Inspirados já nos ensinamentos de Sófocles, aqui, procurar-se-á a conexão, pelo conhecimento, entre o velho e o novo, com seus conflitos. As pistas perseguidas, de modos específicos, continuarão a ser aquelas pavimentadas pelo grego do período clássico (séculos VI e V a.C).
domingo, 29 de outubro de 2023
ALIENISTAS DO CAOS
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HISTÓRIA DA LOUCURA NA OBRA “O ALIENISTA” DE MACHADO DE ASSIS: discurso, identidades e exclusão no século XIX
Autores
Márcio José Silva Lima
UFPB
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Sivuca e Glorinha Gadelha - JOÃO E MARIA - Sivuca e Chico Buarque
luciano hortencio
Sivuca e Glorinha Gadelha, interpretando JOÃO e MARIA, de Sivuca e Chico Buarque de Hollanda.
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Agora eu era o herói
E o meu cavalo só falava inglês
A noiva do cowboy era você além das outras três
Eu enfrentava os batalhões, os alemães e seus canhões
Guardava o meu bodoque e ensaiava o rock para as matinês
Agora eu era o rei
Era o bedel e era também juiz
E pela minha lei a gente era obrigada a ser feliz
E você era a princesa que eu fiz coroar
E era tão linda de se admirar
Que andava nua pelo meu país
Não, não fuja não
Finja que agora eu era o seu brinquedo
Eu era o seu pião, o seu bicho preferido
Vem, me dê a mão, a gente agora já não tinha medo
No tempo da maldade acho que a gente nem tinha nascido
Agora era fatal que o faz-de-conta terminasse assim
Pra lá deste quintal era uma noite que não tem mais fim
Pois você sumiu no mundo sem me avisar
E agora eu era um louco a perguntar
O que que a vida vai fazer de mim?
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Nas entrelinhas: Entre a sede de vingança e os horrores da guerra
Publicado em 29/10/2023 - 07:10 Luiz Carlos Azedo
Cinema, Cultura, EUA, Guerra, Israel, Memória, Palestina, Partidos, Política, Política, Segurança, Terrorismo, Violência
A retaliação de Israel ao Hamas ganha contornos de limpeza étnica, com a expulsão dos palestinos da Faixa de Gaza, que só não ocorreu ainda porque as fronteiras estão fechadas
Circula nas redes sociais a foto de dois meninos de mãos dadas, um com a camisa azul de Israel e seu quipá, e outro com a bandeira palestina e seu lenço quadriculado. É uma mensagem utópica: a convivência fraterna entre palestinos e israelenses. O presente na Palestina é absurdamente distópico. Na guerra da Faixa de Gaza, ambos os lados têm lugar de fala, com um rosário de argumentos para ir à guerra. Entretanto, nada justifica o ataque terrorista do Hamas ao território de Israel, nem legitima o massacre de civis palestinos, principalmente crianças, mulheres e idosos pelo Exército israelense. É uma espécie de Lei de Talião ao quadrado: olho por olhos, dente por dentes.
Havia um “tit for tat” na relação de Israel com seus inimigos na região. A expressão vem do holandês dit vor dat, “este por esse”, que corresponde à expressão latina quid pro quo — “uma coisa pela outra”. Consistia numa política que alternava retaliação ao Hamas, sempre que havia uma agressão, e cooperação tácita, após o cessar-fogo. Essa estratégia enfraquecia a Autoridade Palestina, inviabilizava a criação de um Estado palestino independente e possibilitava a colonização nos territórios ocupados por Israel na Cisjordânia. Entretanto, saiu do controle. O Hamas se fortaleceu e promoveu um violento ataque terrorista, que pegou de surpresa o governo de Benjamin Netanyahu.
Não há dúvida de que Israel será vitorioso contra o Hamas, graças ao seu poderio bélico, que inclui armamento nuclear, e o apoio militar e diplomático dos Estados Unidos, que inibe ação dos demais inimigos de Israel, principalmente o Irã. O pronunciamento de Netanyahu, ontem, mostra a disposição de levar a guerra às últimas consequências, ou seja, reduzir a Faixa de Gaza a escombros. A ofensiva em Gaza é tratada pelo governo de Israel como uma segunda guerra da independência.
É uma remissão à Guerra do Yom Kippur, em 1973, quando a Síria e o Egito invadiram Israel, cujo bastidor é retratado no filme Golda — A mulher de uma Nação, com a atriz Helen Mirren. O diretor Guy Nattiv conduz a narrativa para mostrar um modo de fazer política no qual o objetivo de salvar o país e resgatar seus soldados presos, porém, nunca esteve descolado da ambição de conquistar o reconhecimento diplomático e um acordo de fronteira com o principal agressor, o Egito.
Golda Meyerson, Mabovitch quando solteira, nasceu em Kiev, na Ucrânia, em 3 de maio de 1898. Ainda criança, emigrou com os pais para os Estados Unidos (1906) e, em 1921, estabeleceu-se na Palestina. Ali, começou a trabalhar para a criação do Estado de Israel, aliando-se ao movimento sindical Histadrut e ao Partido Trabalhista (Mapai). Foi embaixadora na União Soviética, ministra do Trabalho, chanceler e secretária-geral do Mapai. Tornou-se primeira-ministra em 1969, após a morte de Levi Eschkols. De centro esquerda, o Mapai é sionista e social democrata.
