segunda-feira, 15 de agosto de 2016

POLÍTICA ÀS AVESSAS

“Sou o intervalo entre o meu desejo e aquilo que os desejos dos outros fizeram de mim.” FERNANDO PESSOA


“(...) Pensei então em escrever uma estória ao contrário: um menino que nasce de carne e osso e, à medida que estuda na escola, vai virando uma outra coisa... (...)” RUBEM ALVES PINÓCHIO ÀS AVESSAS


EDITORIAL
EDITORIAL ESTADÃO
Já houve um tempo, não tão distante, em que as forças do Congresso Nacional se organizavam em blocos governista e oposicionista com base em considerações programáticas. Isso significa que o toma lá dá cá, a transformação de cada deputado em partido de si mesmo, sem qualquer vínculo com ideias e propostas para o País, não são uma fatalidade. O abastardamento da política, infelizmente visto hoje quase como algo natural, é na verdade resultado da meticulosa engenharia dos artesãoslulopetistas, cuja pretensão de permanecer para sempre no poder jamais foi compatível com o funcionamento normal das instituições democráticas, a começar pelo Congresso. A defenestração do PT, portanto, deveria sinalizar a reversão desse processo de desmoralização da democracia, restabelecendo o princípio das alianças em torno de projetos, e não de verbas, sinecuras ou coisa pior. Mas o atual governo não parece suficientemente disposto a romper a terrível lógica do fisiologismo - e tal hesitação cobra seu preço na forma de incerteza permanente sobre o apoio político a medidas essenciais para a recuperação econômica do País.



14 Agosto 2016 | 05h00
Um exemplo disso foi dado na terça-feira passada, quando a Câmara votou o projeto que renegocia a dívida dos Estados com a União em troca da imposição de um teto para os gastos estaduais, primeiro grande passo do governo do presidente em exercício Michel Temer na direção do urgente ajuste fiscal. Apesar da aprovação, 55 deputados que supostamente integram a base de sustentação de Temer votaram contra o projeto. Com os ausentes e os que se abstiveram de votar, conforme mostrou o jornal O Globo, chegou a 133 o número de deputados governistas que não deram seu apoio - cerca de um terço da bancada de 380 deputados que deveriam ser fiéis ao governo.
A traição ficou particularmente explícita no caso do PSC, partido do líder do governo na Câmara, deputado André Moura (SE). Dos 8 deputados da legenda, nada menos que 5 votaram contra o projeto encaminhado por Temer.
O próprio partido do presidente em exercício não foi um primor de fidelidade. Dos 52 parlamentares do PMDB que compareceram à votação, 5 votaram contra e outros 14 correligionários de Temer nem sequer apareceram para votar. A desculpa é a esfarrapada de sempre: os ausentes estavam envolvidos com as eleições municipais, e os que votaram contra assim o fizeram para não melindrar suas bases em ano eleitoral. Considerando-se que esses políticos não fazem outra coisa senão pensar na eleição seguinte, é o caso de perguntar se em algum momento o governo poderá contar com eles para aprovar medidas relevantes para o País.
Esse cenário incômodo para o governo prova que as alianças costuradas com promessas de vantagens para partidos e políticos não são garantia de apoio. Muito pelo contrário: o governo nada pode fazer caso seja passado para trás, e é essa certeza que torna os oportunistas tão ousados - a ponto de votarem contra o governo mesmo depois que este lhes fez todas as concessões exigidas, como aconteceu na votação do projeto sobre as dívidas estaduais.
Um exemplo escandaloso é o do Solidariedade, partido de Paulinho da Força. Noticiou-se recentemente que Temer vai ressuscitar o Ministério do Desenvolvimento Agrário somente para agradar àquele partido. No entanto, eis que 4 dos 11 deputados do Solidariedade presentes à sessão de terça-feira passada votaram contra o projeto do governo, e outros 3 correligionários de Paulinho nem deram as caras.
Temer e seus experientes operadores no Congresso decerto sabem que os políticos se acomodam às circunstâncias. Se o governo deixar claro que não faz negócios, e sim política, haverá razoável chance de que os parlamentares, uma vez convencidos de que o Executivo deixou de ser franqueado aos parasitas, comecem a pensar no verdadeiro interesse de seus eleitores, ou seja, no interesse público. No entanto, se o governo seguir acreditando que as únicas alianças possíveis são as fisiológicas, não terá direito de se queixar dos tropeços que fatalmente sofrerá.





