TSE
indefere pedido de registro de candidatura de Lula à Presidência da República
Ministros vedaram a prática de atos de campanha pelo
ex-presidente. Coligação O Povo Feliz de Novo poderá fazer substituição do
candidato em até 10 dias
01.09.201802:15
O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
indeferiu, por maioria de votos (6 a 1), o registro de candidatura do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para disputar as eleições à Presidência
da República em outubro. A decisão seguiu o entendimento do relator do pedido
na Corte, ministro Luís Roberto Barroso, que declarou a inelegibilidade de Lula
com base na Lei da Ficha Limpa.
Também por maioria (5 a 2), o colegiado decidiu
facultar à Coligação O Povo Feliz de Novo (PT/PCdo B/Pros) a
substituição de seu candidato a presidente no prazo de 10 dias. Os ministros
proibiram a Lula a prática de atos de campanha, incluindo a veiculação de
propaganda eleitoral no rádio, na televisão e em outros meios de difusão de
informação, como internet e redes sociais, até que ocorra sua eventual
substituição. Os ministros também determinaram a retirada do nome do
ex-presidente da República da programação da urna eletrônica de votação.
Antes de proferir seu voto, o ministro Luís Roberto
Barroso esclareceu as razões que o levaram a pedir a convocação da sessão
extraordinária dessa sexta-feira (31) e a realizar o julgamento do pedido de
registro. Segundo ele, após a análise das razões da defesa de Lula e dos
argumentos apresentados nas impugnações e notícias de inelegibilidade do caso,
a questão a ser decidida se restringia a matéria de direito, sem a necessidade
de se abrir prazo para alegações finais, uma vez que não houve apresentação de
provas.
O relator ponderou ainda que não havia qualquer
razão para o TSE contribuir para a insegurança jurídica e política do país por
meio da ampliação do prazo para julgamento do pedido de registro de
candidatura. Barroso afirmou que, no caso, não houve atropelo nem tratamento
desigual. Os direitos de Lula, disse ele, foram assegurados, assim como o
direito de a sociedade brasileira ter uma eleição presidencial com os
candidatos devidamente definidos, antes do início do horário eleitoral gratuito
no rádio e na televisão.
Em seu extenso voto, o ministro Barroso fez um
histórico da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010), ressaltando sua
importância para a vida política do país e o fato de sua constitucionalidade
ter sido confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). “Trata-se de uma
norma originada de projeto de lei de iniciativa popular que contou com mais de
1,5 milhão de assinaturas e foi aprovada por votação expressiva pelo Congresso
Nacional. Uma lei que tem lastro expresso no artigo 14, parágrafo 9º, da
Constituição, que impõe a proteção da moralidade como valor para o exercício do
mandato eletivo, levando-se em conta a vida pregressa do candidato”, assinalou.
O pedido de registro de Lula foi questionado no TSE
por impugnações, notícias de inelegibilidade e ações de impugnação de mandato,
num total de 17 processos. As demandas foram apresentadas pelo Ministério
Público Eleitoral (MPE), por candidatos e partidos adversários, entidades e até
eleitores. Todas essas contestações continham, essencialmente, o mesmo
fundamento: Lula é inelegível em razão da incidência do artigo 1º, inciso I,
alínea ‘e’, itens 1 e 6, da Lei Complementar nº 64/90 (com a redação dada pela
Lei Complementar n° 135/2010, a Lei da Ficha Limpa), que dispõe que são
inelegíveis aqueles que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou
proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do
prazo de oito anos após o cumprimento da pena, pelos crimes contra a economia
popular, a fé pública, a administração pública e o patrimônio público (item 1)
e de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores (item 6).
Decisão
da ONU
A alegação central da defesa foi rejeitada pelo
ministro Barroso. Os advogados argumentaram que a medida cautelar emitida pelo
Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações (ONU) no último dia 17
teria provocado a suspensão da inelegibilidade decorrente da condenação de Lula
pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), constituindo
fato superveniente suficiente para afastar qualquer obstáculo à sua
candidatura, nos termos do artigo 26-C da Lei Complementar nº 64/1990,.
