domingo, 24 de janeiro de 2021

O presidente caricato

Democratas precisam evitar que Bolsonaro passe a controlar o Poder Legislativo ***
Surpreende que o mundo político, em sentido estrito – Congresso, parlamentares, partidos –, somente agora comece a cogitar de um possível impeachment presidencial por crimes de responsabilidade. Quando o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ativo militante do moderantismo, veio a público declarar (15/1) que o afastamento de Bolsonaro do cargo de presidente da República “será debatido de forma inevitável no futuro”, ele deu o tom de uma inflexão que se poderá consolidar nos próximos meses. Aproveitou para chamar às falas o Congresso, que inexplicavelmente se mantém em recesso enquanto o País pega fogo. Bolsonaro não havia sido, até agora, atingido por uma ameaça desse tipo. A primeira etapa de seu mandato foi um período de desgoverno e tragédia, em que ele pintou e bordou, agindo com uma mistura patética de tiranete, chefe de gangue e godfather tropical. O escárnio diante do vírus, do povo, da vacina e dos cientistas foi constante, mastigado com indiferença e como prova de “autenticidade” por uma população em grande parte anestesiada. Com a pandemia, sua personalidade desequilibrada e narcisista ganhou plena manifestação. Os meses foram se passando e os estragos, aumentando. Seu prontuário engordou. O presidente fez política contra a política, empenhado em criar confusão para camuflar sua incompetência e atiçar seus seguidores. Em nenhum momento, porém, pôde proclamar-se vitorioso. O padrão oposicionista seguiu roteiro conciliador, que travou os planos maléficos do presidente. Fez o rei ficar nu. Meio que em silêncio, com muito jogo de bastidores, possibilitou que houvesse alguma governação no Brasil, paralisando a Presidência da República. Bolsonaro foi reduzido a uma caricatura de presidente, que fala compulsivamente, de modo agressivo, com cálculo de malandro, boca cheia de impropérios e grosserias, mas é inepto e pouco faz de positivo. Age como um animal encurralado, que ameaça sem morder. Continua a atacar as instituições, a instigar as Forças Armadas, a ameaçar retrocessos. Com os venenos que produz na cozinha do Palácio constrói um imaginário negativo, polarizador, que confunde e corrói. Suas orientações esvaziam e destroem setores estratégicos das políticas sociais, dos direitos humanos, da economia, da proteção ambiental. Sua indigência diplomática comprometeu até mesmo a produção das vacinas e a campanha de vacinação. A oposição teve sucesso nessa que a mente afiada do cientista político baiano Paulo Fábio Dantas Neto chamou de “estratégia maricas”: o bolsonarismo foi forçado a negociar. Os humores mudaram, porém. Quanto mais a pandemia se agravou, quanto mais os ministros de Bolsonaro mostraram sua desqualificação, quanto mais o País se foi marginalizando no sistema internacional e fracassando no comércio bilateral, mais aumentou a pressão para o encontro de uma solução. Abriu-se assim uma nova etapa da luta política. Ainda que a “estratégia maricas” consiga continuar arrancando a fórceps decisões do governo federal, ela precisa ser complementada por uma estratégia mais contundente, que aperte o cerco, mas saiba evitar tentações polarizadoras, escolhos e armadilhas. A nova fase transcorrerá em algumas frentes principais. A primeira é a afirmação de um campo oposicionista democrático consistente, que consiga soldar os diferentes partidos e forças políticas numa unidade programática mínima, forjada sem vetos ideológicos, firulas acadêmicas e cálculos políticos sofisticados. A segunda é a organização do clamor popular, com a invenção de formas de protesto que aumentem o som das panelas e contornem a dificuldade de se ter gente nas ruas. A terceira é o processamento político das denúncias de crime de responsabilidade contra Bolsonaro. Disso dependerá a abertura ou não do impedimento constitucional do presidente. Por mais que esse seja um passo delicado, sobretudo quando se considera que o presidente tem apoio popular e parlamentar, há no Congresso lideranças com inteligência política e dignidade cívica para