OPINIÃO
BRASIL
Saqueada por um bando de ladrões e devastada por 13 anos de erros e irresponsabilidades, a maior empresa do Brasil, a Petrobrás, apenas começa a emergir do atoleiro. O lucro trimestral de R$ 370 milhões ficou muito abaixo dos R$ 2 bilhões projetados por analistas financeiros. Mas pelo menos as contas ficaram positivas depois de três períodos no vermelho. A reconstrução ainda vai ser demorada e será impossível, já avisaram os novos administradores, completar os investimentos de US$ 20 bilhões programados para este ano. Com prejuízo de R$ 2,17 bilhões no primeiro semestre, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) também exibe as marcas do governo petista. Em um ano a provisão para risco de crédito passou de R$ 480 milhões para R$ 4,44 bilhões, aumentando 824,4%. Mas os danos à Petrobrás e a outras estatais são apenas marcas especialmente visíveis dos estragos causados por uma rara combinação de incompetência, irresponsabilidade, arrogância e corrupção. Não cabe nessas tabelas a parte mais importante e mais impressionante da história.



Rolf Kuntz,
O Estado de S.Paulo
14 Agosto 2016 | 06h29
Nem tudo é explicitado nos balanços e nas demonstrações de lucros e perdas. Não aparecem, por exemplo, as consequências econômicas – para a empresa e para o País – do enfraquecimento da Petrobrás. Não se explicitam os efeitos do enorme desperdício de recursos nas operações do BNDES ou de outros bancos estatais. Não se passa diretamente dessas contas para a inflação e para a deterioração da economia nacional, mas todos esses fatos são componentes da mesma história.
Parte do balanço dessa longa noitada de farras e desmandos vem sendo realizada pela Operação Lava Jato. Nenhuma investigação igualmente profunda foi iniciada em outras áreas da administração indireta, mas um de seus desdobramentos atingiu a Eletronuclear e já resultou em condenação. Como o aparelhamento, o loteamento e a barganha têm dominado a alocação de altos postos no sistema estatal, ninguém se surpreenderá se novas investigações mostrarem uma rede muito mais ampla de escândalos.
Neste emaranhado de bandalheiras e de irresponsabilidades, nem sempre é fácil distinguir o crime da mera incompetência. Mas os dois conjuntos de ações convergiram na produção do desastre maior. Só de transferências do Tesouro o BNDES recebeu mais de R$ 400 bilhões a partir de 2009. Era dinheiro destinado ao Programa de Sustentação do Investimento (PSI), criado para durar poucos meses, como parte do combate à recessão, mas só extinto no ano passado.
As aplicações do banco, destinadas preferencialmente a grandes grupos e vinculadas à criação de campeões nacionais, consumiram enormes volumes de dinheiro, com resultados abaixo de pífios e, em alguns casos, escandalosos.
A crise da indústria, iniciada no meio do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, comprova há muito tempo o erro das decisões. Pelos dados oficiais, a produção geral da indústria cresceu 0,4% em 2011, diminuiu 2,3% em 2012, aumentou 2,1% em 2013 e depois encolheu sem parar. Houve resultados negativos de 3% em 2014, 8,2% em 2015 e 9,1% no primeiro semestre de 2016.
Não houve apenas um enorme recuo da produção. Houve também, mais grave que isso, uma desastrosa perda de produtividade e de poder de competição. O governo gastou bilhões em subsídios ao crédito, perdeu bilhões em desonerações fiscais e criou programas vinculados a protecionismo comercial. Nada funcionou, porque os setores favorecidos se acomodaram no esquema de favores, enquanto puderam, e deixaram de investir.
A maior prova disso é o recuo tanto da produção quanto da importação de bens de capital (máquinas e equipamentos). A Petrobrás, submetida a uma política de conteúdo nacional na compra de equipamentos e componentes, teve de suportar custos maiores e de perder eficiência também por isso. A crise da fornecedora de sondas Sete Brasil, levada à recuperação judicial, é parte dessa história altamente imprópria para menores.
O desarranjo das contas públicas, a inflação acima dos padrões dos países desenvolvidos e emergentes, a recessão, o desemprego de mais de 11 milhões e a contração do comércio exterior são efeitos desses erros e desmandos. Uma história mais completa incluiria as pedaladas e a maquiagem das contas públicas, a gestão desastrosa do setor elétrico e a contenção de preços da gasolina, mas nem é preciso avançar nesses detalhes.
O superávit comercial só voltou a ocorrer porque as importações caíram mais que as exportações. De janeiro a julho o valor dos bens importados foi 27,6% menor que o de um ano antes, pela média dos dias úteis. A receita das vendas externas foi apenas 5,6% inferior à de janeiro a julho de 2015. Ainda assim, o superávit de US$ 28,23 bilhões só foi possível porque o agronegócio teve um saldo positivo de US$ 45,58 bilhões, suficiente para compensar com sobras o déficit conjunto dos demais setores.
Há sinais de estabilização da economia. Se o governo provisório se converter em efetivo, terá mais força para implantar medidas de arrumação das contas públicas. O crescimento poderá recomeçar, facilitado pela enorme capacidade ociosa da indústria. Mas crescimento para valer – duradouro e pelo menos na faixa de 4% a 5% ao ano – só virá se a economia se tornar muito mais eficiente e competitiva. Isso dependerá de contas fiscais em condições aceitáveis, de inflação menor (com juros também menores) e de muito investimento em capital fixo e em boa educação.
A política educacional só irá para o rumo necessário se o populismo for abandonado e a qualidade, revalorizada. Perdeu-se tempo alargando as portas de ingresso em faculdades, enquanto se desprezava a boa formação fundamental e média.
A exigência de boa formação em linguagem, matemática e ciências foi rotulada como preconceito elitista, como se nos países mais capazes de competir e de gerar bons empregos a educação fosse tratada com populismo e descuido. A recriação de um país próspero vai dar muito mais trabalho que a mera reativação da economia.





