quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Desvendando Moro desvelando-se

Folha de S. Paulo


Quar 12/10/2016


painel do leitor




LAVA JATO

Lamentável que um respeitado jornal como a Folha conceda espaço para a publicação de artigo como o "Desvendando Moro", e mais ainda surpreendente que o autor do artigo seja membro do Conselho Editorial da publicação. Sem qualquer base empírica, o autor desfila estereótipos e rancor contra os trabalhos judiciais na assim denominada Operação Lava Jato, realizando equiparações inapropriadas com fanático religioso e chegando a sugerir atos de violência contra o ora magistrado. A essa altura, salvo por cegueira ideológica, parece claro que o objeto dos processos em curso consiste em crimes de corrupção e não de opinião. Embora críticas a qualquer autoridade pública sejam bem-vindas e ainda que seja importante manter um ambiente pluralista, a publicação de opiniões panfletárias-partidárias e que veiculam somente preconceito e rancor, sem qualquer base factual, deveriam ser evitadas, ainda mais por jornais com a tradição e a história da Folha.

SERGIO FERNANDO MORO, juiz federal (Curitiba, PR)






ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE
11/10/2016 


O húngaro George Pólya, um matemático sensato, o que é uma raridade, nossugere ataques alternativos quando um problema parece ser insolúvel.

Um deles consiste em buscar exemplos semelhantes paralelos de problemas járesolvidos e usar suas soluções como primeira aproximação. Pois bem, ahistória tem muitos exemplos de justiceiros messiânicos como o juiz SergioMoro e seus sequazes da Promotoria Pública.

Dentre os exemplos se destaca o dominicano Girolamo Savonarola,representante tardio do puritanismo medieval. É notável o fato de queSavonarola e Leonardo da Vinci tenham nascido no mesmo ano. Morria aIdade Média estrebuchando e nascia fulgurante o Renascimento.
Educado por seu avô, empedernido moralista, o jovem Savonarola agiganta-secontra a corrupção da aristocracia e da igreja. Para ele ter existido eraabsolutamente necessário o campo fértil da corrupção que permeou o iníciodo Renascimento.

Imaginem só como Moro seria terrivelmente infeliz se não existisse corrupçãopara ser combatida. Todavia existe uma diferença essencial, apesar dasmuitas conformidades, entre o fanático dominicano e o juiz do Paraná -não háindícios de parcialidade nos registros históricos da exuberante vida deSavonarola, como aliás aponta o jovem Maquiavel, o mais fecundo pensadordo Renascimento italiano.

É preciso, portanto, adicionar um outro componente à constituição dapersonalidade de Moro -o sentimento aristocrático, isto é, a sensação,inconsciente por vezes, de que se é superior ao resto da humanidade e de quelhe é destinado um lugar de dominância sobre os demais, o que poderíamoschamar de "síndrome do escolhido".

Essa convicção tem como consequência inexorável o postulado de que oplebeu que chega a status sociais elevados é um usurpador. Lula é umusurpador e, portanto, precisa ser caçado. O PT no poder está usurpando olegítimo poder da aristocracia, ou melhor, do PSDB.

A corrupção é quase que apenas um pretexto. Moro não percebe, em seuesquema fanático, que a sua justiça não é muito mais que intolerânciamoralista. E que por isso mesmo não tem como sobreviver, pois seusapoiadores do DEM e do PSDB não o tolerarão após a neutralização daameaça que representa o PT.

Savonarola, após ter abalado o poder dos Médici em Florença, é atraídoardilosamente a Roma pelo papa Alexandre 6º, o Borgia, corrupto e libertino,que se beneficiara com o enfraquecimento da ameaçadora Florença.

Em Roma, Savonarola foi queimado. Cuidado Moro, o destino dos moralistasfanáticos é a fogueira. Só vai vosmecê sobreviver enquanto Lula e o PTestiverem vivos e atuantes.


Ou seja, enquanto você e seus promotores forem úteis para a elite políticabrasileira, seja ela legitimamente aristocrática ou não.

ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE *, físico, é professor emérito da Unicamp e membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia e do Conselho Editorial da Folha*








Rogério Cezar de Cerqueira Leite

Graduado em Engenharia Eletrônica e Computação, pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e doutorado em Física de Sólidos pela Universidade de Paris (Sorbonne). Trabalhou como pesquisador nos Laboratórios da Bell/EUA (1962-1970). Lecionou no I.T.A., na UNICAMP e na Universidade de Paris (Professeur d´echange). Foi agraciado com a Comenda da Ordem Nacional do Mérito da França e com a Cátedra da Universidade de Montreal, Canadá. Foi diretor dos Institutos de Física e Artes e Coordenador Geral das Faculdades da UNICAMP. É Professor Emérito dessa mesma Universidade, da qual foi Professor Titular de 1970 a 1987. É Pesquisador Emérito do CNPq. Recipiente da Ordem Nacional do Mérito Científico na Classe de Grã-Cruz. Publicou 80 trabalhos em revistas especializadas, foi editor da Solid State Communications, editada em Oxford (Inglaterra), de 1974 a 1988, e “referee” de cerca de 20 revistas internacionais. Obteve cerca de 3.000 citações em revistas científicas de impacto. Foi Presidente e criador da CODETEC, da CIATEC, e de outras empresas que atuam em setores intensivos em tecnologia. Foi Vice-Presidente Executivo da Companhia Paulista de Força e Luz (1982 a 1986). É membro do Conselho Editorial da Folha de São Paulo desde 1978 e escreveu além de textos técnicos, vários livros sobre assuntos polêmicos tais como a atuação das multinacionais, o programa nuclear, o nacionalismo, o ensino superior, a transferência de tecnologia. Publicou também livros sobre Física dos Sólidos, sobre Música, sobre riquezas naturais (Quartzo, Nióbio, Álcool, etc.) e, mais recentemente, sobre Energia. É membro da Comissão de Energia da União Internacional de Física Pura e Aplicada e Presidente de Honra do Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais que inclui o Laboratório Nacional de Luz Sincrotron, de Biotecnologia, de Nanotecnologia e do Bio-Etanol.


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