Segundo o relator, apesar da importância do órgão
para a garantia dos direitos humanos no plano internacional, suas recomendações
não têm força vinculante, ou seja, a Justiça brasileira não está obrigada a
cumpri-las. O relator, entretanto, considerou necessário examinar os argumentos
apontados pelo órgão administrativo da ONU para recomendar que Lula não fosse
impedido de concorrer às eleições de outubro até que todos os recursos se
esgotassem.
Na representação que fez à ONU, a defesa de Lula
alegou que a condução da ação penal que resultou na sua condenação a 12 anos e
um mês de reclusão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do
apartamento triplex do Guarujá (SP) violou direitos constantes do Pacto
Internacional de Direitos Civis e Políticos. A defesa pediu que a Justiça
Eleitoral cumprisse a determinação do comitê, argumentando que a decisão
vinculava o Judiciário brasileiro, uma vez que o país aderiu à Convenção e à
jurisdição do Sistema ONU, sendo irrelevante a ausência de publicação de
decreto presidencial para se atribuir força vinculante ao tratado
internacional.
Além da ausência de força vinculante, o relator
enumerou um conjunto de fundamentos para rejeitar a aplicação da medida
cautelar expedida pelo Comitê de Direito Humanos da ONU: a orientação foi
proferida no âmbito de uma comunicação protocolada antes do esgotamento dos
recursos internos disponíveis, sem a prévia oitiva do Estado brasileiro, o que
impediu que o comitê tivesse à sua disposição todos os elementos de fato e de
direito para a análise da questão.
Além disso, sustentou o relator, a medida cautelar
foi proferida por apenas dois dos 18 membros do comitê, sem qualquer
fundamentação a respeito do risco iminente de dano irreparável ao direito de
disputar eleição, previsto no artigo 25 do Pacto Internacional sobre Direitos
Civis e Políticos. Por fim, Barroso ressaltou que o julgamento final do
mérito da questão pelo comitê da ONU ocorrerá somente no ano que vem, ou seja,
após as eleições e depois da posse do presidente eleito, quando os fatos já
estarão consumados e serão de “difícil ou traumática reversão”.
Divergência
Ao divergir do relator, o ministro Edson Fachin
afirmou que a falta de decreto executivo dando efetividade ao Pacto
Internacional de Direitos Civis e Políticos não pode comprometer a sua
aplicação em território nacional porque as suas disposições têm efeito
supralegal, ou seja, estão hierarquicamente abaixo da Constituição, mas acima
da legislação ordinária. Segundo o ministro, por esse motivo não se pode
negar eficácia à medida cautelar expedida pelo Comitê de Direitos Humanos da
ONU.
Embora concorde que o ex-presidente Lula deve ser
considerado inelegível por força da Lei da Ficha, o ministro Fachin entende
que, em razão da liminar concedida pelo órgão internacional, o ex-presidente
obteve o direito de suspender a eficácia da decisão que resultou na sua
inelegibilidade, por isso deve-se reconhecer seu direito de se candidatar às
eleições presidenciais enquanto perdurar a medida cautelar deferida. “A
segurança está acima da minha convicção individual e da convicção coletiva. O
Poder Judiciário não reescreve a Constituição nem edita as leis. Cumpre as
regras e as faz cumprir”, afirmou, acrescentando que não se pode produzir uma
regra ad hoc (para a finalidade do caso), por mais “sensível e
limítrofe que ele seja”.
Para Fachin, a decisão do Comitê da ONU e a
prerrogativa prevista no parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição (que dispõe
sobre garantias individuais decorrentes dos tratados internacionais do qual o
Brasil é parte) garantem a Lula o direito, ainda que em caráter provisório, de
se candidatar às eleições deste ano, mesmo estando preso.