POLITICA
Defesa do amigo do ex-presidente Lula apresenta alegações finais no processo da Lava Jato em que é réu por corrupção, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta no emblemático empréstimo de R$ 12 milhões que tomou junto ao Banco Schahin, em 2004, para 'irrigar'o partido






Fausto Macedo, Julia Affonso e Mateus Coutinho
13 Agosto 2016 | 05h39



Jose Carlos Bumlai FOTO GABRIELA BILO / ESTADAO
O pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Lula e preso desde 24 de novembro de 2015 na Operação Passe Livre, desdobramento da Lava Jato, se considera o ‘trouxa perfeito do PT’. Em alegações finais – peça decisiva na ação penal em que Bumlai é réu por corrupção, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta de instituição financeira -, apresentada ao juiz Sérgio Moro nesta sexta-feira, 12, a defesa diz que ele ‘sabe ter cometido um grave equívoco, que redundou na acusação, tem consciência de seus atos e de muitos deles se arrepende’.
Bumlai é protagonista do emblemático empréstimo de R$ 12 milhões que tomou junto ao Banco Schahin, em outubro de 2004. O dinheiro, segundo o próprio pecuarista, foi destinado ao PT, na ocasião em dificuldades de caixa. Segundo a Lava Jato, em troca do empréstimo, o Grupo Schahin foi favorecido por um contrato de US$ 1,6 bilhão sem licitação com a Petrobrás, em 2009, para operar o navio sonda Vitória 10.000. Lula, que não é acusado nesta ação, teria dado a ‘bênção’ ao negócio – o que é negado pela defesa do petista.
“A prova dos autos explica o que de fato aconteceu: o PT precisava de dinheiro para, entre outras providências, quitar dívidas da campanha da prefeitura de Campinas”, alega a defesa. “Por sua vez, o Banco Schahin, representado pelo então presidente Sandro Tordin e seus controladores Salim e MIlton Schahin, tinha dinheiro disponível e muito interesse em se aproximar do Governo Federal e do Partido dos Trabalhadores para se beneficiar de novas ‘oportunidades de negócios’… Nesse contexto, como esclareceu Bumlai, ‘o empréstimo já estava totalmente aprovado’ e ‘só precisava de um trouxa’ ‘pra assinar e ficar responsável por ele’22. E o ‘trouxa’ escolhido foi José Carlos Bumlai que, além de ser conhecido de todos os envolvidos, era adimplente23 e amigo do presidente Lula24. Eis o trouxa perfeito!”
Documento
Ao final do documento de 70 páginas, a defesa pede a Moro que devolva a Bumlai a liberdade.
“Na contramão do que tem sido comum nos processos envolvendo a Força-Tarefa da Lava-Jato, José Carlos Bumlai não é lobista, não é empreiteiro, não é político e tampouco se beneficiou de contratos milionários com o Governo Federal. Tudo o que tinha a esclarecer, foi esclarecido. Bumlai errou e arrepende-se imensamente. Afinal, cometeu falsidades documentais que possibilitaram a irrigação ilícita de recursos ao Partido dos Trabalhadores, sucedida, posteriormente e à sua total revelia, de uma compensação de favores escusa entre esta agremiação partidária e o Grupo Schahin em negociações com a Petrobrás. Mas, a César o que é de César!”
Enfraquecido por um câncer na bexiga e problemas cardíacos, Bumlai, de 71 anos, há alguns meses foi autorizado pelo juiz Moro a fazer tratamento em casa. Mas, nesta quinta-feira, 11, o juiz da Lava Jato mandou o amigo de Lula voltar para a prisão em regime fechado.
Nas alegações finais, os advogados de Bumlai argumentam. “Ainda que a acusação insista em apontar José Carlos Bumlai como grande ‘protagonista’ dos fatos, o que a instrução comprovou é aquilo que ele mesmo disse em seu interrogatório em Juízo: foi apenas o ‘trouxa’, o homme de paille, de que o Partido dos Trabalhadores e o Banco Schahin precisavam para simular o empréstimo de R$12 milhões. Nada mais do que isso!”
