poder do que Maquiavel. Desde Platão a
"sabedoria" foi incluída entre as virtudes necessárias para o bom
governo. Erasmo, na "Educação de um príncipe cristão", in Conselho
aos governantes, op. cit., p. 313, diz: "Se queres mostrar que és um
príncipe excelente, certifica-te que ninguém te exceda nas necessárias
qualidades de sabedoria, magnanimidade, reserva e integridade.” Tomás Moro, que
antes de Maquiavel já recomendava a separação entre política e moral e, como o
contemporâneo Erasmo (os dois foram amigos e Erasmo supervisionou a publicação
da Utopia), justificava a busca da paz e da justiça em termos racionais, não
descuidou do statesmanship. O governo seria o produto natural de seres humanos genuinamente
livres e responsáveis e a autoridade derivaria do consentimento. Mais adepto de
formas representativas de governo do que das monarquias com seus reis, Moro,
seguindo Aristóteles, tinha maior confiança nas leis do que nas paixões dos
homens para alcançar o bom governo. Moro acreditava que a lei e a educação
constituíam os fundamentos do governo. A prudência e a tradição cultuadas pelos
líderes formariam os suportes do arcabouço institucional. Acreditava na
separação dos poderes, nas regras da lei, na separação entre Estado e religião,
em representantes eleitos e em formas protegidas de deliberação, que deveriam ser
livres e públicas. Ver a respeito do pensamento de Moro o excelente livro de
Gerard B. Wegemer, Thomas More on Satesmanship, Washington, The Catholic
University of America Press, 1996. (...)
(...)
CAPITULO 2
Encontrei
Lula em uma pequena sala, cercado por companheiros, muitos dos quais, como
Djalma Bom e José Cicote, viriam a se destacar, anos depois, como vereadores,
deputados ou dirigentes partidários. Tivemos conversa direta. Lula disse que se dispunha a me
apoiar, que poderia fazer pouca coisa, mas que eu iria contar com a ajuda do
advogado do sindicato, Almir Pazzianotto, deputado estadual pelo MDB, que
votaria em mim na convenção do partido (para ser candidato por uma sublegenda eu
precisaria obter 20% dos votos dos delegados à convenção, e os candidatos
tradicionais se opunham a me dar uma vaga). (...)
É ainda Cardoso,
Professor e Sociólogo de Campo, quem nos indica que Reason, Rhetoric and Law devem servir de muletas para nos auxiliar
no trilhar caminhos que nossas pernas trôpegas podem não ser capazes de fazer com
seus próprios atributos quando, por exemplo, sugere o livro Thomas More on Statesmanship Gerard B Wegemer Washington, D.C.: The Catholic University of America Press, 1986
cujo resumo, em inglês, segue:
This study examines More’s complete works in
view of his concept ofstatesmanship, and, in the process, links More’s
humanism, his faith, and his legal and political vocations. The work integrates
the literature, philosophy, history and politics of the Renaissance in its
discussion.
Para aqueles que não têm a paciência e a pachorra
para a leitura recomenda-se a audição de uma série de entrevistas, em inglês, sobre St.
Thomas More: Faithful Statesman with Fr. C.. John McCloskey and Dr. Gerard
Wegemer sobre o tema tratado no livro citado
Circunstâncias?
Ou mais? Imprevisto? Uma espécie de deus avulso. Com certeza.
Na sequência, tem-se um acadêmico, agora de fato, sendo
saudado por um amigo na Casa fundada por dois amigos diletos: Machado e Nabuco,
alteregos, quem saberá, de mais dois amigos e mais novos confrades, um século
mais tarde na roda da fortuna e com votos decisivos na assembleia dos
acontecimentos.
CELSO LAFER
(...)
É hora de encerrar esta saudação, redigida, como disse, sob o signo da amizade
e da admiração, mas empenhada na verdade, a primeira, porém dificultosa
qualidade da História como advertia o pe. Antonio Vieira. Está, no entanto, em
sintonia com a observação neste contexto do “Imperador da língua portuguesa”:
"Todas as penas nasceram em carne e sangue, e todas na tinta de escrever
misturaram as cores do seu afeto”.