Naufrágios
Benjamin “Bibi” Netanyahu ocupa o cargo de primeiro-ministro de Israel pela terceira vez. Chefe do partido Likud, já havia liderado o país de 1996 a 1999 e de 2009 a 2021. Natural de Tel Aviv, é o primeiro-chefe de Estado que nasceu em Israel, em 21 de outubro de 1949. O Likud congrega a centro-direita e a direita conservadora. Foi criado em 1973, como uma coalizão liderada pelo partido Herut, que representa os sionistas revisionistas. Acusado de corrupção, Netanyahu enfrenta forte oposição popular, por causa de sua proposta de reforma do Judiciário, cujo objetivo é transformar a democracia de Israel num regime iliberal.
A retaliação de Israel ao Hamas ganha contornos de limpeza étnica, com a expulsão dos palestinos da Faixa de Gaza, que só não ocorreu ainda porque as fronteiras com o Egito estão fechadas. Em tese, só haverá paz quando a sede de vingança for ultrapassada pela consciência dos horrores da guerra. E as crianças que aparecem na foto, qual o destino delas? Sem um acordo de paz que possibilite a erradicação do terrorismo e a criação do Estado palestino, serão inimigas pelo resto das suas vidas?
Em setembro de 2015, a imagem de outra criança viralizou nas redes sociais: o corpo de Alan Kurdi, de 3 anos, amanheceu numa praia da costa da Turquia. A foto de Nilüfer Demi chocou a opinião pública mundial e desnudou a tragédia humanitária que ocorre no Mediterrâneo, com milhões de refugiados. Abdullah Kurdi, com a mulher e dois filhos, naufragou num bote de borracha no qual embarcara em Bodrum, na Turquia, para chegar a Cós, ilha grega no Mar Egeu. O objetivo da família era migrar para o Canadá e começar uma nova vida, com ajuda de Teema, tia do menino, que lá trabalhava como cabeleireira em Vancouver. Somente Abdullah sobreviveu. Poderiam ter feito esse trajeto de avião, mas não tinham passaportes. Como os curdos da Turquia, os palestinos da Faixa de Gaza serão tratados como párias.
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Lourival Sant’Anna - A impotência dos EUA
O Estado de S. Paulo
Biden pediu que Israel levasse em conta a lei internacional, mas foi ignorado
O ataque do Hamas e a resposta de Israel reforçam a projeção de poder da China. A crise expõe as contradições e a fragilidade da Rússia. E impõe grandes riscos políticos ao presidente dos EUA, Joe Biden, não só na competição com a China, mas sobretudo com seus rivais republicanos.
Ao assumir, em 2021, Biden suspendeu a venda de armas para Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos (EAU), selada por Donald Trump. E retomou negociações para o acordo nuclear – rompido por Trump – com o Irã, adversário regional da Arábia Saudita. O reino saudita se aproximou da China, que passou a lhe fornecer armas.
Biden visitou o príncipe herdeiro e homem forte saudita, Mohamed bin Salman (MBS), que lidera a Opep, para pedir aumento na produção de petróleo e reduzir o preço do barril, com a escassez gerada pelas sanções contra a Rússia. MBS ignorou o pedido e manteve a aliança da Opep com o governo russo.
A China promoveu uma aproximação entre Arábia Saudita e Irã. Biden contrapôs esse movimento com os Acordos de Abraão, pelos quais EAU, Bahrein, Marrocos e Sudão normalizaram relações com Israel. A joia da coroa era o reino saudita, o país mais rico do mundo árabe e berço do Islã.
Em contrapartida, Israel adotaria medidas para melhorar a vida dos palestinos.
Esse processo estava amadurecendo, com visitas de ministros israelenses a Riad, quando o Hamas cometeu as atrocidades do dia 7 em Israel. O Irã patrocina o Hamas. Os sauditas, assim como outros países muçulmanos, responsabilizaram Israel pelos ataques do Hamas.
DIPLOMACIA. Em contraste, a aproximação Teerã-Riad se intensificou. O presidente iraniano, Ebrahim Raisi, um ultranacionalista, telefonou para MBS para discutir a crise em Gaza. A estratégia chinesa prevaleceu.
No Conselho de Segurança da ONU, a Rússia apresentou duas resoluções – rejeitadas por falta de votos favoráveis – que não mencionavam o Hamas e não contemplavam o direito de autodefesa de Israel. O mesmo princípio se aplicaria à ajuda que a Ucrânia tem recebido para enfrentar a agressão russa. A Rússia depende dos drones e foguetes do Irã, patrocinador do Hamas, para levar adiante a guerra contra a Ucrânia.
O vice-chanceler russo e enviado do Kremlin para o Oriente Médio, Mikhail Bogdanov, recebeu em Moscou o chefe de relações internacionais do Hamas, Mousa Abu Marzouk, e o
vice-ministro do Exterior do Irã, Ali Bagheri Khan. A Rússia apoia a ditadura na Síria, por onde o Irã envia ajuda para o Hamas. Os suprimentos passam também pelo Iraque, que ficou sob a influência iraniana depois que os EUA derrubaram Saddam Hussein, em 2003.