impedir que as labaredas da crise institucional incendeiem o País. No curto prazo, uma quarta frente passa pelo desfecho da disputa pelas presidências da Câmara e do Senado. Muitos parlamentares estão em flutuação, marcando posição, sem compreender a importância de um evento que poderá definir muito do ritmo político daqui para a frente. Mas é o que se tem. Os operadores democráticos precisarão trabalhar dobrado, sensibilizar setores do Centrão e da esquerda para evitar que Bolsonaro passe a controlar o Poder Legislativo. O recurso ao impeachment poderá catalisar o mal-estar que hoje, impregnado de horror, medo e repulsa, se espalha pela sociedade. Como está não pode ficar. A perspectiva conciliadora, vitoriosa em nossa História recente, só tem a ganhar se adquirir corpo e poder de direcionamento, contrapondo ao negativismo radical do presidente o ar renovado da política positiva. Sem o qual, aliás, nenhum vírus será derrotado. *** - Marco Aurélio Nogueira* *** - O Estado de S. Paulo *** *Professor titular de teoria política da Unesp *** https://gilvanmelo.blogspot.com/2021/01/marco-aurelio-nogueira-o-presidente.html *** *** Jacaré econômico ***
Placar parcial no Congresso: 100% de apoio ao auxílio emergencial, 0% para o Ministério da Economia *** É uma roda de ciranda a coleção de compromissos assumidos na área econômica pelos candidatos à presidência da Câmara e do Senado. Quatro dos quatro principais candidatos (os senadores Rodrigo Pacheco e Simone Tebet e os deputados Baleia Rossi e Arthur Lira) deram declarações de apoio à nova rodada do auxílio emergencial, que o ministro Paulo Guedes resiste em aceitar. Resultado até agora: 100% de apoio para o auxílio contra 0% para o Ministério da Economia. Guedes, por sua vez, quer uma nova CPMF para financiar a desoneração da folha e aposta na vitória de Lira, que, no ano passado, indicou essa possibilidade “desde que com alíquota baixa” para criar empregos. Contrário ao novo imposto, Baleia Rossi, que é autor da PEC 45 de reforma tributária, sai a campo e marca posição depois que reportagem do Estadão mostrou que o plano de Guedes para a recriação do imposto não morreu. “Meu adversário é pura metamorfose ambulante. Ele já quis CPMF. Depois, disse que não é bem assim.” Pisando em ovos e com as redes sociais repercutindo negativamente o risco da volta da CPMF, Lira desconversa, finge esquecer o apoio dado há poucos meses, liga para Guedes e cobra explicações do ministro. O Ministério da Economia diz que “não tem nada disso” e tenta abafar o assunto. A recomendação é ninguém falar nada agora para não atrapalhar a eleição. Mas o tema volta com Pacheco, que afirma que “pode se discutir, criar a CPMF e desonerar a folha, é até aceitável desde que haja desoneração na outra ponta”. Assim como Baleia não pode fechar as portas totalmente para o imposto sobre transações, porque tem também entre seus apoiadores defensores da desoneração dos salários, Lira tampouco quer afastar aqueles parlamentares que têm ojeriza à CPMF. Baleia diz que a CPMF representa aumento de carga tributária. Governo e aliados tentam emplacar a narrativa de que a PEC 45, patrocinada pelo arqui-inimigo Rodrigo Maia, é que vai elevar o peso dos impostos. Bolsonaro pega carona e diz: “Se a reforma provocar aumento de tributos, é melhor deixar como está”. Resultado até agora: ninguém ganha, e a reforma tributária, que todos dizem querer 100%, fica ainda mais difícil e distante. Se há uma pauta que revela como nunca a sinuca de bico desses acordos do plantão eleitoral é o das privatizações. No auge da briga com Maia, Guedes o acusou de bloquear o avanço das privatizações da Casa de Moeda e Eletrobrás, por causa de um acordo que ele teria feito com o PT para se reeleger presidente da Câmara. Agora, o ministro assiste a Pacheco, o candidato do Planalto, ser apoiado pelo PT e detonar a privatização da Eletrobrás, a principal da lista de Guedes para 2021. A disfuncionalidade da aliança do PT na Câmara com Baleia, muito criticada por Guedes, e no Senado com Pacheco bloqueia os planos do ministro, independentemente do vencedor. Resultado até agora: chances mínimas de a