“Os erros que cometeu são sim condenáveis, mas, diferentemente do que sustenta o Ministério Público Federal, estão longe de configurar qualquer um dos crimes apontados na denúncia”, insistem os advogados do pecuarista, um grupo de seis criminalistas – Jacinto Miranda Coutinho, Daniella Meggiolaro, Edward Rocha de Carvalho, Conrado de Almeida Prado, Lyzie de Sousa Andrade Perfi e Fernando Bertolino Storto.
“Os meses em que esteve na cadeia somados ao tempo em que permanece enfurnado e doente em casa já foram mais que suficientes para castigá-lo pelas falsidades que praticou para tomar e quitar um empréstimo que jamais lhe beneficiou”, enfatizam os advogados.
“Arrepende-se, pois sua trajetória de vida até meados de 2004 sempre fora escorreita e ilibada. Arrepende-se, pois, sem nenhuma intenção, acabou envolvendo um grande amigo e parceiro de negócios em uma ‘fria’1. Arrepende-se, pois seu filho Maurício, injustamente, também responde a essa ação penal. Arrepende-se, pois não há dificuldade em dizer não e receio de desagradar ao partido político da situação que justifiquem a realização de um empréstimo simulado. A confissão (de Bumlai) foi como um bálsamo em sua vida, pois com ela conseguiu tirar de suas costas um peso que vinha carregando há mais de 10 anos, passando, finalmente, a dormir em paz.”
A defesa alega incompetência de Moro para o caso, aponta ‘a imprestabilidade das provas obtidas por interceptações telefônicas ilegais’, a ‘ilegalidade da interceptação telemática’ e diz que ‘é inepta’ a denúncia do Ministério Público Federal.
“O fetiche em torno de sua figura sempre foi grande, mas a imagem de articulador do Governo Federal e de intermediário de supostos negócios escusos de interesse do então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva finalmente desmilinguiu-se, desmantelou-se”, segue a defesa. “O que restou dessa ação penal foi a constatação de que as bandalheiras envolvendo a Petrobrás, seus dirigentes e funcionários, partidos políticos e agentes públicos passam ao largo de José Carlos Bumlai.”
“A amizade entre Bumlai e o ex-chefe do Executivo existe e não tem como ser negada. Mas dela nada mais se extrai, a não ser uma enorme injustiça, que está na iminência de se desfazer.”
A defesa aponta para um capítulo do caso que envolve o então tesoureiro do PT, João Vaccari Neto – preso na Lava Jato desde abril de 2015. “Como o próprio Bumlai admitiu perante esse Juízo, ele cometeu um ‘grande erro’ ao consentir com as ações arquitetadas pelos representantes das partes interessadas no empréstimo, ou seja, o Banco Schahin e o Partido dos Trabalhadores, concordando em realizar falsamente o mútuo em seu nome. Ao perceber que o empréstimo não seria quitado como prometido, o peticionário, é verdade, procurou o responsável pelas finanças do PT na época para cobrar uma solução, já que a iniciativa de pagar a dívida com a entrega de um bem imóvel havia sido rechaçada pelos credores. Sem entrar no mérito de como isso seria feito, afinal, esse problema não era seu, Bumlai apenas cobrou uma posição do tesoureiro João Vaccari, tendo este lhe dito depois que a quitação viria assim que fossem acertados negócios entre a Petrobrás e o Banco Schahin, cujos interesses eram bem maiores do que receber de volta os 12 milhões emprestados.”
“José Carlos Bumlai é um senhor de 71 anos, primário e de bons antecedentes e acometido por uma série de enfermidades recentemente descobertas”, ponderam os defensores. “Mesmo assim, em nenhum momento criou óbice ao trâmite do processo ou reiterou as condutas a ele atribuídas, cessadas no longínquo ano de 2009. Ademais, conforme comprovado nos autos, não comandou ou liderou a prática de qualquer crime, tampouco se utilizou do nome do ex-presidente Lula para fins ilícitos.”