Rússia e China vetaram resolução americana que condenava o Hamas e pedia pausas humanitárias. O veto russo teria sido suficiente. Mas os chineses quiseram deixar clara sua aliança estratégica com o Irã e seu interesse na crise. A China compra petróleo barato de Irã e Rússia, aproveitando-se das sanções impostas a ambos.
A crise coloca os EUA na difícil posição de defender Israel enquanto o país viola o direito internacional, que proíbe punições coletivas contra civis. Milhares de civis, incluindo crianças, mulheres e idosos, têm sido mortos nessas três semanas de bombardeios israelenses. Dois milhões sofrem de fome e sede por causa do bloqueio e dos bombardeios.
Como organização criminosa, o Hamas não tem lugar na comunidade internacional. Já Israel e Irã são membros da ONU. Isso não implica só direitos, mas também deveres.
CHANCE. A crise é uma oportunidade para a China tentar demonstrar que as democracias não são superiores moralmente às autocracias. Israel é uma democracia que ocupa militarmente a Cisjordânia e Jerusalém Oriental, enquanto os 22 países árabes são ditaduras, com exceção de Líbano e Líbia, Estados falidos.
A situação cria ainda um estresse na credibilidade das alianças dos EUA com Israel e a Ucrânia. Biden tem enfrentado dificuldades em aprovar novos orçamentos numa Câmara dos Deputados dominada por republicanos que ficou três semanas sem presidente por causa de uma rebelião na bancada majoritária.
Biden está acuado. Trump e os republicanos acusam o presidente de haver “abandonado Israel”, um tema sensível nos EUA. A acusação não procede. Em 2016, no governo de Barack Obama, com Biden como vice, foi aprovada ajuda militar para Israel de US$ 38 bilhões no decênio 2019-2028 – portanto, acima da média histórica de US$ 3 bilhões por ano.
Além disso, Biden pediu ao Congresso mais US$ 14 bilhões em ajuda militar para Israel, enviou reposições de interceptadores de foguetes do sistema Domo de Ferro e outras munições. E despachou dois portaaviões, incluindo o maior do mundo, USS Gerald Ford, com seus grupos de batalha naval.
Biden fez ainda uma rara viagem de um presidente americano a uma área sob ataque de foguetes para expressar apoio a Israel. Em troca, pediu que Israel levasse em conta em sua represália a lei internacional. Foi ignorado. O país mais poderoso do mundo está impotente.
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CABEÇA DE BAGRE II (AO VIVO + LETRA)
Arquivo Mamonas Assassinas
9,84 mil inscritos
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"Loucura, insensatez, estado inevitável"
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Lisandra Paraguassu (Agência Reuters): Boa tarde, presidente. Presidente, o senhor se envolveu na questão da Ucrânia e, agora, na questão do Hamas e de Israel. Parte da sociedade diz que o governo não estava condenando o Hamas o suficiente. Então, estava com uma posição parcial. Eu queria que o senhor desse qual é a sua posição com relação a isso e saber também o que que você acha que o Brasil pode fazer, pode influenciar, para tentar que se chegue a uma trégua naquele local. E se tem notícias dos brasileiros que ainda estão em Gaza e como é que avançou essa negociação para a retirada deles de lá.
Lula: Olha, eu acho que a posição do Brasil é a mais clara e nítida possível. O Brasil fez até uma nota para que nenhum companheiro ou companheira da imprensa brasileira tivesse dúvida sobre o comportamento do Brasil. Primeiro, o Brasil só reconhece como organização terrorista aquilo que o Conselho de Segurança da ONU reconhece. E o Hamas não é reconhecido pelo Conselho de Segurança da ONU como organização terrorista, porque ele disputou eleições na Faixa de Gaza e ganhou. O que que nós dissemos? É que o ato do Hamas foi terrorista. Nós dizemos isso em alto e bom som: que o ato do Hamas foi terrorista. Que não é possível fazer o ataque, matar inocentes, sequestrar gente, da forma que eles fizeram. Não é possível. Sem medir as consequências do que acontece depois. Porque agora o que nós temos é a insanidade também do primeiro-ministro de Israel, querendo acabar com a Faixa de Gaza, se esquecendo que lá não tem só soldado do Hamas, que lá tem mulheres, tem crianças. Que são as grandes vítimas dessa guerra.
Eu vi uma manchete aqui no jornal dizendo que a proposta do Brasil é rejeitada. Não é verdade, é mentira. Não foi rejeitada, tinha 15 votos em jogo. Ela teve 12, duas abstenções e um contra. Como é que ela pode ter sido rejeitada? Ela foi vetada por causa de uma loucura que é o direito de veto concedido aos cinco países titulares do Conselho de Segurança da ONU, que eu sou totalmente, radicalmente, contra. Isso não é democrático, não sei se vocês viram, essa semana, os Estados Unidos veta a Rússia, a Rússia veta os Estados Unidos, Estados Unidos veta a Rússia, a Rússia veta os Estados Unidos. E veja que nós tivemos dois votos de países que tinham direito de veto: da China e da França. Tivemos duas abstenções de pessoas que tinham direito de veto: Rússia e Inglaterra. E os americanos assumiram a responsabilidade pelo que fizeram. Paciência. Mas a posição nossa é clara. É muito clara: Todas as guerras não têm apenas um lado culpado ou mais culpado. Todo mundo sabe: o Brasil fez uma crítica veemente, igualzinho está na carta da ONU. Nós condenamos a Rússia de ter invadido o território ucraniano. Ponto pacífico, está explícito no comportamento do Brasil. Mas isso não significa que eu sou obrigado a me colocar do lado da Ucrânia para guerrear.