Votos
O ministro Jorge Mussi acompanhou integralmente o
voto do relator pelo indeferimento do registro de Lula, ressaltando que a Lei
da Ficha Limpa teve sua constitucionalidade reconhecida pelo STF e se aplica
“de modo pleno e irrestrito” a todos os cidadãos que concorrem a cargos
eletivos. Segundo ele, a condenação do ex-presidente em segunda instância torna
a inelegibilidade do candidato “patente” e “cristalina”, não cabendo à Justiça
Eleitoral analisar o mérito dessa decisão. Alinhado ao relator do processo, ele
acrescentou que o entendimento do Comitê de Direitos Humanos da ONU não possui
efeito vinculante.
O ministro Og Fernandes também aderiu à argumentação
do relator e manifestou o entendimento de que a decisão do Comitê das Nações
Unidas não tem caráter vinculante nem força normativa suficiente para afastar a
aplicação da causa de inelegibilidade prevista na Lei da Ficha Limpa. Na mesma
linha, o ministro Admar Gonzaga sustentou não ser possível subordinar os
comandos constitucionais brasileiros aos requerimentos do comitê da ONU. Para
ele, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos ostenta natureza de
norma intermediária e não pode contrariar o texto da Constituição de 1988,
notadamente na parte em que exige requisitos mínimos de probidade e moralidade
para o exercício do mandato. O ministro, entretanto, entende que o registro de
Lula continua sub judice, a despeito da decisão do TSE de negativa do
registro.
O ministro Tarcisio Vieira de Carvalho de Carvalho
Neto também acompanhou o voto do relator pelo indeferimento do registro de Lula
com base na Lei da Ficha Limpa. Para ele, a medida cautelar expedida pelo
Comitê de Direitos Humanos da ONU não tem o efeito de suspender a
inelegibilidade, ainda mais por prazo incompatível com a efetividade do
processo eleitoral brasileiro em curso, sobretudo no tocante à estabilidade e
segurança jurídica. “Num exemplo dramático, nós poderíamos estar diante de
decisões que suspendessem a própria eleição ou determinassem a soltura do
candidato”, advertiu.
Última a votar, a presidente do TSE, ministra Rosa
Weber também negou o registro de Lula em razão de inelegibilidade prevista na
Lei da Ficha Limpa, mas divergiu parcialmente do relator para assegurar ao
ex-presidente o direito de participar da campanha eleitoral, utilizar o horário
gratuito de rádio e TV e ter seu nome na urna enquanto seu o pedido de registro
estiver sub judice, ou seja, pendente de uma decisão final do Judiciário,
no termos do artigo 16-A da Lei das Eleições (Lei 9.504/1997). A ministra
ressaltou que a norma alcança os candidatos a qualquer cargo. Quanto aos
efeitos da medida cautelar deferida pelo comitê da ONU, Rosa Weber destacou que
se trata de matéria polêmica em razão da discussão de seu alcance, porém
acompanhou o entendimento do relator no sentido de não haver cumprimento
obrigatório de suas decisões, por não ter havido a conclusão de todos os atos
necessários à incorporação da norma internacional ao direito brasileiro.
Preliminar
Antes da manifestação dos demais integrantes do
colegiado, em preliminar, por quatro votos contra três, os ministros negaram o
pedido da defesa de Lula para adiar o julgamento para que as partes que
impugnaram o registro pudessem se manifestar e para que o Ministério Público
Eleitoral oferecesse um parecer final. De acordo com o relator do pedido de
registro, não havia necessidade de se abrir novo prazo para alegações finais,
visto que não houve apresentação de provas.
VP,LC, LR, RR
Sessão
Plenária Extraordinária 31/08/2018
Transmitido ao vivo
Sessão Plenária Extraordinária 31/08/2018
Referências
http://www.tse.jus.br/imagens/fotos/sessao-extraordinaria-do-tse-em-31-08-2018-1535746606283/@@images/afe3a347-18b3-4804-af55-d35bcf818bd2.jpeg
http://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2018/Setembro/tse-indefere-pedido-de-registro-de-candidatura-de-lula-a-presidencia-da-republica
https://www.youtube.com/watch?v=ON1Qlbiqr2g
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