“Muito embora não tenha assinado nenhum acordo de colaboração premiada, (Bumlai) confessou voluntária e espontaneamente suas condutas, auxiliando efetivamente para o deslinde não só das investigações que redundaram nesta ação penal.”
“Apesar da irresignação da acusação, a prova dos autos revela que Bumlai não praticou os delitos de corrupção passiva, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O único crime que pode ser a ele atribuído é o de falsidade documental, já prescrito, motivo pelo qual sua absolvição é medida de rigor.”
A defesa contesta, ainda, o que classifica de desproporcional constrição patrimonial imposta a Bumlai. “Para garantir futura indenização pelos prejuízos supostamente causados pelos delitos apurados nesta ação penal, Bumlai e seus familiares sofreram constrição patrimonial de 23 veículos e 22 imóveis. Não obstante, há nesta ação penal outros corréus que tiveram atuação bem mais intensa que a de José Carlos Bumlai, que lucraram com o crime, que causaram prejuízo à Petrobrás, mas que, estranhamente, não tiveram nenhum de seus bens bloqueados. Esses acusados – exempli gratia os afagados e protegidos donos do Banco Schahin – inclusive, possuem liquidez o bastante para garantir e reparar o dano de forma bem mais rápida e eficiente que Bumlai.”
Ao pedir a Moro que mande soltar Bumlai, os advogados destacam um ponto que reputam importante. “Ele jamais quebrou as condições estabelecidas para a prisão domiciliar, de modo que não há nenhum indicativo de que sua manutenção nesse regime possa colocar em risco a ordem pública ou a aplicação da Lei Penal e, ao mesmo tempo, permitirá que ele possa cuidar dignamente de sua saúde. Por esse motivo, o defendente dirige um apelo a esse Juízo: pede, na remota hipótese de condenação, a possibilidade de responder o processo em liberdade ou, ao menos, a fixação de uma medida cautelar menos gravosa, como o uso da tornozeleira eletrônica em regime domiciliar.”
Os advogados anotam que o Ministério Público Federal quer a condenação e a manutenção do encarceramento do amigo de Lula, ‘mesmo já tendo passado meses na prisão, mesmo diante de seu debilitado quadro de saúde, mesmo diante de sua postura altamente colaborativa’.
A defesa define Bumlai como ‘um empresário probo, um benfeitor de grandes projetos sociais, que sempre prezou por ajudar ao próximo e que nunca se beneficiou de um único tostão proveniente do empréstimo tomado em seu nome ou da inescrupulosa empreitada envolvendo a maior estatal brasileira’.
“O acusado confia no bom senso desse Juízo, que haverá de julgar improcedente todas as pretensões da acusação”, concluem os advogados de Bumlai. “Assim, aguarda serenamente sua absolvição, seja em razão da atipicidade dos fatos que lhe são imputados, seja em razão da comprovação de que não participou dos crimes que lhe são atribuídos. Mesmo que V. Exa. assim não entenda, a acusação não pode prosperar em razão da ilicitude originária da prova colhida nos autos e das demais nulidades que permeiam o feito.”
O pedido derradeiro. “Se, por absurdo, sobrevier sua condenação, aguarda-se a fixação das penas no mínimo legal, com a aplicação das atenuantes do artigo 65, incisos I e III, alínea d, do Código Penal e das causas de diminuição de pena previstas no artigo 1º, §5º, da Lei n° 9.613/98 e no artigo 29, § 1°, do Código Penal, com o cumprimento em regime inicial aberto ou semi-aberto.”
A Schahin informou que não iria se manifestar e que segue colaborando com a Justiça.