Nosso sábio Machado de Assis aponta,
em Esaú e Jacó, que o imprevisto é “uma espécie de Deus avulso” que “pode ter
voto decisivo na assembleia dos acontecimentos”. O imprevisto corresponde ao
que Maquiavel chamou de fortuna que, como “caso, tempo e sorte/Tem do confuso
mundo o regimento” nas palavras de Camões. Para que a fortuna possa ter impacto
efetivo “na assembleia dos acontecimentos” é preciso ter virtú, o conjunto de
qualidades necessário a um homem de Estado. O acadêmico Fernando Henrique, por
conta da sua virtú, soube descortinar as oportunidades que a fortuna dos
imprevistos abriram para a sua trajetória. É esta consciência que explica o
título The Accidental President of Brazil, a sua bela e esclarecedora narrativa
autobiográfica, que é também reveladora do significado que as discussões em sua
casa, bem como a experiência da herança familiar, tiveram para moldar não
apenas a sua sensibilidade e o conhecimento vivo da história, mas também a
percepção da abrangente diversidade do nosso país.
- III – (...)
(...)
O certo, no entanto, é que Fernando Henrique como acadêmico enquadra-se nos
critérios propostos por Nabuco e, neste âmbito, entre os pensadores do Brasil,
a começar pelo próprio Nabuco, presença originária na sua reflexão, “desde as
premissas até a conclusão da tese, que se transformou no livro Capitalismo e
Escravidão no Brasil Meridional”, para recorrer às suas próprias palavras.
“Joaquim Nabuco, democrata” é o título da notável conferência por ele
pronunciada nesta Casa em março de 2010, que representou também uma das etapas
da sua aproximação à Academia, fruto da iniciativa do nosso confrade Marcos V.
Villaça, subsequentemente um dos paladinos da sua eleição. Esta conferência
integra o seu mais recente livro Pensadores que inventaram o Brasil. (...)
(Celso Lafer in Discurso de Recepção ao Acadêmico Fernando Henrique Cardoso)
Todos os personagens aqui citados, independentemente de suas
diferenças, convergem em pelo menos um ponto: todos, sem exceção, contaram com
as circunstâncias, que para Aires de Machado são também fadas. Contaram mais
com o imprevisto. Por ser o imprevisto uma espécie de deus avulso, precisaram
dar algumas ações de graças; puderam ter voto decisivo na assembléia dos
acontecimentos.
Deus salve o Brasil!
Nesta altura de um campeonato catimbado n’as artes da
política e do poder, em arenas nacional e internacional, brasileiros
humildemente ficamos a esperar por uma boa fortuna dentro das estritas
necessidades, torcendo, não se sabe se impotentemente, para que a atual e Primeira
Presidenta de nossa República tenha
virtú e esteja à altura de se converter também em nossa Primeira
Príncipa.
DE
QUANTAS ESPÉCIES SÃO OS PRINCIPADOS E DE QUE MODOS SE ADQUIREM
(QUOTSINT GENERA PRINCIPATUUM ET QUIBUS MODIS ACQUIRANTUR)
Todos
os Estados, todos os governos que tiveram e têm autoridade
sobre os homens, foram e são ou repúblicas ou principados. Os principados são:
ou hereditários, quando seu sangue senhorial é nobre há já longo tempo, ou
novos. Os novos podem ser totalmente novos, como foi Milão com Francisco
Sforza, ou o são como membros acrescidos ao Estado hereditário do príncipe que
os adquire, como é o reino de Nápoles em relação ao rei da Espanha. Estes
domínios assim obtidos estão acostumados, ou a viver submetidos a um príncipe,
ou a ser livres, sendo adquiridos com tropas de outrem ou com as próprias, bem
como pela fortuna ou por virtude. (Maquiavel in O Príncipe Capítulo I)
Documentário O Príncipe (Nicolau Maquiavel)
Que algum deus avulso tenha e guarde sua magnificência!