privatização avançar. Quando o assunto é teto de gastos, a maioria defende a sua manutenção com responsabilidade fiscal, mas só Pacheco pula a cerca e diz: “Teto de gastos não pode ficar intocado”. Indicadores do mercado desabam na mesma hora. Simone Tebet, sua concorrente na eleição, vai ao mercado no dia seguinte e propõe discutir mudanças na metodologia. Tebet, Baleia e Lira sabem que segurar o rojão para manter o teto não será fácil, com o Orçamento apertado para atender a tantos compromissos e à demanda do enfrentamento da covid-19. Resultado até agora: teto balançando mais e gatilho quase acionado para a renovação do auxílio, com a queda de popularidade de Bolsonaro pelo desastre na condução da pandemia. A equipe econômica tenta segurar até março a pressão. Mas tem gente graúda que aposta alto que o ministro vai fazer do limão uma limonada e aceitará a nova rodada, com a condicionante de que o Congresso aprove em um mês uma PEC com medidas de ajuste. Até lá, Guedes vai segurando a pressão com a promessa da sua ciranda econômica: antecipação de 13.º salário e abono, liberação de FGTS, adiamento de impostos... Parlamentares podem até dizer que está tudo normal. Mas tem candidato vendendo como vantagem a promessa eleitoral de que “promessa com ele é cumprida”. Nenhum deles escapa da metamorfose ambulante de Raul Seixas. Tudo isso no caldeirão do impeachment. Com essa ciranda disforme, será trabalhoso dar rumo para a pauta econômica depois das eleições, porque ninguém sabe direito que bicho sairá dali. Será que é um jacaré? *** - Adriana Fernandes *** - O Estado de S. Paulo *** https://gilvanmelo.blogspot.com/2021/01/adriana-fernandes-jacare-economico.html *** *** O custo de ser pária ***
A permanência de Jair Bolsonaro na Presidência inviabiliza a recuperação da imagem do País e a retomada dos contatos produtivos e pacíficos com todas as nações. *** O constrangedor isolamento do Brasil entre as nações civilizadas, resultado de uma política externa amalucada e irresponsável, deveria ser motivo mais que suficiente para que o chanceler Ernesto Araújo fosse demitido sem mais delongas. A pressão para que isso ocorra, aliás, nunca esteve tão forte. Parece estar se constituindo um consenso, inclusive em alguns setores do próprio governo, que a manutenção do sr. Araújo à frente do Itamaraty representa enorme risco para a imagem do Brasil, já tão desgastada, e justamente no momento em que o País, mergulhado numa pandemia mortal e numa crise econômica desafiadora, mais precisa da cooperação internacional. A questão é que a demissão do sr. Araújo não resolveria nada, pois o problema não é o chanceler, mas o chefe dele. É a permanência do sr. Jair Bolsonaro na Presidência que inviabiliza a recuperação da imagem do País e a retomada dos contatos produtivos e pacíficos com todas as nações, que sempre foi a marca da diplomacia do Brasil. É claro que o sr. Araújo é o responsável direto pela formulação da estapafúrdia doutrina externa bolsonarista e deve ter seu nome marcado na história, em letras maiúsculas, como o chanceler que se empenhou em destruir o legado do Barão do Rio Branco. Deve ser lembrado para sempre como aquele que conduziu a diplomacia nacional sob inspiração de um obscuro ex-astrólogo que vive nos Estados Unidos, espécie de guru de Bolsonaro et caterva. Mas Ernesto Araújo não age por conta própria. É apenas o sabujo encarregado de colocar em palavras a mixórdia reacionária que resume a “visão de mundo” de Bolsonaro, o que, convenhamos, não é para qualquer um. Enquanto o Barão do Rio Branco, ciente das fragilidades brasileiras, fez do Brasil um país naturalmente voltado para o entendimento no concerto das nações, Bolsonaro escolheu comprar brigas gratuitas com algumas das maiores potências do planeta, para enfatizar a independência do País sob seu comando. Ao mesmo tempo, derretia-se de amores por Donald Trump quando este ocupava a presidência dos Estados Unidos, enquanto o resto do mundo civilizado, ciente do caráter daninho de Trump, tratava de se afastar dele. Em vez de independência, a doutrina bolsonarista isolou completamente o Brasil. Mas o sr. Araújo não se fez