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Fernando Mitre: "Assisti ao renascimento da democracia", sobre lançamento do livro "Debate na Veia"
Rádio BandNews FM
https://www.youtube.com/watch?v=hXwvwpUN2Nk
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EMBARGOS CULTURAIS
Dr. Simão Bacamarte e a tese de que todos são loucos, menos nós mesmos
4 de março de 2018, 8h05
Por Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy
O Alienista é um conto de Machado de Assis que foi publicado em Papéis Avulsos, em 1882[1]. Um pouco extenso para conto, algo curto para novela, O Alienista foge de padrões mais comuns. A estrutura narrativa se desdobra em circunstâncias inesperadas, cativando o leitor, que é guiado para um mundo imaginário, surpreendentemente plausível, real; no entanto, absurdamente quimérico, fantasioso, inexistente. Trata-se da estória do Dr. Simão Bacamarte e do estudo da loucura que ele empreendeu em algum lugar fictício e bem machadiano: Itaguaí.
O Dr. Simão Bacamarte é o personagem principal dessa sátira. Cientista aclamado em Portugal, aplaudido nas maiores universidades do século XVIII, correspondente dos grandes sábios, protegido do rei e de toda a Corte portuguesa, Bacamarte simboliza o sábio que só presta contas para a ciência, da qual se diz devoto e fiel seguidor. Era na verdade um tirano. Dona Evarista de Moraes era sua esposa; viúva, teve um primeiro casamento, orçava 25 anos, não era bonita nem simpática. Bacamarte apostou nas qualidades fisiológicas e anatômicas da esposa, que, no entanto, não lhe deu a descendência que esperava. Na sátira há também um certo Porfírio, apelidado de Canjica, o barbeiro, que liderou uma rebelião contra o alienista. Crispim é o boticário, o farmacêutico que manipulava receitas, prescrevia unguentos, vendia remédios e prestava assistência médica em emergências.
Os recursos que seriam destinados ao sanatório exigiram muita imaginação para obtenção. Em Itaguaí tudo já era tributado. Criaram um novo tributo. Os cavalos destinados a levar as carruagens com os mortos nos enterros seriam enfeitados com dois penachos. Justificava-se que dois tostões seriam devidos à prefeitura, pelos penachos, repetindo-se tantas vezes essa quantia quantas fossem as horas decorridas entre a da morte e a da última bênção na sepultura. Não é preciso muita imaginação para intuirmos que os enterros passaram a ser rapidíssimos. Hoje chamaríamos de planejamento tributário ou de elisão fiscal...
O Dr. Simão Bacamarte deu início à obra e no frontispício da Casa de Saúde fez gravar frase atribuída ao Profeta Maomé, que teria respeitado os loucos, dado que deles, por poder divino, fora retirado o juízo, exatamente para que não pecassem. Porém, Bacamarte atribuiu a citação do profeta ao Papa Benedito VIII, na expectativa de não desagradar às autoridades da Igreja Católica. Ganhou apoio incondicional dos clérigos. Chamou-se o sanatório de Casa Verde em virtude das cores das janelas.
O Dr. Simão Bacamarte lotou o hospital, a loucura era generalizada, estava em todos os lugares. Alguns inicialmente duvidaram da própria sanidade do médico e houve quem sugerisse que Dona Evarista recomendasse que Bacamarte fizesse um passeio ao Rio de Janeiro, para tomar novos ares. Bacamarte sustentou a necessidade da construção do prédio e o fez com tal veemência que a Câmara de pronto deferiu-lhe o pedido. Bacamarte ampliou o território da loucura e continuou prendendo todas as pessoas de cuja sanidade duvidasse.
Segundo o Dr. Simão Bacamarte, havia também loucos por amor, três ou quatro. Havia escrivão que se dizia mordomo do rei; outro se fazia de boiadeiro de Minas Gerais, e que passava o tempo distribuindo boiadas imaginárias. Entre os maníacos teológicos, havia um tal de João de Deus, que o narrador nos fala que se fazia passar por Deus João... Bacamarte conviveu também com sintomas de melancolia da própria esposa, que, embora não se queixasse, mostrava-se cada dia mais triste, pouco comendo, emagrecendo com rapidez.
A cidade deu os primeiros sinais de insatisfação. Instalou-se um regime de terror. Multiplicaram-se as internações. Recolheu-se à Casa Verde um dos cidadãos mais queridos de Itaguaí, Costa. A patologia: distribuía e emprestava sem cobrar juros toda uma herança que recebera. Ficou pobre, e ainda assim não ralhava com seus devedores. Recolheu-se logo mais o Matias, que pela manhã tinha o costume de admirar, do jardim, uma casa maravilhosa que construíra na cidade. Os que não estavam no hospício começaram a inventar uma série de teorias para justificar a sanha de Bacamarte. Um médico sem clínica afirmara que a Casa Verde era um cárcere privado. Outros achavam que o alienista era vingativo e que só pensava em dinheiro. Houve quem acreditasse que era um castigo de Deus.