ESTADÃO conteúdo De São Paulo e Curitiba
11/03/201615h14
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Rodolfo Buhrer/ Paraná Portal
José Carlos Bumlai é levado ao complexo médico penal de São José dos Pinhais (PR)
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou, por escrito, nesta quinta-feira (10), que seu amigo José Carlos Bumlai - preso desde dia 24 de novembro na Operação Passe Livre, desdobramento da Lava Jato - é um "homem de bem, honesto e pai de família exemplar, tendo-o na mais alta conta". A declaração de Lula foi juntada pela defesa de Bumlai em documento que pede a desistência do depoimento do petista como sua testemunha de defesa.
O depoimento do petista está marcado para esta segunda-feira (14), por videoconferência, mas poderá ser cancelado se a Justiça aceitar o pedido de desistência. O ex-presidente foi intimado a comparecer à Justiça Federal, em São Paulo.
A declaração de Lula é dividida em cinco itens. Um deles entra no mérito do motivo da prisão do amigo. O pecuarista é acusado de ter tomado empréstimo fraudulento de R$ 12 milhões em outubro de 2004 junto ao Banco Schahin - em troca, o Grupo Schahin foi contratado para operar sondas na Petrobras ao preço de US$ 1,6 bilhão, em 2009, no Governo Lula.
"Jamais tive conhecimento de eventual interesse do Sr. Bumlai em negócios relativos a sondas de prospecção de petróleo, seja através do Grupo Schahin, seja de outros, assim como jamais manifestei a quem quer que fosse que esse assunto pudesse causar-lhe problemas ou pedi ajuda para "protegê-lo" de um mal cuja existência desconheço", afirma o ex-presidente em documento assinado de próprio punho.
Bumlai responde ação penal por corrupção, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta.
No ofício ao juiz federal Sérgio Moro, os advogados do amigo de Lula juntaram um depoimento que o petista prestou à Polícia Federal, em Brasília, em dezembro de 2015.
"José Carlos Costa Marques Bumlai, por seus advogados, nos autos da ação penal em epígrafe, vem à presença de V. Exa. desistir da oitiva de Luiz Inácio Lula da Silva, bem como requerer a juntada do termo de depoimento prestado por ele à Polícia Federal (doc. nº 1) e da declaração prestada por escrito (doc. nº 2), tendo em vista que o teor desses documentos representa o conteúdo de prova que se pretendia produzir com tal testemunho."