de rogado: anunciou que, se este era o preço a pagar por defender a “liberdade”, ou seja, “se isso faz de nós um pária internacional, então que sejamos esse pária”. Perfeitamente alinhado a seu chefe, o ainda chanceler teve o descaramento de chamar de “cidadãos de bem” os terroristas que invadiram o Congresso dos Estados Unidos para interromper a confirmação da eleição de Joe Biden como presidente. Adicionando o insulto à injúria, Ernesto Araújo aproveitou para corroborar a tese golpista promovida pelo trumpismo de que houve fraude nas eleições, mentira que o presidente Bolsonaro repetiu vezes sem conta. Se o chanceler for demitido, portanto, não será por ter descumprido ordens ou por ter sido desleal, mas sim, ao contrário, porque foi absolutamente fiel a Bolsonaro – e, por isso, criou grandes e gravíssimos problemas para o Brasil, hoje visto com reticências pelas duas grandes potências globais, Estados Unidos e China, além de enfrentar má vontade na União Europeia e na Índia. É uma façanha. O afastamento de Araújo pode ser o gesto que o mundo espera de Bolsonaro para mudar um pouco a percepção negativa sobre o Brasil. Mas seria ingênuo acreditar que seu eventual substituto terá atuação muito diferente. Pode haver algum pragmatismo nos próximos tempos, especialmente depois que Donald Trump, ídolo de Bolsonaro e Araújo, deixou a Casa Branca. Um sinal disso é a carta que o presidente brasileiro endereçou a Joe Biden, novo presidente norte-americano, pregando uma boa relação. Mas todos sabem que a tal carta não vale o papel em que foi escrita: Bolsonaro menospreza profundamente tudo o que Biden representa – democracia, diálogo e serenidade – e nada o fará mudar de ideia. O chanceler, portanto, pode ser qualquer um – é Bolsonaro quem deliberadamente faz do Brasil um “orgulhoso pária”. *** - O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais *** – Opinião | O Estado de S. Paulo *** https://gilvanmelo.blogspot.com/2021/01/o-que-midia-pensa-opinioes-editoriais_23.html Quem é o cavaleiro símbolo do Estadão? Conheça a história da nossa logomarca *** Jornaleiro francês percorria cidade a cavalo, tocando uma corneta para promover o jornal em 1876 *** 02 de setembro de 2020 | 11h 51 *** Edmundo Leite - Acervo Estadão ***
*** Evolução do ex-libris do Estadão a partir do desenho original de José Wasth Rodrigues EX-LIBRIS *** Foi baseado em registros jornalísticos, literários e fotográficos como esses acima que surgiu o "ex-libris" do jornal O Estado de S. Paulo. Expressão vinda do latim - que em português significa "dos livros de" - "ex-libris é uma etiqueta com desenhos e palavras que identifica a biblioteca à qual determinados livros pertencem. A ilustração com a figura do jornaleiro a cavalo com sua corneta foi desenhada pelo pintor e artista plástico José Wasth Rodrigues a pedido do Estadão, em algum momento da década de 1930, para identificar os livros da biblioteca do jornal. Na década de 1950, a direção do jornal decidiria fazer do cavaleiro francês o símbolo oficial da empresa. Suplementos temáticos, como o Agrícola, o Literário e o turismo passariam a trazer em seus cabeçalhos a ilustração do cavalinho, como muitos passaram a chamar o ex-libris. Em 1971 o símbolo, que passaria por sutis adaptações ao longo dos anos, passaria a aparecer diariamente no expediente da página 3 e, a partir de 1990, como selo do artigo principal da seção Notas & Informações, onde são publicados os editoriais do jornal. *** (...) *** O CACHORRO *** Outro detalhe que mostra a ação do tempo na cidade desde 1876 é o cachorro que aparece junto às pernas traseiras da montaria de Bernard Gregoire. Com a presença do cão, Wasth Rodrigues representava a fuzarca que uma numerosa cachorrada que ficava livre nas ruas da cidade por aqueles dias fazia quando o francês passava, aumentando ainda mais o alvoroço provocado pela sua buzina e o movimento em torno dele para comprar jornais. *** https://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,quem-e-o-cavaleiro-simbolo-do-estadao-conheca-a-historia-da-nossa-logomarca,70003420805,0.htm *** ***

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