Dona Evarista, elevada à condição de musa da ciência, passou a ser a esperança da cidade. Reconduziria o marido ao bom juízo. Em um banquete em sua homenagem, um moço improvisou um discurso oco, elogiando a esposa do doutor. Bacamarte suspeitou que o orador inflamado sofria de um caso de lesão cerebral, que se propunha a estudar. O rapaz foi recolhido na Casa Verde. Alguns acharam que o ciúme motivara o alienista. Pensou-se em se requerer a captura e deportação do próprio Bacamarte.
Estourou uma rebelião, a Revolta dos Canjicas, liderada pelo barbeiro Porfírio. Cerca de 30 pessoas representaram à Câmara em desfavor do alienista. O legislativo recusou processar o pedido, invocando que não se poderia menosprezar a ciência por interferência administrativa e muito menos por movimentos de rua. Bacamarte não se intimidou. Recebeu Porfírio. Para assombro do alienista, ensaiou-se aproximação, insinuou-se acordo. E Bacamarte desconfiou que o Canjica precisaria ser estudado. A Força Pública acabou com os motins de rua. Destituiu-se o Canjica. Bacamarte recebeu mais apoio. Libertou todos os que até então estavam enclausurados. Para surpresa geral, Bacamarte reviu suas teses. O alienista fechou-se na Casa Verde. Passou a estudar a si mesmo. Lá teria morrido 17 meses depois.
O Alienista alcança temas de psicopatologia forense (dado que a loucura é o eixo da narrativa), de tributação (a criação do asilo de loucos exigiria recursos), da relação entre política e Direito (a casa dos alienados decorria da autoridade e do prestígio de seu diretor, o Dr. Simão Bacamarte). O Alienista é um conto que duvida da ciência, do positivismo, das verdades epistemológicas, dos paradigmas canonizados. É uma crítica atemporal contra todos os saberes dominantes, que se deslocam no tempo e no espaço. É uma crítica à fragilidade das instâncias da vida, da fragilidade dos próprios direitos e mesmo da nossa insignificância, quando submetidos a um poder incontrolável. Trata da própria condição humana: todos são loucos, menos nós mesmos, o que não deixa de ser uma forma de loucura.
[1] MACHADO DE ASSIS, Joaquim Maria. O Alienista. São Paulo: FTD, 1994. Edição Escolar. Livro do Professor. Introdução de Aguinaldo José Gonçalves.
Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy é livre-docente em Teoria Geral do Estado pela USP e doutor e mestre em Filosofia do Direito e do Estado pela PUC-SP. Tem MBA pela FGV-ESAF e pós-doutorados pela Universidade de Boston (Direito Comparado), pela UnB (Teoria Literária) e pela PUC-RS (Direito Constitucional). Professor e pesquisador visitante na Universidade da Califórnia (Berkeley) e no Instituto Max-Planck de História do Direito Europeu (Frankfurt).
Revista Consultor Jurídico, 4 de março de 2018, 8h05
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Hänsel und Gretel
Kinderlieder
Hänsel und Gretel verirrten sich im Wald.
Es war schon finster und auch so bitter kalt.
Sie kamen an ein Häuschen von Pfefferkuchen fein:
Wer mag der Herr wohl von diesem Häuschen sein?
Hu, hu, da schaut' eine alte Hexe raus,
sie lockt die Kinder ins Pfefferkuchenhaus.
Sie stellte sich gar freundlich, oh Hänsel, welche Not!
Ihn wollt' sie braten im Ofen braun wie Brot!
Doch als die Hexe zum Ofen schaut hinein,
ward sie gestoßen von unserm Gretelein.
Die Hexe muß jetzt braten. Die Kinder gehn nach Haus.
Nun ist das Märchen von Hans und Gretel aus.
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joao e maria hansel und gretel irmaos grimm contos de fadas 12
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João e Maria | Conto de Fadas Original dos Irmãos Grimm - Completo
Autores Selecionados ⋅ 1 jun. 2023
Um clássico sobre canibalismo para toda a família.
Versão completa do original Hänsel und Gretel
(João e Maria) traduzida, dos irmãos Grimm.
Em frente a uma grande floresta morava um pobre lenhador com a mulher e dois filhinhos: João e Maria. Tinham pouco com que se alimentar e na cidade tudo estava caro, nem mesmo o pão de cada dia conseguiam mais comprar.
Numa dessas noites, o lenhador atormentado pelas preocupações não conseguia dormir e ficava se revirando inquieto na cama e, entre um suspiro e outro, perguntou à mulher, que era madrasta das crianças:
— Que será de nós? Como alimentaremos nossos filhinhos, se nada temos nem para nós?