Lula na mira: Lava Jato investiga ex-presidente e deflagra protestos68 fotos
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4.mar.2016 - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez discurso inflamado e emocionado para militantes no Sindicato dos Bancários, em São Paulo (SP). Em sua fala, Lula disse que virou o "o melhor presidente que este país já teve" e se defendeu das acusações. O petista é investigado na 24ª fase da Operação Lava JatoVEJA MAIS >Imagem: Nelson Almeida/AFP
Giro UOL






João Fellet - @joaofelletBBC Brasil em Washington
11 agosto 2016





Juiz federal no Estado de Maryland, nos Estados Unidos, o americano Peter Messitte diz que o julgamento do mensalão e a Operação Lava Jato deixaram para trás os tempos em que escândalos de corrupção política terminavam em pizza no Brasil.
"Por muito tempo os brasileiros reclamaram da impunidade, e muitos achavam que era algo com que se devia conviver", ele diz em entrevista à BBC Brasil. "Isso mudou."
Segundo ele, a atuação do juiz Sérgio Moro e dos procuradores e policiais federais da Operação Lava Jato é citada em conferências globais como um exemplo do que pode ser feito contra a corrupção.
Ele afirma, porém, que há questionamentos legítimos sobre o uso de prisões preventivas no processo para conseguir acordos de delação premiada, quando réus confessam os crimes e aceitam colaborar com as investigações em troca de penas menores. Vários réus na Lava Jato foram presos antes de serem condenados e negociaram acordos de delação enquanto estavam na prisão.
Messitte criou laços com o Brasil na década de 1960, quando passou dois anos fazendo trabalho voluntário em São Paulo e aprendeu português. Desde então, visitou o país várias vezes e se tornou um dos maiores especialistas estrangeiros no Judiciário brasileiro.
Ele conheceu o juiz Sérgio Moro em julho, quando ambos participaram de um evento no Wilson Center, em Washington, e almoçaram na American University, onde Messitte dirige o Programa de Estudos Legais e Judiciais Brasil-EUA.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista com o juiz americano:
BBC Brasil - Em 2008, o senhor disse numa palestra sobre corrupção no Brasil que "talvez tenha ficado para trás o tempo em que tudo terminava em pizza". A previsão estava certa?
Peter Messitte - Obviamente as coisas mudaram, e o cenário hoje é bem diferente. A forma como os casos do mensalão e da Lava Jato emergiram representam avanços significativos na luta contra a corrupção política. Vocês estão encontrando malfeitores, e em muitos casos eles têm sido julgados e condenados.
É um caminho irreversível. O público está disposto a sair às ruas. Não é mais provável que as coisas acabem em pizza hoje ou no futuro. É uma mudança drástica.
BBC Brasil - Juízes e advogados nos EUA acompanham a Lava Jato?
Messitte - A maioria dos juízes e advogados entende que houve acusações de corrupção massiva no Brasil, que houve denúncias e confissões. Há muitas conferências e atividades anticorrupção acontecendo pelo mundo, com envolvimento do Banco Mundial e entidades como a Transparência International.
A atuação do juiz Moro, do Ministério Público e da Polícia Federal na Lava Jato sempre aparece como um exemplo do que pode ser feito.



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O juiz Sérgio Moro é o responsável por uma das maiores investigações da história brasileira
BBC Brasil - Como compara o caso do mensalão e a Lava Jato?
Messitte - Eles são um pouco diferentes pela natureza da corrupção. O mensalão eram pagamentos por um partido a políticos no Congresso. Na Lava Jato, há mais atores envolvidos.
Nos dois casos, vemos o começo do uso da delação premiada contra o crime organizado no Brasil. Houve algumas delações no mensalão e muitas na Lava Jato. É um desenvolvimento importante.
E a Lava Jato está sendo muito mais rápida. No mensalão, passaram-se muitos anos até o caso chegar ao Supremo. Na Lava Jato, muitas sentenças já saíram em dois anos.
A principal mudança foi a prisão preventiva. Muitos acusados na Lava Jato foram postos na prisão antes do julgamento. Isso realmente aumentou a pressão sobre eles para que fechassem acordos, cooperassem e depusessem contra outros para sair da prisão mais cedo. Isso não aconteceu tanto no mensalão.
Há críticas a serem feitas, se a prisão preventiva pode ser uma ferramenta para estimular pessoas a fazer delação premiada. Muitos questionam isso do ponto de vista constitucional.
BBC Brasil - Tem havido abuso no uso das prisões preventivas?
Messitte - Se a pessoa pode fugir, contribuir para a continuação das atividades criminosas ou destruir provas, há uma boa razão para prendê-la antes do julgamento. Esse deve ser o critério. Não tenho razões para acreditar que o juiz Moro esteja usando as prisões preventivas por outras razões além dessas.
Houve casos em que ele ordenou a prisão preventiva e o Supremo reverteu a decisão. Ainda terá de ser resolvido até onde a prisão preventiva pode ser usada sem que haja exagero. Esse é um debate legítimo e que eventualmente chegará ao Supremo.
Se as pessoas vão fazer delações premiadas, poderiam fazê-las sem a pressão da prisão. A ideia é que as delações premiadas sejam voluntárias. Se há presunção de inocência, por que alguém pode ser preso antes da determinação final sobre sua culpa?
BBC Brasil - Nos EUA, é comum que réus sejam presos para estimulá-los a fazer uma delação?
Messitte - Não, não seria próprio pôr alguém na prisão com o único propósito de arrancar uma delação premiada. Nenhum juiz concordaria com isso. No sistema federal, onde sirvo, os critérios para a prisão preventiva são risco de fuga ou risco à comunidade.
BBC Brasil - Alguns no Brasil questionam a confiabilidade das delações premiadas, dizendo que réus podem mentir só para sair da prisão.
Messitte - Teoricamente, isso é possível em alguns casos. Mas para aprovar o acordo de delação - que é negociado pelo Ministério Público -, o juiz tem de verificar se ele é legal, regular e voluntário. Se determinar que a pessoa está mentindo ou que há algo irregular na forma como depôs, não deve aprová-lo. E não é suficiente admitir a culpa para entrar num acordo, é preciso colaborar.