— Escuta aqui, meu caro marido — respondeu ela —, amanhã cedo os levaremos para o meio da floresta. Lá acenderemos uma fogueira e lhes daremos um pedaço de pão para que se alimentem. Depois iremos para o nosso trabalho e os deixaremos lá sozinhos. Eles não conseguirão encontrar o caminho de casa e assim ficaremos livres deles.
— Não, mulher, não posso fazer isso. Se abandonar meus filhos sozinhos na floresta, não tardarão as feras a devorá-los, como poderei viver depois?
— És um tolo, isso sim. Teremos de morrer os quatro de fome e nada te resta se não aplainar as tábuas para os nossos caixões.
Contudo, não deu sossego ao pobre marido até ele concordar.
joao e maria hansel und gretel irmaos grimm contos de fadas 10
— Mas as pobres crianças causam-me uma pena imensa! — repetia ele.
As crianças, de tanta fome, também não conseguiam dormir. Por isso, ouviram tudo o que a madrasta dizia ao pai. Chorando copiosamente, Maria disse ao irmão:
— Estamos perdidos!
— Não se preocupe — respondeu João —, não tenha medo, eu sei o que fazer.
Assim que os velhos adormeceram, João levantou-se bem de mansinho, vestiu o paletó, abriu a porta da frente e saiu. A lua resplandecia e as pedras branquinhas cintilavam diante da casa. O menino as apanhou e meteu nos bolsos quantas pôde. Depois voltou para casa e disse a Maria:
— Fique tranquila, querida irmãzinha, e dorme sossegada. Deus não nos abandonará.
E deitou-se novamente.
Ao amanhecer, antes ainda do sol raiar, a mulher acordou as crianças, dizendo:
— Levantem-se, seus preguiçosos. Vamos catar lenha na floresta. Deu um pedaço de pão a cada um e disse:
— Isto é para o almoço, mas não deveis comê-lo antes do meio-dia, se não nada mais tereis que comer depois.
Maria guardou o pão no avental pois João estava com os bolsos cheios de pedras. Em seguida, foram todos rumo à floresta. Tendo caminhado um certo trecho, João parou e voltou-se a olhar para a casa. Fez isso repetidas vezes, até que o pai, intrigado, lhe perguntou:
— Que tanto olhas, meu filho, e por que ficas sempre para trás? Vamos, apressa-te.
joao e maria hansel und gretel irmaos grimm contos de fadas 1
— Ah, papai — disse o menino —, estou olhando para o meu gatinho branco que, de cima do telhado, está acenando para mim.
— Tolo, não é o teu gato — interveio a mulher. — Não vês que é o sol da manhã brilhando na chaminé?
Mas João não olhava para gato nenhum, era apenas um pretexto para, todas as vezes, deixar cair no caminho uma das pedrinhas brilhantes que trazia no bolso.
Quando, finalmente, chegaram ao meio da floresta, disse-lhes o pai:
— Juntemos um pouco de lenha, meninos, vou acender uma fogueira para que não fiquem com frio.
João e Maria juntaram uma boa quantidade de gravetos e ramos secos, com os quais acenderam a fogueira. Assim que as chamas se elevaram, disse-lhes a mulher:
— Deitai-vos junto ao fogo, meninos, enquanto nós vamos rachar lenha.
Quando terminarmos o nosso trabalho, viremos buscar-vos.
João e Maria sentaram-se perto do fogo e, ao meio-dia, cada qual comeu o seu pedaço de pão. Ouvindo os golpes do machado, julgaram que o pai estivesse ali por perto, mas não era o machado, era simplesmente um galho que ele havia amarrado a uma árvore seca e que batia sacudido pelo vento. Ficaram muito tempo sentados junto do fogo; depois, por conta do cansaço, adormeceram profundamente. Quando despertaram, já era noite avançada. Maria começou a chorar com medo.
— Como sairemos da floresta?
— Espera um pouco — disse-lhe João para consolá-la —, espera até surgir a lua, aí encontraremos o caminho.
joao e maria hansel und gretel irmaos grimm contos de fadas 5
Não tardou, apareceu a lua resplandecente. João tomou a irmãzinha pela mão e juntos foram seguindo as pedrinhas, que brilhavam como moedas novas e lhes indicavam o caminho. Andaram a noite toda. Ao amanhecer, chegaram à casa do pai. Bateram à porta e, quando a mulher abriu, vendo os dois na sua frente, disse, muito zangada:
— Crianças preguiçosas, por que dormiram tanto na floresta? Até pensamos que não queriam mais voltar para casa.
O pai, ao contrário, alegrou-se ao vê-los, pois tinha remorso por tê-los abandonado lá sozinhos.
Assim passou certo tempo. Depois a miséria tornou a invadir a casa e, uma noite, quando estavam deitados, os meninos ouviram a madrasta dizer ao pai:
— Já comemos tudo o que havia em casa, só nos resta meio pão. É preciso levá-las embora. Desta vez, porém, para o fundo da floresta, para que não encontrem o caminho de volta. Não nos resta outra solução.
O homem sentiu o coração apertar e ia pensando: "Seria melhor dividir teu último pão com teus filhos", e relutava em concordar. A mulher, porém, não queria dar-lhe ouvido e censurava-o asperamente. Mas como havia cedido da primeira vez, viu-se forçado a ceder novamente.
joao e maria hansel und gretel irmaos grimm contos de fadas 8
As crianças, que ainda estavam acordadas, ouviram toda a conversa. Assim que os velhos adormeceram, João levantou-se novamente para sair de mansinho, como da outra vez, para catar as pedrinhas lá fora, mas a madrasta havia trancado a porta. Entretanto, consolou a irmãzinha, dizendo-lhe:
— Não chores, Maria, dorme sossegada. O bom Deus vai nos ajudar.
Ao raiar do dia, na manhã seguinte, a madrasta tirou as crianças da cama. Cada um deles recebeu um pedaço de pão, ainda menor que da vez anterior. No caminho para a floresta, João esfarelou-o no bolso e, de quando em quando, parava a fim de, jeitosamente, deixar cair as migalhas.
— Que tanto olhas para trás, João, e por que te demoras? — perguntou o pai.
— Estou olhando para o meu pombinho que está a dizer-me adeus de cima do telhado.
— És um tolo — disse a mulher —, não vês então que não é o teu pombinho, mas sim o sol nascente, que brilha na chaminé?
Entretanto, o menino foi, pouco a pouco, marcando o caminho com as migalhas.
joao e maria hansel und gretel irmaos grimm contos de fadas 3
Dessa vez a madrasta levou as crianças ainda mais para o interior da floresta, para um lugar onde jamais haviam estado. Acenderam, novamente, uma grande fogueira e ela disse-lhes:
— Ficai aqui, quietinhos, meninos. Quando estiverdes cansados, deitai-vos e dormi um pouco. Enquanto isso, nós iremos rachar lenha e, à tarde, ao terminar nosso trabalho, viremos buscar-vos.
Ao meio-dia, Maria repartiu seu pedaço de pão com o irmão. Depois adormeceram e anoiteceu, mas ninguém foi buscá-los. Acordaram quando a noite ia alta, e a menina começou a chorar. João consolou-a, dizendo:
— Espera até surgir a lua, aí então veremos as migalhas de pão que espalhei e por elas encontraremos o caminho de casa.
Quando surgiu a lua, levantaram-se, mas não encontraram mais nem uma só migalha. Os passarinhos, que andavam por toda parte, tinham comido todas. João então disse à Maria:
— Não tem importância, vamos encontrar o caminho de qualquer maneira. Não encontraram o caminho e andaram toda a noite e mais um dia inteiro sem conseguir sair da floresta. Estavam com uma fome tremenda, pois só tinham comido algumas amoras, e tão cansados que as pernas não se aguentavam mais. Então, deitaram-se debaixo de uma árvore e adormeceram.
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Na manhã do terceiro dia, retornaram a procurar o caminho, mas cada vez se embrenhavam mais pela floresta e, se ninguém os ajudasse, certamente acabariam morrendo de fome.
Ao meio-dia, avistaram um lindo passarinho, branco como a neve, pousado num galho. Cantava tão lindamente que os meninos pararam para ouvi-lo. Quando acabou de cantar, saiu voando, e as crianças foram atrás dele. Assim chegaram a uma casinha onde o passarinho pousou no telhado. Aproximaram-se e viram que a casinha era feita de pão de ló e coberta de chocolate, com janelinhas de açúcar.
— Oba! — exclamou o menino satisfeito. — Podemos fazer uma excelente refeição. Eu comerei um pedaço do telhado e tu, Maria, podes comer um pedaço da janela: é doce.
João subiu na ponta dos pés, estendeu as mãos e arrancou um pedaço de telhado para provar. Maria começou a lamber os vidros da janela. Então, de dentro da casa, saiu uma vozinha estridente:
Rapa, rapa, rapinha,
Quem rapa a minha casinha?
Os meninos responderam:
— O vento, sou eu,
O filho do céu.
E continuaram comendo, sem se perturbar. João, que achava o telhado delicioso, arrancou um belo pedaço e Maria arrancou um vidro inteiro, redondo. Sentou-se no chão e comeu-o deliciada.
Mas, de repente, abriu-se a porta e num passo trôpego saiu uma velha bem idosa, apoiada numa muleta. João e Maria assustaram-se de tal maneira que deixaram cair o que tinham nas mãos. A velhinha, porém, disse-lhes:
— Ah, meus queridos meninos, quem vos trouxe aqui? Entrai e ficai comigo, aqui nenhum mal vos acontecerá.
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Pegou-os pela mão e levou-os para dentro da casinha. Aí serviu-lhes uma deliciosa refeição, com leite e bolinhos, maçãs e nozes. Depois foram preparadas para eles duas lindas caminhas, muito limpas e alvas; João e Maria, muito cansados, deitaram-se, acreditando estar no céu.
A velha fingia ser muito boa, mas na verdade era uma bruxa muito má, que atraía as crianças, por isso construiu a casinha de pão de ló. E, quando caía alguma criança em suas mãos, ela matava-a, cozinhava-a e comia-a, e esse era um dia de festa.
As bruxas, geralmente, não enxergam bem e têm os olhos vermelhos, mas são dotadas de um olfato muito agudo, como os animais, o que lhes permite sentir o cheio de uma criança de longe. Portanto, quando João e Maria se aproximaram da casa, ela riu, dizendo com os seus botões: "Estes caíram em meu poder, não me escaparão mais."