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O juiz americano conheceu Sérgio Moro em julho, quando ambos participaram de um evento no Wilson Center
BBC Brasil - Na última década o combate à corrupção no Brasil esteve muito enfocado em iniciativas legais, como a aprovação da Lei da Ficha Limpa. Em que medida a corrupção pode ser combatida por leis, e em que medida é uma questão cultural mais complexa e difícil de ser sanada?
Messitte - Por muito tempo os brasileiros reclamaram da impunidade, e muitos achavam que era algo com que se devia conviver. Isso mudou.
A ideia agora é: "não precisamos aceitar isso, não é a forma como deve ser". O Brasil virou a página. Houve uma mudança cultural, e foram as leis que fizeram isso, leis que definiram o que é a corrupção política.
As delações premiadas começaram no Brasil nos anos 1990 com os crimes hediondos. De repente, passaram a ser usadas contra o crime organizado, porque leis ampliaram a possibilidade de que fossem aplicadas nesses casos.
BBC Brasil - O juiz Sérgio Moro é uma figura controversa no Brasil, tratado como herói por uns e acusado por outros de abusar de seus poderes e agir politicamente. Que impressão teve dele ao encontrá-lo?
Messitte - Achei que ele é um cara muito direto e decente. Não detectei nele qualquer inclinação política. Há leis no Brasil contra corrupção, lavagem de dinheiro e extorsão. Alguém tem de aplicá-las. Não esqueçamos o papel do Ministério Público e da Polícia Federal: eles podem não ter a mesma publicidade que o juiz Moro, mas merecem o mesmo crédito.
Às vezes, quando você aplica a lei e isso fere alguém, essa pessoa se diz vítima, afirma que sua decisão é política. Algumas pessoas te amam pelo que faz, e outros te odeiam.
Eu aprecio as posições dele. Imagine se, diante de depoimentos de informantes internos de que havia corrupção massiva [na Petrobras], um juiz dissesse que ninguém é culpado e não aceitasse nenhum acordo de delação?
Haverá erros no processo? Não tenho dúvida. Espero que eles sejam corrigidos na apelação. Mas menos de 5% das decisões de Moro foram revertidas até agora.
BBC Brasil - Não é arriscado e indesejável que um juiz se torne uma figura tão pública e atraia tanta atenção?
Messitte - É inevitável. Às vezes, acontece o inverso. Veja o que ocorreu com Giovanni Falcone e Paolo Borsellino na Itália. Estavam indo atrás do que consideravam a verdade e terminaram na situação mais infeliz [os dois juízes foram mortos após julgarem grandes casos contra a máfia italiana].
Deve-se dar crédito a Moro pela coragem. Esse cara inspirou um grande número de brasileiros, [mostrando] que há possibilidade de Justiça, de tratamento igualitário perante a lei. Qual a última vez que isso aconteceu no Brasil? Você não vê figuras assim com frequência.




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