Pela manhã, bem cedinho, antes que os meninos acordassem, levantou-se e foi espiá-los. Vendo-os bochechudos e coradinhos, a dormir como dois anjinhos, murmurou: "Que petisco delicioso vou ter!" E agarrando João, levou-o para um chiqueirinho, trancando-o dentro das grades de ferro. De nada lhe adiantou gritar e espernear.
Depois foi ter com Maria. Sacudiu a menina e gritou:
— Levanta-te, preguiçosa! Vai buscar água e prepara uma boa comidinha para teu irmão, que está preso no chiqueirinho e deve engordar. Pois, assim que estiver bem gordinho, quero comê-lo.
Maria começou a chorar copiosamente, mas seu pranto foi inútil e teve mesmo de fazer o que lhe ordenava a perversa bruxa.
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Maria, então, preparava as refeições mais requintadas para o irmão, enquanto ela ficava só com as sobras. Cada manhã a velha ia até junto da grade e dizia:
— João, mostra-me teu dedinho, quero ver se está gordinho!
João, porém, mostrava-lhe sempre um ossinho e a velha, que não enxergava nem um palmo diante do nariz, julgava que fosse o dedo do menino e ficava muito admirada por ele nunca engordar. Passadas quatro semanas, visto que João continuava sempre magro, perdeu a paciência e resolveu não esperar mais.
— Vamos, Maria — ordenou —, traz água depressa. Gordo ou magro não importa, o matarei assim mesmo e amanhã o comerei.
Como chorou a pobre irmã ao ter de trazer a água! Como lhe corriam rios de lágrimas pelo rosto!
— Ah, Deus bondoso, ajuda-nos! — implorava ela. — Antes nos tivessem devorado as feras no meio da floresta! Pelo menos teríamos morrido juntos!
— Deixa de lamentações — gritou-lhe a velha —, elas de nada adiantam.
Pela manhã, bem cedinho, Maria teve de ir buscar água, encher o caldeirão e acender o fogo.
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— Primeiro vamos assar o pão, já preparei a massa — disse a bruxa — e já acendi o forno.
Empurrou a pobre Maria para perto do forno do qual saíram grandes labaredas.
— Entra lá dentro — disse a velha — e vê se já está bem quente para poder assar o pão.
Assim, pensava a bruxa, quando Maria entrasse lá dentro, fecharia a boca do forno e a deixaria assar para comê-la também. A menina, porém, adivinhando sua intenção, disse:
— Eu não sei como se faz! Como é que se entra?
— Tonta, estúpida — disse a velha —, a abertura é bastante grande, olha, até eu poderia entrar!
Assim dizendo, abeirou-se da boca do forno, aproximando a cabeça. Maria, então, com um forte empurrão a fez entrar no forno e fechou rapidamente a porta de ferro com o cadeado. Uh! Que berros horríveis soltava a bruxa! Maria, porém, saiu correndo e a velha acabou morrendo, miseravelmente queimada.
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Chegando ao galinheiro, a menina abriu a portinhola, dizendo ao irmão:
— João, corre, estamos livres. A velha bruxa morreu.
João então saiu pulando, alegre como um passarinho, ao lhe abrirem a gaiola. Com que felicidade se abraçaram e se beijaram, rindo e dançando! Como nada mais tinham a temer, percorreram a casinha da bruxa e viram espalhadas pelos cantos grandes arcas cheias de pérolas e pedras preciosas.
— Estas são bem melhores do que as pedrinhas lá de casa! — disse João, enquanto ia enchendo os bolsos até não poder mais.
— Eu também vou levar! — disse Maria, e foi enchendo o avental.
— Agora vamo-nos embora daqui — disse o irmão —, temos que sair da floresta da bruxa.
Após terem andado durante algumas horas, chegaram à margem de um rio muito largo.
— Não vamos conseguir atravessá-lo — disse João —, não vejo nem uma ponte.
— Nem mesmo um barquinho — disse a irmã —, mas olha, aí vem uma pata. Se lhe pedirmos, ela certamente nos ajudará a atravessar:
— Patinha, patinha,
Aqui estão João e Maria,
Não podemos passar,
Queres nos levar?
A pata se aproximou da margem e João sentou nas suas costas, dizendo à irmã que também sentasse, bem juntinho dele. Mas Maria respondeu:
— Vai ficar muito pesado. É melhor que ela nos leve um de cada vez. Assim fez a boa patinha. E quando felizmente chegaram ao outro lado, depois de caminharem bastante, a floresta foi-se tornando mais familiar até que finalmente viram a casa do pai. Correram em sua direção e, lá dentro, o abraçaram e o cobriram de beijos.
O pobre homem nunca mais tivera uma hora feliz desde que abandonara as crianças no meio da floresta. A mulher (para felicidade de todos) havia morrido. Então Maria sacudiu o avental, deixando rolar pelo chão as pedras preciosas. João acrescentou todo o conteúdo de seus bolsos.
Desde então, acabaram-se todos os sofrimentos e preocupações, e os três viveram felizes pelo resto da vida.
"Minha história acabou, um rato passou, quem o pegar poderá sua pele aproveitar."
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